30.4.08

Banco social da Fraterna ajuda mais de 300 famílias

Joaquim Forte, in Jornal de Notícias

Voluntários têm visto aumentar significativamente o número de cabazes para entregar às famílias carenciadas


"O que me vale são os cabazes da Fraterna. Sem esta ajuda não conseguia sobreviver". O desabafo é de Maria José, 36 anos, desempregada (tal como o marido), com cinco filhos, dos dois aos 15 anos. Um deles sofre de artrite crónica juvenil e está confinado a uma cadeira de rodas. "Vim para casa quando ele ficou paralisado. Precisa de mim junto dele", diz esta moradora num bairro social da freguesia de Fermentões, em Guimarães.

A família de Maria José é uma das 300 do concelho que recebem cabazes do Banco Social da cooperativa municipal Fraterna. Um número que tem vindo a aumentar nos últimos anos. "Estou na Fraterna há quatro anos e nessa altura tínhamos 40 famílias", revela, ao JN, Marina Silvares, daquela cooperativa.

Já não são apenas as famílias afectadas pelo drama do desemprego ou pela doença que recorrem ao Banco Social. Há cada vez mais trabalhadores que não conseguem suportar as despesas mensais com o salário, como alertou, na semana passada, o deputado Capela Dias, na Assembleia Municipal.

"Famílias monoparentais (principalmente mulheres com filhos pequenos), famílias numerosas - com sete, dez filhos -, trabalhadores a recibo verde, de classe média... Temos casos de três pessoas da mesma família que trabalhavam na mesma empresa e que ficaram desempregadas quando esta fechou", desfia Marina Silvares.

Depois há as "vítimas do costume" famílias a braços com as prestações das casas, idosos com reformas baixas e despesas elevadas com medicamentos e os beneficiários do Rendimento Social de Inserção.

De dois em dois meses, a equipa da Fraterna percorre o concelho, levando cabazes a cada uma das famílias referenciadas - no Natal, o número aumenta significativamente. Os pedidos chegam aos serviços através de sinalizações das paróquias, Juntas de Freguesia, Segurança Social ou da própria Câmara. Cada cabaz é composto por alimentos - farinha, arroz, azeite, óleo, leite, papas para crianças -, oferecidos por supermercados, pessoas e pela União Europeia. É feito conforme os elementos do agregado familiar. "Se há crianças, leva mais leite, papas, fraldas", informa Marina.

Preços de alimentação vão subir 39% este ano na Europa

in Jornal de Notícias

A alimentação vai ficar 39% mais cara, na Europa, avisou esta semana a Comissão Europeia. A inflação de preços já acelerou nos dois primeiros meses deste ano e, com base nos contratos de futuros sobre as principais culturas agrícolas, negociados sobretudo na Bolsa de Chicago, Bruxelas prevê que atinjam um pico de 54% na primeira metade deste ano, antes de estabilizarem.

A escalada dos preços dos alimentos a uma escala mundial começou em 2007. Só na segunda metade do ano passado, comparando com a mesma altura do ano anterior, os preços tinham aumentado 40%, em resultado do crescente consumo em mercados emergentes (como a China e a Índia), forte procura de certas culturas para a produção de biocombustíveis (ler ao lado) e fracas campanhas agrícolas em alguns países, bem como a imposição de tarifas aduaneiras por parte de países exportadores. A estas explicações, os especialistas juntam a especulação dos grandes fundos de investimento, que têm aplicado o seu dinheiro na compra de mercadorias agrícolas em grande escala, levando também ao aumento de preço.

Além da Comissão Europeia, outras organizações mundiais têm alertado para o agravamento sucessivo de preços na alimentação e ontem mesmo a ONU criou uma "célula de crise" (ler ao lado). O objectivo é propor soluções para um problema que já levou uma cadeia de supermercados norte-americana a racionar a venda de arroz.

Portugal produz menos

A subida dos preços é uma má notícia para os consumidores, mas boa para quem produz cereais. Em Portugal, "infelizmente, são poucos e cada vez menos os produtores", afirmou João Machado, presidente da Confederação da Agricultura Portuguesa. Portugal sempre foi altamente deficitário no que toca à produção de cereais, mas João Machado diz que o cenário está a piorar, porque o actual Governo deixou de os considerar uma cultura estratégica.

Em consequência, não pode receber apoios ao investimento do Quadro de Referência Nacional Estratégico (QREN) por exemplo. "Mais, o ministro tem afirmado publicamente que Portugal não tem condições para produzir cereais e tem incentivado os agricultores a reconverter as explorações para outras culturas", afirmou. É o caso da região de Beja, a mais propícia à produção de cereais e que hoje, assegurou, foi reconvertida para olival. "Isto não é uma indústria que muda a produção numa semana. Reconversões na agricultura demoram dez anos a dar resultado", afirmou.

João Machado entende que as políticas "erráticas" de sucessivos governos têm levado ao actual estado de coisas e, perante os aumentos dos cereais, admite que, em breve, os produtores de biocombustíveis deixem de conseguir pagar matéria-prima.

Europa sem racionamento

Portugal não corre o risco de ficar sem cereais e sofrer algum tipo de racionamento, acredita o ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, Jaime Silva. Em declarações à TSF, ontem, o responsável afirmou "Temos que estar tranquilos porque não vão faltar cereais para consumo". O país, disse, "não está sozinho, está no quadro de um mercado único muito grande, o maior do Mundo, que é a União Europeia". E o espaço comunitário, assegurou, terá este ano, e de novo, "mais produção do que as necessidades de consumo da União Europeia".

Mas mesmo estando afastada a possibilidade de racionar o acesso à alimentação, Jaime Silva garantiu que o Governo vai acompanhar a evolução do preço do arroz. "Iremos acompanhar justamente para termos a certeza de que não há aumento especulativo como se pretendeu fazer crer que ia haver no caso do pão", disse, lembrando notícias do início deste ano que admitiam um aumento de 50% no preço do pão.

Medidas agro- -alimentares para cereais retiradas"

in Jornal de Notícias

João Machado, Presidente da CAP

Os agricultores portugueses pouco vão beneficiar da subida dos preços, já que são cada vez menos os que produzem cereais. A CAP espera que a "moda recente" de produzir azeite não tenha consequências nefastas no futuro.

Processo a panificadores por possível subida do pão acabou

in Jornal de Notícias

A Autoridade da Concorrência (AdC) ouviu o presidente da Associação do Comércio e Indústria da Panificação, Pastelaria e Similares e chegou à conclusão que não existe "fundamento para a abertura de um inquérito contra aquela entidade associativa por violação das regras nacionais da concorrência", ou seja, a existência de um cartel de preços, lê-se no comunicado emitido a propósito. A audição foi motivada por notícias surgidas no início deste ano, em que Carlos Alberto Santos era citado dizendo que o pão iria aumentar 50% por causa da subida do preço dos cereais. Na inquirição feita pela AdC, o responsável negou ter feito essas afirmações. E, adiantou ontem Jaime Silva à TSF, o pão aumentou "apenas" 10%. Questionada, a AdC não revelou se está, ou não, a investigar o aumento dos cereais em Portugal, alegando segredo de justiça.

Não vão faltar cereais para o consumo"

in Jornal de Notícias

Jaime Silva, Ministro da Agricultura

A União Europeia produz mais do que consome, pelo que a Europa (e Portugal) não corre o risco de ver a alimentação racionada. Apesar disso, assegura estar preocupado com o aumento dos preços dos cereais.

Célula da ONU enfrenta crise alimentar

Leonor Watson, in Jornal de Notícias

A crise afecta já 100 milhões de pessoas em todo o Mundo

A Organização das Nações Unidas (ONU) criou uma equipa para responder aos problemas alimentares mundiais provocados pela subida dos preços, anunciou ontem em Berna, na Suíça, o secretário-geral da ONU. Ban Ki-moon e os dirigentes de 27 agências e organismos da ONU estão reunidos, desde anteontem, para delinear um plano para solucionar esta crise.

A célula de crise será composta por responsáveis das agências da ONU e do Banco Mundial - sob a autoridade directa de Ban Ki-moon - e recorrerá a medidas de urgência e de longo prazo para fazer face à crise causada pelo vertiginoso aumento do preço de alimentos essenciais como, por exemplo, o trigo.

Tudo isto foi explicado, ontem, pelo secretário-geral da ONU em conferência de imprensa conjunta com a directora executiva do programa Alimentar Mundial (PAM), Josette Sheeran; com o presidente do Banco Mundial, Robert Zoellick; com o director da Organização para a Agricultura e Alimentação (FAO), Jacques Diouf; com o presidente do Fundo Internacional para o Desenvolvimento da Agricultura (FIDA), Lennart Bage; e com o director-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), Pascal Lamy.

Já o director do Banco Mundial, Robert Zoellick, avisou que "as próximas semanas serão críticas", afirmando que a instituição que lidera planeia criar um fundo para financiar os países mais pobres e ajudá-los nas respectivas agriculturas.

Não restringir exportações

Aquele dirigente pediu, ainda, que "não sejam utilizadas as interdições de exportação", explicando que "essas medidas fazem disparar os preços mundiais" de mercadorias alimentares. E neste sentido, congratulou a decisão da Ucrânia de levantar as restrições à exportação de trigo.

O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon apelidou de "desafio sem precedentes" o aumento de preço dos alimentos no mercado mundial e avançou que "se não forem cumpridos plenamente os fundos que solicitámos aos doadores, aumentará ainda mais a fome, a subnutrição e os distúrbios sociais numa escala sem precedentes".

Na reunião com os dirigentes de 27 agências e organismos da ONU foram referidas, entre as causas da crise, a falta de investimentos no sector agrícola, os subsídios que pervertem o comércio, as más condições climatéricas, a degradação do meio ambiente e os subsídios aos biocombustíveis (ver texto sobre os biocombustíveis).

Biocombustíveis em causa

Leonor Paiva Watson, in Jornal de Notícias

Os biocombustíveis, como alternativa ao petróleo, evidenciam agora efeitos adversos. Especialistas questionam a sua real capacidade para reduzir as emissões de dióxido de carbono, alertam para os efeitos de desflorestação e para a subida de preços dos bens alimentares.

Em Agosto do ano passado, um estudo divulgado pela FAO - organismo das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação - e pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Económico, (OCDE), revelava que a crescente exigência por biocombustíveis já estava a provocar uma alteração no mercado agrícola internacional, com a consequente subida dos preços de alguns alimentos. Os autores do estudo avisavam os consumidores pagarão mais pela carne, produtos lácteos e óleos vegetais. Os países importadores e as camadas mais pobres das populações urbanas terão motivos para estar preocupados.

O estudo alertava ainda para o facto de a procura de cereais, açúcar e óleos vegetais para usar em larga escala na produção de biocombustíveis afectar negativamente o sector agrícola nos próximos dez anos.

Segundo os especialistas, tem-se desflorestado mais para o cultivo de cereiais e oleaginosas e o impacto no ambiente não reside apenas na perda de largas zonas de floresta repletas de biodiversidade, mas, igualmente, numa superior emissão de dióxido de carbono devido às queimadas e ao uso de fertilizantes que contibuem para as emissões de CO2.

O recurso aos biocombustíveis pode ter efeitos muito nefastos nas reservas alimentares do Mundo.

A estatística da crise

100 milhões de pessoas afectadas, em todo o Mundo, pela subida dos preços dos bens alimentares.

30 anos
A reserva de alimentos no Mundo está ao nível mais baixo dos últimos 30 anos devido ao aumento de preços.

