27.5.22
Produtores vivem situação “dramática”
Há criadores de gado em situação “dramática”, alerta o Agrupamento de Produtores Pecuários do Campo Branco.
António Lopes, presidente do Agrupamento, assegura que a escassez de pastagens, devido à seca, obrigou muitos criadores de gado a alimentar os animais à mão com palhas e rações “durante toda a primavera”.
O agravamento dos custos de produção está a causar graves problemas ao setor e a tornar-se incomportável.
Como se não bastasse, há explorações que nem conseguiram comprar fenos para alimentar os animais, adianta António Lopes.
Com a chegada do verão os problemas tendem a agravar-se ao nível da alimentação e do abeberamento do gado.
O presidente do Agrupamento de Produtores Pecuários do Campo Branco frisa que “os restolhos não aguentam o gado mais do que 15 a 20 dias”.
António Lopes lamenta a falta de ajudas do Governo e teme o pior: que os animais morram à fome, porque os criadores não têm nem como os alimentar, nem como os vender.
24.5.22
“NÃO SOU MENOS CIGANA PORQUE ESTUDEI E ME TORNEI UMA MULHER INDEPENDENTE”
Sónia Calheiros, in Visão
Licenciada em Direito e especializada em Direito Criminal, Alcina Faneca, advogada de 28 anos, com escritório em Trás-os-Montes, sempre teve o apoio da família para seguir o sonho de ser juíza, mas a sua comunidade apontou-lhe o dedo
Abri o meu escritório há dois meses, em parceria com dois colegas de Esposende, mas estou sozinha em Torre de Moncorvo. Não quero tornar-me advogada só de pessoas de etnia cigana, trabalho para quem vier ter comigo. Por agora, tenho trabalhado bastante na área de direitos reais, por exemplo na compra e venda de uma casa ou a tratar de testamentos, mas antes, com o meu patrono, trabalhava em direito do trabalho e direito criminal, que considero ser o mais aliciante.
Comparando Torre de Moncorvo, no Interior, no distrito de Bragança, com uma grande cidade, a criminalidade é menor, mas vê-se um pouco de tudo. Os homicídios podem ser chocantes, mas é nesses casos que mais gosto de trabalhar, embora seja sempre mais complicado defender o culpado. Só não aceito casos de violação – é a minha única objeção de consciência.
Sempre sonhei ser juíza desde que comecei a ouvir dizer que as decisões em relação à etnia cigana nem sempre eram imparciais. Ao começar a conhecer a lei e os pressupostos que devem ser respeitados, faziam-me confusão certas situações que envolviam as pessoas da comunidade. Queria conseguir fazer justiça e reverter a situação. Agora, vou ganhar experiência e, daqui a meia dúzia de anos, quando a minha filha for mais crescida, concorro ao Centro de Estudos Judiciários pela via profissional.
“Tens de fazer a diferença”
Comecei a perceber a diferença que havia entre mim e as outras raparigas ciganas principalmente quando fui para a faculdade no Porto, por volta dos 20 anos. Depois do ensino secundário – em que o meu pai não se deixava levar pelas minhas manhas, nem que fosse para faltar só uma manhã à escola –, algumas quiseram dar seguimento aos estudos e já não puderam, porque a faculdade é longe – a mais próxima fica, pelo menos, a uma hora de casa –, e aí o acesso à educação era-lhes vedado. Mas comigo isso não aconteceu. Quando terminei o 12º ano, o meu pai começou logo a procurar a melhor faculdade de Direito para mim.
Na infância e adolescência, tinha uma vida como a de qualquer outra criança, cigana ou não. Os meus pais sempre me disseram, a mim e aos meus irmãos [tenho duas irmãs, de 32 e 26 anos, mais um irmão de 18], para continuar: “Tens de fazer a diferença.”
Na comunidade, entre as pessoas mais próximas, havia quem discordasse de eu ir estudar para fora, mas isso não fazia diferença na minha vida. Ouvíamos comentários menos bons, mas o meu pai nunca lhes deu ouvidos, ignorava-os. Diziam-lhe que eu não ia para o Porto estudar, ia passear; não estava bem ir para lá sozinha e tirar a carta de condução.
Não ganhei má fama, mas penso que a maior parte das pessoas, sem serem apenas as da comunidade cigana, achava que eu não conseguiria terminar o curso.
Respeito a minha comunidade e a forma como quer viver e trabalhar, normalmente a vender, mas não concordo com alguns aspetos. Há valores que não aceito para a minha filha, agora com 3 anos, como deixar de estudar aos 13 para casar, que não possa ir para a faculdade, não possa ter amigos rapazes que não sejam ciganos ou não possa sair para jantar fora com as amigas.
Respeito a minha comunidade e a forma como quer viver e trabalhar, mas não concordo com alguns aspetos. Há valores que não aceito para a minha filha, como deixar de estudar aos 13 anos para casar, ou que não possa ir para a faculdade, não possa ter amigos rapazes que não sejam ciganos ou não possa sair para jantar fora com as amigas
Porque é que viajar com amigas ou ir tomar um café com amigos nos haveria de definir como pessoas ou tornar-nos menos ciganas? As outras mulheres da comunidade não o fazem porque fica mal aos olhos dos outros. Eu não me importo com o que pensam.
Todos temos direito à liberdade de expressão e a fazer o que bem entendermos, sem prejudicar os outros. Hoje, só não muda quem não quer. Mas viver numa família muito conservadora pode não ajudar. Nesses casos, a força da família é muito maior do que a da mulher sozinha, e são ainda poucas as mulheres a arriscar ter uma vida diferente.
Não incentivo as minhas amigas a fazerem quaisquer mudanças. Não quero ser vista como a causa do problema. Mas já passei por uma situação em que uma mãe e a sua filha de 15 anos vieram ter comigo para me pedir ajuda para falar com o pai dela. Então, fui ter com ele para falar sobre deixar a filha continuar a ir à escola.
Expliquei-lhe o meu caso, e que o facto de estudarmos não impede de continuarmos a cumprir todas as tradições ciganas. Tenho muito orgulho em ser cigana. E consegui que essa menina voltasse a estudar.
“Ninguém tem o direito de cortar as asas”
Não sou menos cigana porque estudei, fiz o meu percurso e me tornei uma mulher independente e realizada. Isso só nos torna mulheres mais felizes e completas, sem sermos dependentes de um homem – um conselho, aliás, que sempre ouvi do meu pai.
Na universidade, os meus professores, quando souberam que era cigana, até ficaram felizes por ali estar. Na altura, passei por uma situação em que o meu pai teve um problema e tive de faltar às aulas – todos facilitaram imenso e ajudaram-me.
Nunca ter ouvido expressões como “vai vender na feira” é um sinal de mudança, sobretudo na minha geração, mas na dos mais velhos ainda há muito para fazer, e nem sei se alguma vez a mudança acontecerá.
É preciso mudar a forma de educar meninas e meninos. De que vale ter uma mulher com uma opinião mais aberta se a do homem se mantiver conservadora? Talvez só quando eu for avó se irão sentir mudanças significativas.
Estamos a progredir e vamos no bom caminho, mas quando vou a escolas fazer palestras, noto que há crianças com sonhos, mas também entraves familiares que não as deixam avançar. Ninguém tem o direito de cortar as asas e não deixar concretizar o sonho. Espero que a minha filha tenha gosto em estudar e siga a profissão que quiser.
ONU pede ajuda aos bilionários para acabar com a fome mundial
O líder do Programa Alimentar Mundial das Nações Unidas (PAM) apelou aos bilionários que "é tempo de avançar" contra a ameaça alimentar que cresce no mundo e elogiou o apoio de magnatas, como Elon Musk e Jeff Bezos.
Depois de um impasse mediático que teve com o bilionário Elon Musk no ano passado, o diretor-executivo do PAM, David Beasley, foi desafiado pelo dono da Tesla Motors a comprovar como é que uma doação de seis mil milhões de dólares (aproximadamente 5 mil milhões de euros) às Nações Unidas poderia resolver a fome mundial.
Durante o encontro do Fórum Económico Mundial, que decorre em Davos, na Suíça, até dia 26, Beasley contou à agência Associated Press que o magnata doou o valor acordado a uma fundação, mas que as Nações Unidas ainda não receberam nenhuma parte da quantia.
"Tenho esperança que sim", acrescentou o líder do PAM, que se dirigiu mais tarde a Musk: "Estamos a tentar todos os ângulos possíveis, e Elon, precisamos da tua ajuda, irmão".
Segundo Beasley, esta mensagem era também um apelo para todos os bilionários, porque "o mundo está em grandes problemas".
"Isto não é retórica, nem tretas. Avancem agora, porque o mundo precisa de vocês", pediu o diretor-executivo do PAM.
23.5.22
Comissária da ONU para os Direitos Humanos inicia visita à China
A alta-comissária da ONU para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, iniciou hoje uma visita à China, tendo prevista uma deslocação a Xinjiang, onde Pequim é acusada de abusos contra a minoria étnica chinesa de origem muçulmana uigur.
Michelle Bachelet "chegou [à China] e está a ter uma reunião", disse Ravina Shamdasani, porta-voz do alto comissariado, citada pela agência France Presse.
Esta visita promete ser controversa para a ex-presidente chilena, que corre o risco de não ter livre acesso à região e de ser usada pelas autoridades chinesas para fins propagandísticos, apontam observadores.
A alta-comissária vai dar uma conferência de imprensa no último dia da visita, esclareceu o comunicado divulgado pelo seu gabinete.
Um grupo do gabinete das Nações Unidas liderado por Bachelet chegou à China no dia 25 de Abril, para preparar a visita. O grupo teve de cumprir um período de quarentena, imposto a quem chega ao país asiático oriundo do exterior.
Nos próximos meses, Michelle Bachelet deverá publicar um relatório sobre a situação em Xinjiang, que ficará à consideração de Pequim, para que as autoridades chinesas se possam pronunciar.
De acordo com organizações de defesa dos Direitos Humanos, pelo menos um milhão de uigures e membros de outras minorias de origem muçulmana, estão ou foram encarcerados em campos de doutrinação em Xinjiang, e colocados sob vigilância apertada pelas autoridades.
Pequim contesta, dizendo que são centros de treino vocacional, destinados a afastá-los de movimentos terroristas e separatistas.
A prioridade do governo é tirar as famílias da pobreza
Erradicar a pobreza extrema e reduzir a pobreza absoluta é o objectivo máximo de Cabo Verde, e todos os sectores trabalham transversalmente para o mesmo desiderato, garante Lídia Lima. O foco são as famílias, em particular as crianças. Em conversa com o Expresso das Ilhas, por ocasião do Dia Mundial da Família, 15 de Maio, a Secretária de Estado da Inclusão Social fala da situação socio-económica das famílias, dos programas em curso e de projectos futuros para proporcionar uma infância tranquila às crianças, trabalhando (também) assim para quebrar os ciclos de pobreza e garantir a continuidade do desenvolvimento do país.
Quando se fala das famílias cabo-verdianas, a secretária de Estado para a Inclusão social (SEIS) destaca, desde logo, a situação sócio-económica das mesmas. E um olhar pelos números ajuda a caracterizar essas famílias que hoje Cabo Verde tem. Neste momento, em aproximadamente 500 mil habitantes, há cerca de 175 mil pessoas pobres, 115 mil das quais em situação de pobreza extrema. Representam 31,6% da população nacional, uma taxa enorme que está no centro das preocupações do país e que mostra um retrocesso. Como lembra Lídia Lima, em 2019 a taxa de pobreza era de 26%, o que representava então um grande avanço face a 2015, em que era de 35%. Depois vieram a pandemia e a seca e a pobreza aumentou.
