Refeitório oferece almoços e uma alternativa de vida

Hermana Cruz, in Jornal de Notícias

Associação "Mão Amiga" abriu ontem, sexta-feira, um espaçoonde serão dadas 150 refeições diárias a sem-abrigo

A Associação "Mão Amiga" abriu ontem, sexta-feira, no Porto, um refeitório social, com capacidade para 150 refeições diárias. No espaço, os sem-abrigo da cidade encontrarão não apenas comida quente mas também "uma saída".

As estórias de Miranda, com 56 anos, que "andou perdido no mundo do álcool", ou de Miguel, com 39 anos, que era toxicodependente, são dois dos 13 testemunhos que 150 sem-abrigo da cidade do Porto ouviram, ontem à noite, quando estrearam o novo refeitório social da "Mão Amiga", na Rua de Camões (Porto). A maioria foi "resgatada" das ruas da cidade, mas alguns já são utentes da associação, criada há 13 anos, no Bairro S. João de Deus, e que desde então já ajudou mais de três mil toxicodependentes, alcoólicos ou vítimas de exclusão social.

Entre garfadas de feijoada e muitos bolos, os sem-abrigo assistiram a peças de teatro, representadas pelos utentes da associação. Aliás, foram estes quem pagaram a refeição. "Foi um utente que teve a ideia durante uma reunião e tudo foi custeado com parte do rendimento de inserção social que recebem", salienta o fundador da associação, José Cambra.

Durante a noite, os convidados ouviram ainda de voluntários que também para eles existe "uma saída". É que, o refeitório, que estará aberto todos os dias entre as 11.30 e as 12.30 horas, não funcionará propriamente de portas abertas para todos. Foi criado um cartão que dá direito a 10 refeições, além de um reforço para a noite.

"Durante a hora em que cá estiverem, tentaremos recolher toda a informação acerca deles. Depois de ficarmos a conhecer a sua estória, vamos criar um plano alternativa de vida", começa por explicar José Cambra, que também ele foi um sem-abrigo, "arrastado" pelo vício da droga.

Quando o sem-abrigo voltar para uma segunda refeição, ouvirá o plano de vida que a associação traçou para ele e terá um tempo para pensar se aceita abraçar essa "alternativa". Quando chegar à 10ª refeição, será altura de decidir. "Se não quiser, terá que sair porque não iremos alimentar a sua situação", refere José Cambra.

Quem aceitar lutar para sair das ruas e do vício, seja ele qual for, será encaminhado para uma comunidade terapêutica da associação, como a que existe em Santo Tirso. A partir daí, fará o seu percurso dentro da instituição, podendo um dia mais tarde ser ele a oferecer "alternativas" a outras pessoas. É o que já muitos fazem, voluntariando-se para, duas vezes por semana, andarem pela cidade do Porto a oferecer café com leite quente aos sem-abrigo.

A abertura do refeitório social era um sonho da "Mão Amiga" já com seis anos, que agora está pronta para abraçar um projecto mais ambicioso. "Cerca de 30% dos nossos utentes são incapacitados e carecem de cuidados continuados. Por isso, gostávamos de abrir uma clínica de cuidados continuados, vocacionada para os sem-abrigo e também para quem está só", adianta Cambra.