Rede antipobreza apela ao Governo

Leonor Paiva Watson, in Jornal de Notícias

O presidente da Rede Europeia Anti-Pobreza em Portugal (REAPP) fez ontem um apelo à intervenção do Governo português para colocar um fim ao aumento dos preços dos bens alimentares que "atinge principalmente os mais pobres". "Tenho famílias no centro da cidade do Porto que dispõem de 13 euros por dia. Famílias com filhos e netos", frisou o padre Jardim Moreira à agência Lusa.

Estes "são dados concretos" que, de acordo com o presidente da REAPN, "obrigam o Governo a rever as suas actuais políticas". Para o padre Jardim Moreira "é a economia e a política que têm de estar ao serviço da sociedade civil e não o contrário. É preciso tomar consciência da realidade e avançar com as devidas soluções", considerou.

Aquele responsável revelou que "há cada vez mais famílias a queixarem-se do aumento dos bens essenciais, como o pão" e que, "a situação tem tendência para piorar". O padre Jardim Moreira prevê que a escalada dos preços pode originar "tensões sociais" porque "a estabilidade social e política depende da estabilidade dos povos".

O disparo dos preços dos bens alimentares ainda não se fez sentir no nosso Banco Alimentar, de qualquer modo Isabel Jonet alerta para o imenso problema social que se aproxima. "As famílias já têm um orçamento muito pequeno. este aumento é atirá-las para uma situação miserável. A comida é um bem básico".

O banco Alimentar sobrevive dos donativos da agricultura e da indústria agro-pecuária, bem como das campanhas que faz junto dos consumidores. "Se houver menos excedentes, nós também distribuiremos menos", avisou.

Carlos Lage critica atraso nas estatísticas regionais

Aníbal Rodrigues, in Jornal Público

O presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (CCDRN), Carlos Lage, criticou ontem o facto de o Instituto Nacional de Estatística (INE) ter começado a publicar, há cerca de cinco anos, resultados regionais com um atraso de dois anos face aos nacionais. "Não sabemos o que aconteceu na economia regional desde 2006. Temos essa manifesta carência", apontou Carlos Lage, no seu discurso a propósito da tomada de posse da nova vice-presidente da CCDRN, Ana Teresa Lehmann.

"Nós, através do INE, só conhecemos a evolução da economia regional com dois anos de atraso", explicou ainda Carlos Lage aos jornalistas. Sendo as estatísticas fundamentais para a CCDRN, este organismo decidiu criar mecanismos que ajudam a suprir a falta de estatísticas atempadas por parte do INE. E esta é uma das áreas que Ana Teresa Lehman irá tutelar.

A CCDRN instituiu, na sua macro-estrutura, o Centro de Avaliação de Políticas e Estudos Regionais, onde irá funcionar o Observatório das Dinâmicas Regionais do Norte. "Precisamos de uma bússola que nos permita guiar a navegação", comentou Carlos Lage. "A superintendência de acompanhamento e avaliação será bem entregue a Ana Teresa Lehman", acrescentou Lage, adiantando que a nova vice-presidente, que até aqui foi pró-reitora da Universidade do Porto, irá coordenar também o Planeamento e Prospectiva assim como a Internacionalização e Relações Externas.

Já o secretário de Estado do Desenvolvimento Regional, Rui Baleiras, apelou a um "maior relacionamento" do Norte com as regiões espanholas de Castela e Leão, à semelhança do que já sucede com a Galiza. "Não podemos descansar sobre os resultados obtidos", avisou o governante. Rui Baleiras explicou ainda que está prevista a existência, não apenas no Norte, mas em todas as regiões, de centros de observação de dinâmicas regionais, que irão funcionar em articulação com o observatório nacional.

Crianças são vítimas do aquecimento global

Ana Machado, in Jornal Público

São as crianças, e principalmente as dos países mais pobres do planeta, as principais afectadas pelas consequências do aquecimento global. A conclusão é de um relatório da Unicef no Reino Unido, publicado no âmbito dos dez anos da assinatura britânica do Protocolo de Quioto.

Segundo o relatório, cheias, secas, doenças provocadas por vectores, como a malária, afectarão também a educação e perspectivas de futuro das crianças dos países mais desprotegidos. Enquanto os países mais desenvolvidos e mais ricos se adaptarão às novas condições climáticas, os povos com menos recursos não terão hipótese de responder.

"É quem tem contribuído menos para as alterações climáticas, os países mais pobres e, acima de tudo as suas crianças, que serão os mais afectados", disse à BBC David Bull, director da Unicef no Reino Unido. "Se o mundo não responder já para minimizar os efeitos das alterações do clima e para se adaptar aos novos riscos, estaremos a colocar em perigo o cumprimento dos Objectivos do Milénio até 2015", acrescentou Bull.

Os oito Objectivos do Milénio, os maiores desafios mundiais, segundo a ONU, compreendem a erradicação da pobreza extrema e da fome, a educação universal, a igualdade de género, a redução da mortalidade infantil, investimento na saúde materna, combate contra o HIV e malária, a sustentabilidade do ambiente e a construção de uma parceria global para o desenvolvimento.

As nações comprometeram-se a alcançar estes objectivos até 2015. Mas o Banco Mundial alertou este mês para o facto de esse compromissos estar em risco de não ser cumprido. Pelo menos a África subsariana falhará os oito objectivos por essa data.
Mas para a Unicef são as alterações climáticas o principal travão a essa conquista. O aquecimento global e as consequências na redução de chuva, o aumento das doenças relacionadas com o consumo de água não potável, como a cólera, e a diminuição da produtividade agrícola reforçam esta tese do organismo das Nações Unidas para a infância.

"Tudo isto tem a ver com o aumento da temperatura global, que cresceu pelo menos um grau em média, desde 1850", disse à BBC Nicholas Stern, ex-vice-presidente do Banco Mundial, conselheiro do executivo de Gordon Brown e autor do Relatório Stern sobre o impacto económico das alterações climáticas. O aquecimento global seria o principal motor de um possível aumento da mortalidade infantil em África, diz Stern.

As alterações climáticas seriam o motor de um possível aumento da mortalidade infantil em África

Matosinhos cria escola de segunda oportunidade

Bárbara Wong, in Jornal Público

Não é concorrente ao programa do Governo das Novas Oportunidades, mas é uma outra forma de chegar ao mesmo público, àqueles jovens que não concluíram a sua formação académica e também não têm também formação profissional. Chama-se Escola de Segunda Oportunidade e vai começar a funcionar no início do próximo ano lectivo, em Matosinhos.

Hoje, a autarquia matosinhense, a Direcção Regional de Educação do Norte (DREN) e a Associação para a Escola de 2.ª Oportunidade (AF2O) vão assinar um protocolo para a constituição desta nova oferta educativa, existente noutros países europeus e que fará parte da Rede Europeia de 2nd Chance Schools.

O objectivo, explica Guilherme Pinto, autarca de Matosinhos, é "a qualificação dos recursos humanos, o combate ao desemprego e a melhoria das condições de vida desses jovens". O programa destina-se a indivíduos entre os 16 e os 25 anos que foram excluídos das ofertas formativas disponíveis. "É uma segunda oportunidade para se qualificarem", define.

Em comunicado de imprensa, a autarquia lembra os números "alarmantes" de abandono escolar e informa que, em Matosinhos a taxa de saída antecipada da escola, sem o 9.º ano, ronda os 18 por cento; 37 por cento saem sem completar o secundário.

A nova escola pretende dar uma resposta "sócio-educativa inovadora", uma alternativa à experiência escolar "mal sucedida" que os jovens tiveram, diz Luís Mesquita, presidente da AF2O. "É um trabalho de educação não formal", ou seja, não funciona com currículos preestabelecidos, mas com planos individuais, adequados a cada um dos 40 alunos que vai frequentar o estabelecimento. Os estudantes poderão fazer workshops, em contexto de trabalho, nas áreas de cozinha, informática, multimédia, artes e apoio ao lar.

No final do ano lectivo - o objectivo é ter os alunos apenas um ano na escola - a experiência termina. O projecto vai funcionar nas instalações de uma antiga escola, em Telheiro, e Mesquita espera que o número de estudantes aumente nos próximos anos. A DREN será responsável pelos recursos humanos da escola.

A rede europeia foi criada em 1998, na altura, a Câmara Municipal do Seixal teve uma experiência-piloto de uma escola de segunda oportunidade, financiada pela Comissão Europeia.

Mais de cem lares de idosos foram encerrados no ano passado

Andreia Sanches, in Jornal Público

Nenhum dos equipamentos encerrados era gerido pela Segurança Social, ao contrário daquele onde um incêndio provocou ontem duas mortes


O Instituto de Segurança Social (ISS) detectou no ano passado falhas em 105 lares de idosos que acabaram mesmo por receber ordens para fechar as portas. As principais causas de encerramento relacionam-se com "a verificação de deficiências graves que põem em causa os direitos dos utentes ou a sua qualidade de vida", fez saber o ISS.
Os estabelecimentos fechados apresentavam "condições precárias relacionadas com a instalação, segurança, funcionamento, salubridade, higiene e conforto". Regra geral sofriam, simultaneamente, de várias falhas, explica Helena Silveirinha, assessora de imprensa do ISS.

A maioria eram lares lucrativos ilegais, propriedade de entidades privadas, acrescenta. Alguns encerramentos, nota ainda, "foram feitos voluntariamente pela entidade proprietária, após comunicação do instituto para cessarem a actividade". Nenhum era gerido pela Segurança Social.

Os lares geridos pelo Estado são, de resto, uma minoria dos que existem no país, nota. O Centro de Recolhimento da Encarnação, em Lisboa, onde ontem morreram duas pessoas na sequência de um incêndio, é um dos poucos que estão nessa situação (ver texto ao lado).

O ISS recusa que tenha havido falhas de segurança que tenham contribuído para o desfecho trágico do incêndio. Em declarações à Lusa, a directora distrital da Segurança Social do distrito de Lisboa, Rosa Maria Araújo, garantiu que, apesar de se tratar de um edifício muito antigo (que desde os anos 30 recebe idosos), tem condições para funcionar e está apto para responder em necessidade de socorro.
Os bombeiros presentes no local apontaram, contudo, falhas.

O tenente-coronel Carlos Fernandes, comandante das operações no local, criticou, aliás, o quadro legal em vigor: "Temos de ser cautelosos a fazer uma avaliação geral sobre as condições de segurança contra incêndio nos lares, porque, entre bons e maus, há de tudo. Mas a legislação é um pouco insuficiente. Há normas que são implementadas e outras não, sem consequências. A lei não está bem definida: refere-se a casas de habitação e a unidades hospitalares, mas é relativamente omissa em relação aos lares, que tanto podem ser encaixados num tipo como noutro".

Carlos Fernandes diz esperar, por isso, que o novo regulamento geral de segurança contra incêndios seja publicado rapidamente, porque acredita que clarificará a situação.

O ministro do Trabalho e da Solidariedade Social afirmou, por seu lado, que, para além das investigações dos serviços competentes, o próprio ministério vai "recolher informação" e "serão desencadeados todos os processos para perceber quais as causas que estiveram na origem do incêndio" de ontem.

"É responsabilidade do Estado averiguar o que se passou e criar as melhores condições para todos aqueles que necessitem de apoio", disse o ministro Vieira da Silva aos jornalistas, em Beja.

Apesar de referir não dispor de "informação muito detalhada", Vieira da Silva fez saber que o centro tinha sido alvo de obras de manutenção "recentemente" e que os sistemas de prevenção de incêndios "estavam instalados conforme a lei estipula".