“São duas crises que estamos a enfrentar. Agora estamos a sair da pandemia, com uma verificação da retoma da economia, mas temos uma seca severa”, observa.
Cadastro Social
Um dos principais instrumentos no combate à pobreza, e que permite maior assertividade na definição das políticas sociais e na sua aplicação e direccionamento para quem realmente precisa, é o Cadastro Social Único (CSU).
Neste momento, estão registados no CSU 79.051 agregados familiares (305.965 indivíduos), divididos em grupos: grupo 1 – pessoas em situação de pobreza extrema (cerca de 25 mil agregados); grupo 2 - na pobreza (20.800 agregados); grupo 3 – vulneráveis (17 mil), grupo 4 - não pobres.
Embora isso mostre que de 60% da população já está cadastrada, nem todos os concelhos conseguiram registar todas as famílias pobres no CSU, lamenta Lídia Lima.
É com base no CSU que os programas vão então sendo direccionados para as famílias dos grupos prioritários. “Só que os desafios são enormes porque temos de estar constantemente a actualizar o cadastro”, explica.
Agregados que na altura do registo pertenciam a um grupo, com as crises podem ter passado para o nível abaixo. “Famílias que antes estavam no grupo 3, por exemplo, passaram para o grupo 1 ou 2”. Algumas que estavam no grupo 4 podem ter passado para o 3. “As coisas foram mudando, a situação socioeconómica mudou, então isto implica uma mudança também da situação no seio das famílias”.
Uns perderam o emprego, outros tinham um negócio que deixou de render, outros filhos emigrantes que não conseguiram continua a mandar remessa…
É então necessária uma actualização do cadastro, o que já começou a ser feito em alguns concelhos. Muitas vezes são até as próprias famílias “que já estão a entender o funcionamento do cadastro, “que se vão dirigindo às Câmaras para solicitar a actualização do seu registo”, comenta.
Programas
A pandemia veio na verdade testar um conjunto de instrumentos e iniciativas já anteriormente estabelecidos. “Veio a crise e esses programas contribuíram de uma forma espectacular para equilibrarmos a situação social”, analisa.
Um deles foi o referido CSU. Mas também o Rendimento Social de Inclusão (RSI), que como medida emergencial foi alargado a um maior número de beneficiários. Tem conta a retoma da economia e insustentabilidade da manutenção do alargamento emergencial, a medida já foi suspensa.
“É uma obrigação do Estado apoiar as famílias quando estão a passar por dificuldades extremas e não há outra saída. Fizemos aquilo que tinha de ser feito”, mas o Estado não poderia “continuar a suportar um custo de mais de 100 mil contos mensais só com o RSI”, explica.
Assim, passada a emergência (e vinda a retoma), o esforço concentra-se agora em “ajudar as famílias a ganhar a sua independência económica. Empoderá-las e ajudá-las a saírem da situação de pobreza”.
É com esse o objectivo que está ser implementado o programa inclusão produtiva, actualmente a funcionar em 9 concelhos e que deverá ser alargado a todo o país até ao final do mandato. O programa, que nesta fase abrange cerca de 2000 famílias, “consiste na capacitação profissional das famílias pobres e também aquelas que estavam a receber o RSI”. As mesmas receberão ajuda na criação de actividades geradoras de rendimento e gestão do autonegocio. O desafio, continua a SE, é paralelamente, levar as famílias que estão no sector informal a formalizar o seu negócio. Aliás, a pandemia veio mostrar bem essa necessidade de ter uma rede de apoio a nível da segurança social.
Foi inclusive essa falha que levou, também na pandemia, à necessidade de estabelecer o rendimento solidário (RSO), outra medida de emergência, “para socorrer muitas famílias que não tinham nenhum tipo de segurança social”.
“Então, estamos a trabalhar para garantir que essas pessoas que vivem do comércio informal, formalizem o seu negócio e estejam realmente incluídos nessa rede de segurança social. Ajuda o país. Ajuda as famílias. E em momentos de crise podemos estar mais aptos, também a nível de governação para gerir todas as situações que vão surgindo”.
Além dos programas já referidos, outro que se destaca no apoio às famílias é o Programa Nacional de Cuidados, que Lídia Lima avalia ter sido “muito bem estruturado, implementado”. Aqui o desafio é, agora, “reforçar a sua actuação e alargar o número de beneficiários”.
A SE refere ainda o programa Apoio Integrado às Famílias, gerido pela direcção-geral de inclusão social e implementado através de contratos estabelecidos com as câmaras municipais, e que apoia as famílias com despesas de educação, saúde, criação de actividades geradoras de rendimento, entre várias outras.
No meio disto tudo, é ainda importante sensibilizar a “sociedade para aderir e aproveitar esses apoios que o Estado, através do Ministério da Família, vai concedendo”, sublinha a SE.
Crianças
Se tirar as famílias da pobreza é uma prioridade, o foco principal, e assumido, são então as crianças. Como refere, falando no geral, Lídia Lima: “O governo tem definido um conjunto de prioridades em todas as áreas, mas as crianças são a nossa prioridade absoluta e quando pensamos nas crianças estamos a pensar no futuro país, de acordo com os objectivos do desenvolvimento sustentável.”
Assim, reforça, “temos de trabalhar para erradicar a pobreza extrema, temos de trabalhar com os grupos mais vulneráveis, mas temos de dar uma maior atenção, às crianças, porque, para termos garantia de sustentabilidade, temos de ter crianças bem preparadas, inseridas socialmente para que possam no futuro também dar continuidade ao processo de desenvolvimento do país.”
Ora, há, neste momento, 91 mil crianças registadas nos grupos 1,2 e 3, do CSU. Ou seja, 91 mil crianças são pobres em Cabo Verde. “É um número expressivo, preocupante e que nos apela para intervenções rápidas e urgentes”, considera. Até porque priorizar as novas gerações é também dar ênfase à eliminação do ciclo de pobreza.
Para além da pobreza, outras situações que preocupam – e estão muitas vezes relacionadas com a pobreza - são: o abandono por parte das famílias, a desestruturação familiar, a falta de responsabilidade parental e a agressão sexual a crianças.
Vários ministérios, como o da Justiça (recorde-se que foi revista recentemente, no âmbito do novo código penal, a legislação sobre crimes de agressão e violação sexual das crianças) ou da Educação têm também tomado várias medidas para protecção dos menores, e da parte sob alçada particular do Ministério da Família está a haver um reforço do ICCA, tanto a nível das instalações como do aumento de recursos humanos.
“O ICCA está também a trabalhar com planos. Já foi avaliado o plano de combate à violência sexual contra as crianças de 2017-2021 e agora temos o novo Plano que vai até 2023. Vamos contratar um coordenador para trabalhar nesse plano, que iniciará as suas funções ainda neste mês de Maio”.
Está também a ser feita a revisão do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), uma actualização que deverá resolver questões como o conceito de menor e situações que limitam a “intervenção judicial em determinados casos”, entre outros.
Responsabilidade parental
Neste desafio de proteger as crianças e proporcionar-lhes uma infância tranquila há, pois, dois actores fundamentais. Um deles é o Estado, que tem o dever de amparar, criar condições lá onde haja necessidade e apoiar as famílias quando estas, sozinhas, não conseguem responder a todas as necessidades.
O outro actor fundamental são, como é óbvio, as famílias e é importante passar essa mensagem “de que a família tem as suas responsabilidades”.
Esta responsabilidade familiar, em sentido lato, passa por diversos aspectos. Um deles é o próprio planeamento. A SE refuta que a aposta, feita desde há décadas, no planeamento familiar não funcionou. “Já estamos a verificar uma diminuição da natalidade”. Porém, é necessário continuar a empoderar as famílias, particularmente as mulheres, até para “saberem fazer a gestão da sua vida, do seu estado emocional, do seu corpo, etc”, considera.
Depois há fenómenos a que os pais também devem ser chamados a responder e ser responsabilizados. Por exemplo, crianças sozinhas a deambular pelas ruas são um fenómeno relativamente comum, com efeitos perversos conhecidos (vulnerabilidade à violência, ao abuso sexual, ao consumo de drogas, etc).
Existe inclusive uma proposta de lei apresentada pelas Aldeias SOS, e que vai nesse sentido. A proposta foi partilhada e discutida entre parceiros, em reuniões em que a SE também participou. Infelizmente, nem todos concordam com a necessidade da existência dessa lei. “Há um foco na questão de subsídio de alimentação, mas essa lei não está a defender apenas esse direito da criança. Tem a ver com outras responsabilidades” parentais.
Lídia Lima, por seu turno, defende a necessidade de uma lei que efectivamente promova essa responsabilização. “As famílias estão a perder muitos dos bons princípios, dos bons valores. Então resgatar posturas e responsabilidades perante esta matéria, tem que ser através da lei. Só com valores, já não dá”, avalia. Através da Lei e com possível penalização “em relação ao acompanhamento e à educação dos filhos”.
“Não podemos desenvolver as sociedades sem regras, sem leis. Quando as pessoas não fazem algo, socialmente, de forma tranquila, tem de ser por imposição”, insiste.
Depois, é preciso fazer vigorar a lei e para tal “as instituições têm que ter mecanismos para realmente fiscalizarem o comportamento dos pais, mas também os estabelecimentos” que permitem menores no seu interior. A par dessas medidas deve haver “muita sensibilização e informação”.
“Temos de mostrar às famílias que elas também se vão perdendo quando os filhos se começam a perder”, acrescenta.
ATL
Voltando ao papel do Estado, neste caso do governo, Lídia Lima defende que mais do que projectos de grande envergadura, este trabalho de combate e prevenção de certas situações, deve ser feito com “pés no chão” e com respostas céleres e sustentáveis. Praticidade nas iniciativas. “Acho que nos falta-nos isso”.
“Há coisas que são muito simples, que se podem fazer com vontade e junção dos esforços- sociedade civil, governo, câmaras”.
Em relação, por exemplo, “à problemática da situação das crianças” que ficam nas ruas, esta é uma situação que tem a ver, muitas vezes, com a dificuldade de as famílias que trabalham acompanharem os filhos, em períodos contrários às aulas.
“As mães vão trabalhar e não sabem o que os filhos ficam a fazer durante o dia”.
Assim, uma proposta da SEIS, desde que entrou no governo, é “agilizar, de forma simples e sem muita burocracia, a criação de espaços nas diferentes localidades, nos bairros mais vulneráveis, para responder às necessidades dessas mulheres”. Ou seja, criar espaços onde as crianças possam ficar no período contrário às aulas.
Embora já existam alguns espaços assim, em alguns concelhos, estes são manifestamente insuficientes.
“Defendo a proliferação desse tipo de iniciativas, porque é assim que o Estado tem de ajudar”, sublinha. Ajudar as famílias, no sentido de “prevenir o surgimento de situações de crianças na rua e garantir o aproveitamento escolar das crianças. Tem que ser assim”.
Esses espaços devem, defende ainda, funcionar sob uma conjugação de esforços, num trabalho integrando vários sectores e tutelas. “As associações sozinhas não conseguem, mesmo com financiamentos, devem ser acompanhadas, apoiadas a diversos níveis”. E o trabalho deve ser feito não só com a criança, mas com a “criança integrada dentro da sua família”.
Entretanto, a criação desses espaços tipo ATLs implica envolvimento de parceiros como as CM ou Instituto do Património, para resolver questões como, por exemplo, o espaço onde os mesmos podem funcionar. Algo que não é muito simples. “São coisas que vão fazem-nos perder muito tempo, quando devia ser rápido”.
Mas este é um projecto de que se pretende ver surgir ainda nesta governação.
