26.11.10

Portugueses querem protecção social, mas também que o Estado seja mais eficiente

Por Clara Viana, in Jornal Público

Estudo do European Social Survey coloca portugueses entre os mais "estatistas" da Europa. Mas são também os que mais reticências têm quanto à eficácia das políticas sociais


Os portugueses não estão dispostos a abrir mão do Estado social - entre os europeus estão no grupo dos que lhe dão maior importância -, mas na Europa são também dos que se mostram mais recalcitrantes em ver os seus impostos aumentados para financiar as despesas sociais que lhe são inerentes. Figuram ainda entre os que mais consideram que estas despesas - que abrangem sectores como a saúde, educação e segurança social - "constituem um fardo pesado para as empresas e a economia em geral".

Os resultados dos inquéritos realizados em 2008 no âmbito do European Social Survey - um projecto que tem como objectivo monitorizar as atitudes sociais e valores prevalecentes na Europa - foram ontem apresentados no Instituto de Ciências Sociais (ICS), em Lisboa. Para Filipe Carreira da Silva, sociólogo e investigador do ICS, que dirigiu a investigação, constituem um sinal claro do que a maioria espera de uma reconfiguração do actual modelo do Estado Providência, uma reforma que, sublinha, "vai ser o grande desafio e debate dos próximos anos".

Serão estes resultados, obtidos a partir de 2367 entrevistas, a confirmação do retrato habitual dos portugueses como subsídiodependentes, que continuam a esperar do Estado o que não estão dispostos a dar? Não é essa a leitura de Filipe Carreira da Silva. Em declarações ao PÚBLICO, o investigador sustenta que aquilo que os portugueses disseram "é que querem protecção social, mas também querem que o Estado seja mais eficiente e utilize melhor os seus recursos".

Acentuar a fractura

Na importância dada ao Estado Providência, nos 28 países onde se realizaram inquéritos, os portugueses apenas são ultrapassados pelos espanhóis, gregos e por alguns dos ex-países comunistas. Nas reticências quanto ao aumento da carga fiscal só são superados pelos húngaros e romenos. O mesmo acontece no que respeita à percentagem dos que defendem, ao invés, uma diminuição dos impostos. Mas os portugueses estão próximos dos alemães, franceses e ingleses quando encaram as despesas sociais como um fardo. E são também dos que mais acham que a maioria das pessoas beneficia de serviços sociais a que não tem direito e que os apoios sociais não chegam a quem realmente precisa.

Segundo o investigador, esta apreciação negativa é também reflexo da expansão de novas situações, como a precariedade no trabalho, para as quais o Estado não tem tido respostas. Lembra que esta afecta sobretudo os jovens e que a situação acaba por sobrecarregar as suas famílias. "Que motivação poderão ter eles para contribuir e pagar impostos?", questiona.

Para Filipe Carreira da Silva, o estudo confirma que um modelo neoliberal "não teria acolhimento junto dos portugueses" e adverte que a fractura só poderá acentuar-se quando se escolhe, como agora, cortar nas despesas sociais que, em 2010, representaram 18,2 por cento do Produto Interno Bruto.