Por Ana Rute Silva, in Jornal Público
O empreendedorismo social está a crescer. Filipe Santos, professor no INSEAD, diz que 25 por cento dos seus alunos querem seguir este caminho. Há cinco anos eram só cinco por cento
Filipe Santos está a assistir à mudança. O professor de Empreendedorismo na sede europeia do Insead, instalada mesmo ao lado da densa floresta de Fontainebleau, em França, vê passar gerações de alunos, todos gestores ou aspirantes a líderes de grandes empresas. São mais de mil só nos MBA, todos os anos.
Em 2005, 60 por cento dos estudantes que traçavam como objectivo criar o seu próprio negócio "encaixavam-se" no estereótipo do growth entrepreneur (aquele que quer levar a empresa à bolsa). Cerca de 35 por cento sonhavam ser empresários para dar uma boa vida à família, mas sem grandes dores de cabeça ou burocracias (são os lifestyle entrepreneurs). Apenas cinco por cento eram socialentrepreneurs, ou seja, queriam resolver um problema na sociedade, criando valor e receitas, esquecendo o lucro.
"Agora, quando pergunto aos alunos em qual dos três se revêem, 25 por cento respondem: no socialentrepreneur. Cerca de 40 por cento querem ser growth entrepreneur, revela Filipe Santos. A preocupação com o impacto social do negócio "está presente no espírito da nova geração". E isso, diz o director do Maag International Centre for Entrepreneurship, vai e (já está) a mudar o mundo.
Citando um estudo feito no Reino Unido, o professor português da prestigiada escola de Gestão diz que no momento do inquérito quatro por cento da população estava a criar uma empresa de cariz social. "Normalmente o número para empreendedores comerciais é de oito por cento. Portanto, quatro por cento não é assim tão pouco. Em Portugal a estatística será semelhante", analisa.
Outro indicador: desde 2005 que o Insead tem um programa de formação em Empreendedorismo Social para dar ferramentas de gestão a quem quer ver o negócio crescer. Dos cerca de 200 estudantes que já passaram pelo ISEP (Programa de Empreendedorismo Social), dez são portugueses. "A ideia é encontrar empreendedores sociais e dar-lhes formação sobre como criar equipas, medir o impacto, entre outras. Os participantes mantêm-se em contacto depois do curso e realizam encontros anuais", explica Filipe Santos, que também é director do ISEP.
O maior impulso do empreendedorismo social foi dado em 2006 com o Grameen Bank de Muhammad Yunus, Nobel da Paz, que lançou o conceito inovador de microcrédito. Outros seguiram-lhe os passos.
Em Portugal, o boom deu-se em 2007, refere Miguel Alves Martins, director executivo do Instituto de Empreendedorismo Social (IES), acrescentando que não faltam organizações no sector social. O que é preciso é transformá-las, diz, "dando-lhes competências e tornando-as mais inovadoras e empreendedoras". De programas de educação alimentar a livros para crianças com necessidades especiais, são cada vez mais os exemplos (ver caixa).
A formação na área também está a aumentar e o IES tem vindo a fazer um levantamento de casos no concelho de Cascais - projecto que quer replicar a nível nacional. "O que procuramos são modelos de negócios inovadores, na área social e ambiental", explica Miguel Alves Martins. Para além disso, o instituto (onde o Insead é um dos parceiros) tem como missão identificar as necessidades dos empreendedores sociais e tornar-se num centro de investigação e formação.
Ainda há muito para fazer. "A maioria [dos negócios sociais] funciona como organizações não-lucrativas - ao contrário de outros países onde existe o conceito de empresa social - e não estão sob alçada da banca e fundos de capital de risco", diz. Os empreendedores sociais portugueses conseguem obter fundos através dos seus associados ou apoios públicos (autarquias, Estado ou fundos europeus). "Em vários casos constroem serviços e produtos que interagem com o mercado", acrescenta.
Esta nova geração foca-se em áreas esquecidas pelo mercado tradicional e tenta resolver problemas de forma inovadora. "Ser subsidiado não é necessariamente mau. Há áreas que a parte privada não vai financiar. As receitas podem ser mistas", refere Filipe Santos. A diferença está na escala.
"Se um projecto social não encontrar um modelo de negócio sustentável, nunca consegue crescer para além da escola ou da comunidade local onde é posta em prática, por exemplo". O que se pretende é criar impacto para além das fronteiras de uma cidade.