24.11.10

Relatório anual da Organização Mundial de Saúde

Por João Manuel Rocha, in Jornal Público
Todos os anos cem milhões ficam pobres por se tratarem


Cem milhões de pessoas são todos os anos atiradas para a pobreza devido aos encargos com a saúde. O problema é mais comum em países vulneráveis, mas atinge também economias desenvolvidas, refere o relatório anual da Organização Mundial de Saúde (OMS).

O caso mais flagrante de países desenvolvidos onde a “facturação dos cuidados de saúde” recai essencialmente sobre os utentes é o dos Estados Unidos. Um estudo da Universidade de Harvard referido pela OMS, e citado pela AFP, indica que as doenças e gastos com a saúde foram em 2007 responsáveis por 62 por cento das situações de ruína de famílias norte-americanas, contra 50 por cento em 2001.

Portugal é referido pela OMS como um dos países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico (OCDE) em que parte da população enfrenta dificuldades financeiras para suportar os custos de saúde. “Ninguém deve ser forçado à ruína para se tratar”, indignou-se Margaret Chan, directora-geral da organização.

O Relatório sobre a Saúde do Mundo 2010, apresentado em Berlim, no início de uma conferência ministerial sobre financiamento do sector, aponta três caminhos para melhorar os cuidados: reforço do financimento público, através de soluções inovadoras; obtenção de fundos de modo mais equitativo e melhoria da eficiência dos serviços de saúde.

O documento é divulgado quando o mundo está longe da cobertura universal a que os 192 membros da organização das Nações Unidas para a saúde se comprometeram em 2005. Surge também numa altura em que a crise aumentou as dificuldades orçamentais e muitos países enfrentam uma subida dos encargos devido ao envelhecimento populacional.

40 por cento de desperdício

A OMS calcula que 20 a 40 por cento do dinheiro investido em saúde seja desperdiçado, o que a leva a recomendar medidas que permitam uma maior eficiência, através do uso de medicamentos genéricos sempre que possível e da melhoria de funcionamento das redes hospitalares. A organização refere que metade a dois terços do financiamento público é absorvido pelos hospitais e calcula em quase 300 mil milhões de dólares o desperdício provocado pela sua falta de eficiência.

“Num momento em que o dinheiro escasseia, o conselho é o seguinte: antes de procurarem onde cortar gastos com assistência médica, há que procurar opções que melhorem a sua eficiência”, refere Margaret Chan.

Se essas recomendações podem servir a alguns países, noutros o problema é mesmo o fraco financiamento. A OMS calcula em 44 dólares per capita o financiamento para garantir serviços mínimos de qualidade nos países com menores recursos e se muitos já conseguem afectar o equivalente a esse valor, 31 países gastam menos de 35 dólares anuais por pessoa e, nesses casos, a ajuda internacional é importante.

Uma estimativa da organização indica que se os 49 países mais pobres do mundo destinassem 15 por cento dos orçamentos à saúde, isso representaria 15 mil milhões de dólares suplementares por ano, o que quase duplicaria os meios de que dispõem. A meta de 15 por cento foi um compromisso assumido pelos chefes de Estado africanos em 2000 e que a Libéria, Ruanda e Tanzânia já alcançaram.

O aumento de verbas poderia ser conseguido com uma maior eficiência do sistema fiscal, como fez a Indonésia – que desse modo aumentou as receitas em dez por cento – ou por novas formas de obtenção de fundos, caso de taxas sobre vendas ou transacções financeiras. Esta última via foi seguida no Gana, que paga parcialmente o seu seguro nacional de saúde com 2,5 por cento do que arrecada em IVA. A Índia é referida como exemplo de um país que poderia obter 370 milhões de dólares anuais com o agravamento de 0,005 por cento da taxa sobre transacções em divisas.

Outro dos caminhos apontados é o aumento de impostos sobre o tabaco