Alcançando os 33,3%, Portugal está ligeiramente acima da média da UE no que respeita à percentagem global de mulheres em cargos de administração nas empresas cotadas em bolsa, mas grande parte ocupa cargos não-executivos. De modo a alcançar números equivalentes aos do topo da Europa, a legislação em torno da paridade de género em cargos de gestão terá de ser reforçada, disse ao Expresso Sara Falcão Casaca, professora do ISEG. Hoje é Dia Internacional da Mulher
trajetória ascendente no que respeita ao número de mulheres nos órgãos de administração das empresas portuguesas cotadas na bolsa é evidente, mas os últimos números da União Europeia (UE) nesta matéria não deixam, contudo, de mostrar enormes disparidades entre os países e alguns sinais de alerta.
Se, em 2022, Portugal até esteve ligeiramente acima da média da UE no que toca à percentagem global de mulheres em cargos de administração - 33,3% face a 32,2% - no indicador correspondente ao número de mulheres que exercem cargos executivos, como o de CEO, ficou aquém da média dos 27 Estados-membros - 19,7% contra 21,1%.
Os dados são do Instituto Europeu para a Igualdade de Género, e retratam um mundo empresarial que ainda coloca alguns obstáculos à progressão profissional das mulheres europeias. Na Hungria ou no Chipre, por exemplo, representam cerca de 10% do total dos cargos em órgãos administrativos, sendo que, no lado oposto, representam 45% e 42% em França e Itália, respetivamente.
No caso português, a evolução tem sido notória desde 2003. Nesse ano, as maiores empresas cotadas no Euronext Lisboa tinham 3,5% de mulheres nos seus órgãos de administração, uma percentagem que subiu timidamente para 5,4% em 2010 e 16% em 2017.
Tudo mudou a partir de 2018, quando entrou em vigor uma lei que obriga as empresas cotadas em Portugal a cumprir quotas e garantir que há pelo menos entre 20% a 33,3% de pessoas do sexo sub-representado nos seus órgãos sociais. Desde então, o número de mulheres na administração destas empresas disparou para os 33,3%, um aumento de 5% face a 2021 - ou seja, a lei é cumprida.
Contudo, as mulheres ocupam cargos sobretudo em cargos não executivos, estando mais arredadas de funções executivas.
Entre os países que adotaram um enquadramento regulatório semelhante, como França, Itália ou Bélgica, Portugal está perto da cauda, ao mesmo nível da Áustria e precedido pela Grécia. Regra geral, os países que optaram por quotas vinculativas têm tido bons resultados nos índices de paridade de género em cargos de gestão, apesar de outros, caso da Islândia, Suécia ou o Reino Unido, que apostaram em medidas de apoio à auto-regulação empresarial, também estarem bem classificados.
No sentido de harmonizar os quadros legais dos 27, a UE adotou no final de 2022 uma diretiva que exige que todas as grandes empresas cotadas em bolsa na UE tenham pelo menos 40% dos cargos de administrador não executivo ou 33% de todos os cargos de administrador ocupados pelo sexo feminino até ao final de junho de 2026.
COMO PODERÁ PORTUGAL MELHORAR A SUA CLASSIFICAÇÃO?
Para Sara Falcão Casaca, coordenadora do Livro Branco “Equilíbrio entre mulheres e homens e planos para a igualdade nos órgãos de gestão das empresas”, publicado no final de 2021, e professora no ISEG, é preciso mais "ambição" numa eventual revisão da lei de 2018.
Embora reconheça o relativo empenho das empresas em promover uma maior igualdade de género nas suas administrações, a investigadora diz ao Expresso que o limiar mínimo de paridade devia subir para os 40% e aplicar-se “tanto a cargos executivos como a cargos não-executivos”.
E depois há o facto de as empresas cotadas representarem uma minoria do universo empresarial português, constituído sobretudo por micro, pequenas e médias empresas. Nessas, e também nas grandes, a legislação de 2018 não se aplica.
O resultado está a vista, já que, segundo dados do Livro Branco acima referido, nas 50 maiores empresas portuguesas (privadas e não cotadas) as mulheres ocupam apenas 13% dos cargos de gestão. Por isso, Sara Falcão Casaca defende a necessidade de estender o quadro regulatório de 2018 a todas “as empresas com mais de 250 trabalhadores”.
Por fim, é preciso incentivar as empresas a “refletir” sobre planos de igualdade e a “desenhar um plano de carreiras atento à igualdade entre mulheres e homens, internamente”: qualquer lei futura deverá “valorizar mais os planos de igualdade e prever também sanções para o não cumprimento deste requisito", sugere a professora do ISEG.
O objetivo não poder estar limitado a “criar um maior equilíbrio entre mulheres e homens nos órgãos cimeiros das empresas”, mas a “procurar promover e efetivar uma maior igualdade para todas as trabalhadoras e trabalhadores", conclui.