“Aquando estamos a fazer isso estamos a trabalhar para um país mais seguro. Tudo isso também dará respostas à questão da delinquência juvenil, à questão do surgimento do thugs, vários outros problemas. Então vamos falando, só falando de todos esses problemas, quando as soluções são tão simples”. Falta então juntar esforços, simplificar e realmente avançar…
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1068 de 18 de Maio de 2022.
Prestações de desemprego voltam a cair em abril para 185.673
O número de beneficiários de prestações de desemprego voltou a cair em abril, em 31 % face ao período homólogo e em 7,2% comparando com o mês anterior, para 185.673, segundo as estatísticas mensais da Segurança Social
“Em abril de 2022, foram processadas 185.673 prestações de desemprego”, lê-se na síntese estatística elaborada pelo Gabinete de Estratégia e Planeamento (GEP) do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social.
O número total de prestações de desemprego registadas em abril é o mais baixo desde o início da pandemia, em março de 2020, tal como já tinha acontecido no mês anterior.
Os dados mostram que em abril, na comparação com o mês anterior, ocorreu uma diminuição de 14.423 beneficiários (-7,2%) e, face ao período homólogo, a redução foi de 83.539 beneficiários (-31,0%).
O sexo feminino representava 57,3% do total das prestações de desemprego em abril e o sexo masculino 42,7%.
O subsídio de desemprego abrangeu 132.797 pessoas em abril, representando igualmente o valor mais baixo desde o início da pandemia de covid-19, com uma diminuição de 8.983 (-6,3%) face ao mês anterior e uma redução de 76.228 subsídios processados (-36,5%) comparando com o mesmo período do ano anterior.
Já o subsídio social de desemprego inicial foi atribuído em abril a 6.441 pessoas, uma descida em cadeia de 15,0% e de 39,6% face ao mês homólogo.
O subsídio social de desemprego subsequente foi concedido a 24.313 beneficiários, tendo ocorrido um aumento de 1.317 pessoas (+5,7%) face a março e, em termos homólogos, um acréscimo de 5.182 pessoas (+27,1%).
A prorrogação da concessão do subsídio de desemprego abrangeu 15.375 pessoas em abril, tendo-se verificado uma redução do número de processamentos face a março em 28,8%.
Em abril, o valor médio das prestações de desemprego situou-se nos 548,63 euros, mantendo-se praticamente idêntico ao dos dois meses anteriores e acima dos registado ao longos dos últimos meses.
DF // MSP
“O combate à pobreza tem de ser um desígnio nacional”
A frase é do padre Agostinho Jardim Moreira, presidente da Rede Europeia Anti-Pobreza (EAPN). Em entrevista nos estúdios da Sintonia, o responsável reforçou que é necessário “encarar este problema de frente”, mostrando-se convicto de que o PRR poderá ser “uma oportunidade única para mudar as estruturas que geram pobreza” no país. A EAPN dinamiza, até 4 de junho, um Congresso Nacional que assinala os seus 30 anos de existência. Sob o tema ‘Diálogos sobre a Pobreza’, a iniciativa divide-se em quatro seminários em quatro cidades do país. O primeiro decorreu a 30 de abril, no Porto.Criada em Portugal em 1991, a Rede Europeia Anti-Pobreza tem vindo a desenvolver um trabalho de fundo de combate à pobreza em Portugal. O padre Jardim Moreira recorda os primeiros anos deste organismo. “Não havia dados em Portugal sobre a pobreza, foi um trabalho que começou do zero. Na altura, começámos com a dificuldade enorme de perceber o que significava uma rede em Portugal. […] A pobreza era um dado adquirido, era vista como uma fatalidade“, lembra.
Uma das grandes lutas da EAPN tem sido a implementação de uma estratégia articulada de combate à pobreza em Portugal. “Esta conquista não foi fácil”, afirma o presidente da EAPN. “Havia algum assistencialismo à pobreza, mas não existia uma luta contra a pobreza, porque essa luta implica a defesa não só dos direitos humanos, mas também a defesa da dignidade humana de todas as pessoas”, sublinha. “Enquanto rede, não perfilhamos o sistema assistencialista, mas o sistema do desenvolvimento integral da pessoa“, acrescenta. Por isso, a luta travada pela EAPN tem sido no sentido de criar “uma estratégia articulada com todos os ministérios que têm influência na vida social das pessoas” para por fim à pobreza.
A central, no Porto, traça as grandes linhas orientadoras da ação deste organismo, nomeadamente no que toca à “formação e capacitação“, como explica Sandra Araújo, diretora executiva da EAPN.
A primeira preocupação da EAPN é a “dimensão do conhecimento“, afirma a responsável. De forma mais pormenorizada, importa saber, esclarece Sandra Araújo, quais as pessoas mais afetadas pela pobreza num território, que trabalho é desenvolvido pelas entidades locais e de que forma é que essa resposta se pode “tornar mais capaz“. A recolha destes indicadores, no plano nacional e a nível distrital, tem sido crucial para “sustentar a atuação” da EAPN, que partilha esta informação com “quem tem poder de decisão” para que “as políticas públicas sejam mais eficazes”.
“Estamos numa Europa que tem abandonado os valores fundamentais da pessoa humana
A pandemia da Covid-19, a guerra no leste da Europa, os aumentos do custo dos combustíveis, da energia e dos bens essenciais são fatores que terão um “grande impacto” na pobreza em Portugal e na Europa, reconhece o padre Jardim que alerta, contudo, para a pobreza que vai além disto: “a pobreza imaterial”. “É outro fator que não passa pelo dinheiro, porque esse é evidente. Temos um problema também do imaterial, da segurança, da afetividade, do relacionamento, da esperança e do sentido da vida das pessoas“, afirma. “Estamos numa Europa que tem abandonado os valores fundamentais da pessoa humana e tem-se fixado muito apenas no material e penso que chegou o momento de podermos olhar a pessoa no seu todo. A luta contra a pobreza ou tem como objetivo ajudar a construir o caminho para a felicidade das pessoas, ou é desastrosa. O ser humano não nasceu para a sobrevivência, nasceu para a sua plenitude pessoal, para a vida plena", sublinha.
“O elevador social está avariado em Portugal”
Quem são os grupos mais vulneráveis à pobreza? Sandra Araújo enumera: mulheres, famílias monoparentais, idosos, crianças e jovens até aos 18 anos. “A taxa da pobreza infantil, apesar de ter vindo a melhorar ligeiramente nos últimos anos é muito grande e isto produz uma pobreza geracional. Estas crianças, que nascem em famílias ou agregados familiares pobres, a tendência é que a situação se perpetue, não conseguimos inverter esta situação“, alerta. E acrescenta. “O elevador social está avariado em Portugal porque a nossa capacidade e eficácia das políticas para inverter esta situação não tem sido muito eficaz. Esta perpetuação e manutenção no sistema tem sido muito difícil de romper“, reconhece.
Sandra Araújo acredita que a Estratégia Nacional de combate à pobreza, aprovada recentemente, pode ajudar neste combate, alertando que é preciso passar da teoria à prática. “Não pode ser apenas no papel, precisamos de um plano nacional com recursos, humanos e materiais, para desenvolver a estratégia e um sistema de avaliação e monitorização, que é outra coisa que a EAPN há muito defende“, argumenta. “Há ciclos políticos e programas políticos e quando há mudança de ciclo opta-se por rever tudo e começar tudo de novo e nunca se faz um trabalho de avaliação sério do impacto das políticas“, acrescenta.
“Temos uma oportunidade única para podermos mudar as estruturas que geram a pobreza”
Nesse sentido, o Congresso Nacional sob o tema ‘Conversas sobre a Pobreza’, que se divide em quatro momentos, é uma oportunidade para “pressionar” as instâncias governamentais e não só, afirma o padre Jardim Moreira. “Queremos que seja também a sociedade civil toda a assumir uma viragem de página, porque temos uma oportunidade única do PRR e dos fundos estruturais da Europa para podermos mudar as estruturas que geram a pobreza. A pobreza tem causas estruturais, na economia, na habitação, na educação“, recorda. E remata: “O combate à pobreza devia de ser um desígnio nacional”.
Entrevista EAPN 28/04/2022
Resgatados mais 75 migrantes no Mediterrâneo centra
Seguiam num barco a 42 milhas da costa da Líbia.
O navio Ocean Viking, que pertence à ONG SOS Méditerranée, resgatou nas últimas horas 75 migrantes no Mediterrâneo central. De acordo com a organização, já seguiam a bordo outros 158 migrantes resgatados em várias operações.
“Esta noite, 75 pessoas foram resgatadas pelo Ocean Viking de um barco em perigo a 42 milhas da costa da Líbia, depois de o veleiro Nadir os ter ajudado durante horas”, escreveu a ONG nas redes sociais.
Dados do Ministério do Interior italiano indicam que, desde o início do ano até agora, cerca de 16.000 migrantes chegaram às costas italianas, em comparação com quase 13.500 no mesmo período do ano passado.
A Organização não Governamental (ONG) SOS Mediterranée adiantou também que foi informada pelo Alarm Phone de que um navio tinha sido intercetado pela guarda costeira da Líbia.
“As nossas equipas viram um barco de patrulha a transportar várias pessoas, provavelmente devolvidas ilegalmente à Líbia”, acrescentou.
A Alarm Phone é um serviço telefónico que atende pedidos de ajuda de barcos de migrantes no Mediterrâneo Central e informa as autoridades e ONGs dedicadas ao resgate humanitário.
O Ocean Viking viaja agora com 233 pessoas resgatadas a bordo, depois de na última quinta-feira ter recolhido 158 migrantes, incluindo seis mulheres grávidas e uma criança de três meses, que viajavam em dois botes de borracha superlotados nas águas da Líbia.
Nesse mesmo dia, o navio GeoBarents, dos Médicos Sem Fronteiras (MSF), chegou ao porto siciliano de Augusta, com 471 migrantes a bordo, embora o desembarque tenha demorado mais de um dia para que fosse concluído. Seis pessoas saltaram para a água “desesperadas após 11 dias de espera injustificada desde o primeiro resgate”, explicou a ONG.
Fenómeno da “reduflação”: Deco pede atenção redobrada nas idas ao supermercado
A ‘reduflação’ não é ilegal, mas muitas vezes o consumidor sente-se enganado.
Os consumidores devem redobrar a atenção sobre a quantidade e tamanho dos produtos que estão acostumados a comprar, verificando se compram menos pelo mesmo preço, alerta a associação Deco, que tem recebido denúncias especialmente sobre alimentos congelados.
Em causa está o fenómeno denominado de ‘reduflação’ (tradução literal do neologismo inglês ‘shrinkflation’), que consiste na diminuição da quantidade de produto, mantendo — ou mesmo aumentando – o preço.
“Denúncias não no sentido de que há aqui uma ilegalidade, mas no sentido de os consumidores notarem que há uma alteração” no produto, tornando-o mais caro, explicou à Lusa o coordenador do departamento jurídico da associação de defesa dos consumidores Deco, Paulo Fonseca.
A ‘reduflação’ não é ilegal desde que a informação no rótulo esteja correta, mas muitas vezes o consumidor sente-se enganado com estas subidas de preço que acha serem disfarçadas.
A maioria das denúncias que têm chegado à associação Deco referem-se a compras no setor retalhista e na área de alimentação, sobretudo compras de produtos congelados.
“Os consumidores relatam que, por exemplo, por 15 euros compravam sete postas de pescada e agora, pelo mesmo preço, só compram cinco postas. Ou seja, há duas postas que já não constam da embalagem”, afirmou.
O jurista defende que, das duas uma: ou a informação de que são cinco postas em vez de sete consta do produto, porque é obrigatório constar a indicação de todos os componentes, não sendo uma prática proibida, ou está-se perante uma situação em que “a informação é enganosa”, tratando-se de uma prática comercial desleal cuja fiscalização compete à Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE).