Há 1562 lares de idosos (dados de 2006, os únicos disponíveis), com mais de 61 mil utentes. Apenas 394 pertencem a entidades lucrativas. A maior parte é gerida por Misericórdias e instituições de solidariedade social. A comparticipação do Estado por idoso está fixada nos 330 euros mensais. E é ao Instituto da Segurança Social (ISS) que cabe fiscalizar as condições de funcionamento, pedindo apoio a entidades como bombeiros ou delegados de saúde para avaliar áreas que não domina. Todos os anos, o ISS elabora um plano de fiscalização. Mas não há nenhuma regra que determine que um lar, uma vez atribuído o alvará que lhe permite funcionar, tenha que ser alvo de inspecções periódicas, diz o ISS. A fiscalização também acontece em casos de denúncias - e que estão geralmente associadas ao funcionamento de lares ilegais.
com Catarina Prelhaz

Nações Unidas criam gabinete de crise para a alimentação

Ana Fernandes, in Jornal Público

As soluções terão de passar pelo curto prazo e por medidas de fundo: alimentar os famintos e voltar a investir na agricultura


A prioridade imediata é alimentar os famintos. Mas todo o esforço que é agora pedido à comunidade internacional não pode deixar de lado as questões estruturais: garantir que os mais pobres conseguem começar a produzir os seus próprios alimentos, investindo na agricultura nos países em desenvolvimento. Foi esta a mensagem deixada ontem pelas Nações Unidas, que criaram um gabinete de crise para fazer face ao problema.

Depois de uma reunião, que teve início na segunda-feira, das 27 agências da ONU, ficou decidido criar um grupo, presidido pelo secretário-geral da organização, Ban Ki-moon, e coordenado pelo seu secretário-geral, John Holmes, para organizar a resposta à crise alimentar. Que é urgente, sublinharam.

Nas últimas semanas, multiplicaram-se os avisos sobre a gravidade da situação: de Março de 2007 a Março de 2008, o índice de preços de alimentos da FAO (Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação) subiu 57 por cento. Para quem gasta cerca de 60 por cento do seu orçamento familiar em comida, como é o caso dos mais pobres, o impacto tem sido terrível.

Contas do Programa Alimentar Mundial indicam que, este ano, haverá necessidade de alimentar 73 milhões de pessoas. "As nossas necessidades totais para 2008 ascendem a 3100 milhões de dólares (cerca de 2 mil milhões de euros)", disse Josette Sheeran, director do PAM. "Faltam-nos mais 755 milhões de dólares (483 milhões de euros) por causa do aumento dos preços da alimentação", acrescentou, citada pela AFP e Reuters.
Daí o apelo crescente ao contributo da comunidade internacional, instada a dar a mesma resposta que deu depois do tsunami na Ásia.

Mas a distribuição de alimentos, apesar de essencial nos casos das crises humanitárias, não dá uma resposta de fundo à crise, sublinham vários responsáveis das Nações Unidas.

Num artigo ontem publicado no site da FAO, o director-geral desta organização, Jacques Diouf, sublinha que, apesar de ser "inegável que o aumento dos preços alimentares exacerbou a insegurança alimentar e criou tensões sociais, há, simultaneamente, o perigo de que as medidas de emergência de curto prazo releguem para segundo plano o debate sobre como transformar esta ameaça numa oportunidade para relançar a agricultura, sobretudo nos países pobres."

Por isso, a FAO é mais defensora de ajudas financeira aos pequenos agricultores e tenciona investir - se houver apoios para isso - 1100 milhões de euros para reforçar a produção agrícola nos países mais afectados pela crise. O Banco Mundial vai duplicar a sua ajuda à agricultura africana para 512 milhões de euros.

Os responsáveis pela crise são vários: mais procura, sobretudo por parte da China e Índia, e quebras na oferta, tanto por maus anos agrícolas como pelo desvio de parte da produção para biocombustíveis. O cenário foi agravado por muita especulação e pela escalada do petróleo.

Segundo Diouf, o aumento dos preços constituiria, segundo os fundamentos do mercado, um incentivo a que os agricultores aumentassem as suas produções. Mas em boa parte do planeta isto não está a acontecer. "Em muitos casos, faltam estradas, infra-estruturas, serviços de comunicação, acesso a tecnologias, investigação agrícola e um bom sistema de crédito e comercialização", salienta.

Na realidade, o mundo rural de muitos países em desenvolvimento - sobretudo na África subsariana -, onde estão os mais pobres entre os pobres, não tem capacidade para responder à procura porque não está sequer a receber mais dinheiro por produtos que no mercado mundial não param de escalar. Muitos agricultores comprometeram-se a vender as suas colheitas a um preço fixado antes da recente subida dos preços, salienta o Banco Mundial.

"Mesmo em algumas áreas em que os produtores se apercebem do aumento dos preços, não estão a plantar mais porque receiam o aumento dos custos dos inputs", disse Robert Zoellick, presidente do Banco Mundial. A preocupação prende-se com factores como os transportes e os fertilizantes, que têm também subido.

Além disso, os pequenos agricultores dos países pobres produzem sobretudo para seu autoconsumo e tendem a ser consumidores líquidos, pelo que estão também a ser afectados pelo aumento dos preços, sem colherem benefícios.

Para a FAO, a única forma de controlar seriamente o problema é criar condições ao investimento destes agricultores, recordando que depois da grande crise alimentar dos anos 70, muitos governos asiáticos investiram muitobastante em irrigação e em pesquisa agrícola, "o que permitiu um rápido aumento da produtividade que permitiu que milhões escapassem à pobreza e à fome", diz Diouf. "É urgentemente necessária uma resposta idêntica agora, sobretudo na África subsariana."

Caberá ao gabinete de crise, agora criado, traçar concretas medidas de acção e assegurar-se que estas serão postas em prática. Nele estarão representados todas as instituições das Nações Unidas, o Banco Mundial e o FMI. Mas, para que tenha sucesso, caberá aos países, sobretudo os mais ricos, reforçarem as suas doações.

57% É quanto os alimentos aumentaram entre Março de 2007 e Março de 2008, segundo o índice de preços da FAO.

Apelo à abertura das fronteiras

Corte nas exportações apenas piora situação


O Banco Mundial apelou ontem a que os países não levantem barreiras às exportações para tentar manter as reservas em casa. Essa atitude apenas piora os problemas, salientou Robert Zoellick (na foto), presidente da instituição.

"Estes controlos encorajam o armazenamento, fazem os preços subir e penalizam os mais pobres do planeta", disse este responsável. Vários países, da Argentina à China, tomaram esta atitude.

Também Pascal Lamy, director da Organização Mundial de Comércio referiu os mesmos efeitos da decisão: "É evidente que estas medidas tentam controlar uma maior subida dos preços, mas, a curto prazo, não são uma boa medida económica."

Entre as medidas de médio prazo para solucionar o problema, muitos apontam para o sucesso das negociações de Doha da OMC (ver artigo de Opinião na página 46).
Mas alguns analistas consideram que a situação ainda irá extremar mais as posições. Sobre a mesa está um corte de 75 por cento dos subsídios dos países ricos, mas, ainda recentemente, Berlim juntou-se a Paris na defesa dos apoios da PAC (Política Agrícola Comum). A.F.

A China à conquista de terras agrícolas

A China produz mais de 90 por cento dos cereais que consome, mas tem sido apontada como um dos factores que levou à subida do preço dos cereais - porque a população come cada vez mais e melhor (em especial cada vez mais carne) e os cereais são usados também para alimentar o gado. Mas, numa altura de crise, Pequim está muito interessada em garantir a segurança alimentar - daí que esteja a intensificar a cooperação agrícola com outras nações, ou até a explorar directamente terrenos agrícolas noutros países.

A Rússia e outros países da ex-União Soviética, a América do Sul e África são alguns dos locais onde a China está a procurar investir para garantir alimentos para a sua população - até porque os terrenos agrícolas estão a ser engolidos pelo avanço das cidades e da indústria, e também da desertificação. Números oficiais, citados pela Thomson Financial, apontam para que a área de terra arável na China tenha diminuído para 121.730 milhões de hectares no ano passado - já bem perto dos 120 milhões de hectares que as autoridades designaram como o ponto crítico, a partir do qual o país começará a ter problemas.

De acordo com o jornal Manhã de Pequim, citado pela BBC, há empresas chinesas interessadas em comprar ou explorar, em sistema de leasing, terrenos agrícolas no estrangeiro, anunciou o Ministério da Agricultura. "Desenvolver os recursos de regiões de solo rico e água abundante pode baixar os custos de produção das empresas chinesas", disse Zhang Xichen, líder do grupo Suntime, que tem projectos agrícolas no México e em Cuba, citado pela Thomson Financial.

Em África, a China está ainda a lançar um projecto para financiar a produção de colheitas valiosas (como o arroz) na Libéria e noutros países, durante 50 anos.
A subida dos preços dos cereais a nível global fez disparar a inflação na China - que no primeiro trimestre atingiu oito por cento, o mais alto em 12 anos. Na última década, a população chinesa aumentou 90,5 milhões, mas a produção agrícola per capita diminuiu de 412 quilos (1996) para 378 (2006). C.B.

O futuro de África passa pela mandioca?

A mandioca é um tubérculo muito rico em hidratos de carbono. É o alimento básico de mais de 600 milhões de pessoas


Trocar a farinha de trigo importada pela tradicional mandioca, para fazer pão, é a resposta à subida do preço dos cereais que Moçambique está a ensaiar. É um exemplo do regresso a culturas locais, em detrimento dos cereais importados, usando a ciência para melhorar ou para avaliar novas utilizações, como aconselhava um estudo financiado pelo Banco Mundial e pela FAO divulgado a 15 de Abril, a Avaliação Internacional do uso da Ciência e Tecnologia Agrícola para o Desenvolvimento.

"Primeiro, testámos a mistura de trigo com dez por cento de farinha de mandioca e não se sentiu a diferença. Passámos para 15, depois para 20 e depois para 25 por cento e sentiu-se uma grande diferença, para melhor", contou à agência Lusa Fernando Chitio, coordenador do Programa Nacional de Investigação de Raízes e Tubérculos do Ministério da Agricultura moçambicano. Para passar a fazer pão de mandioca em grande escala, "o trabalho ao nível de laboratório está feito", diz. O próximo passo será dos políticos.

O Ministério da Ciência de Moçambique está a negociar a cooperação com o Brasil, que hoje dedica boa parte do seu dinheiro para a ciência à investigação agrícola, que decaiu nos países mais ricos. Nagib Nassar, da Universidade de Brasília, ganhou até o Prémio Mundial da Alimentação em 2002, por causa do seu trabalho sobre a mandioca, produzindo híbridos mais resistentes a doenças e condições meteorológicas adversas.
A mandioca é um alimento básico para mais de 600 milhões de pessoas. É um tubérculo, como a batata, resistente à seca, muito rico em hidratos de carbono e, embora originário da América, de onde foi trazido pelos portugueses, é cultivado nos trópicos há séculos. A mandioca pode ser cozida, assada, frita ou seca. Nigéria, Uganda, Quénia, Tanzânia e Congo são alguns dos cerca de 90 países onde é cultivada.

Há alguns projectos internacionais lançados para melhoramento da mandioca - muitas vezes anunciada como a solução para a fome nos países mais pobres, mas sem nunca satisfazer esse potencial. Falta um impulso para que a investigação se traduza em fortes ganhos: a produtividade deste tubérculo aumentou apenas um por cento ao ano nas últimas três décadas, quando a do arroz, trigo e milho subiu dois a cinco por cento anualmente, de acordo com dados da FAO. Em África, as colheitas de mandioca rondam as oito toneladas por hectare, quando potencialmente poderiam atingir 80 toneladas. Clara Barata

Situação alarma associações que apoiam pobres

Lucília Oliveira, in Fátima Missionária

"A situação é preocupante". O alerta é da presidente da Federação Portuguesa de Bancos Alimentares Contra a Fome


O quadro é de crise, em Portugal, mais grave do que actual, devido à subida em curso dos preços dos principais bens alimentares. Isabel Jonet apela à “serenidade” para “evitar corridas ao mercados” e à acumulação de bens alimentares que tem como consequência fazer disparar ainda mais os preços.

