29.10.10

Ninguém se pode excluir do combate à pobreza

Paula Abreu, in Jornal da Madeira

Francisco Jardim Ramos defendeu que o combate à pobreza e à exclusão social é uma tarefa global e não apenas uma responsabilidade dos governos e das instituições de solidariedade social. «As questões da pobreza e da exclusão social são muito sérias para servirem de arma de arremesso político–partidária. Mas deve ser um compromisso de cada um, trabalhando o seu melhor».

O governante falava na cerimónia de abertura do Seminário “Pobreza e Exclusão Social... Olhar, Reflectir e Agir”, uma iniciativa promovida pelo Centro Social e Paroquial de Santa Cecília, no Centro de Cultura de Câmara de Lobos.

O responsável realçou que esta é «uma missão e uma obrigação que a todos deve envolver: desde os responsáveis políticos, autoridades públicas e toda a sociedade civil, numa perspectiva integrada, de participação em rede, de todos os agentes sociais, com o objectivo de se conseguir uma sociedade mais inclusiva».

Jardim Ramos sustentou que «o dever público não deve levar a que cada cidadão se demita do seu compromisso cívico, no combate à pobreza e à exclusão social», sublinhando que «ninguém pode ficar de balcão a assistir indiferente ao que se passa ao lado».

Com as vulnerabilidades sociais a serem acentuadas pela crise económica que atravessa o país, comentou que as famílias que, «vivendo até aqui com algum desafogo económico, vêem-se, de um momento para o outro, caídas em situações de desemprego e de endividamento excessivo». Para Jardim Ramos, é preciso «voltar a incutir a necessidade de combater o desperdício e a ilusão da felicidade produzida, pelo consumismo desenfreado».

O Executivo madeirense tem lutado contra os fenómenos de exclusão social como um objectivo da sua política, inspirada na doutrina social da igreja. «Agir sobre estes problemas, não passa por nos limitarmos a quantificá-los, quer apontando números, quer reduzindo o seu combate à atribuição de subsídios. Conhecemos os números e estes estão publicados», disse. A acção governativa é centrada nas famílias, que representam «a célula estrutural da sociedade, o espaço privilegiado para a plena realização do ser humano e a primeira rede de apoio e de protecção. Aos promovermos as suas potencialidades, ao capacitá-las para o desempenho das suas funções, esbateremos muitos dos problemas sociais que conduzem à pobreza e à exclusão social».
Já o bispo do Funchal recordou a Doutrina da Igreja, prestando um reconhecimento ao papel das instituições de caridade na ajuda aos mais desfavorecidos. D. António Carrilho realçou que os pobres devem ser encarados como pessoas e não como números. «O nosso olhar não pode ser um olhar frio, tantas vezes distante e calculista, porque por detrás dos problemas traduzidos em números e teorias sociais estão mulheres, homens e crianças. Olhar a partir da Fé situa-nos no encontro pessoal com o outro, face-a-face, olhos nos olhos, partilhando as suas angústias e esperanças, sentindo com ele, sofrendo com ele», sublinhou o prelado diocesano.
A seu ver, «mais pobre que o pobre é aquele que não consegue ver a pobreza alheia. O mais excluído é aquele que se auto-exclui, negando-se a olhar ao irmão que à sua volta sofre». D. António Carrilho acrescentou ainda que, ao reflectir sobre a pobreza e a exclusão social, «o cristão tem de o fazer também na perspectiva da fé, cimentada nas palavras de Jesus, quando Ele une o mandamento de amar a Deus com o de cada um amar o próximo».

Economia e pobreza devem ser vistas com a mesma prioridade

O presidente da Comissão Nacional de Justiça e Paz foi o principal orador convidado do Seminário promovido pelo Centro Social e Paroquial de Santa Cecília. Alfredo Bruto da Costa reconheceu que há muito trabalho desenvolvido de combate à pobreza e à exclusão social por diversos responsáveis públicos e instituições privadas, no país e na Europa. «Os governos e as instituições privadas fazem muito contra a pobreza. Daí a minha interrogação: porquê que, fazendo tanto, a pobreza diminui a um ritmo muito lento?» O professor reflectiu sobre as razões inerentes a uma realidade em que, apesar dos esforços desenvolvidos ao longo de séculos, não se consegue esbater o flagelo.

Explorando três pontos importantes sobre o tema em causa, Bruto da Costa entende que «a pobreza e a desigualdade têm de ser analisadas com a mesma seriedade com que são as questões ligadas à actividade económica e à produção». É necessário inverter a actual tendência de se dar prioridade à actividade económica e ao crescimento económico, e só depois, na distribuição e luta contra a pobreza. «Isso não dá. A pobreza e a desigualdade têm de ser analisadas ao mesmo tempo e com a mesma seriedade que a actividade económica», defendeu o especialista.
A outro nível, e numa altura de incertezas em relação à aprovação ou não do Orçamento de Estado, Bruto da Costa considera que independentemente de ser ou não aprovado, o fosso na desigualdade social vai aumentar. Mas, «eu acredito que, se o Orçamento não passar as consequências vão ser piores do que más. Portanto, defendo que o Orçamento deva passar, não porque ele seja bom mas porque se for chumbado, as coisas ficarão ainda piores».

Conceitos diferentes de pobreza

Na abertura do seminário organizado pelo Centro Social e Paroquial de Santa Cecília, no âmbito do Ano Europeu do Combate à Pobreza e Exclusão Social, o presidente da Câmara Municipal destacou a evolução social do concelho de Câmara de Lobos, no combate ao flagelo da pobreza e exclusão social e ao «estigma social» que tal situação dava ao concelho.

Reconhecendo que há ainda trabalho por fazer, Arlindo Gomes disse que muito foi conquistado. Mas, apontando a pertinência do assunto em debate e no Ano que se assinala, o autarca disse que «a pobreza material é uma realidade que ainda se assiste na nossa sociedade. Mas muitas vezes, confunde-se a pobreza e tenta-se dar cobertura a outras situações em que se deve ponderar muito bem». A seu ver, «confunde-se a pobreza e a exclusão social com males que a sociedade padece e que devemos combater, com medidas e apoios, nomeadamente contra a toxicodependência e a delinquência que, apesar de serem causas de exclusão social, são motivadas por outras razões que não a da carência financeira ou de bens de consumo.

Refira-se que o seminário contou também com as opiniões do ex-presidente da Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade Social, José Maia, que se pronunciou sobre “Novas Pobrezas, novas respostas”, da ADENORMA, da Cáritas de Lisboa, do Instituto de Emprego da Madeira e do Estabelecimento Vila Mar.