Paulo Fonseca destaca que “o problema que preocupa” a Deco são os consumidores que compram de forma rotineira e não reparam na mudança de rotulagem do produto, cuja leitura diz ser às vezes difícil, considerando que “muitas vezes só um consumidor extremamente atento é que consegue” detetar a mudança.
O jurista lembra que a Deco alertou a Secretaria de Estado da Defesa do Consumidor, ausente no atual Governo, para a necessidade de regulamentar estas práticas de ‘reduflação’ e de reforçar a informação ao consumidor nestas situações.
“Deveria existir aqui uma obrigatoriedade acrescida de reforçar esta informação, de tornar mais transparente para o consumidor, para se tornar percetível” a alteração nos componentes do produto mantendo o preço, concluiu.
PRR: Bruxelas dá luz verde a desembolso de 1,16 mil milhões de euros a Portugal
Em causa está um pedido de financiamento apresentado por Portugal à Comissão Europeia a 25 de janeiro
A Comissão Europeia aprovou esta sexta-feira um desembolso a Portugal de 1,16 mil milhões de euros, dos quais 553,44 milhões são subvenções e o restante empréstimos, sendo o primeiro desembolso após metas cumpridas ao abrigo das verbas da recuperação.
“A Comissão Europeia aprovou hoje uma avaliação preliminar positiva do pedido de pagamento de 1,16 mil milhões de euros apresentado por Portugal, dos quais 553,44 milhões de euros são subvenções e 609 milhões de euros são empréstimos ao abrigo do Mecanismo de Recuperação e Resiliência”, informa a instituição em comunicado.
Em causa está um pedido de financiamento apresentado por Portugal à Comissão Europeia a 25 de janeiro, ao qual Bruxelas deu hoje uma primeira ‘luz verde’ devido ao “cumprimento dos 38 marcos e metas selecionados […] para a primeira parcela”, explica o executivo comunitário.
“Com o seu pedido, as autoridades portuguesas apresentaram elementos de prova pormenorizados e completos que demonstram o cumprimento dos 38 marcos e metas”, acrescenta.
Em meados de janeiro, o ministro das Finanças, João Leão, assinou em Bruxelas o acordo operacional do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) português, anunciando na altura que Portugal iria solicitar o primeiro desembolso já em função de marcos atingidos.
Antes, no início deste ano, o responsável pela gestão do PRR português, Fernando Alfaiate, presidente da estrutura de missão Recuperar Portugal, anunciou que Portugal já tinha concretizado os 38 indicadores necessários (34 marcos e quatro metas) – equivalente a 21 reformas concretizadas e 17 investimentos lançados – para realizar o primeiro pedido de pagamento de fundos do instrumento de recuperação e resiliência a Bruxelas.
Depois do pré-financiamento de 2,2 mil milhões de euros que Portugal recebeu no verão de 2021 – equivalente a 13% do montante total do PRR –, este é o primeiro desembolso em função de metas atingidas, as quais Bruxelas diz hoje ter “avaliado exaustivamente”.
A Comissão Europeia especifica que em causa estão “reformas nos domínios da saúde, habitação social, serviços sociais, investimento e inovação, qualificações e competências, silvicultura, economia azul, bioeconomia, gases renováveis (incluindo o hidrogénio), finanças públicas e administração pública”.
“Vários destes marcos dizem igualmente respeito a investimentos nos domínios das infraestruturas, da descarbonização da indústria e da educação digital”, adianta.
Em causa está o Mecanismo de Recuperação e Resiliência, avaliado em 672,5 mil milhões de euros (a preços de 2018) e elemento central do “NextGenerationEU”, o fundo de 750 mil milhões de euros aprovado pelos líderes europeus em julho de 2020 para a recuperação económica da UE da crise provocada pela pandemia de covid-19.
O PRR português inclui investimentos e reformas em 20 componentes temáticas, com uma verba de 13,9 mil milhões de euros em subvenções e 2,7 mil milhões de euros em empréstimos.
A primeira tranche de pagamentos, equivalente a 13% (2,2 mil milhões de euros) do PRR, foi paga por Bruxelas a Portugal a título de pré-financiamento a 03 de agosto de 2021.
Para este novo pagamento ser efetuado, caberá agora ao Comité Económico e Financeiro analisar, dentro de um mês, a avaliação preliminar positiva da Comissão Europeia sobre o cumprimento português, e dar o seu parecer para, depois, o desembolso ter autorização final.
Citada pela nota, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, destaca que “Portugal deu hoje um passo importante na via da recuperação”.
“Realizou bons progressos na execução do seu plano de recuperação, com reformas transformadoras e investimentos ambiciosos nos domínios da saúde, da habitação social e da descarbonização da indústria”, elenca.
Mais cedo ou mais tarde, a agricultura terá de abraçar o Pacto Ecológico Europeu
O futuro da agricultura também passa por “formar mais agricultores”, ensinando-lhes técnicas mais modernas e ecológicas que permitam poupar água e produzir alimentos mais saudáveis.
Abraçar as transformações necessárias para responder à crise climática sem perder a viabilidade económica — eis uma das grandes encruzilhadas da agricultura europeia ao olhar para o futuro, num momento em que se completam os 60 anos da Política Agrícola Comum (PAC), um dos instrumentos mais antigos e também mais dispendiosos do orçamento da União Europeia. Em 2023, depois de um período de transição de dois anos, entrará em vigor a nova PAC para 2021-2027, documento que atraiu muitas críticas, entre as quais a de que os objectivos ecológicos estavam a ser “impostos” ao mundo rural.
Mas o que é, hoje, o nosso “mundo rural”? De quem falamos quando falamos em “agricultores”? A eurodeputada do PS Isabel Carvalhais, membro da comissão de Agricultura do Parlamento Europeu, prefere falar em “ruralidades”, reconhecendo a heterogeneidade do território. A própria distinção entre um pequeno agricultor e um grande produtor pode significar coisas distintas em diferentes pontos do país — compare-se, por exemplo, as pequenas propriedades do interior norte com as grandes explorações do Alentejo.
Acima de tudo, diz, “há espaço para todas as dimensões”. Apesar dos desafios em equilibrar as produções focadas no lucro com requisitos de sustentabilidade, também os grandes proprietários devem ser valorizados pela capacidade de investir em inovação, divulgar práticas, manter uma maior produtividade.
Falta debate sobre como os alimentos são produzidos e nos chegam à mesaFrancisco Guerreiro (Independente)
Também para o eurodeputado Álvaro Amaro, eleito pelo PSD, “é errado haver esse combate entre grandes e pequenos” — “há lugar para todos” —, recordando a importância para a produção nacional da “agricultura competitiva e moderna” feita pelas empresas com mais meios.
Além das emissões de gases de efeito de estufa, algumas actividades agrícolas são vistas também como culpadas pelo declínio da biodiversidade, decorrente da forma como o solo é explorado e muitas vezes esgotado. Neste momento, afirma Francisco Guerreiro, eurodeputado independente do grupo dos Verdes no Parlamento Europeu, a PAC continua a olhar para o “modo de produção em quantidade e não em qualidade”.
O eurodeputado ambientalista lamenta o desconhecimento generalizado da realidade rural e dos seus problemas, que “só se aborda quando é para criar polémica”. Considera que existe, acima de tudo, desconhecimento sobre a forma como a comida é produzida: “Falta debate sobre como os alimentos são produzidos e nos chegam à mesa.” É preciso, diz, “formar mais agricultores” do ponto de vista técnico, de forma a poderem aplicar técnicas mais modernas e ecológicas que permitam poupar água e produzir alimentos mais saudáveis. De acordo com alguns relatórios, isto também passa por uma certa formação ambiental, de forma a tornar visível o impacto negativo para o ambiente da utilização de recursos como determinadas técnicas ou produtos.
Francisco Guerreiro sublinha que é preciso quebrar a divisão, por vezes artificial, entre o litoral e o interior e olhar para problemas transversais que também são sentidos no mundo rural. O acesso à Internet (um dos objectivos do Pacto Ecológico), a serviços públicos de proximidade e a empregos de qualidade, que ajudam a fixar as populações nos territórios, também podem contribuir para a modernização da produção agrícola e desenvolvimento do mundo rural. Recordando que, ao lado da transição ecológica, a UE também enfrenta o desafio da transição digital, Francisco Guerreiro alerta que “o fosso da desigualdade vai aumentar” se nada for feito para contornar estas disparidades.
Para Isabel Carvalhais, existe agora uma grande oportunidade se incorporar o mundo rural na aplicação do Plano de Recuperação e Resiliência, desde áreas como a digitalização até, em particular, às questões ambientais, tendo em conta o papel fulcral da agricultura tanto na redução das emissões como na promoção da biodiversidade.
Questões ambientais
O social-democrata Álvaro Amaro torce o nariz às pretensões ecológicas que não garantam fundos para compensar os agricultores por eventuais perdas na produção. Acusa o comissário Frans Timmermans de ter aprovado o Pacto Ecológico Europeu à pressa, afirmando que são precisas mais avaliações de impacto destas propostas. Alguns relatórios publicados até ao momento indicam que haverá uma queda na produção decorrente, entre outros, da redução da utilização de pesticidas e fertilizantes nocivos (o Pacto Ecológico prevê uma redução de 50% até 2030). Para Álvaro Amaro, a situação agravada com a guerra na Ucrânia deixou a descoberto uma das fragilidades de se reduzir a produção. “Queremos produção e soberania alimentar”.
Já a socialista Isabel Carvalhais, relatora no Parlamento Europeu da Estratégia para a Biodiversidade, alerta que as medidas agora tomadas que dão menos importância a critérios ecológicos devem ser excepção. Não se pode, afirma, utilizar a guerra como pretexto para regressar ao “business as usual”, quando o impacto das alterações climáticas é cada vez mais claro para os produtores. Se a guerra da Ucrânia tornou mais visível a crise no abastecimento, o alerta sobre a escassez de alimentos e o aumento de preços já tinha sido lançado no ano passado pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO).
Em Portugal, os efeitos da seca já têm levado a algumas concessões, como a utilização de pousios, para garantir a produção, mas Isabel Carvalhais reforça que é preciso não perder de vista os objectivos climáticos e não deixar que as “excepcionalidades se tornem no novo normal”. “Não podemos achar que isto é uma resposta de longo prazo”.
A gestão dos recursos agrícolas é um puzzle complexo, que envolve não apenas a soberania alimentar ou imperativos climáticos, mas também questões como as exportações (incluindo para países em desenvolvimento, sem capacidade de produção agrícola) ou o desperdício alimentar.
Reforma ou revolução?
Para resolver este puzzle para o futuro, a União Europeia parece ter escolhido o caminho que coloca a protecção do ambiente em primeiro lugar, com estratégias ambiciosas como “Do prado ao prato”, para garantir sistemas alimentares — de produção e de consumo — mais sustentáveis, ou a estratégia para a Biodiversidade.
Álvaro Amaro, particularmente crítico da estratégia “Do prado ao prato”, insiste no gradualismo. Discorda de mudanças “por decreto”, afirma que “não pode haver uma decisão arbitrária”. A redução de pesticidas e a aposta na agricultura biológica, reforça, devem significar um acréscimo nos apoios para garantir que os agricultores não perdem rendimentos nessa transição ecológica. “O que está aqui em causa não é tanto a arquitectura verde”, explica, mas antes “aplicar esta estratégia de imediato”, sem ter a certeza, afirma, de que os agricultores não ficarão desamparados perante a esperada redução da produção.