A presidente da Federação dos Bancos Alimentares Contra a Fome, que realiza este fim-de-semana uma campanha de recolha de alimentos, aponta a situação preocupante dos idosos, que além da alimentação têm ainda um grande encargo com medicamentos.

À Lusa, Fernando Nobre, presidente da Assistência Médica Internacional (AMI), revela que “as pessoas estão com a corda ao pescoço”. Uma situação que é fruto do endividamento das pessoas, “aliciadas pelos bancos”, e consequente “empobrecimento da classe média”. “Só tornando a questão [da pobreza] uma causa nacional é que se pode inverter a situação”, afirma Fernando Nobre.

O Instituto Nacional de Estatística calculou a existência de dois milhões de pobres em Portugal, em Outubro de 2007. Ou seja, um terço da população entre os 16 e os 64 anos vive com menos do que o estipulado. O limiar da pobreza é definido abaixo de um euro por dia.

“Situação em Portugal é das mais preocupantes”

Luís Rego, em Bruxelas, in Diário Económico

Isabel Jonet alerta para os efeitos da crise.

Portugal é um dos países europeus mais expostos à recente subida dos preços agrícolas. Numa combinação explosiva, os portugueses têm o maior peso da factura alimentar no orçamento familiar (20%) são os terceiros mais pobres da Europa – 20% da população, ou seja 2 milhões, vive abaixo do limiar da pobreza – e 14% dos trabalhadores no activo vivem abaixo desse limiar (60% do rendimento mediano por adulto). Neste quadro, pagar mais na alimentação – ou muito mais, se atendermos a que os bens alimentares vão, segundo Bruxelas, subir 38% este ano – pode significar um rastilho para o agravamento da pobreza e conflitualidade social.

Isto num país onde a subida marginal das taxas de juro – tendo em conta que a esmagadora maioria dos contratos de crédito à habitação foram feitos com taxas variáveis – tem empobrecido muitas famílias. E onde o poder de compra salarial é cada vez menor. Os rendimentos auferidos por trabalhador são, em média, negativos nesta década, como demonstraram as últimas previsões da Comissão Europeia, apresentadas esta segunda-feira. Mas não são apenas as estatísticas que o dizem. No terreno, Isabel Jonet, economista e presidente do Banco Alimentar contra a Fome, explica que a situação em Portugal “é das mais preocupantes porque não estamos só a falar de desfavorecidos como crianças, desempregados ou idosos”. “A subida das taxas de juro criou uma nova classe de carenciados: são os novos pobres. Estamos a falar de pessoas sobreendividadas, que até têm emprego, mas que começam a sentir o peso do aumento dos bens de consumo, sobretudo os de primeira necessidade, como pão e leite”, disse ao Diário Económico.

Os dados recentemente divulgados pelo INE demonstram que o ressurgimento da inflação, em níveis superiores a 3% – e em particular dos bens alimentares – terá um impacto mais violento no orçamento dos portugueses do que na média europeia. Não só gastamos mais em comida como o país importa cada vez mais alimentos para satisfazer a procura e compensar a falta de produção. Na zona euro, os alimentos representam em média menos de 15% do cabaz de bens consumidos, enquanto em Portugal e em Espanha esta proporção já ronda os 20%. Aliás, os espanhóis também estão bem expostos a esta crise, partilhando do mesmo drama nas taxas de juro. Apesar de Espanha contar com ligeiramente menos população nas margens da pobreza, tem uma bolha inflacionista a rebentar no sector da habitação que promete reduzir à força o crescimento económico. Uma situação bem diferente têm por exemplo, a Grécia, a França ou a Alemanha – tanto pelo peso da alimentação no cabaz, menor nestes países do que em Portugal ou Espanha.

Agricultores com apoio para colheitas

Miguel Marujo, in Fátima Missionária

Preços mais caros podiam significar mais receitas. Mas a subida dos preços de combustíveis e sementes arruína qualquer esforço. Muitos podem cair na pobreza extrema


Um apoio de 200 milhões de dólares (quase 128 milhões de euros) está a ser garantido aos agricultores mais pobres para a próxima colheita, uma tentativa para aliviar o sofrimento de centenas de milhões de pessoas que enfrentam a fome e a desnutrição, por causa da rápida subida dos preços dos produtos alimentares.

“A capacidade dos 450 milhões de pequenos agricultores de todo o mundo para responder ao aumento dos alimentos está em risco por causa da espiral dos preços da energia e dos fertilizantes”, afirmou Lennart Båge, presidente do Fundo Internacional das Nações Unidas para o Desenvolvimento Agrícola (FIDA). “Os agricultores pobres não estão a colher os benefícios da subida dos preços dos produtos alimentares porque não podem pagar o adubo ou as sementes para plantarem para a próxima época”.

Båge apelou a uma acção coordenada e concertada pela comunidade internacional para impedir que milhões de pessoas caiam na mais extrema pobreza. “[Estes] agricultores são fundamentais para qualquer solução para a crise alimentar global de hoje ou para os problemas a longo prazo da fome e da pobreza”, observou o responsável

29.4.08

ONU procura soluções para a crise alimentar

in Jornal Público

O secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, e os responsáveis de 27 agências e organismos da ONU estão até esta manhã reunidos em Berna, na Suíça, para debater como combater a crise mundial causada pelo aumento do preço dos alimentos.
"Este é um momento em que somos desafiados a concretizar os melhores esforços para aumentar as expectativas que o mundo coloca em nós", considerou Ban Ki-moon.

No encontro participam representantes do Banco Mundial, do Programa Alimentar das Nações Unidas e da Organização Mundial do Comércio. Ban Ki-moon considerou que o aumento dos preços está a provocar uma "crise global" e apelou aos líderes mundiais para melhorar os sistemas de distribuição e produção.

Só hoje serão conhecidos os resultados do encontro, no qual os responsáveis da ONU procuram encontrar respostas urgentes para as populações mais afectadas pela fome e soluções a mais longo prazo. O responsável da ONU para o direito à alimentação, Jean Ziegler, salientou que esta reunião "é essencial para todos os que têm fome no mundo" e considerou que a especulação é responsável por 30 por cento do aumento do preço dos alimentos. Apelou ainda aos governos para darem prioridade às culturas de subsistência.

Existem cerca de 100 milhões de pessoas no mundo afectadas pelo aumento do preço da comida, de acordo com o Programa Alimentar da ONU. Após a elevada procura de arroz durante o fim-de-semana, no Vietname, o Governo apelou à regulação dos mercados para impedir que os comerciantes que não costumam vender comida possam agora vender arroz. Na capital do Senegal, Dacar, cerca de mil pessoas manifestaram-se contra o aumento do preço da comida, e também em Conacri, na Guiné, houve uma manifestação contra o preço dos alimentos.

Como a crise atormenta África

in Jornal Público

Falta comida para 30 por cento da população


O Programa Alimentar Mundial (PAM) da ONU marcou 30 países que enfrentam este ano uma insegurança alimentar crescente: 22 estão em África. À medida que os preços aumentam, na Mauritânia, Burkina Faso, Camarões ou Senegal enfrentam tensões sociais. A fome está a provocar as mesmas consequências das últimas secas, inundações ou confrontos civis. Na Mauritânia, o número de pessoas sem comida suficiente aumentou 30 por cento nas zonas rurais, apesar de uma colheita razoável, diz o PAM. A emergência alimentar foi declarada em grande parte do país.

Os peritos da ONU, os responsáveis do Banco Mundial e as ONG temem que este seja o início da pior crise alimentar em décadas na região. E pedem aos países ricos 755 milhões de dólares extras. As agências já estão a deixar os mais desfavorecidos cada vez mais dependentes do mercado. "Este é o novo rosto da fome", diz Josette Sheeran, directora do PAM. A globalização deveria ter eliminado este tipo de desastres. Face à confiança dos economistas na nova eficácia do mercado, a necessidade de auto-suficiência alimentar parecia quase arcaica. Na nova realidade, os mercados globais forneceriam a abundância que a terra árida não dá, e a preços razoáveis. Mas, afinal, a globalização não funciona para os alimentos. Os países, em especial os ricos, continuaram a proteger os seus agricultores e stocks de alimentos internos, mesmo enquanto pressionavam para a liberalização comercial dos productos manufacturados.

A Mauritânia, sem antecipar este cenário, abandonou políticas de preços fixos nos anos 1990. E desistiu de aumentar a produção agrícola, desviando recursos para as minas e outras indústrias.

Na Mauritânia cada refeição é um sacrifício

Anthony Faiola, Nouakchott, in Jornal Público

É a venda do último gado que deixa os peritos mais preocupados. Temem que acelere uma crise que poderia aproximar-se às fomes em grande escala


Mesmo antes de se lançar com a faca à garganta da cabra, Likbir Ould Mohamed Mahmoud sabia que só estava a piorar as coisas. Nesta cidade sedenta no extremo do Sara, a cabra dava-lhe o leite com que enchia os estômagos da família ao pequeno-almoço. Mas à medida que o disparo dos preços em todo o mundo ataca forte nas nações mais pobres de África, ele viu-se obrigado a imitar muitos vizinhos que matam ou vendem as suas únicas fontes de riqueza - os animais.

Ao sacrificar a sua cabra, no mês passado, o pastor e trabalhador à jorna de 39 anos trocou o leite matinal da família pelo jantar. Durou alguns dias. Com a família incapaz de pagar os galopantes preços dos alimentos básicos, diz Mahmoud, os dois filhos mais pequenos choram agora todas as manhãs com fome. Um dia, ele não aguentou mais. Levou a cabra bebé - um dos dois últimos animais do seu rebanho - ao esquálido mercado de gado na esperança de a vender para comprar comida. "Tudo - o arroz, o trigo, o açúcar e as rações - está mais caro que nunca", diz. "O que é que vamos fazer? Em breve não teremos nada para vender."

Como quase todos os outros países muito pobres do mundo, a Mauritânia foi apanhada na armadilha da alimentação global. Produz apenas 30 por cento do que a sua população come e importa o resto. E, com os preços em escalada, os que têm menos são os mais afectados, enquanto o mundo confronta a pior ofensiva de inflação de comida desde a crise soviética dos cereais dos anos 1970.

Uma procura global forte e fornecimentos limitados são os factores-chave na subida dos preços, mas talvez seja igualmente importante a interrupção nos fluxos livres do comércio global. Nos últimos meses, os países produtores de alimentos, da Argentina ao Cazaquistão, começam a fechar as portas para proteger o acesso doméstico aos alimentos que produzem.

Mahmoud, cuja família mora atrás das dunas numa cidade-fantasma de barracas em pleno deserto, ganha perto de 1,5 dólares por dia para manter quatro pessoas. O seu salário não subiu. Mas nos últimos seis meses, o trigo importado que a sua mulher usa para fazer o pão tradicional aumentou 67 por cento, o óleo de cozinha 117 por cento e o arroz 25. Apesar de estes serem os alimentos básicos da vida aqui, onde só 0,2 por cento da terra é agrícola, a escassez cresce. Em parte isso acontece porque há cada vez menos agricultores. A vida na cidade era melhor, mas nos últimos meses, com a subida dos preços, os que já viviam nas pequenas margens desesperaram. "Não sei como é que vou alimentar a minha família", diz Mahmoud. "Não temos como."

O melhor peixe foge

A competição global pela comida está a atingir a Mauritânia de outras formas. Nas costas atlânticas de Nouakchott isso é bem visível. A pesca aqui desceu a pique: 30 por cento do orçamento nacional vêm da venda de licenças de pesca, a maioria a barcos europeus. Isso deu ao Governo uma fonte desesperadamente necessária de dinheiro vivo, mas significou menos peixe nas redes dos pescadores locais. O peixe sai daqui para Paris, Nova Iorque ou Tóquio.

