Sérgio Aníbal, in Jornal Público
Líderes europeus reconhecem riscos para a economia da actual crise dos mercados e mantêm-se preocupados com a inflação
Em pleno Rio Douro, os principais responsáveis pela política económica da União Europeia (UE) reuniram-se ontem para acertar a estratégia a usar para fazer face à crise que se vive nos mercados financeiros mundiais. O anfitrião, Teixeira dos Santos, garantia, à entrada para o barco onde decorreu a reunião, que "as águas do Douro não são turbulentas".
O mesmo não acontece, porém, com o ambiente nos mercados financeiros. Logo pela manhã, o Financial Times Deutschland dava conta da existência de um relatório confidencial do Comité Económico e Financeiro da UE que conclui que as consequências da actual turbulência nos mercados financeiros poderão ser mais graves do que o esperado. Ao mesmo tempo, o Banco de Inglaterra anunciava a atribuição de uma ajuda a uma das principais instituições financeiras do país para que esta pudesse fazer face a problemas de liquidez. Mais tarde, os indicadores da confiança dos consumidores e do comércio a retalho nos EUA apresentavam resultados piores do que o esperado, indiciando o contágio para toda a economia dos problemas vividos no mercado subprime.
Como resposta, tanto o BCE como a Comissão Europeia e os ministros das Finanças europeus apostaram num discurso pensado para recuperar a confiança, reafirmando que o crescimento da economia vai continuar próximo do potencial.
Mas reconheceram uma enorme incerteza em relação à actual situação."Ninguém pode saber ao certo quando é que a instabilidade vai acabar", reconheceu Teixeira dos Santos, que assumiu a presidência do encontro. Joaquín Almunia, comissário europeu para os Assuntos Económicos e Financeiros, disse que "os riscos de um menor crescimento aumentaram nas últimas semanas e a incerteza é agora maior".
Do lado do BCE, Jean-Claude Trichet reconheceu que ainda é "demasiado cedo para retirar conclusões definitivas" sobre a situação financeira e confirmou a revisão em baixa de 0,1 pontos percentuais na estimativa de crescimento para este ano na zona euro. Para 2008, a previsão manteve-se inalterada, mas o presidente do BCE fez questão de frisar que "isso não quer dizer que os riscos não aumentaram".
Jean-Claude Juncker, primeiro-ministro luxemburguês e presidente do Eurogrupo, disse que "os riscos agravaram-se", mas defendeu que "as condições económicas mantêm-se fortes o suficiente para que não haja correcções dramáticas".
Juncker foi ainda o "porta-voz" de uma manifestação pública de apoio à recente actuação do BCE por parte dos governos europeus. E mesmo a recente apreciação do euro, que constitui uma ameaça adicional para o crescimento europeu, não motivou, ao contrário de outras ocasiões, críticas fortes por parte dos Governos.
Mudanças na regulação
"É preciso retirar lições da actual situação, em relação a todas as intituições", repetiu várias vezes ontem o presidente do BCE. No entanto, qualquer alteração legislativa que tenha o objectivo de melhorar o sistema de regulação nos mercados financeiros - que mostrou com a actual crise uma grande fragilidade - ainda vai demorar a ser aplicada. Ontem, os membros do Ecofin pediram ao Comité Económico e Financeiro que avaliasse "formas de melhorar a transparência de instrumentos financeiros complexos, das intituições e dos veículos". No entanto, Charles McCreevy, comissário para o Mercado Interno e Serviços, assinalou que por enquanto se está numa "discussão inicial" e defendeu que é preciso "calma e tempo", antes de tomar decisões. Para já, as agências de rating continuam a ser visadas, devido à incapacidade revelada para alertar para a actual crise.
Apesar dos riscos actualmente existentes, Trichet - apoiado por Almunia - não baixou a guarda na defesa da estabilidade de preços. "Os riscos para a inflação são de subida", uma frase que parece confirmar a ideia de que, depois de os mercados estarem mais calmos, as taxas de juro vão voltar a subir na zona euro.