22.11.10

Pobreza: 41% das pessoas carenciadas nunca foram pobres

por Marta F. Reis, iInformação

Braga, Porto e Setúbal são os distritos onde há mais pedidos. "Instituições estão no limite", diz Isabel Jonet


Cinco mil famílias em lista de espera para receber apoios. Um quinto das instituições de solidariedade social do país sem recursos para responder a todos os pedidos, e 76% a assegurar que estes aumentaram nos últimos três anos. Um estudo com 3279 instituições e 15 mil pessoas carenciadas apresentado ontem na conferência Portugal Solidário, no Porto, revelou o extremar da pobreza em Portugal: 41% nunca foram pobres, a maioria são idosos, só 19% têm um trabalho remunerado.

"As instituições estão no limite", diz ao i Isabel Jonet, presidente do Banco Alimentar Contra a Fome que realizou a análise em parceria com a Entrajuda, através da Universidade Católica Portuguesa. Os inquéritos às instituições foram realizados em Abril e as entrevistas decorreram entre Junho e Outubro, naquilo que se espera que venham a ser análises regulares para a criação de um Observatório da Pobreza em Portugal, anunciou a responsável.

Braga, Grande Porto e Setúbal são as zonas do país onde há mais pedidos, adianta Isabel Jonet, embora a incapacidade de resposta das instituições se tenha tornado uma realidade de Norte a Sul. Se a maior procura coincide com as zonas onde há mais desemprego, a cobertura também continua a ser assimétrica. No Algarve e Alentejo estão situadas apenas 11,4% das instituições.

Novos pobres Nos novos pedidos de apoio destacavam-se situações de desemprego, endividamento e divórcio ou abandono do lar, esta última com um peso de 42,6%. Mais de metade vive com menos de 250 euros por mês e apenas 9% dos inquiridos refere ter mais de 500 euros. Reformados (68%) e desempregados (20%) representam a maioria das pessoas que recorrem ao apoio das instituições de solidariedade social, sendo que 41% são pessoas que nunca foram pobres, e que agora se sentem como tal, destaca Isabel Jonet. Entre os inquiridos em idade activa, 60% está desempregado, e destes 76% há mais de um ano. A falta de alimentos vai-se tornando endémica: 20% diz não ter comida até ao final do mês e 32% refere que isso acontece "às vezes". Se a comida falta, as contas mantêm-se: 31%, e sobretudo jovens, adianta ter um empréstimo para pagar.

Apoio possível Neste momento a rede do Banco Alimentar Contra a Fome, através de 1800 instituições, dá apoio a 280 mil pessoas. A nível nacional estima-se que os apoios das instituições cheguem a mais de 70 mil famílias e 350 mil pessoas, mais um número para realidade da pobreza em Portugal. Segundo os últimos dados do INE, de 2008, 41,5% dos portugueses vive no limiar da pobreza, uma fatia que só desce para 24,3% com as prestações sociais mas onde cabem ainda cerca de 170 mil portugueses que não recorrem a estes apoios por vergonha, como noticiado esta semana pelo i.

Se nas instituições inquiridas pela Universidade Católica 77,1% têm inspiração religiosa (73,2% católica), o presidente da Conferência Episcopal Portuguesa, D. Jorge Ortiga, disse ontem no Porto que a Igreja "não pode nem deve colocar-se no lugar do Estado". Citado pela TSF, o responsável da igreja católica destacou o pioneirismo das instituições no terreno e apelou a uma sociedade com uma "nova consciência".

O contributo europeu É visto como um marco da Comissão Europeia para 2010, Ano do Combate à Pobreza. Numa mensagem enviada à conferência Portugal Solidário, Durão Barroso anunciou que um dos pilares para inclusão da estratégia ''Europa 2020'' - a Plataforma Europeia de Combate à Pobreza - será lançada nos próximos dias. A rede apresentada em Março visa reduzir em 20 milhões o número de pessoas que vivem em pobreza, sobretudo através da inclusão no mercado laboral. Por cá, no próximo fim-de-semana decorre a segunda campanha do ano do Banco Alimentar. Um novo armazém na Ilha Terceira vai juntar-se aos 17 bancos de recolha de alimentos já a funcionar no país. No início de 2011 está prevista a abertura do 19º banco, em Beja.