in Jornal Público
"É um absurdo", afirma Carvalho da Silva sobre as dificuldades alegadas pelas empresas. Mas mais absurdo, diz, é associar o salário mínimo apenas à pobreza
O secretário-geral da CGTP critica o Governo por defender o aumento do salário mínimo como uma forma de combater apenas a pobreza. As remunerações não deveriam estar associadas à indigência, mas à valorização do trabalho.
Carvalho da Silva considera "um absurdo" afirmar-se que não há condições para aumentar o salário mínimo para 475 euros em 2010. O seu peso na massa salarial é, "em média, um sobre dez mil". Mas é outra a questão que o preocupa.
"Quando o Governo vem fazer o seu discurso assente na valorização meramente como combate à pobreza e deixa as pistas para o negócio com o patronato, propondo a redução da taxa social única sobre os trabalhadores que, em 2009 auferiram o salário mínimo e colocando outros apoios para sustentar a tese de que as empresas têm de ser subsidiadas, estamos a caminhar para a desvalorização profunda do trabalho", afirmou ao PÚBLICO.
"Começa-se pelo salário mínimo, mas depois são todos os salários. E qualquer dia o salário não é uma retribuição pelo valor do trabalho mas integra-se no contexto de sobrevivência, em relação ao mínimo de condições e não na perspectiva de repartição de riqueza de forma justa".
É uma dinâmica global, recorda. "Não é por acaso que na conferência anual da OIT onde foi celebrado o pacto mundial para o emprego, um dos apelos fortes é a necessidade de não redução dos salários". A crise tem sido "um instrumento de pressão negativa sobre os salários". E as duas causas para a manutenção do desemprego são a queda dos salários e a fragilidade do emprego precário". E em Portugal, as contrapartidas pedidas pelo patronato, a um Governo fragilizado, pode premiar o infractor.
"Dou-lhe o caso do sector têxtil. Em 2009, várias associações fizeram negociações dos contratos subsectoriais. Outras recusaram-se a negociar. E como os salários eram muito próximos do salário mínimo, grande parte desses trabalhadores ficaram a ganhar o salário mínimo. Agora esses infractores que não actualizaram salários em 2009 vão ser beneficiados com a redução da taxa social única. Isto é muito mau. Já alertámos o primeiro-ministro para isto, mas há diversos sectores que estão a chamar a atenção, porque é um escândalo".
Em vez de reduzir os descontos para a Segurança Social, o Estado poderia ajudar as empresas. Na verdade, os apoios aprovados pelo Governo "pouco chegam" às pequenas empresas, ficando nas empresas maiores que as subcontratam, impõe-lhes preços injustos, "saqueiam-lhes as margens. E volta tudo ao mesmo". "Este funcionamento do estrangulamento das pequenas empresas pelas grandes é um dos traços da actualidade que precisava de ser abordado".
"Aqui é que era necessário uma intervenção de pressão sobre o sector financeiro para o crédito ser mais barato". Poderia ser feito o mesmo nas telecomunicações e na energia. Por outro lado, a CGTP vê com bons olhos que as pequenas empresas ganhem uma "maior identidade e mais organização específica. A representação patronal pouco identifica as preocupações dos pequenos. São as grandes que determinam".
E o que vai acontecer na reunião da concertação social? "Não sei o que vai acontecer. É preciso um contributo grande para desmontar esta campanha. Não há qualificação". A parte patronal tem "manifesta falsa preocupação". O que há a fazer é defender os 475 euros e encontrarem-se medidas de apoio efectivo às pequenas empresas, de forma que façam com que os apoios cheguem aos seus destinatários. E não sejam sugados pelos grandes. J.R.A.