Alexandra Marques, in Jornal de Notícias
Segurança Social pretende recolher dados dos processos individuais ao longo do trimestre
Estima-se que só em Lisboa e no Porto existam mais de dois mil sem-abrigo
"Em estado muito adiantado" é como se encontra a o processo de registo dos sem-abrigo existentes em Portugal. Escolhidos estão já 20 destes cidadãos para darem o pontapé de partida no projecto de reinserção social: Casas Primeiro.
O recenseamento dos cerca de três mil sem-abrigo que se estima existirem no país está a ser feito pelo Instituto de Segurança Social (ISS), em estreita articulação com várias Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS), e "estará concluído ao longo do primeiro trimestre de 2010", afirmou ao JN o presidente do ISS, Edmundo Martinho.
"Temos trabalhado de forma conjugada com as IPPS que estão no terreno e conhecem de perto esta realidade, para se fazer um recenseamento completo da população sem-abrigo", explicou este responsável, acrescentando que não se encontra concluído, mas "em estado muito adiantado".
"O objectivo não é apenas saber o nome e proceder à identificação do cidadão. É, sobretudo, conhecer as circunstâncias em que vive e os motivos que o levaram a essa condição", adianta Edmundo Martinho.
Com essas informações, será possível conhecer as fragilidades de cada indivíduo, as tentações, tendências ou dependências que o condicionem, mas também potencialidades que possam ser aproveitadas no futuro.
Para o presidente do ISS, o conhecimento das situações e do passado profissional de um sem- -abrigo contribuirá para traçar um plano de vida alternativo, no caso de revelar vontade em iniciar um quotidiano diferente.
O processo de recolha de dados engloba os que vivem e pernoitam ao relento em sete capitais de distrito: Lisboa, Porto, Aveiro, Braga, Coimbra, Setúbal e Faro. E a intenção é abranger cerca de duas mil pessoas nesta condição.
"Não se trata de evidenciar a condição do sem-abrigo - que pode ser, e muitas vezes é mesmo, transitória. Mas, sim, de ajudar a que deixem essa condição", salienta este dirigente.
Estima-se que só nas duas maiores metrópoles do país - em Lisboa e no Porto - existam mais de dois mil sem-abrigo, com a agravante que esta é uma população muito volátil - não constante - e muito reservada quanto a partilhar informações sobre a sua vida passada e presente.
Um dirigente de uma IPSS (que não quis ser identificado) considera, porém, que este tipo de recenseamento é "inconveniente" e não crê que seja bem sucedido. Porque, argumentou ao JN, "a maioria dos sem-abrigo prefere manter o anonimato e têm direito à sua privacidade".
"Avançámos, entretanto, com o projecto Casas Primeiro, que pretende incluir 50 pessoas que vivem na rua", adianta Martinho.
Já foram identificadas 20 pessoas que possuem o perfil e as características adequadas e que, em breve, irão viver sozinhas, ou não, para apartamentos. Subsistindo através de pensões ou de apoios estatais, serão acompanhados pela Associação para o Estudo e Integração Psicossocial (AEIPS).
"Queremos evitar as soluções em espaços colectivos de vida", como albergues onde vivem em grupo."É preciso fazer um corte e este começa por a pessoa sentir que tem a sua casa, o seu quarto e as suas coisas", conclui Martinho.