por Catarina Almeida Pereira, in Diário de Notícias
As empresas portuguesas estão entre as que menos recorrem a mecanismos de flexibilidade na organização do horário de trabalho. Os dados são do Eurofound, organismo da Comissão Europeia que defende que este tipo de flexibilidade pode amortecer a destruição de emprego. A quebra do número de empregados tem sido mais forte em Portugal, que já tem a quarta maior taxa de desemprego da OCDE.
Foi uma das bandeiras do Governo na discussão do novo Código do Trabalho e é uma das receitas da Comissão Europeia para evitar a queda do nível de emprego. Mas a avaliar pelas conclusões do Eurofound, as empresas portuguesas estão entre as que menos recorrem a mecanismos de flexibilidade horária. Num estudo ontem divulgado, Portugal surge entre os países da União Europeia com menor recurso a diferentes formas de gestão flexível de horários.
Os primeiros resultados do European Company Survey 2009, ontem divulgado, baseiam-se em inquéritos realizados no primeiro trimestre a mais de 27 mil estabelecimentos (1012 em Portugal) com mais de 10 trabalhadores, em 30 países. O organismo com sede em Dublin conjuga três indicadores: a possibilidade de trocar horas de trabalho por dias livres; a possibilidade de determinar a hora de entrada e de saída e a possibilidade de gerir a acumulação de horas não convertíveis por folgas. Menos de metade (48%) das empresas inquiridas em Portugal declararam implementar um destes sistemas. Na União Europeia, apenas cinco países têm um resultado mais baixo (Grécia, Estónia, Malta, Chipre e Bulgária), numa lista que é liderada pelos países nórdicos - com a Finlândia à cabeça - e pelas ilhas britânicas (ver gráfico).
Esta é uma das questões que tradicionalmente afasta sindicatos e empregadores em Portugal.
Gregório Novo, da Confederação de Indústria Portuguesa (CIP), refere que algumas convenções colectivas "impedem" a adopção de mecanismos de adaptabilidade. E acrescenta que os sindicatos "não têm sido muito abertos" à negociação do banco de horas. A figura, introduzida no novo Código do Trabalho, prevê que o período de trabalho possa ser aumentado até mais quatro horas diárias, com o limite de 60 semanais, desde que o acréscimo não exceda 200 horas por ano. A compensação pode ser feita através de tempo ou dinheiro.
É precisamente a possibilidade de compensar horas extraordinárias com tempo livre que motiva fortes reservas entre os sindicatos. "O que as empresas procuram é um pretexto para reduzir custos e rendimentos dos trabalhadores", refere Arménio Carlos, da CGTP, "pelo que a gestão do tempo de trabalho tem sempre de ter a intervenção dos sindicatos". Relacionar flexibilidade horária com protecção do emprego "é uma falsa questão", defende. "Na Qimonda foram impostos horários de 12 horas diárias e não foi por isso que deixou de falir", afirma.
Gregório Novo admite, por outro lado, resistência por parte das próprias empresas. "A gestão da adaptabilidade dá algum trabalho aos gestores de recursos humanos. É preciso que se mentalizem que é necessária para potenciar a produtividade", afirma o dirigente da CIP.
Portugal surge no relatório como o segundo País, a seguir à Irlanda, em que maior percentagem de empresas declaram ter passado por algum tipo de reestruturação nos últimos três anos: 42,1%.
Um terço das empresas alterou o seu sistema de remunerações e 90% têm empregados cujo salário está relacionado com o desempenho. Quase 60% declaram ter trabalhadores cujo salário está dependente de negociação colectiva.
Portugal - que é um dos que mais recorre a contratos precários - surge, por outro lado, como o que apresenta menor percentagem de empresas (4,6%) com sistemas de representação de trabalhadores. Mas esta última conclusão é relativizada ao DN pelos autores do estudo, que chamam a atenção para deficiências metodológicas no apuramento deste indicador.