Helena Teixeira da Silva, in Jornal de Notícias
Mesmo quem nunca se despenha antes da maioridade, entra na universidade sem nunca ter chumbado, acaba a licenciatura com boa média e sai para o mercado de trabalho com percurso imaculado, está preparado para o tempo de espera. "Mas nunca para a ausência de critérios, seja na admissão ou na dispensa de um trabalhador". É Lígia Costa, 33 anos, licenciada em Comunicação Social, quem o afirma.
"Somos a última geração do emprego para sempre e isso faz sentido, porque ao fim dos primeiros cinco, seis anos, um profissional sente vontade de evoluir, aprender mais, ter novos desafios. Infelizmente, somos também a geração confrontada com uma crise que nos suspendeu as ambições. E, tão mau ou pior do que isso, não sabemos o que conta para ter lugar no mercado de trabalho. Nada é suficiente: nem habilitações, nem boa formação humana, nem disponibilidade, nem capacidade de trabalho." Como Lígia, há neste momento 54600 desempregados com o Ensino Superior.
Desempregada há dois anos, dedicou sete da sua vida e empenho a uma empresa de estudos de mercado, no Porto. Começou como ajudante de campo, mas rapidamente progrediu. Dois meses depois, foi admitida no quadro. Como é de Braga, "ia e voltava todos os dias de comboio, numa altura, 2002, em que a viagem demorava duas horas". E ela entrava às 14 horas e saía às 23 horas. Nunca vacilou. "Estava entusiasmada, ganhava traquejo, tinha um ritmo alucinante, mas adorava trabalhar, analisar soluções para os clientes. Ao fim de meio ano, tornei-me responsável pelo departamento."
Mudou-se definitivamente para o Porto, casou, comprou casa. Somava elogios à medida que começava a sentir-se estagnar. "Mas o mercado não permite grandes loucuras, não podia sair sem saber como ou para onde." Em meados de 2007, a empresa começa a sentir a crise, com menos encomendas". Na véspera do Natal de 2008, "a sangue frio", foi chamada à administração: estava despedida. Sem justa causa. Nem sequer causa atendível. Despedida apenas porque a empresa tinha de emagrecer custos.
"O seu trabalho é excelente, mas por causa da crise vamos extinguir o posto de trabalho". Custa ouvir isto quando alguém passou meses a ser solidário com a empresa, nunca protestando dos salários em atraso; custa ainda mais quando se é dispensado em detrimento de funcionários que se limitavam a existir. "Senti-me injustiçada. O trabalho não era compensado." Lígia, licenciada, ganhava mil euros. Mil euros ao fim de sete anos.
Receber a indemnização a que legalmente tinha direito foi uma batalha longa, ganha, mas a prestações. Geriu o dinheiro, a frustração e o desapontamento e, pouco dada a lamentações, tornou-se "profissional de entrevistas". Dezenas de candidaturas espontâneas, currículos, fases eliminatórias, testes psicotécnicos, formações, onde quer que fosse. Não rejeitou nada, semeou em todos os campos: no dela, da comunicação, no da Psicologia, amor antigo, no livreiro e em todos os outros mercados, mais improváveis. Nada.
Não há optimismo ou sanidade mental que resista. Sobretudo quando o marido se vê confrontado com a mesma situação: crise, desemprego. E uma casa para pagar. E o relógio biológico a soar cada vez mais alto. "Os estágios profissionais são mero fogo de vista, falsos muitas vezes. Todos os sítios para onde me movia, encontrava uma porta fechada. Chegaram a dizer-me: não tenho coragem de a contratar por 600 euros." Tropeçou no cansaço, caiu numa depressão. Divorciou-se, voltou a Braga. "Voltei à estaca zero."
Como o tempo não se compadece com depressões, tratou de se curar. E voltar à estrada. Frequenta uma formação que lhe irá levar oito semanas, todos os dias das 16 à meia-noite, sem garantia de que será escolhida. Se for, vai receber o salário mínimo. Se não, talvez emigre. Neste país, "conseguir um emprego é como jogar no totoloto".
Têm habilitação superior 8,5% dos desempregados
De acordo com o Instituto Nacional de Estatística, Portugal tem, este ano, mais 8,5% desempregados com habilitações de Ensino Superior do que em 2009, ou seja, 54600. E cada vez menos perspectivas de encontrar emprego.
Quem já esteve empregado durante pelo menos cinco anos, mas hoje vive no limbo, tem direito durante 19 meses a 80% do salário que auferia. Volvido esse tempo, nova redução, determinada a partir do indexante de apoios sociais. Na prática, traduz-se em metade dos 80% recebidos anteriormente por um período de nove meses. Lígia Costa recebe, agora, 335 euros.