Por Amílcar Correia, in Jornal Público
O projecto dos Bairros Críticos é daquelas iniciativas a todos os títulos meritórias e bem intencionadas, mas que nunca passam disso mesmo: de uma boa intenção. O Governo aprovou em 2005 um projecto que reunia oito ministérios com a intenção de intervir "em territórios urbanos que apresentam factores de vulnerabilidade crítica" e escolheu como prioritários os bairros da Cova da Moura (Amadora), Vale da Amoreira (Moita) e Lagarteiro (Porto). Cinco anos depois, como esta semana fez questão de lembrar a deputada do BE Catarina Martins, nada aconteceu no Lagarteiro.
O que poderia ser um modelo inovador de intervenção social, agregando organizações governamentais, locais e população, arrisca-se a ser um mero anúncio político sem qualquer desenvolvimento prático, com tudo o que isso implica de descredibilização para os políticos e para as suas intenções sociais.
Continuar a ignorar estes bairros e o que eles têm de mais crítico é de uma hipocrisia politicamente inaceitável. As Covas da Moura deste país cada vez mais "crítico" não podem servir de cenário apenas para mais ou outra medida pontual e na maior parte dos casos a roçar um popularismo disfarçado. O facto de 75 por cento da população do Bairro do Lagarteiro ser beneficiária do Rendimento Social de Inserção deve querer dizer alguma coisa.
O Estado e as câmaras não podem prescindir do papel de correcção dos erros de planeamento urbanístico e dos consequentes danos sociais que se disseminaram nas últimas décadas pela cidade e que transformaram a sua zona oriental numa sucessão de vários problemas. O mesmo é válido para a necessidade de reabilitar os centros históricos esventrados das principais cidades. Mas, a avaliar pelas declarações de ontem do presidente da Junta Metropolitana e Câmara do Porto, o Orçamento de Estado irá exigir alguns sacrifícios nesta matéria. Reduzir as verbas destinadas a programas para habitação social ou à reabilitação urbana é uma opção política insensata deste Orçamento de Estado. Veja-se o exemplo fornecido ontem por Rui Rio: a dotação orçamental do Prohabita para 2010 é inferior ao valor que o Porto recebeu em 2009...
Só num país como este é que a palavra bairro tem uma conotação tão pejorativa e os centros históricos são tão desabitados e desvalorizados.