Sérgio Aníbal, in Jornal Público
As profissões em que os salários são mais baixos ganharam peso na estrutura do emprego
O ritmo de crescimento dos salários líquidos mensais dos trabalhadores por conta de outrem em Portugal está a diminuir desde o final de 2005 e quase estagnou no quarto trimestre de 2007, mostram os números do Instituto Nacional de Estatística.
No inquérito ao emprego publicado na passada sexta-feira, o INE revela que, para os quase quatro milhões de portugueses que obtêm o seu vencimento através de trabalho dependente, o rendimento médio líquido por mês foi de 720 euros, o que representa uma variação de apenas um euro face a igual período do ano anterior.
Durante toda a última década, apenas nos primeiros nove meses de 2003 - um período em que a economia portuguesa caiu em recessão técnica - se registou uma variação homóloga ainda mais negativa do nível de rendimento médio dos assalariados portugueses.
Existem duas explicações para este forte abrandamento que tem vindo a registar-se nos dois últimos anos. A primeira, é a tendência de moderação salarial a que se assiste na economia. Como o desemprego está a um nível historicamente alto, as empresas têm o poder, perante os seus trabalhadores, de não realizar actualizações significativas do valor dos seus salários, contratando novos funcionários a "preço" muito baixo. Ao mesmo tempo, no Estado, continuam a aplicar-se aumentos salariais inferiores à taxa de inflação, ao mesmo tempo que as progressões das carreiras estão congeladas.
Ainda assim, só isto não seria o suficiente para explicar uma variação média dos salários, em termos nominais, quase igual a zero. O que também aconteceu foi uma redução do peso no total do emprego das profissões que exigem mais qualificações e são mais bem pagas, ao mesmo tempo que se verificou um aumento relativo do número de pessoas com profissões que exigem poucas qualificações e são mal pagas.
Por exemplo, os trabalhadores que são quadros da Administração Pública e das empresas (e que ganham em média 1671 euros por mês) reduziram o seu peso no mercado de trabalho em Portugal, passando de 9,7 por cento no primeiro trimestre de 2005 para seis por cento no final de 2007. Pelo contrário, os trabalhadores que trabalham nos serviços e nas vendas (com um salário médio de apenas 569 euros no final de 2007) passaram de 12,9 para 15 por cento no mesmo período.
Esta alteração da estrutura do mercado de trabalho não só prejudica a evolução do salário médio em Portugal como vai no sentido inverso daquilo que era desejável para assegurar um desempenho mais forte da economia portuguesa. A tendência de reforço da importância de profissões mal remuneradas no sector dos serviços ou dos trabalhadores classificados como "não qualificados" está geralmente associada a actividades económicas menos produtivas, das quais Portugal deveria conseguir reduzir a sua dependência.
Mulheres prejudicadas
O salário médio conseguido pelas mulheres é bastante mais baixo do que o dos homens. No quarto trimestre de 2007, de acordo com os dados do inquérito ao emprego do INE, o rendimento médio líquido das mulheres que trabalham por conta de outrem foi 17,8 por cento menor do que o dos homens. Os tipos de profissões em que as diferenças são mais acentuadas são as desempenhadas na indústria e a agricultura, com as diferenças a situarem-se na casa dos 30 por cento. É entre os técnicos e profissionais de nível intermédio que se registam diferenças mais limitadas, na ordem dos sete por cento. Se se fizer a análise no prazo de uma década, a tendência é de uma redução das diferenças, mas a verdade é que, nos três últimos anos, a desvantagem das mulheres se acentuou. No início de 1998, a diferença no rendimento para os homens era de 19,3 por cento e, no início de 2005, era de 14,7 por cento. Este tipo de dados fornecidos pelo INE não podem ser usados, no entanto, para concluir sobre a existência de diferenças de rendimento entre os homens e as mulheres que desempenham exactamente a mesma função.
As vantagens da qualificação
Um quadro da administração pública ou de uma empresa ganha, em média, cerca de três vezes e meia mais do que um trabalhador não qualificado. A diferença é menor do que a registada há dez anos atrás, mas no último ano acentuou-se, já que, no quarto trimestre de 2007, foram exactamente os quadros que beneficiaram de acréscimos do rendimento médio líquido mais elevados face ao período homólogo do ano anterior. Portugal, mostram vários estudos comparativos efectuados sobre esta matéria, é um dos países europeus em que um acréscimo do nível de qualificações mais compensa a nível salarial.
Lisboa lidera
O salário de um trabalhador por conta de outrem na Grande Lisboa é, em média, 40 por cento maior do que o rendimento auferido por um trabalhador da região Centro do país. O Algarve é, embora ainda a uma grande distância, a região que se aproxima mais da capital neste ranking, superando o Norte, Alentejo e regiões autónomas. Curiosamente, foi em Lisboa e no Algarve que se registaram as diminuições mais acentuadas no valor do rendimento médio durante o quarto trimestre de 2007. As diferenças registadas no valor dos salários médios auferidos nas regiões têm como principal explicação a distinta estrutura produtiva existente em cada ponto do país. Também não é possível, com estes dados fornecidos pelo INE, verificar se há diferenças de rendimento para a mesma função entre regiões.