Francisco Guerreiro contrapõe que é mesmo preciso uma revolução, considerando que as pequenas reformas não têm sido adequadas para fazer face às mudanças urgentes para combater as alterações climáticas.
É obrigação das políticas públicas estimularem essa revoluçãoIsabel Carvalhais (PS)
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Gradualismo ou revolução? Isabel Carvalhais prefere uma posição mais moderada. “Tende a concordar” com Francisco Guerreiro, mas reforça que é preciso salvaguardar a chamada transição justa, senão para muitos agricultores — em particular os pequenos — “a revolução pode ser o fim”. Retorna-se, assim, à importância de os Estados-membros incluírem o mundo rural nas suas prioridades políticas, disponibilizando fundos: “É obrigação das políticas públicas estimularem essa revolução.” Se estivermos sempre a adiar esse impulso, alerta a eurodeputada, “daqui a pouco não temos é planeta”.
Uma cronologia ambiental da PAC
A Política Agrícola Comum foi oficialmente lançada em 1962, instituindo organizações de mercado comum para áreas como a produção de cereais, carnes, vinho ou frutas e vegetais. Em 1985 (ainda antes da entrada de Portugal na então Comunidade Económica Europeia), é publicado um “Green Paper” onde se reconhece que, além da produção, “a agricultura contribui para a manutenção do tecido social nas áreas rurais, a protecção das terras e a conservação dos recursos naturais”. A protecção do ambiente volta a ser integrada na grande reforma da PAC de 1992 (a Reforma MacSharry), na Reforma Fischer de 2003 e na revisão de 2008, onde as alterações climáticas e a protecção da biodiversidade são abordadas.
Em 2013, nos planos para o pacote da PAC para 2014-2020, encontram-se novas respostas às exigências sociais em áreas como as alterações climáticas, o bem-estar animal e o desenvolvimento rural de uma forma mais abrangente.
Foi, contudo, com a comissão que tomou posse em 2019 que o ambiente e o combate às alterações climáticas passaram a estar no centro do debate. Em Dezembro de 2019, em plenas negociações para a nova PAC, é apresentado o Pacto Ecológico Europeu, que engloba as estratégias “Do prado ao prato” (Farm to Fork) e da biodiversidade (que viriam a ser detalhadas pela comissão em 2020) com o objectivo de criar sistemas alimentares (de produção e de consumo) mais sustentáveis.
COM O APOIO
O projeto foi cofinanciado pela União Europeia no âmbito do programa de subvenções do Parlamento Europeu no domínio da comunicação. O Parlamento Europeu não foi associado à sua preparação e não é de modo algum responsável pelos dados, informações ou pontos de vista expressos no contexto do projecto, nem está por eles vinculado, cabendo a responsabilidade dos mesmos, nos termos do direito aplicável, unicamente aos autores, às pessoas entrevistadas, aos editores ou aos difusores do programa. O Parlamento Europeu não pode, além disso, ser considerado responsável pelos prejuízos, directos ou indirectos, que a realização do projecto possa causar
Protecção de dados regista máximos de coimas, violações de dados e processos de averiguações em 2021
Num total de 60 coimas sobressai a aplicada à Câmara Municipal de Lisboa no caso do envio de dados de activistas às autoridades russas.
Quatro anos após a entrada em vigor do Regulamento Geral sobre a Protecção de Dados (RGPD), a Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD) registou em 2021 máximos de processos de averiguações, violações de dados e coimas. O maior aumento ocorreu nas coimas.
No ano passado, houve 60, num valor total de 1,49 milhões de euros, incluindo as sanções aplicadas ao abrigo do RGPD e da lei da privacidade nas comunicações electrónicas, onde se enquadram as normas relativas ao spam e às gravações de chamadas. Do total sobressai a aplicada à Câmara Municipal de Lisboa no caso do envio de dados de activistas às autoridades russas, no valor de 1,25 milhões de euros.
Em 2020, só foram aplicadas 15 coimas, no valor de 47 mil euros. Em 2019, houve 34 multas, num valor de cerca de 600 mil euros, sendo que sete destas sanções dizem respeito a infracções ao RGPD (410 mil euros) e as restantes à legislação anterior. Já no ano 2018, ano em que a RGPD entrou em vigor, a CNPD aplicou 22 coimas, que ascenderam a 408 mil euros.
Somando a actividade sancionatória da CNPD desde a vigência do RGPD, verifica-se um total de 131 coimas. Estas originaram mais de 2,54 milhões de euros.
No que toca a notificações de violação de dados pessoais, a autoridade reguladora presidida por Filipa Calvão registou um total de 318 no ano passado, ao abrigo do RGPD, 250 das quais no sector privado e 68 no sector público. Entre os privados, a maior prevalência ocorreu na área de comércio e serviços (78 notificações), seguindo-se a banca e seguros (42); no sector público destacaram-se os incidentes na administração local (27) e no ensino superior (24).
Quanto à origem dos incidentes de segurança, surge em primeiro lugar “falha humana”, com 77 notificações; em segundo lugar, “ransomware”, com 70. O phishing motivou 38 incidentes notificados. Houve ainda 32 que se deveram a falhas aplicacionais, explicou a CNPD, acrescentando que “o princípio da confidencialidade dos dados foi o mais comprometido”, com 249 casos, à frente do princípio da disponibilidade (86) e do princípio da integridade (64), embora um incidente possa afectar mais do que um princípio em simultâneo.
As 318 violações de dados pessoais em 2021 tiveram também um aumento relativamente às 301 notificadas em 2020, às 240 de 2019 e às 161 entre 25 de Maio e 31 de Dezembro de 2018. No cômputo geral deste período pós-RGPD, contabilizam-se 1.020 notificações de violação de dados pessoais.
Paralelamente, foram abertos 1.232 processos de averiguações em 2021, entre os quais estão investigações por iniciativa própria da CNPD e denúncias de outras entidades, como PSP, GNR, ASAE, Ministério Público (MP) ou Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT). O número marca um aumento de 11,6% face aos 1.104 processos de 2020 e é ainda superior aos registos de 2019 (936) e do período de vigência do RGPD em 2018 (610), resultando num total de 3882 ao longo destes anos. Estes processos abrangem não só situações cobertas pelo RGPD, mas também por qualquer legislação em matéria de protecção de dados pessoais, em particular no sector das comunicações electrónicas e no sector policial.
Em relação a pedidos de parecer sobre projectos de diploma, regulamentos, protocolos ou sistemas de videovigilância - quer na esfera do RGPD, quer da lei de protecção de dados para efeitos de investigação criminal e repressão de infracções penais -, a CNPD recebeu 135 pedidos em 2021. Mais do que foi registado em 2020 (105), 2019 (81) ou 2018 (29), o que perfaz 350 pedidos após Maio de 2018.
Por último, a autoridade administrativa revelou que até sexta-feira estavam registados 4397 encarregados de protecção de dados (EPD). Desses, 813 em funções em entidades públicas e 3584 em entidades privadas, contra 3620 EPD activos no final de 2020 e 3104 que tinham sido notificados à CNPD em 2019.
A protecção de dados pessoais ganhou outra força com a aplicação do RGPD após 25 de Maio de 2018, sensivelmente dois anos depois da aprovação no Parlamento Europeu e no Conselho Europeu. Entre as principais mudanças esteve a imposição de avultadas sanções financeiras que, no limite, podem atingir para as contra-ordenações muito graves os 20 milhões de euros ou 4% do volume de negócios anual a nível mundial dos infractores, consoante o valor que seja mais elevado.
Municípios vão ter 168 milhões do PRR para arrendarem 1600 casas a custos acessíveis
O programa Parque Público de Habitação a Custos Acessíveis, financiado pelo PRR, tem como objectivo lançar 6800 casas com rendas acessíveis. Está atrasado, mas o Governo garante que as metas serão cumpridas.
Os municípios vão poder aceder, a partir desta segunda-feira, a uma linha de crédito de 167,8 milhões de euros para financiar a reabilitação, construção ou aquisição de imóveis destinados ao arrendamento acessível. É a primeira linha de financiamento da componente de empréstimos do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) a ser lançada, na vertente da habitação, e tem como objectivo financiar a disponibilização de 1590 casas no mercado de arrendamento. O programa está a arrancar com atraso, mas o Governo garante que as metas “não estão em causa”.
A nova linha é lançada no âmbito do “Parque Público de Habitação a Custos Acessíveis”, um dos vários programas que fazem parte da componente de habitação do PRR e que visam promover o acesso a habitação para todos. Para este programa, está previsto um investimento total de 774,8 milhões de euros até 2026, montante que será obtido através da componente de empréstimos do PRR. Do montante total, 607 milhões serão destinados ao financiamento de 5210 alojamentos a custos acessíveis promovidos directamente pelo Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU), enquanto os restantes 167,8 milhões serão canalizados para a linha de financiamento que agora arranca, que visa financiar 1590 casas. Ao todo, o programa permitirá a disponibilização de 6800 alojamentos a custos acessíveis.
O objectivo, pode ler-se no aviso que estabelece as condições desta nova linha, publicado esta segunda-feira, é disponibilizar casas “às famílias que não encontram respostas no mercado tradicional, por incompatibilidade entre os seus rendimentos e os valores de renda praticados”. Os municípios e o Fundo Nacional de Reabilitação do Edificado (FNRE) poderão candidatar-se a estes empréstimos para promover a oferta habitacional através dos programas municipais próprios, ficando sujeitos às mesmas condições de financiamento obtidas pelo Estado junto da União Europeia no âmbito do Mecanismo de Recuperação e Resiliência, com taxas de juro mais baixas e prazos de pagamento mais longos do que os que são praticados pela banca.
Os limites máximos de financiamento a conceder por projecto, para a reabilitação ou construção, serão aqueles que estão definidos no regime de habitação de custos controlados. No caso da reabilitação, este limite pode ser aumentado até 25%, “e casos excepcionas devidamente fundamentados e aceites pelo IHRU, designadamente quando as obras devem ser precedidas de trabalhos prévios de demolição, contenção ou similares”. Já no caso da aquisição, o financiamento máximo corresponde aos valores medianos de venda de alojamentos familiares novos, em cada concelho, divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE).
Já os valores máximos de rendas a serem praticadas uma vez que as casas estejam prontas para ser lançadas no mercado são as que estão estabelecidas no Programa de Arrendamento Acessível. Ou seja, no máximo, as rendas terão de corresponder a uma redução de 20% face aos valores medianos de renda em cada concelho, de acordo com os dados divulgados semestralmente pelo INE. Mas os valores poderão ser inferiores, se, por exemplo, os programas municipais definirem rendas mais baixas do que este limite.
Metas “não estão em causa"
O programa que agora arranca está atrasado face aos compromissos que foram assumidos com a Comissão Europeia no âmbito do PRR – como, aliás, o Governo admitiu quando entregou o Programa Nacional de Reformas a Bruxelas, em Abril. Mas estes atrasos, garante agora o executivo, são “as vicissitudes normais de um calendário” e não colocam em causa as metas traçadas, que, para já, não foram alteradas.
Isso mesmo assegura a secretária de Estado da Habitação, Marina Gonçalves, em declarações ao PÚBLICO. “O atraso é em relação ao cenário óptimo que queríamos e estamos a trabalhar para ir recuperando para a meta final. O nosso objectivo continua a ser de 6800 fogos a custos acessíveis e, até ver, não há nada que nos faça antecipar que isso não vai acontecer”, diz a governante. “São as vicissitudes normais de um calendário. Obviamente, tínhamos um cenário óptimo, que, depois, vamos reajustando, mas a meta final, até ver, não está em causa”, acrescenta.
