Isabel Stilwell, in Destak
»Só as redes sociais e de vizinhança têm impedido que a situação social portuguesa expluda», afirmou o bispo do Porto no lançamento do livro O que sabemos sobre a pobreza em Portugal, que aconteceu ontem na Faculdade de Economia daquela cidade. E depois avisou: «Não podemos pensar em termos imediatos. Precisamos de ter cuidado e abrir os olhos, sendo mais solidários, porque é da nossa própria sobrevivência que se trata.»
Aura Teixeira, uma das três coordenadoras da obra que reúne textos de oito grandes especialistas na área, lembrou que combater a pobreza de uns (e são muitos) é contribuir para a riqueza de todos. Afinal, quantos mais portugueses tiverem acesso à educação, à saúde, ao trabalho, mais irão produzir e consumir, contribuindo para um pais mais rico, de que seremos todos usufrutuários.
Num primeiro momento estranhamos este «combater a pobreza para nosso próprio bem». Estamos mais habituados ao apelo à solidariedade altruísta, em que se dá sem olhar ao que se recebe.
Mas D. Manuel Clemente e Aura Teixeira usam uma estratégia mais inteligente para o momento actual. Quando as pessoas estão assustadas, porque perderam de facto qualidade de vida ou porque temem vir a perdê-la, fecham-se sobre os seus problemas, sitiando-se atrás de muralhas, o azeite a ferver preparado para lançar sobre os inimigos, reais ou imaginários. As desgraças dos outros tornam-se secundárias, e é fácil embarcar num “salve-se quem puder”.
Provavelmente, só se quebra este egocentrismo deixando claro que tudo o que diz respeito aos outros nos diz respeito a nós, porque a vida em sociedade é uma teia complexa em que não é possível puxar um fio sem que os outros venham atrás. Talvez a estratégia resulte. Talvez o medo dos efeitos do nosso egoísmo nos faça abrir os olhos. Se calhar é isto o “Deus escreve direito por linhas tortas”.