"Vemos o nosso melhor peixe sair do país todos os dias", conta Mame Diop, de 36 anos, enquanto espera, com outros pescadores, que os exportadores terminem os negócios. Vão comprar as sobras para revender na cidade. "Deixam--nos as sardinhas enquanto comem peixe sumarento. Não temos hipótese contra a fome dos países ricos."
Garoupa, diz Diop, fazia parte dos cozinhados tradicionais, mas desapareceu das mesas. Mesmo o mau peixe disponível subiu de preço. Cerca de 40 por cento nos últimos anos.

No Sudeste distante e rural das vilas de casas de lama e demasiado calor, o Programa Alimentar da ONU declarou uma emergência alimentar. Nos mercados, o preço do sorgo - cereal muitas vezes usado para fazer cuscuz, e aqui a base do prato mais tradicional - aumentou mais de 20 por cento. E isso aconteceu ao mesmo tempo que o vizinho Mali, abençoado com uma precipitação ligeiramente superior e temendo a sua própria crise alimentar, parou as exportações de cereais para a Mauritânia.

O trigo, que costuma ser acumulado nas cidades, desapareceu da maioria dos mercados desta região. Comerciantes do Senegal e do Mali passaram a fronteira para comprar o que sobrasse, dizendo que aqui é menos caro do que nos seus países.

Migração adiantada

Apesar dos agricultores de subsistência nesta zona cultivarem há muito o sorgo da terra árida, nunca foi suficiente. Para ganhar dinheiro e comprar mais os homens destas paragens viajam anualmente à procura de trabalho sazonal antes das chuvas. A migração anual está este ano a acontecer com meses de antecedência por causa dos preços. Em Bouta, uma aldeia pobre de 70 famílias, perto da fronteira com o Mali, os homens partiram há meses.

Como a maioria em Bouta, Metouna Mint Mohmaud, de 29 anos, não sabe onde é que o marido está. Partiu com outros à procura de trabalho braçal em cidades a muitos dias a pé daqui. Não há telefones - não há electricidade - para manter o contacto. Mas ela sabe, e os responsáveis do PAM confirmaram, que as suas gémeas de onze meses estão gravemente malnutridas. Comida, diz ela, tem sido sempre uma batalha, mas os olhos piscam de ansiedade quando fala dos problemas recentes.

A falta de sorgo, do Mali ou importado de outros países, duplicou os preços nos quatro meses desde que os homens partiram. As mulheres não sabem como o comprar, mesmo com as somas que os maridos possam trazer. "Como vamos comer este ano?", pergunta Mahmaud, com as gémeas lânguidas ao colo. "Não temos dinheiro para as sementes."

Os três dólares por semana que ganhava a cozer as lapelas douradas das roupas tradicionais diminuíram. "Não podemos vender - toda a gente está a gastar o dinheiro na comida", diz. "Não temos planos, não sei o que fazer."

Os preços estão a afectar mesmo os que têm a sorte de receber ajuda. Em Maghleg, uma aldeia a leste, a loja do PAM que vende cereais a preços mais baixos está meio vazia. Com os preços a duplicar, o dinheiro das vendas não permite repor o stock. E mais pessoas ficaram dependentes do mercado, a um dia de caminho.

Até agora, é a erosão do gado que deixa os peritos mais preocupados por aqui. Temem que acelere uma crise mais alargada que poderia aproximar-se às fomes em grande escala de África nos anos 1980.

"Para muitas pessoas, as fontes de rendimento estão a diminuir no mesmo momento em que os preços dos alimentos estão a aumentar", diz Gian Carlo Cirri, director do PAM para a Mauritânia.


Ver a comida a passar

"Quem vai comprar a minha cabra", gritou Likbir Ould Mohamed Mahmoud no mercado de gado, levando-a nos braços.

Um potencial comprador mostra interesse. "Deixe-me ver. O melhor preço que pode fazer?" Mahmoud respondeu que "25 dólares" e ouviu que a cabra "é muito pequena".
Não houve venda. O comprador não quis pagar o que seria normal há meses, não com tantas outras cabras à venda. "Eu não posso vendê-la demasiado barata. Não seria certo para a minha família."

A família já está em dívida. Não faz ideia como vai pagar. Reza, diz, para que o dono da loja local continue a vender-lhe fiado. "Senão, como vamos comer?"
Apesar da vida aqui ser dura, ele recusa deixar o bairro de barracas de lama. "Não quero voltar para a aldeia. Lá podemos morrer de fome sem nos apercebermos. Nem vemos comida. Aqui pelo menos posso vê-la a passar num carro. Dá-me esperança. Deixa-me feliz."

Trabalhadores não-qualificados são os que mais cometem suicídio

Catarina Gomes, in Jornal Público

No grupo dos menores de 65 anos o Algarve destaca--se pela negativa, sendo a única região onde a taxa de mortalidade padronizada por suicídio cresceu


O suicídio e a existência de sintomas de "sofrimento psicológico" afectam sobretudo trabalhadores não-qualificados, refere um estudo feito pelo Alto Comissariado da Saúde (ACS) que explora alguns dos factores que influenciam a saúde mental em Portugal.

Ao contrário de ideias feitas ainda muito arreigadas, os problemas de saúde mental "não são um luxo dos ricos, das senhoras ociosas ou das pessoas que têm dinheiro para pagar psicanálise", sublinha o coordenador nacional da Saúde Mental, Caldas de Almeida. "As doenças mentais estão estreitamente associadas à pobreza", como demonstra o estudo do ACS que cruzou dados do Inquérito Nacional de Saúde 2005/2006 e do Instituto Nacional de Estatística.

As taxas de mortalidade por suicídio são mais elevadas entre os trabalhadores não-qualificados (o que inclui pessoal de limpeza, serventes, vendedores ambulantes), seguindo-se os de profissões manuais (como operadores, artífices) e dos sectores da agricultura e pescas. Para os dois sexos o suicídio tem os valores mais baixos em profissões não-manuais, caso dos quadros de empresas e do pessoal administrativo.

No geral, quanto menos são os anos de escolaridade, maior é a probabilidade de existir "sofrimento psicológico", sendo que este indicador atinge o seu máximo em trabalhadores com menos de cinco anos de estudos, diz uma das autoras do estudo, Luísa Couceiro.Para se avaliar se alguém padece de "sofrimento psicológico", o Inquérito Nacional de Saúde fez uma série de perguntas para ver se as pessoas se sentiam ansiosas, nervosas, deprimidas, tristes e por quanto tempo - sintomas que não são sinónimo de doença psiquiátrica, mas que indiciam tendencialmente maior prevalência de patologias do foro mental, explica Caldas de Almeida.

A pobreza não é causa de doença mental, mas no grupo dos que têm menos estudos e recursos têm lugar "acontecimentos sociais precipitantes e predisponentes para doenças mentais", como é o caso do desemprego, do abandono enquanto crianças, do alcoolismo, de rupturas familiares. "É uma espiral que potencia a vulnerabilidade". Os dados confirmam o que acontece em termos internacionais.

Outro dado: são os viúvos, seguidos dos divorciados e dos separados, quem mais se suicida. Não se trata apenas de pessoas que vivem sós, o que está em causa "são pessoas que vivem sós e viveram acompanhadas. O fenómeno da perda é importante", junta Caldas de Almeida.

Que os idosos (com mais de 65 anos) do Alentejo são o grupo onde há mais suicídios é um dado conhecido. Este estudo revela que nas pessoas com menos de 65 anos o Algarve destaca-se pela negativa. Entre 2000 e 2005 só na região houve um crescimento da taxa de mortalidade padronizada por suicídio, "facto determinado pela população feminina", lê-se. No contexto geral, o suicídio é muito mais alto no masculino.

Ricardo Gusmão, professor de Psiquiatria na Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa, afirma que pode haver dois factores que explicam o cenário atípico no Algarve. Trata-se de "uma população com mais residentes estrangeiros", mais vulneráveis por estarem fora dos seus países, e onde existe "uma vida económica sazonal". São pessoas que numa parte do ano podem estar mais expostas a problemas financeiros.

O psiquiatra admite ainda que possa haver deficiências de registo que façam variar estas taxas.

O novo rosto da fome

Paulo Ferreira, Subdirector, in Jornal de Notícias

Um responsável do Banco Mundial chamou-lhe "tsunami". A directora do Programa Alimentar Mundial da ONU (Organização das Nações Unidas) definiu-a como "o novo rosto da fome". A crise gerada pela escalada de preços dos cereias é grave e está mesmo à nossa frente. Mas, como ainda não nos atingiu severamente (quase) negamos a sua existência.

Os sinais aconselham a que lhe prestemos toda a atenção, para não sermos surpreendidos quando a crise se fizer sentir a sério nos nossos bolsos. A França acaba de anunciar que as suas reservas de trigo estão esgotadas. O Brasil (o maior produtor de arroz do Mundo, juntamente com o Vietname) ameaça deixar de exportar. Nos EUA, cadeias como a Wal-Mart começaram a racionalizar as vendas de arroz e farinha. Um susto, portanto.

De onde vem a crise? Da especulação e dos paradoxos que a modernidade sempre gera. Países como a China e como a Índia passaram a ter dinheiro suficiente para satisfazer bem mais do que as necessidades básicas. A mudança dos hábitos alimentares dos chamados "países emergentes" fez aumentar a procura para níveis que a oferta não consegue satisfazer.

Por outro lado, a crise cai em cima de uma das principais apostas de muitos estados em todo o Mundo - os biocombustíveis. O disparo dos preços do petróleo justifica, cada vez mais, a abordagem a fontes de energia alternativa. Sucede, porém, que é difícil, senão mesmo impossível, explicar à opinião pública a necessidade de continuar neste trilho, quando o número de pessoas seriamente afectadas pela escassez de alimentos não pára de crescer. A mancha dos protestos alastra. E faz mortes. A questão moral que aqui se coloca é, por isso mesmo, tremenda.

Finalmente, a especulação. Para os investidores, os cereais são, nesta altura, puro "ouro". O preço do arroz já chegou a subir, num só dia, mais de 30 por cento! Até quando se manterão os especuladores no mercado é, para já, uma incógnita.

Como se vê, não faltam sinais de preocupação. Que os não queiramos ver releva apenas da distância com que costumamos olhar para as tragédias que não se passam à porta das nossas casas. Esta, contudo, é daquelas que não pedirá licença para entrar.

Pobreza está 11% acima da média

Leonor Paiva Watson, in Jornal de Notícias

Portugal apresenta valores de desigualdade social que estão 11% acima da média dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE). Segundo a oitava folha de dados da Associação para o Planeamento Familiar (APF), o nosso país regista níveis de desigualdade de 35,6 % , sendo a média da OCDE 25,2%.

No ano passado, por exemplo, Portugal registava elevados níveis de pobreza (18%) no contexto dos países da União Europeia. A esta realidade estão mais vulneráveis as crianças e jovens, os idosos, as mulheres, as pessoas com deficiências, os imigrantes e os sem-abrigo.

Apesar de Portugal não estar entre os países com maior incidência de pobreza infantil, regista valores significativos, ou seja, 21%. O risco maior situa-se nas famílias monoparentais (40%) ou nas numerosas (38,5%). Numa outra vertente do problema, no ano passado existiam 4,7% de crianças a viver em agregados familiares desempregados.

Relativamente aos idosos, no ano de 2006 eram já 26% os que enfrentavam o risco da pobreza. A média dos países da UE está nos 19%.Os idosos a viver sós são os que estão mais vulneráveis, sendo que para esses a incidência de pobreza era de 40% no ano passado.