Quanto ao impacto que o aumento acentuado dos preços dos materiais poderá ter sobre o cumprimento destes prazos, a secretária de Estado admite que existe “preocupação” em torno deste tema, mas lembra as medidas que estão a ser implementadas para mitigar este impacto. “Ainda na sexta-feira, foi publicado o diploma da revisão de preços e o Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção (IMPIC) publicou um documento de recomendações às entidades adjudicantes, para orientá-las sobre como devem aplicar o Código dos Contratos Públicos (CCP) e garantir que não ficam com concursos desertos. Há, também, um trabalho que é feito pelo Governo, junto do sector, para garantirmos que temos mão-de-obra. Todos estes cenários têm uma margem de risco e de incerteza, mas o que é importante é fazermos esta antecipação e acompanharmos com medidas, que é o que estamos a fazer”, aponta.
As medidas que estão a ser implementadas, acredita Marina Gonçalves, serão suficientes para evitar cenários em que não há candidatos aos concursos de obras públicas, até porque “este aumento do preço é, efectivamente, extraordinário”, pelo que se espera um regresso à normalidade. “Vamos acompanhando em função da evolução do mercado e, à partida, garantimos que os compromissos assumidos vão ser concretizados”, resume.
Segurança Social tem €13,3 mil milhões por cobrar. Dívida pagaria um ano de pensões de velhice
Estado provisiona mais de metade da dívida à Segurança Social, sinalizando dificuldades de recuperação, indica a Conta Geral do Estado de 2021
A Segurança Social fechou o ano 2021 com 13,3 mil milhões de euros por cobrar. Em causa estão dívidas de empresas e de trabalhadores independentes, que não fizeram os descontos, ou de beneficiários, que receberam prestações sociais indevidas. Mais de metade do valor está provisionado, o que sinaliza que o Estado não tem grande esperança em recuperar o dinheiro, que, em termos globais, daria para pagar um ano inteiro de pensões de velhice.
De acordo com a Conta Geral do Estado de 2021, que acaba de dar entrada na Assembleia da República, a Segurança Social dá conta de que “o valor bruto das dívidas de terceiros” (que, na sua esmagadora maioria, corresponde a dívidas de contribuintes) atingiu os 13.336,1 milhões de euros no final do ano passado. Deste bolo, 8325,4 milhões de euros (cerca de 62% do total) encontra-se provisionado, o que sinaliza maior risco de não ser recuperado.
Ao contrário da Autoridade Tributária, que apresenta as dívidas dos contribuintes com maior detalhe, a descrição da Segurança Social é muito sumária. Não é especificado como se decompõe esta dívida, nem é dada informação sobre a sua probabilidade de cobrança.
O valor em dívida este ano cresce ligeiramente em relação ao registado em 2020, altura em que atingiu os 13290,5 milhões de euros, segundo a Conta Geral do Estado de então. E, para se ter uma ideia, quase daria para cobrir um ano de pensões de velhice.
CONTAS POSITIVAS
Em termos globais, a Segurança Social fechou o ano passado em terreno positivo, isto é, com mais receitas do que despesas. Ao todo, o saldo foi de 2,3 mil milhões de euros. Significa isto que não foi necessário ir buscar dinheiro ao Orçamento do Estado ou ao Fundo de Capitalização (a chamada “almofada” das pensões) para pagar as prestações do sistema previdencial.
A contribuir para este bom desempenho esteve o emprego, que contribuiu para um aumento das contribuições e quotizações em 9,5%, para os 19,9 mil milhões de euros. Para este desempenho a Segurança Social vem contando com um número crescente de receitas gerais, como é o caso do adicional ao IMI, e da contribuição especial sobre o setor bancário. A soma de ambas rendeu quase 500 milhões de euros no ano passado.
Do lado da despesa, as pensões continuaram a aumentar e atingiram 18.459,2 milhões de euros no ano passado (13,9 mil milhões dos quais em pensões de velhice), assim como os valores gastos com subsídios de doença e de desemprego, que o governo atribui essencialmente à Covid.
Pesando os dois pratos da balança, o saldo da execução do orçamento do sistema de Segurança Social, na ótica da contabilidade pública, cifrou-se em 2328,3 milhões de euros. Foram mais 196,7 milhões de euros, ou mais 9,2%, do que em 2020.
Apesar de os últimos anos terem afastado o fantasma de sustentabilidade da Segurança Social, os cenários traçados pelo Governo admitem que, na próxima década, será necessário acionar o fundo de estabilização financeira, porque as contribuições em pagamento não chegarão para pagar despesas.
Numa das suas recentes passagens pelo Parlamento, no final de abril, a ministra da Segurança Social chegou a anunciar a “decisão” de criação de uma comissão para “apresentar uma reflexão sobre sustentabilidade e diversificação das fontes de financiamento da Segurança Social”.
Até hoje ainda não detalhou nomes para o grupo de trabalho, a sua missão concreta e calendário de trabalhos.
Apresentadoras de TV do Afeganistão voltam a cobrir o rosto
No sábado, as apresentadoras desafiaram a ordem dos talibãs e optaram por apresentar-se em direto sem esconder o rosto. Mas este domingo já surgiram de cara coberta.
As apresentadoras das principais cadeias de televisão afegãs surgiram este domingo em antena com a cara coberta, um dia após desafiarem a ordem dos talibãs para esconderem o rosto, submetendo-se assim à visão austera deste grupo islâmico.
Depois do regresso ao poder no ano passado, os talibãs impuseram uma série de restrições à sociedade civil, grande parte das quais para limitar os direitos das mulheres.
No início do mês, o chefe supremo dos talibãs emitiu uma ordem segundo a qual as mulheres devem cobrir-se inteiramente em público, incluindo o rosto, idealmente com a burca tradicional.
Antes, bastava um lenço para cobrir o cabelo.
O temido Ministério para a Promoção da Virtude e a Prevenção do Vício do Afeganistão ordenou às apresentadoras de televisão que cumprissem a norma até sábado.
Mas as jornalistas optaram por não acolher a ordem no sábado e apresentaram-se em direto sem esconder o rosto.
Hoje, apresentaram-se de burca, deixando ver apenas os olhos para apresentarem os jornais nos canais TOLOnews, Ariana Television, Shamshad TV e 1TV.
Taxa de desemprego desce para 5,9% no trimestre
População empregada chegou aos 4,9 milhões de pessoas e aumentou 0,4% (21,9 mil) em relação ao trimestre anterior.
A taxa de desemprego recuou para 5,9% no primeiro trimestre, valor inferior em 0,4 pontos percentuais à do trimestre anterior e em 1,2 pontos percentuais à do trimestre homólogo de 2021, divulgou esta quarta-feira o INE.
De acordo com o Instituto Nacional de Estatística (INE), entre Janeiro e Março a população desempregada, estimada em 308,4 mil pessoas, diminuiu 6,7% (22,2 mil) em relação ao trimestre anterior e recuou 14,3% (51,7 mil) face ao trimestre homólogo.
A população empregada foi estimada em quase 4,901 milhões de pessoas e aumentou 0,4% (21,9 mil) em relação ao trimestre anterior e 4,7% (219,3 mil) relativamente ao mesmo período de 2021.
De acordo com a informação agora disponibilizada pelo INE, a proporção de trabalhadores que exerceram a sua profissão “sempre ou quase sempre a partir de casa” em regime de teletrabalho foi de 10,4%, abrangendo 510,2 mil pessoas. Este valor “correspondeu à segunda menor proporção deste indicador” (que surgiu no segundo trimestre de 2020, logo após a pandemia), após o trimestre anterior.
A subutilização do trabalho abrangeu 618,2 mil pessoas, “tendo diminuído 1,9% (11,9 mil) em relação ao trimestre anterior e 17,2% (128,2 mil) relativamente ao período homólogo”. De igual modo, diz o INE, também a taxa de subutilização do trabalho, que se situou nos 11,5%, “diminuiu tanto em relação ao trimestre anterior (0,2 p.p.) como ao homólogo (2,6 p.p.)”.
Há mais mulheres a trabalhar em Portugal mas continuam a ganhar menos. 20% vive em risco de exclusão social
Este ano, o Dia do Trabalhador e o Dia da Mãe celebram-se na mesma data. Para assinalar esta coincidência, a Pordata, a base de dados estatísticos da Fundação Francisco Manuel dos Santos, compilou uma série de dados que caracterizam o perfil atual da mulher trabalhadora portuguesa.
Há, hoje, mais mulheres a trabalhar em Portugal do que em décadas anteriores mas continuam a ganhar menos do que os homens e cerca de um quinto vive mesmo em risco de pobreza e exclusão social. Estas são algumas das principais conclusões dos dados compilados pela Pordata, a base de dados estatísticos da Fundação Francisco Manuel dos Santos, no âmbito de um relatório que pretende assinalar o Dia do Trabalhador e o Dia da Mãe, que hoje, dia 1, se comemoram.
"A evolução histórica é notória, mas ainda há caminho a percorrer no que respeita à situação laboral das mulheres e mães portuguesas", alerta a instituição em comunicado de imprensa. "Estes são também dados que permitem verificar as diferenças que as mulheres em Portugal apresentam face às dos restantes países da União Europeia e a sua vulnerabilidade face à pobreza e ao desemprego", refere ainda o documento. Os números recolhidos atentam-no.
Existem atualmente 2,4 milhões de mulheres trabalhadoras em Portugal. Representam metade da população empregada. Dessas, segundo o Instituto Nacional de Estatística, 88% trabalha por conta de outrem, 8% são trabalhadoras por conta própria isoladas e apenas 3% são empregadoras. 10% trabalha apenas a tempo parcial. Desses 2,4 milhões, 82,6% presta funções na área dos serviços, 15,8% trabalha na indústria e 1,6% subsiste da agricultura e das pescas. Das trabalhadoras por conta de outrem, 83% estão efetivas e 14% têm contrato a prazo.
Em termos de população empregada, a diferença numérica não é grande. Em 2021, o número oficial de homens era 2.428.600 e o de mulheres 2.383.700. Mas, ao fim do mês, eles não levam para casa o mesmo do que elas. "Elas ganham, em geral, menos 220 € por mês. Mas a diferença acentua-se nos níveis mais elevados. Nos quadros superiores, elas ganham menos 700 € que os homens e menos 326 € entre os profissionais altamente qualificados", sublinha.
"É nas atividades financeiras e nos seguros que a diferença é maior. Elas ganham menos 624 €. Segue-se o setor da saúde com uma diferença de mais de 380 € e a educação com 349 € de diferença", informa ainda a instituição. Ainda assim, as coisas têm evoluído. Hoje, elas estão mais presentes nos cargos de decisão empresariais. "Quase um terço dos cargos dos conselhos de administração das empresas cotadas em bolsa são ocupados por mulheres", constata a fundação.
"Portugal é o décimo-primeiro país da UE27 com maior peso das mulheres nos conselhos de administração das empresas. A evolução em Portugal tem sido notória. Antes de 2010, o peso das mulheres era inferior a 5%", recorda esta entidade. O peso das empregadoras também aumentou. Em 1974, eram cerca de 12.000. Hoje, rondam os 76.500. "No contexto da UE27, Portugal é o segundo país onde o peso das empregadoras é mais elevado", regozija-se esta entidade.
Na política, também há mais mulheres eleitas. A percentagem de representantes femininas nas assembleias legislativas atingiu os 40,9% em 2021. Em 2003, não ia além dos 20,5%. Apesar dos avanços positivos, mantêm-se os alertas. As mulheres continuam a ser mais vulneráveis à pobreza e à exclusão social do que os homens. Uma em cada cinco corre esse risco, alerta a fundação. "A percentagem do número de adultos, mulheres a viverem sozinhos com crianças ou filhos no total das famílias monoparentais, em Portugal, em 2020,é de 85,4%", sublinha a instituição.
