27.9.23

Jovens de 18 anos estão a beber mais álcool. Pela primeira vez, o consumo entre raparigas superou o dos rapazes

Cristiana Faria Moreira, in Público

Consumo de álcool e de drogas tem aumentado entre os jovens de 18 anos. Tende a ser superior nos rapazes, quando se tratam de substâncias ilícitas e de padrões de consumo mais frequentes e intensos.

Nove em cada dez jovens de 18 anos diz ter consumido álcool, cinco em dez fumaram tabaco e três em dez consumiram uma substância ilícita nos 12 meses anteriores à realização de um inquérito sobre comportamentos adictivos, realizado pelo Serviço de Intervenção nos Comportamentos Adictivos e nas Dependências (SICAD). Pela primeira vez, foram as raparigas que mais consumiram bebidas alcoólicas nesses 12 meses.

Entre estes jovens, mais de metade (54%) admitiu já ter bebido álcool de "forma binge", ou seja, "intensiva", tomando cinco ou seis bebidas alcoólicas na mesma ocasião. Entre os jovens inquiridos, 36% diz ter-se embriagado severamente pelo menos uma vez nos 12 meses anteriores ao inquérito​, detalha o relatório “Comportamentos Adictivos aos 18 anos: consumo de substâncias psicoactivas”, que resulta de um inquérito feito a 135.273 jovens que participaram no Dia da Defesa Nacional em 2022.

O documento, publicado esta terça-feira, dá nota de que a prevalência de consumo de bebidas alcoólicas nos 12 meses anteriores ao inquérito é, pela primeira vez, ligeiramente superior no sexo feminino (86% entre as raparigas, 84% entre os rapazes), sendo o consumo de tabaco superior nos rapazes. Quanto à toma de tranquilizantes/sedativos sem receita médica, esta é superior nas raparigas.


“Entre 2015 e 2022 as prevalências de consumos intensivos de bebidas alcoólicas por ocasião" nos 12 meses anteriores ao inquérito aumentaram, "principalmente o consumo binge, a sua frequência, a embriaguez ligeira (nas raparigas) e a sua frequência e a embriaguez severa, sendo este aumento particularmente expressivo no grupo das raparigas”, refere o relatório. No entanto, estes consumos, “ainda que intensos por ocasião”, “tendem a ser pouco frequentes” (em uma a cinco ocasiões em 12 meses).


De acordo com as conclusões deste estudo, "os consumos tendem a ser superiores nos rapazes em comparação com as raparigas, principalmente se se trata de substâncias ilícitas e de padrões de consumo de maior frequência ou intensidade", realça o relatório.


"O que é mais comum é uma frequência esporádica, contudo, há uma percentagem de jovens que temos de considerar que consomem com mais frequência. Há determinados padrões de consumo mais problemáticos, que anteriormente eram mais típicos nos países do Norte da Europa, têm-se vindo a consolidar, comparando 2015 com 2022", nota ao PÚBLICO a psicóloga Ludmila Carapinha, uma das autoras deste estudo.

É o que a também investigadora do SICAD chama "consumo intensivo de bebidas alcoólicas", passível de provocar uma embriaguez severa e acarretar comportamentos de risco para os jovens (dificuldade em discernir, situações de violência). "Verificámos que três em cada dez jovens já o fizeram pelo menos uma vez. Se o fazem todas as semanas? Não. Também tende a ser com pouca frequência", observa.


Sobre a prevalência no consumo por parte das raparigas, a investigadora enquadra que se tem vindo a verificar "uma diminuição da diferença que existia entre homens e mulheres", tanto nos jovens como na população em geral, no consumo de bebidas alcoólicas. "Existem algumas hipóteses que têm sido colocadas através de outros estudos de que o consumo de bebidas alcoólicas [por mulheres] tem que ver com a afirmação de uma certa assertividade e até contestação do que é aceitável para o rapaz versus o que é aceitável para as raparigas", explica.

Menos cannabis e tabaco, mas mais drogas

O inquérito é realizado desde 2015 (com excepção de 2020 devido à pandemia) e abrange a quase totalidade dos jovens com 18 anos, realça a psicóloga. Por isso, permite obter informação "bastante robusta".

Olhando para os dados recolhidos entre 2015 e 2022, a conclusão é que “os consumos têm, predominantemente, aumentado (por exemplo, o consumo de cocaína e a embriaguez), embora alguns tenham diminuído, como por exemplo o consumo de tabaco”. Ainda assim, 52% dos jovens inquiridos diz já ter fumado pelo menos uma vez na vida — e 44% nos últimos 12 meses anteriores à realização do questionário.

No que respeita às substâncias ilícitas, os dados revelam também um aumento no seu consumo ao longo dos últimos anos: 34% dos jovens diz tê-las ingerido pelo menos uma vez na vida e 27% nos 12 meses anteriores e 16% nos 30 dias anteriores ao inquérito.


O consumo de anfetaminas/metanfetaminas (incluindo o ecstasy) também aumentou: 5% dos jovens admitem ter consumido estas substâncias nos 12 meses anteriores e 3% admite ter consumido cocaína.


A cannabis continua a ser o “produto ilícito consumido por mais jovens”: 23% admite ter ingerido nos 12 meses anteriores e 14% nos 30 dias anteriores ao inquérito. No entanto, em 2022, houve uma ligeira diminuição no seu consumo, nota Ludmila Carapinha.

Por outro lado, há mais consumos de substâncias ilícitas, como a cocaína ou as anfetaminas. "Estamos a falar de evoluções muito ligeiras — e não são contínuas ao longo de todos os anos —, mas há de facto uma tendência predominante de maior contacto com outras substâncias ilícitas que não a cannabis", nota.

“Comparando os jovens que declaram consumos de cada substância em 2022 com os de 2015, constata-se que em 2022 a prevalência de consumo em 40 ou mais ocasiões nos 12 meses anteriores [à realização do inquérito] tende a assumir valores muito superiores para a grande maioria dos consumos (bebidas alcoólicas, anfetaminas/metanfetaminas, cocaína, canabinóides sintéticos, catinonas sintéticas [vulgarmente conhecidas por “sais de banho”], alucinogénios, opiáceos), principalmente devido ao forte incremento deste padrão de consumo entre 2021 e 2022”, sublinha o relatório.


Entre as consequências que os próprios jovens assumem ter sentido relacionados com consumos de álcool e de outras substâncias estão situações de mal-estar emocional, relações sexuais desprotegidas, problemas de rendimento na escola/trabalho e ainda problemas de comportamento em casa.

[artigo disponível na íntegra apenas para assinantes]