Igualmente, as mulheres são um grupo de risco. Em 2005, cerca de 17% das mulheres a viverem na UE encontravam-se em situação de pobreza, representando dois pontos percentuais acima do risco de pobreza para os homens. Em Portugal, no ano passado, 38% dos agregados constituídos por mulheres eram pobres. No nosso país, as mulheres continuam a ter salários mais baixos desempenhando as mesmas tarefas, auferindo menos 5% do que os homens por hora de trabalho.

As pessoas com deficiência estão entre os mais vulneráveis à desigualdade. Em Portugal, a maioria da população com deficiência possui baixos níveis de escolaridade e 37% são mesmo analfabeta. Desta população, apenas 29% possui uma actividade económica, sendo que 71% está economicamente inactiva.

Ainda os imigrantes são alvo de desigualdade social. Os dados da APF não esquecem de referir, no entanto, que os imigrantes representam 21% da crição do trabalho líquido. Ainda assim, referem os dados, enfrentam acesso desigual ao mercado de trabalho, à habitação, à saúde, estão sujeitos a trabalhos precários e têm grandes dificuldades em reconhecer as suas habilitações académicas.

Já em situação de pobreza extrema estão os sem-abrigo, cujo conceito tem sofrido alterações. Se, por um lado, a maioria não é escolarizada, por outro, começa a existir uma minoria crescente com habilitações médias.

Crianças e idosos são as principais vítimas

in Jornal de Notícias

Pelo menos uma criança e um idoso foram vítimas de violência em cada dia de 2007, ano em que recorreram à Associação de Apoio à Vítima (APAV) 6130 mulheres e 858 homens. Curiosamente, o número de homens vítimas de violência doméstica tem vindo a aumentar de ano para ano.

Das 7041 pessoas que recorreram à APAVno ano passado, a maioria eram mulheres (87%), que continuam a ser as mais visadas em termos de vitimação. Porém, o secretário-geral da Associação de Apoio à Vítima, João Lázaro, aponta o facto de o número de homens vítimas ter "vindo a aumentar de ano para ano".

Em 2005, os homens representavam 10% das vítimas, número que subiu para 11% em 2006 e 12% em 2007.

As crianças representam 7,2% do total das vítimas e os idosos 7,6%, refere a APAV, acrescentando que, entre 2000 e 2007, a instituição recebeu 3459 pessoas idosas vítimas de crime.

Segundo a instituição, 506 crianças com menos de 17 anos foram vítimas de crime durante o ano passado, mais 44 do que em 2005 (9,6%).

No que respeita aos idosos, a APAV registou um aumento de 20,4% num ano, tendo passado de 545 vítimas de crime em 2006 para 656 em 2007.

A maioria das vítimas (417) tinham idades compreendidas entre os 65 e 75 anos, seguindo-se a faixa etária dos 76-85 anos, com 193 casos, e a dos mais de 86 anos (46 casos). Relativamente ao total de crimes assinalados, entre 2006 e 2007 também se verificou um aumento, tendo passado de 1077 para 1245 crimes (mais 15,6%).

Os dados indicam que os maus-tratos psíquicos lideram o número de crimes (340), seguindo-se os maus-tratos físicos, as ameaças/coacção (177) e difamação/injúrias (155).

João Lázaro explicou, em declarações à agência Lusa, que estes números mantêm a tendência de aumento de violência contra idosos, uma população "particularmente vulnerável".

Mais de 90% das situações de violência doméstica registadas pela APAV, em 2007, foram praticadas por homens com idades entre os 26 e os 55 anos (41,5%).

Atendimento

6130 mulheres vítimas

A maioria das vítimas que chegaram à APAV são mulheres. Uma tendência que se mantém com valores marcantes, sendo cada vez maior o número de homens que recorrem à associação devido a casos de violência.

Inflação paga pelos pobres

in Jornal de Notícias

O comissário europeu responsável pelos assuntos económicos disse, ontem, que "a inflação é o maior problema" que a União Europeia "tem de resolver no curto prazo".

Joaquin Almunia aproveitou a conferência de Imprensa para mandar recados aos governos dos 27, dizendo que a subida "impressionante" da inflação que está a preocupar as autoridades é, na "maior parte" dos países da UE, consequência do "mau funcionamento do mercado, da falta de reformas estruturais e de competitividade" e não exclusivamente resultado da subida dos preços dos bens alimentares e da energia.

Almunia disse que quem está a "pagar" são os sectores "mais pobres" da sociedade, recomendando que os executivos dos 27 prestem atenção às consequências "sociais" da inflação. Neste sentido, o comissário pediu aos governos, que usam as estatísticas da Comissão Europeia, para aumentarem o esforço no sentido de "adoptar e implementar reformas estruturais que possam contrariar os riscos da inflação". Almunia disse que as eventuais estratégias que possam proteger os cidadãos das consequências da inflação terão consequências "extremamente positivas". Bruxelas prevê que este ano o índice de preços aos consumidor suba para os 2,8% em Portugal, 3,2% na Euroárea e 3,6% na UE- -27.

Rede Europeia Anti-Pobreza quer que governo intervenha do preço dos alimentos

in Jornal Público

O presidente da Rede Europeia Anti-Pobreza em Portugal (REAPP), Jardim Moreira, apelou hoje à intervenção do Governo para "pôr cobro" ao aumento dos preços dos bens alimentares que "atinge sobretudo os mais pobres".

"Tenho famílias no centro da cidade do Porto que dispõem apenas de 13 euros por dia. Famílias com filhos e netos", frisou o padre Jardim Moreira. Estes "são dados concretos" que, segundo o presidente da REAPN, "obrigam o Governo a rever as suas actuais políticas".

O tema do aumento dos bens alimentares essenciais está a ser tratado numa reunião das Nações Unidas que está a decorrer desde segunda-feira na Suíça. O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, e os dirigentes das 27 agências e organizações das Nações Unidas estão reunidos em Berna para elaborar um plano de ataque face à crise provocada pelo disparo dos preços dos produtos alimentares.

Hoje, a Organização das Nações Unidas e o Banco Mundial anunciaram que vão criar uma "força-tarefa" para combater a alta sem precedentes dos preços de produtos alimentares em escala mundial. Entre outras medidas, o presidente do Banco Mundial, Robert Zoellick, pediu que os países parem de impor restrições às exportações de alimentos como forma de combater a crise.

Economia e política devem estar ao serviço da sociedade

Jardim Moreira defendeu que "a economia e a política têm de estar ao serviço da sociedade civil e não o contrário. É preciso tomar consciência da realidade e avançar com soluções", considerou o responsável. "É preciso uma maior solidariedade e equidade na repartição de bens entre ricos e pobres", disse. Jardim Moreira frisou que é urgente "encontrar um equilíbrio para a distribuição da riqueza".

Em seu entender, "enquanto os governos estiverem dependentes do poder económico não serão capazes de resolver os problemas. Muitas vezes só avançam com soluções quando pressionados pelas bases". "Há cada vez mais famílias a queixar-se do aumento dos bens essenciais, como o pão, por exemplo, e a situação tem tendência a piorar", disse.

O responsável admitiu que a escalada dos preços possa originar "tensões sociais" uma vez que "a estabilidade social e política depende da estabilidade dos povos". Uma das soluções apontadas por Jardim Moreira passa pelo incentivo à agricultura, no sentido de permitir que "muitas famílias possam auto-sustentar-se".

"É fundamental aumentar a produção de cereais. Ainda há dias um comerciante me contou que não tinha sementes para vender. É uma situação que eu considero gravíssima e que obriga a medidas imediatas", frisou o padre Jardim Moreira. O presidente da REAPN admitiu tratar-se "certamente de uma situação comum a vários países", referindo, a propósito, o tema da reunião das Nações Unidas que está a decorrer desde segunda-feira na Suíça.

Pobreza: "Governo português deve por cobro ao aumento dos bens alimentares"

in RTP

O presidente da Rede Europeia Anti-Pobreza em Portugal (REAPP) apelou hoje à intervenção do Governo para "pôr cobro" ao aumento dos preços dos bens alimentares que "atinge sobretudo os mais pobres".

"Tenho famílias no centro da cidade do Porto que dispõem apenas de 13 euros por dia. Famílias com filhos e netos", frisou o padre Jardim Moreira em declarações à agência Lusa.

Estes "são dados concretos" que, segundo o presidente da REAPN, "obrigam o Governo a rever as suas actuais políticas".

O tema do aumento dos bens alimentares essenciais está a ser tratado numa reunião das Nações Unidas que está a decorrer desde segunda-feira na Suíça.

O secretário geral da ONU, Ban Ki-moon, e os dirigentes das 27 agências e organizações das Nações Unidas estão reunidos em Berna, Suíça, para elaborar um plano de ataque face à crise provocada pelo disparo dos preços dos produtos alimentares.

Hoje, a Organização das Nações Unidas e o Banco Mundial anunciaram que vão criar uma "força-tarefa" para combater a alta sem precedentes dos preços de produtos alimentares em escala mundial.

Entre outras medidas, o presidente do Banco Mundial, Robert Zoellick, pediu que os países parem de impor restrições às exportações de alimentos como forma de combater a crise.

O padre Jardim Moreira defendeu, a propósito, que "a economia e a política tem de estar ao serviço da sociedade civil e não o contrário. É preciso tomar consciência da realidade e avançar com soluções", considerou o responsável.

"è preciso uma maior solidariedade e equidade na repartição de bens entre ricos e pobres", disse.

Jardim Moreira frisou que é urgente "encontrar um equilíbrio para a distribuição da riqueza".

Em seu entender, "enquanto os governos estiverem dependentes do poder económico não serão capazes de resolver os problemas. Muitas vezes só avançam com soluções quando pressionados pelas bases".

"Há cada vez mais famílias a queixar-se do aumento dos bens essenciais, como o pão, por exemplo, e a situação tem tendência a piorar", disse.

O responsável admitiu que a escalada dos preços possa originar "tensões sociais" uma vez que "a estabilidade social e política depende da estabilidade dos povos".

Uma das soluções apontadas por Jardim Moreira passa pelo incentivo à agricultura, no sentido de permitir que "muitas famílias possam auto-sustentar-se".

"É fundamental aumentar a produção de cereais. Ainda há dias um comerciante me contou que não tinha sementes para vender. É uma situação que eu considero gravíssima e que obriga a medidas imediatas", frisou o padre Jardim Moreira.

O presidente da REAPN admitiu tratar-se "certamente de uma situação comum a vários países", referindo, a propósito, o tema da reunião das Nações Unidas que está a decorrer desde segunda-feira na Suíça.

Crise dos alimentos: Portugal em risco?

in Portugal Diário

ONU criou missão para responder à escassez, mas no nosso país não existe grande preocupação. Ainda assim, os pobres estão sempre mais vulneráveis.

O preço dos alimentos sobe e os mercados vão tentando reagir. Para além da crise dos mercados de capitais, também a crise de alimentos atormenta a sociedade. A ONU já avançou com medidas de prevenção, mas será que Portugal está fora de risco?

O Ministro da Agricultura, Jaime Silva, considera que não. «Temos pão, cereais, arroz. Temos de estar tranquilos, porque estamos num mercado único muito grande, o maior do mundo. Este ano vamos ter outra vez mais produção do que procura. Não nos vão faltar condições, mas isso não significa que não estejamos atentos à evolução dos preços a nível mundial, que se reflectem na União Europeia», disse, em declarações à TSF, lembrando que muitas vezes o alarmismo não se confirma, como o que aconteceu recentemente com o preço do pão.

Na generalidade, os analistas estão descontentes com as políticas adoptadas. Para enfrentar a crise provocada pela subida crescente do preço dos alimentos, o secretário-geral das Nações Unidas diz serem necessários cerca de 1,6 mil milhões de euros. Isso levou Ban Ki-Moon a fazer um apelo urgente para que a comunidade internacional ajude a enfrentar a crise alimentar.