O desemprego também as afeta mais. Mais de metade dos desempregados inscritos no Instituto do Emprego e da Formação Profissional são mulheres, 57%. "São também elas que estão em maioria enquanto beneficiárias dos subsídios de desemprego (56%) e do subsídio social de desemprego (61%)", refere. As dificuldades sentidas acabam por levar muitas mulheres a adiar a maternidade. Em 1960, tinham o primeiro filho aos 25. Hoje aos 30,7 anos.
"As mulheres têm vindo a optar por serem mães pela primeira vez numa idade mais tardia. Portugal é o oitavo país da UE27 onde as mulheres têm o primeiro filho mais tarde. Este adiamento reduz a probabilidade de famílias numerosas. O número médio de filhos por mulher é de 1,4 crianças, o oitavo valor mais baixo da UE27. Para que a substituição de gerações seja assegurada, é preciso que cada mulher tenha em média 2,1 filhos", avisa o relatório da fundação portuguesa.
Primeiro-ministro considera níveis de pobreza laboral “intoleráveis”
António Costa anunciou que o Governo vai alargar o apoio dado às famílias mais carenciadas para compensar o aumento dos preços dos alimentos e da energia.
O Governo vai alargar o apoio dado às famílias mais carenciadas para compensar o aumento dos preços dos alimentos e da energia. Mais 70 mil famílias vão ser abrangidas, anunciou este sábado o primeiro-ministro no Congresso Nacional da Rede Europeia Anti-pobreza, que decorreu na Faculdade de Economia da Universidade do Porto. O primeiro-ministro considerou “intoleráveis” os níveis de pobreza laboral que se registam em Portugal e apontou o combate à precariedade e à intermitência laboral como “absolutamente essencial”.
“Mas não podemos ignorar que vivemos numa sociedade onde, apesar do salário mínimo nacional ter aumentado 40% e estar hoje, claramente, acima do limiar de pobreza, persistem níveis intoleráveis de pobreza laboral, cerca de 10% de quem declara rendimentos do trabalho está abaixo do limiar de pobreza”, afirmou António Costa, no Porto, na abertura do Congresso Nacional da Rede Europeia Anti-pobreza.
O chefe do Governo explicou que a “causa fundamental” daquela situação está relacionada com a existência de “rendimentos intermitentes” e com o facto de muitos trabalhadores terem rendimentos inferiores a 12 ou 14 meses de salário.
“Por isso, o combate à precariedade e à intermitência laboral é absolutamente essencial”, salientou António Costa.
Para António Costa, no âmbito da erradicação da pobreza, “as políticas de habitação têm uma posição absolutamente central”, lembrando o papel também “absolutamente central” do Plano de Resolução e Resiliência.
O primeiro-ministro admitiu que “é um esforço enorme aquilo que é solicitado a todos, autarquias locais, instituições do setor solidário e social e também à administração central”, mas que é essencial.
“Mas [é] uma oportunidade única e extraordinária que o país não pode desaproveitar para dar um grande salto em frente na realização deste objetivo de erradicação da pobreza no nosso país”, referiu.
A pobreza, para António Costa, “fere a dignidade humana, mina a coesão social e a democracia e é uma vulnerabilidade económica para o desenvolvimento do país” pelo que, salientou, “o combate à pobreza foi e é e será um objetivo central deste Governo”.
Como exemplo, apontou o alargamento a mais 70 mil famílias do apoio de 60 euros para atenuar o impacto do aumento dos preços da alimentação, que na sexta-feira foi pago aos beneficiários da tarifa social de eletricidade.
“Este benefício será ainda atribuído a mais 70.000 famílias que, apesar de não beneficiarem da tarifa social de eletricidade, têm prestações sociais mínimas e que beneficiarão, por isso, também deste apoio extraordinário”, explicou.
Uma em cada cinco crianças está em risco de pobreza em Portugal
A pandemia veio travar a descida da taxa de risco de pobreza iniciada em 2015. Com 18,4% da população naquela condição em 2020, num agravamento de 2,2 pontos percentuais face ao ano anterior. Atualmente, uma em cada cinco crianças está em risco de pobreza em Portugal.
Pela ocasião dos 30 anos da Rede Europeia Anti-Pobreza (EAPN) Portugal, Monsenhor Joaquim Moreira deixa apelo ao Governo:
O primeiro-ministro, António Costa, garantiu que já estão a ser tomadas medidas para combater essa realidade:
Há pelo menos mais 22 mil criança em risco de pobreza.
Portugal tem também o pior resultado da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) em termos de mobilidade na educação entre gerações, registando o valor mais elevado, num conjunto de 15 países, de persistência intergeracional na educação. Sendo que o risco de pobreza para a população com o Ensino Básico é quase cinco vezes superior face à que possui estudos graduados.
Urge atacar a ciganofobia
os tempos, o tema dos ciganos tem sido muito badalado. O famigerado André Ventura, patrão do populista partido do “Chega”, numa recente Assembleia da República, em voz bem timbrada disse que os problemas com os ciganos atingem todos os distritos do país. Passada uma semana, o jornal “Público” trazia um artigo onde se informava que a Inspecção -Geral de Educação detectou concentração de crianças ciganas nas mesmas turmas. Este resultado foi a conclusão de um estudo promovido pela Inspecção -Geral de Educação e Ciência em 15 escolas do ensino básico com pelo menos 50 alunos ciganos e constatou que “mais de metade das escolas não respeitava a regra da heterogeneidade. Apresentavam diferenças entre turmas do mesmo ano de escolaridade, Iguais ou superiores a 25% entre o valor máximo e o valor mínimo da percentagem de alunos ciganos.”
Pode-se concluir que na nossa sociedade razões que podem ir do desconhecimento da raça cigana, a roçar a ciganofobia, ao fazer desta causa o chamariz para conquistar eleitores. Confundindo-se a árvore, com a floresta.
Segundo Gabriel Pereira, estudioso deste tema, os ciganos chegaram da Índia a Portugal pelo Alentejo, no final do séc. XV e a sua presença já é revelada em 1521, em o “Auto das Ciganas” de Gil Vicente. Em 1526, saiu a primeira lei repressiva do Rei contra esta etnia. Posteriormente, sucessivos governos promulgaram alvarás para impedir a entrada e até expulsar os ciganos do país, condenando-os às galés ou ao degredo nas colónias africanas. Por todas estas razões, os ciganos foram obrigados em Portugal a viver em constante nomadismo, deslocando-se de terra em terra, onde pernoitam durante alguns dias. Deste modo, foram – se excluindo economicamente e socialmente da nossa vida social. Foi necessário chegar-se a 1822 para os ciganos em Portugal conquistarem o seu estatuto de cidadania, com a Constituição Liberal, aprovada nesse ano.
Ficando assim mais enquadrados nas leis do nosso país, logo no final do séc. XIX, chegou a Portugal mais uma nova vaga de ciganos, sobretudo agora pelo norte do país. Os ciganos desta leva enquadravam-se numa terceira vaga migratória na Europa. Em 1920, já em plena República, o regulamento da GNR prescrevia “severa vigilância “ sobre os nómadas ciganos. Esta perseguição continuaria pelo menos até 1985, havendo casos esporádicos de expulsão de ciganos durante os anos do Estado Novo, nomeadamente em Alcains e em Ponte de Lima. Hoje, em Portugal, segundo dados de 2017, vivem no nosso país cerca de 37 mil pessoas de etnia cigana a qual representa 3% da população. Face a estes dados, pode-se concluir que, dos cerca de 18 milhões de ciganos do continente europeu tem de haver políticas de integração, de eliminação da pobreza, do analfabetismo e da descriminação social. A Comunidade Europeia tem aqui uma palavra importante a dizer.
Um inquérito Nacional das Comunidades Ciganas estimou que 27%,1 de indivíduos de etnia cigana não sabiam ler nem escrever e apenas 2,3% frequentava o ensino secundário. Concluiu ainda que cerca de 48%de ciganos admitiu já ter passado fome. E, recentemente estimou-se que 32% viviam em alojamentos precários. Em 2016, que a taxa de participação dos ciganos portugueses, no mercado de trabalho formal era de 35%. Mais de 76%dos ciganos denunciavam neste inquérito já terem sentido discriminação racial.
Quanto ao tão apregoado Rendimento Social de Inserção, que, mais do que a necessária integração, visa garantir a sobrevivência de famílias, dele beneficiaram 93.132 famílias residentes em Portugal. Destas, 4.500 são de etnia cigana ou seja 3,8%.
Face a estes dados, facilmente entendemos que as aleivosias contra os ciganos, vindas do partido xenófobo Chega, são atordoadas que só se viram contra eles, pelas inverdades lançadas ao vento contra os ciganos. Trata-se de notícias falsas, para pescarem os seus eleitores, tão generosamente já representados na Assembleia da República, como a terceira força política. As inverdades que este partido lança para o ar, segundo a historiadora “Irene Pimentel”, só revela a sua ciganofobia que urge atacar nas suas causas e consequências. O regime nazi começou por atacar os judeus, com os malefícios que conhecemos. Hoje, são os ciganos, mas amanhã, outros grupos étnicos podem vir a ser alvos de um feroz racismo, com consequências brutais e desumanas.
florentino beirão@hotmail. com
Fragilidade de refugiadas ucranianas usada por redes de tráfico sexual
Uma refugiada ucraniana em Portugal foi colocada numa casa de alterne pela pessoa que a acolheu em solo português. O intuito seria a exploração sexual da jovem mulher. A prova dos Factos já tinha denunciado, na passada semana, o caso de uma outra mulher, em Lisboa, vítima de abusos pela família de acolhimento.
A crise migratória é porta aberta para o tráfico sexual. E o voluntariado informal leva a que seja difícil controlar os objectivos ou condições de quem recebe mulheres ucranianas.
O direito aos cuidados no nosso envelhecimento
Filipa Alves, opinião, in o Observador
Tendencialmente, a institucionalização deve ser a última das respostas a ser dada às pessoas idosas. Teremos de implementar novos conceitos, como aldeias seniores, que se distingam pelos serviços.
Em 2050, as pessoas com 65 anos ou mais vão representar 25 por cento da população que vive no nosso país. A Organização Mundial da Saúde tem alertado para esta alteração demográfica, semelhante noutros pontos da Europa, defendendo a necessidade de existirem mais cuidados integrados, uma orientação para a avaliação centrada na pessoa e o reforço dos cuidados primários. Outra prioridade é a redução do risco de declínio cognitivo e demência.
O envelhecimento ativo pode ser parte da solução, otimizando a capacidade intrínseca e a habilidade funcional da pessoa idosa. No entanto, exigem-se melhorias no acesso a diagnósticos, vacinas, medicamentos essenciais e tecnologias auxiliares.
O encorajamento e reforço da utilização do digital nos cuidados integrados é outro caminho, sendo necessário eliminar potenciais barreiras. Aqui, também entra em equação a própria sustentabilidade dos sistemas de saúde, que estiveram sob pressão acrescida durante a pandemia e viram em novas ferramentas uma resposta alternativa. Paralelamente, será importante desenvolver uma força de trabalho mobilizada, adequadamente treinada e com mais competências na área da geriatria e gerontologia. Público e privado são chamados a complementarem-se, em termos de recursos e na sua relação com os mecanismos de proteção social.
Mais do que nunca, viver mais significa viver melhor. E viver melhor é, à medida que o tempo passa, o exercício de fazer valer direitos e ter uma palavra a dizer sobre o nosso futuro. A participação ativa na sociedade também passa pelos cuidados que podemos (e devemos) escolher no nosso envelhecimento.
