Natália Faria, in Jornal Público
A comunidade cigana em Portugal tem piores condições de saúde do que a população não cigana, mas recorre menos aos serviços públicos de saúde, muitas vezes porque “não percebe o que lhes é dito nas consultas médicas”. A conclusão está contida num estudo sobre as comunidades ciganas e a saúde, apresentado ontem,
no Porto, segundo o qual este hiato só será superado com recurso à figura do mediador da saúde.
“As experiências desenvolvidas em locais como o hospital D. Estefânia mostram que um mediador da saúde pode ser muito efi caz na resolução deste problema, mas, infelizmente, o estatuto do mediador não está regulamentado em Portugal”, lamenta
Sandra Araújo, coordenadora da Rede Europeia Anti-Pobreza (REAPN) e uma das autoras do estudo.
“Vamos ser mais assertivos e desenvolver uma pressão mais consistente porque, de outro modo, os poucos mediadores culturais existentes vão continuar a depender da boa vontade das instituições”, acrescentou Sandra Araújo, para quem outra das prioridades à escala nacional é garantir que os profi ssionais de saúde recebam formação sobre diversidade cultural.
Se estas medidas não forem adoptadas, os cerca de 40 mil ciganos que se calcula existirem em Portugal vão continuar a recorrer esporadicamente ao SNS e quase só aos serviços de urgência. “Na saúde materno-infantil, por exemplo, as mulheres ciganas
têm experiências de parto muito cedo, mas raramente recorrem a consultas
específi cas de ginecologia na gravidez, assim como a exames como o papanicolau e a mamografia.”
O diagnóstico resultante dos inquéritos efectuados junto de 367 famílias ciganas portuguesas mostra que doenças como a asma e a bronquite afectam 25 por cento dos ciganos, seguidas do colesterol (15 por cento) e da tensão arterial alta (11 por cento).
A automedicação é prática comum entre 55,8 por cento dos entrevistados, sendo os medicamentos para os resfriados/gripe e para a febre e dores os mais solicitados, a par dos contraceptivos e dos medicamentos para o colesterol e diabetes. Dos inquiridos, 36 por cento nunca foram ao dentista – para a população em geral este valor anda nos 13,7 por cento.
Para Sandra Araújo, este retrato cruza-se em grande parte com a precariedade habitacional que afecta esta comunidade, cujos elementos vivem maioritariamente “em barracas e acampamentos sem condições de salubridade”. É, aliás, esta circunstância
que faz com que a comunidade cigana portuguesa seja, na União Europeia, aquela que apresenta mais doenças crónicas.