Para Mário Soares, vários erros levaram a esta situação. «Aqui há quatro anos ou menos ainda a agricultura era uma coisa que não era preciso fazer. Deixavam-se os campos ao abandono, porque havia produtos a mais e essa loucura que nos foi imposta pela União Europeia está a dar os seus resultados. Temos que regressar em força à agricultura», referiu à Rádio Renascença.

Pobres mais atingidos

O presidente da Rede Europeia Anti-Pobreza em Portugal também aproveitou para apelar à intervenção do Governo para «pôr cobro» ao aumento dos preços dos bens alimentares que «atinge sobretudo os mais pobres».

«Tenho famílias no centro da cidade do Porto que dispõem apenas de 13 euros por dia. Famílias com filhos e netos», frisou o padre Jardim Moreira à Lusa. Estes «são dados concretos» que «obrigam o Governo a rever as suas actuais políticas».

Para o economista Pedro Lains, a crise não deverá afectar muito Portugal. «O país já está numa posição em que se devia preocupar em ajudar os outros, porque está no grupo dos países mais desenvolvidos. Estamos numa posição muito privilegiada a nível internacional, por isso já estamos do outro lado desta história. Estamos protegidos, porque o Euro, apesar de tudo, protege-nos destes impactos», referiu à Antena 1.

Biocombustíveis prejudicam

Na véspera de abandonar o cargo de relator da ONU para o Direito à Alimentação, Jean Ziegler culpou o etanol pela crise de alimentos no mundo e pede uma moratória de cinco anos para o biocombustível. Na sua opinião, o mundo vive uma «verdadeira tragédia» e os biocombustiveis são «intoleráveis».

«São um crime contra grande parte da humanidade», já que provocam a subida nos preços dos alimentos. Esta tese, porém, é rebatida pelo secretário-geral da ONU, Ban Ki Moon, que não concordar com a visão de Ziegler. «O massacre quotidiano da fome não é novo. Mas, agora, as novas classes sociais caíram no abismo da fome em poucos meses», referiu, lembrando que os mais atingidos foram os países em desenvolvimento.

28.4.08

A imigração em Lisboa

Feliciano Barreiras Duarte, Professor Universitário, in Jornal de Notícias

Lisboa cidade e Lisboa enquanto área metropolitana são o espaço territorial e administrativo de Portugal onde vivem (em muitíssimos casos em condições muito difíceis) o maior número de cidadãos estrangeiros legais e (infelizmente) ilegais. É em Lisboa (a par do Algarve região e de Setúbal distrito) que sobretudo desde o pós 25 de Abril de 1974 que o fenómeno da imigração mais se fez sentir em Portugal, em particular, com o fluxo migratório oriundo das ex-colónias portuguesas de África.

Portugal hoje tem cerca de quase meio milhão de imigrantes que representam cerca de 10% da nossa população activa e cerca de 5% da nossa população residente. Que são oriundos de mais de 150 países dos quatro cantos do mundo e que falam cerca de 230 línguas maternas e dialectos diferentes.

E é em Lisboa cidade e área metropolitana que a grande maioria destes imigrantes vivem, sofrem, trabalham, e dão o seu contributo à cidade e ao país. Estudos diversos atestam-nos que Portugal tem ganho muito com eles. Não só economicamente mas também culturalmente. No que diz respeito às políticas públicas para esta área faz todo o sentido, que a autarquia de Lisboa, assuma a imigração no pilar da integração como uma prioridade.

Lisboa como cidade cosmopolita que é deve ter uma política publica ambiciosa, criativa e integrada para esta área à semelhança do que acontece com muitas cidades europeias e no mundo.

É que a imigração não deve ser entendida como um problema, mas sim como uma oportunidade. Sustentada numa articulação de vectores interligados. A saber, por exemplo na inclusão escolar, na educação não formal e na participação cívica e comunitária, sobretudo dos mais jovens. Lisboa pode e deve aprofundar á semelhança do que sucede com concelhos como Oeiras, Amadora e Sintra, as suas políticas para esta área. Deve procurar assumir essa política com base numa nova geração de direitos - língua, habitação, trabalho e direitos cívicos e políticos.

Lisboa cosmopolita, moderna, virada para o futuro, pode e deve criar instrumentos emblemáticos e simbólicos nesta área. Um monumento ao imigrante, um museu das migrações (emigração e imigração), entre muitas outras coisas, fazem todo o sentido em Lisboa. Porque Lisboa até para se regenerar demograficamente deve entender a imigração como uma oportunidade.

Mediador de etnia cigana é caso de sucesso no hospital

Teixeira Correia, in Jornal de Notícias

A integração é o melhor remédio para combater a exclusão. Esta foi a "receita" encontrada pelos responsáveis do Hospital José Joaquim Fernandes, em Beja, onde, à semelhança de outras unidades do país, havia a necessidade de responder da forma mais conveniente às situações específicas que, por razões de índole cultural, rodeiam a admissão de um doente de etnia cigana.

Entradas extemporâneas no Serviço de Urgência, visitas aos pisos fora de horas ou viaturas mal estacionadas eram constantes dificuldades com que os profissionais da saúde se debatiam. A resposta chegou através Centro de Formação Multiprofissional do Centro Hospitalar do Baixo Alentejo (CFM/CHBA) - que abarca as unidades de Beja e Serpa - ao propor um mediador da mesma etnia, que pudesse gerir os conflitos e emoções. O sucesso não se fez esperar, com as situações mais problemáticas a serem resolvidas pela "via diplomática", herdada directamente do conhecimento dos hábitos, crenças e costumes das suas gentes.

Através do Centro de Estudos de Intervenção Social (CESIS) e apoiado pelo programa comunitário EQUAL, com base no projecto "P'lo sonho é que vamos", começava um processo de selecção que levaria à resolução do problema.

"Só tenho a 4.ª classe"

Da sua humilde casa de madeira, construída no quintal da casa dos pais, na pequena aldeia de Mombeja (a cerca de 20 quilómetros de Beja), chegou, em Julho de 2007, o jovem João Pedro, que acabou por ser o escolhido para a função, em detrimento de dois "conterrâneos" - como chama às gentes da sua etnia. "Só tenho a 4ª classe, mas, sou uma pessoa inteligente e interessada em aprender", disse ao JN o jovem que frequentou aulas de português, ministradas por um professor contratado pelo hospital.

Durante seis meses, João frequentou um estágio interno. Ficou a saber qual a sua função, conheceu todos os cantos do hospital, contactou com médicos, enfermeiros e administrativos, familiarizou-se com linguagem da saúde, e tornou-se no mediador sócio-cultural que o CHBA procurava. "Vivia do Rendimento de Inserção Social, e, de vez em quando, fazia una "biscatos" na agricultura", conta.

O Serviço de Urgências ou o átrio principal do hospital são os lugares onde mais se sente a sua presença. De fato e gravata, telemóvel na mão, trato fácil e uma delicadeza impar, João Pedro leva muito a sério o seu trabalho. "É um emprego que me agrada. Sinto-me orgulhoso pela forma como todos me respeitam", diz sorridente, ainda que um pouco envergonhado.

Contrato para renovar

Quando chegou, teve conhecimento dos problemas relacionados com os seus "conterrâneos". Chegou a ser maltratado por uma rapariga da sua etnia, mas garante já ter esquecido as ofensas.

O contrato com o Centro Hospitalar termina no próximo mês de Junho, mas já tem a garantia de Rui Sousa Santos, presidente do Conselho de Administração, que vai ser renovado por mais seis meses". "Tem dado volta ao hospital na vivência e relação com uma comunidade com que tínhamos problemas", disse ao JN, o responsável.

Imigração gera mercados específicos de consumo

in Jornal de Notícias

Cosmopolita, saudosista ou étnico? Estes são os perfis mais comuns entre os consumidores que se sentem atraídos por ofertas alternativas e que procuram os mercados etnoculturais que podemos encontrar em Lisboa.

Os conceitos foram "desenhados" por Francisco Lima da Costa, sociólogo que vai defender amanhã uma tese de doutoramento que reflecte sobre o contributo da imigração para as cidades, a partir de dados recolhidos num inquérito à diversidade promovido pelo grupo de trabalho SocinovaMigrações.

O objectivo foi tentar perceber quem são os consumidores da diversidade e que tipo de produtos preferem. "A economia etnocultural é um factor de inclusão importante", explicou o investigador em entrevista à Lusa. O fenómeno da imigração pode ser encarado numa óptica negativa "de estereótipo e fechamento" ou de forma mais positiva e inclusiva através dos consumos culturais, adiantou.

Enquanto os étnicos consomem produtos que fazem parte das suas próprias referências, os cosmopolitas encaram o exótico como um valor em si. Os saudosistas têm um padrão de consumo mais indistinto. "São pessoas que tiveram uma relação directa ou indirecta com esses universos", como os macaenses, os retornados e os ex-combatentes.

Cinco anos, 4400 desempregados

Ana Correia Costa, in Jornal de Notícias

Em apenas cinco anos, pelo menos 14 fábricas têxteis fecharam as portas no concelho de Santo Tirso. Segundo dados do sector têxtil da concelhia do PCP, mais de 4400 operários ficaram sem trabalho desde 2003. Ou seja, por ano, cerca de mil conheceram as agruras do desemprego só nesta indústria.

A sexagenária fábrica Pinheiro da Rocha, em S. Martinho do Campo, engrossou o número em Janeiro passado 150, a maioria com mais de 40 anos, ficaram sem trabalho e com três meses de salários por receber. Na mesma freguesia, a Sociedade Têxtil Flor do Campo, fundada há mais de 75 anos, deixou de ter dinheiro para pagar aos funcionários em 2006. Parada desde então, ainda não liquidou salários e direitos a 400 trabalhadores. Em Vilarinho, a Baiona, que abriu falência em 2003, deve ordenados de dois meses, subsídios e indemnizações a 250. Exemplos - e ficam 11 por citar - que atestam a decadência de uma indústria que já alimentou o Vale do Ave.

Dos 5567 tirsenses desempregados que o Instituto do Emprego registou em Janeiro, quase três mil completaram apenas o 4º ano do Ensino Básico, que é, de resto, o grau de formação dominante entre os trabalhadores. A aposta em qualificações mínimas terá permitido a manutenção de salários baixos (um operário ganha pouco mais de 400 euros por mês), mas não estancou a perda de competitividade face a um mercado globalizado. "A Flor do Campo e a Pinheiro da Rocha são empresas que, ao longo de anos, não se modernizaram", acusa o comunista Jaime Toga, para quem "houve uma obsessão pelo lucro e acumulação de riqueza" por parte dos empresários.

JMA vai despedir mais

Em breve, o panorama deverá piorar, com a JMA a adensar números já alarmantes. "Vai haver redução de postos de trabalho", garantiu, ao JN, Paulo Rocha, administrador da José Machado Almeida, sem, contudo, revelar quantos. Num ano, a cinquentenária fábrica de felpos reduziu o número de operários para metade os mil registados em 2007 deram lugar aos actuais 507, revelou a responsável. Uma redução que não ficará por aqui, dado que a empresa iniciou um processo de restruturação que inclui o recurso ao outsourcing, com parcerias já feitas com unidades de produção paquistanesas e indianas. Com duas fábricas em S. Martinho do Campo (uma fecha em Setembro), foi uma das maiores empregadoras do concelho.

Flor do Campo parada

Paralisada desde 2006 e com dívidas acumuladas, a Flor do Campo só agora optou pela insolvência, juntando-a ao processo aberto, em Janeiro de 2007 (e ainda sem sentença), pelos trabalhadores (ler caixa). As dificuldades da têxtil agudizaram-se há cerca de quatro anos a matéria-prima começou a escassear e uma fiação foi encerrada, recorda Manuel Costa, ex-trabalhador.