Recentemente, o interessante estudo Live and Work Well at Home, conduzido em quatro países europeus – Alemanha, Espanha, França e Itália –, concluiu que cerca de 60 por cento dos participantes cuidavam de um familiar idoso e 47 por cento tinham essa responsabilidade numa base diária. Não é de estranhar que 66 por cento dos inquiridos demonstrassem interesse em subscrever um serviço de apoio, considerando-o “altamente valioso”. Entre as necessidades identificadas, três saltavam à vista: cuidados ao domicílio (higiene e alimentação), saúde em casa (enfermagem e exames médicos), dispositivos de emergência (tecnologias, por exemplo, para detetar quedas).
Se há algo que a pandemia veio sublinhar é a importância da casa, enquanto centro da vida de cada um de nós. Um porto seguro, quando reunidas condições de habitabilidade, salubridade, enfim, dignidade. Portugal, que tem das maiores taxas de cuidados domiciliários informais da Europa, tarda em dar um salto. Porque estes cuidados domiciliários informais são, essencialmente, assegurados por familiares, sem formação e, por vezes, sem capacidade física ou mental para responder da melhor forma.
Tendencialmente, a institucionalização deve ser a última das respostas a ser dada às pessoas idosas. Desenraizá-las das suas comunidades tem um custo demasiado elevado, seja económico, seja social, seja da própria saúde, conforme está documentado em diversas investigações. No caso de ser necessário atuar, teremos de implementar novos conceitos, como aldeias sociais ou aldeias seniores – ofertas residenciais para idosos, que se distinguem pelos serviços que podem ir desde saúde, alimentação, até bem-estar e atividades desportivas. Em alguns casos, até podem ter uma componente de dinamização de concelhos despovoados.
O desafio é criar, cada vez mais, equipas multidisciplinares para planear estas respostas e políticas públicas. O relógio não para e, um dia, vamos querer usufruir daquilo que defendemos, hoje, em nome da dignidade de todos.
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Pobreza: mitigar e erradicar
Carvalho da Silva, opinião, in JN
Todas as promessas de desenvolvimento do país não passarão de falácia se não forem resolvidos problemas estruturais que geram e ancoram a pobreza.As duras realidades deste flagelo exigem da sociedade todos os esforços possíveis para mitigar os seus efeitos e atenuar a sua ampliação. Contudo, a erradicação da pobreza, objetivo que todos os portugueses deviam assumir, exige um combate corajoso com políticas estruturais que eliminem as suas causas.
Nas notas de apresentação do seu Congresso a "EAPN Portugal - Rede Europeia Anti Pobreza", começa por afirmar "A pobreza vive de mão dada com o desemprego, a instabilidade laboral, a ausência de recursos financeiros, as dificuldades no acesso à educação e à saúde e a má qualidade da habitação" e lembra-nos que com "a pandemia da covid-19" e nos "períodos de crise socioeconómica todos estes fatores se agravam, juntamente com o estigma, a vergonha, a discriminação e a exclusão".
Já aqui afirmei e hoje repito: os portugueses são vergonhosamente condescendentes com a pobreza. Têm acreditado que bastam solidariedades de emergência, políticas públicas de "reparação de danos" e de gestão mais humanizada da situação dos pobres. Não. Isso pode e deve ser feito, mas apenas mitiga sofrimentos. Grande parte das políticas especificamente dirigidas aos pobres são políticas paupérrimas. São os não pobres, e em particular os mais ricos, aqueles que estão em condições de retirar os pobres da condição de pobreza. O Estado deve favorecer um combate cultural e políticas públicas com o objetivo da erradicação. Com autoridade democrática, deve impor ao poder económico políticas laborais mais justas e garantir melhor distribuição da riqueza.
O segundo dos quatro seminários do congresso da EAPN Portugal decorre hoje mesmo na Universidade de Aveiro, sob o tema "Trabalho, Pobreza e Desigualdades". O "Documento Temático" de apoio ao debate dá-nos um preocupante retrato da pobreza que atinge uma enorme fatia dos trabalhadores portugueses, e identifica as suas causas.
Temos trabalhadores pobres porque: 1) os salários da esmagadora maioria dos trabalhadores são baixíssimos e os de muitas mulheres ainda mais; 2) muitos não conseguem trabalho a tempo inteiro ou estão em trabalho informal; 3) milhares de desempregados e vários grupos sociais não têm a necessária proteção social; 4) as políticas austeritárias transferiram rendimentos do trabalho para o fator capital; 5) a desvalorização salarial e das profissões continua utilizada como variável de ajustamento da economia; 6) não se valoriza suficientemente o saber fazer em múltiplas atividades; 7) tem-se destruído a contratação coletiva; 8) existem milhares de trabalhadores em situações de vulnerabilidade e os empresários e o Estado não estão preparados para reconhecerem as suas capacidades; 9) as condições de trabalho existentes não asseguram proteção integrada nos planos material, físico e psicológico; 10) os custos da habitação e a dificuldade em aceder a direitos fundamentais são insuportáveis; 11) são demolidores os efeitos da precariedade nos planos salarial, da proteção/segurança social, das qualificações, da solidariedade entre gerações.
O combate à pobreza deve focar-se no objetivo da sua erradicação e não no da mitigação de efeitos. O atual Governo tem condições políticas para fazer essa mudança de agulha. Será imperdoável que não o faça.
Portugal entre os países com mais trabalhadores pobres
Segundo os dados relativos aos rendimentos de 2020, em Portugal, 11,2% dos adultos que trabalhavam estavam em risco de pobreza. Isso num país que tem uma das maiores proporções da União Europeia (UE) de longas horas de trabalho (mais de 48 horas semanais). As conclusões são da Rede Europeia Anti-Pobreza (EAPN), que as vai discutir, amanhã, na Universidade de Aveiro, no seminário "Trabalho, pobreza e desigualdades", no âmbito dos "Diálogos sobre a pobreza".
Segundo o documento que vai estar em debate, a EAPN verificou que, de acordo com os rendimentos de 2019, "Portugal era o 9.º país com maior risco de pobreza entre os trabalhadores por conta de outrem" e o "terceiro no caso dos restantes trabalhadores" (por conta própria, sejam isolados ou empregadores).
De acordo com dados do Eurostat de 2020, "8,7% dos trabalhadores têm longas horas de trabalho", sendo Portugal "o 10.º país da UE com maior proporção. E também "a média de horas semanais de trabalho, para quem trabalha a tempo inteiro, é uma das mais elevadas (41,3 horas semanais, 6.ª média mais elevada).
20.5.22
Uma em cada cinco crianças em risco de pobreza em Portugal
António Costa anunciou que o Governo vai alargar o apoio dado às famílias mais carenciadas para compensar o aumento dos preços dos alimentos e da energia.
Uma em cada cinco crianças em Portugal estão em risco de pobreza. Os números são preocupantes
O primeiro-ministro garantiu este sábado, no Porto, que já estão a ser tomadas medidas para combater essa realidade.
O Governo vai alargar o apoio dado às famílias mais carenciadas para compensar o aumento dos preços dos alimentos e da energia. Mais 70 mil famílias vão ser abrangidas, anunciou este sábado o primeiro-ministro no Congresso Nacional da Rede Europeia Anti-pobreza, que decorreu na Faculdade de Economia da Universidade do Porto.
O primeiro-ministro considerou “intoleráveis” os níveis de pobreza laboral que se registam em Portugal e apontou o combate à precariedade e à intermitência laboral como “absolutamente essencial”.
Cartaxo inaugura exposição “Troca de Correspondência em Tempos de Pandemia”
O Museu Rural e do Vinho do Concelho do Cartaxo, recebeu, na tarde de dia 13 de Maio, a inauguração da exposição “Troca de Correspondência em Tempos de Pandemia”, que mostra fotografias e objectos efectuados por utentes de catorze entidades com e sem fins lucrativos que, no concelho, prestam a apoio ou têm a valência de Estrutura Residencial para Pessoas Idosas (ERPI).
A inauguração da exposição foi um momento de alegria para os utentes e técnicos das instituições depois de estarem mais de dois anos impedidos de se encontrarem por força da pandemia da doença Covid-19. No reencontro, foram muitos os rostos emocionados por poderem voltar a estar juntos e por verem expostos os trabalhos que resultaram do seu esforço conjunto para manterem proximidade e cumplicidade, apesar do afastamento físico e isolamento a que foram obrigados.
As fotografias e os trabalhos expostos são mais do que simples objectos, são testemunho da vontade e do desejo de partilhar memórias e sabedoria ancestral, dar a conhecer hábitos, gastronomia tradicional, artes e ofícios ou património de cada uma das freguesias do concelho, de onde são oriundos os utentes.
João Ferreira Heitor, presidente da Câmara Municipal do Cartaxo referiu a inauguração como um momento “de celebração. Celebramos, em primeiro lugar, podermos estar aqui hoje, com saúde, a partilhar o vosso trabalho que é feito de talento, mas também de afetos”. O autarca destacou a importância, para a comunidade, “daqueles que têm a missão de cuidar de quem teve uma vida longa e que, por tudo o que deram, por tudo o que representam, são um exemplo para todos nós”.
“Estou muito feliz por vos poder acompanhar neste dia”, afirmou o presidente da Câmara, com emoção, por poder “ver aqui algumas pessoas que me conhecem desde que nasci, que andaram comigo ao colo. Tenho muito carinho por vós”.
A vereadora Maria de Fátima Vinagre que, na autarquia, é responsável pelo pelouro de Ação Social e Saúde, destacou a relevância do trabalho que a exposição agora mostra ao público. “As actividades desenvolvidas no âmbito deste projecto permitiram criar laços de proximidade, aprofundar a colaboração entre os utentes, as instituições e os técnicos, e promover a solidariedade”, afirmou, destacando a importância do projeto “na promoção do bem-estar emocional e da saúde mental, em tempos de isolamento”.
Renato Bento, Director do Centro Distrital de Segurança Social de Santarém, destacou a importância de “retomarmos alguma normalidade. Já tínhamos saudades deste contacto presencial e caloroso”, lembrando que “vivemos dois anos muto difíceis para todos, com desafios extraordinários”, entre os quais destacou o facto de “termos sido obrigados ao isolamento, a não sair das estruturas residenciais”.
Para o director, a “experiência que vivemos nestes dois anos foi absolutamente única”, afirmando que o facto de Portugal “ser um dos países, no mundo, com a menor taxa de mortalidade durante a crise pandémica”, se deve em muito “ao esforço que todos nós fizemos – segurança social, municípios, instituições, direções técnicas e equipas de cuidadores”.
Durante a inauguração da exposição, a Diretora Técnica do Centro de Dia de Pontével, Raquel Vieira e Ricardina Dias, da EAPN – Delegação de Santarém (Rede Europeia Anti-Pobreza), apresentaram o projecto que dá nome à exposição, destacando a importância da experiência para os utentes, quer do ponto de vista cognitivo, quer de motricidade, quer de interação social e afirmaram que, pelo seu sucesso e pelo empenho dos utentes e das instituições, o projeto vai continuar. Raquel Vieira anunciou também que a exposição vai percorrer todas as freguesias do concelho.
O projecto nasceu no âmbito da Rede Social, com o objectivo de que os utentes de diferentes instituições pudessem manter contacto entre si, num momento em que o contacto presencial não era possível. Das trocas iniciais de postais que assinalaram a celebração de datas como o Natal ou a Páscoa, a troca de correspondência evoluiu para objetos que espelham o talento dos utentes e são reflexo do seu empenho em valorizar a sua cultura, as tradições das suas freguesias, assim como, da vontade de partilhar memórias e vivências.
A exposição pode ser visitada de terça a domingo, das 9h30 às 12h30 e das 14h30 às 17h30.