As dívidas somavam-se. Principalmente, à Segurança Social, o maior credor. Por isso, a administração avançou, em 2003, para um Procedimento Extrajudicial de Conciliação com vista à viabilização da firma através de um acordo com os credores. Cerca de 274 operários foram dispensados até 2006. Desde então, a Flor do Campo foi acenando com a possibilidade de recuperação, mas quem conheceu as entranhas à fábrica desconfiou sempre. "A empresa não tinha, nem tem, condições para seguir", sentencia a antiga operária Conceição Matos.

No início deste mês, "a própria empresa reconheceu que não tem capacidade para trabalhar", revela Palmira Peixoto, do Sindicato Têxtil do Porto. "Deixando de haver a justificação de que o IAPMEI não se pronunciou e tendo a empresa requerido a insolvência, o juiz já não tem argumentos para não fazer o despacho", sublinha a sindicalista.

27.4.08

Taxa agravada nos contratos a prazo vai diminuir a oferta de emprego

Por José Manuel Fernandes e Graça Franco (Renascença), in Jornal Público

É contra os recibos verdes, mas enquanto não for mais fácil despedir quem não tem brio não acredita na penalização do trabalho a prazo


A Jerónimo Martins é uma empresa familiar que, com Alexandre Soares dos Santos, se tornou um dos grandes grupos portugueses e se internacionalizou. Aos 73 anos, continua a acompanhar a estratégia do grupo e preocupa-se com o futuro de um país onde, na sua opinião, "a grande mudança vai ter de ocorrer no empresariado". Mas acredita nos trabalhadores e elogia o papel das suas comissões representativas, que prefere aos sindicatos.

Ainda acha que é necessário fazer um pacto entre os diferentes partidos e as forças sociais?

Estou cada vez mais convencido de que teremos de fazer um pacto de regime. Não nos podemos esquecer que tivemos uma revolução que teve em Portugal um impacto brutal de que ainda estamos a pagar a factura. É bom não esquecer que nessa altura perdemos 30 mil quadros para o Brasil...

Há uma falha na elite dirigente?

Criou-se depois uma mentalidade de deixa andar, pois neste país só se fala de direitos. Patronato, sindicatos, políticos, têm de sentar-se e fazer como na Holanda, na década de 1980, em que demoraram a chegar a um acordo e depois cumpriram-no rigorosamente.

Outros países conhecerem processos semelhantes, a Finlândia, a Irlanda...
Por isso lá é diferente e não se vive neste clima de fricção permanente. Não pode haver manifestações todas as semanas. Não pode haver tantas greves na função pública. Tem de se explicar quais os desafios que Portugal enfrenta.

Sócrates continua a ser para si uma agradável surpresa?

O problema dos primeiros-ministros é que está a aproximar-se a época das eleições e começa a travar-se algumas reformas. Um exemplo actual: Código do Trabalho. Temos de perceber o mundo que nos rodeia e, ao sentarmo-nos à mesa, perceber o que temos de fazer para fazer face aos desafios.

Não é isso que está a acontecer?

Não sei. Na Jerónimo Martins convidámos dois membros da comissão do Livro Branco para um debate, que foi interessantíssimo, e fizemos depois seguir uma carta para o ministro. Mas o que não vejo são as confederações do patronato discutirem abertamente o que é mais importante. Está-se sempre a falar da mesma coisa, de despedimentos...

Quais são então os pontos mais importantes?

Para nós é importantíssimo a flexibilidade de horários, a mobilidade.

Este código permite acordos de empresa. No seu caso já teve dificuldades neste campo?

Tive. Ainda há pouco uma senhora pediu para lhe reduzirmos a hora de almoço para meia hora, porque necessitava muito de poder sair meia hora mais cedo. Para nós não tinha qualquer problema, mas tínhamos de pedir autorização ao ministério. Foi chumbado. E foi a trabalhadora que pediu.

A lei não devia, pois, regulamentar que o descanso mínimo para almoço é de uma hora?

Claro, pois isso é um problema entre a companhia e as pessoas.

E não haveria quem mudasse os horários só por conveniência da empresa?

Para isso é que há delegados sindicatos e comissões de trabalhadores. Eu sou um grande defensor das comissões de trabalhadores em vez dos sindicatos, que estão muito politizados e desfasados da realidade. Estão sempre a falar dos direitos adquiridos e não dos desafios do futuro. Nós já tínhamos comissões antes do 25 de Abril na fábrica Lever. E depois do 25 de Abril, passado o período louco da politização, foram e são muito importantes, até para nos ajudar a ver se a gestão estava a funcionar bem. Na Iglo, que fabrica gelados, chegámos uma vez a acordo sobre uma mudança de horários, com maior carga no Verão e férias mais prolongadas no Inverno. Foi também chumbado.

A figura que o código prevê da inadaptibilidade ao posto de trabalho vem ajudar a resolver a rigidez do despedimento individual?

Em empresas bem formadas, o despedimento é uma excepção. Por isso o que entendo é que se devia permitir o despedimento sem justa causa, mas com uma indemnização muito mais elevada porque o subsídio de desemprego é baixo. O problema hoje é que é quase impossível despedir alguém com justa causa.

Não haveria abusos?

Acho que não, mesmo admitindo que nem todas as empresas são como a Jerónimo Martins. Mas hoje nas empresas a reestruturação é permanente, não é apenas de três em três anos. Por outro lado, hoje há muita gente a que falta ambição e um pouco de brio. Tem de haver brio tal como deve haver uma boa remuneração.

Como concilia o seu pedido de maior flexibilidade de horários com a defesa que faz da família?

A sociedade teria de se adaptar. Os serviços públicos teriam de estar abertos noutros horários. As escolas também necessitariam de se adaptar. Este conflito tem de se resolver, porque hoje sabemos que o pai e a mãe trabalham.

Já o ouvi dizer, no quadro do debate sobre os horários dos supermercados, que a Jerónimo Martins defende a sua abertura ao domingo, mas pessoalmente era contra.

Como explica esta aparente contradição?

Eu sou de uma escola em que o domingo era o dia da família e de ir à missa. Estava-se com o avô, com os pais, com os tios, e, como defendo que a família é o grande suporte da sociedade, deve ser protegida. É o meu ponto de partida. Onde é que depois entro em luta comigo? Porque hoje os casais têm necessidades e hábitos diferentes, pelo que toda a actividade económica tem de se adaptar.
Como vê esta crise de confiança entre os consumidores?

É o resultado de só se falar dos problemas.

Mas pode-se falar de projectos que não existem?

É verdade: vai ter de haver uma mudança brutal no tecido económico português. Empresas baseadas num único patrão, sem quadros, sem governação, não funcionam.
Isso é uma má notícia para os portugueses. Significa que há uma reestruturação ainda por fazer...

Pois há. As empresas têm de perceber que devem ter uma dimensão mínima. Têm de ocorrer compras, ou fusões, e têm de decidir se querem ser empresas num mercado aberto. Isso implica ter quadros, definir estratégias, políticas salariais.

Então boa parte do nosso tecido empresarial, até industrial, está condenado...
E está mesmo. Mas pode-se mudar. Basta ver como mudou a região do Douro e os vinhos que lá hoje se produzem.

Tem defendido outras políticas salariais. Como é que pode passar a pagar melhor?

Com prémios por objectivos. Dizer, por exemplo, a um operário: o target da sua máquina é realizar um determinado número de embalagens com um determinado número mínimo de avarias, e se isso acontecer haverá prémios de produtividade. Na Fima-Lever-Iglo há prémios semanais por objectivo e anuais em função dos resultados, e na Jerónimo Martins o prémio é uma componente importante do salário anual.

Concorda com a taxa agravada de três por cento nos contratos a prazo?

Não. Isso vai diminuir o emprego. São custos a mais e as empresas vão-se ressentir. Onde estou cem por cento de acordo é no desaparecimento do recibo verde, que acho indecente. Só espero é que o Estado dê o exemplo, porque é o maior empregador de recibos verdes. E também de contratados a prazo, também não paga horas extraordinárias, e o exemplo tem de vir de cima.

Colabora com o Banco Alimentar contra a Fome. Sente que há uma nova pobreza?

Nos grandes centros urbanos como Lisboa há hoje uma pobreza que não havia. Mas, em contrapartida, ando muito pela província e lá não encontro essa pobreza. Por vezes, temos dificuldade em encontrar pessoas para as nossas empresas, para os nossos armazéns.

Por outro lado, a forma como na nossa empresa os funcionários aderiram ao programa Novas Oportunidades foi extraordinária. As pessoas têm vontade de progredir, a grande mudança que vai ter de ocorrer é no empresariado.

Os políticos têm de falar verdade e com coragem. E cumprir as promessas.

Perguntas & Respostas - Crise prejudica mais quem gasta tudo em comida

in Jornal Público

Quanto aumentaram os preços?

De Março de 2007 a Março de 2008, o índice de preços de alimentos da FAO subiu 57 por cento. Na base destes aumentos estão os cereais. No mesmo período, o milho aumentou 31 por cento, o arroz 74 por cento, a soja 87 por cento e o trigo 130 por cento.

Porque aumentaram os preços?

Por uma conjugação de factores. O primeiro teve a ver com o aumento da população, mas sobretudo com o crescimento da procura de países como a China e a Índia, que começaram a ter um nível de vida que lhes permitiu incluir carne na sua dieta. Por isso, houve mais necessidade de rações para os animais. A procura também aumentou para biocombustíveis, que começaram a competir com o sector alimentar. Por outro lado, alguns países exportadores tiveram maus anos de colheitas. O aumento do petróleo também contribui para encarecer os factores de produção, desde os fertilizantes aos transportes. Acresce ainda a especulação no mercado de futuros.

A situação é inédita?

Não, já houve outros picos, o mais grave dos quais no final dos anos 70. Mas, depois, os preços sofreram, ao contrário do que agora se prevê, uma queda abrupta. Aliás, em termos reais, os preços têm vindo sempre a cair nos últimos 30 anos. Em termos nominais, foram-se mantendo estáveis, em grande parte devido à intervenção dos Estados que, nos países ricos, subsidiam os agricultores para que estes não aumentem os preços ao consumidor, enquanto nos mais pobres, os produtores foram sendo gradualmente descapitalizados.

Quem ganha e quem perde?

Os do costume. Nos países ricos, os agricultores começaram a reagir aos preços e a plantar mais, prevendo-se que Estados Unidos, Austrália, França e Canadá sejam recompensados. Outros países emergentes, como o Brasil e a Argentina, também podem sair a ganhar. Mas também haverá perdedores no mundo desenvolvido, pois há países que são grandes importadores e a balança comercial tende a ressentir-se, como é o caso de Portugal. África e Ásia perdem em toda a linha, com algumas excepções. Mas quem fica realmente a perder é quem tem menos. Os mais pobres, que gastam mais de metade do seu orçamento em comida, têm de racionar ainda mais. E as zonas rurais, onde se aninha boa parte da pobreza mundial, também não está a ganhar nada com a situação, pois, além de não receberem mais pela alta dos preços, são também consumidoras de alimentos. E a fome começa a ganhar raízes mais profundas nas zonas urbanos das nações em desenvolvimento.

Há realmente falta de comida no mundo?

Não. Apesar da queda na oferta e das baixas reservas, ainda há alimentos até às próximas colheitas, diz a FAO. Mas há um problema grave de acesso a estes produtos, que se agravou imenso com a actual alta de preços.

Terá o planeta capacidade de resposta para a crescente população mundial?

Se todos consumissem como os países ricos, de forma alguma. Isso ficou agora muito claro. Mas a agricultura já está a responder à crescente procura e prevêem-se boas colheitas no Verão, o que poderá aliviar a pressão sobre os preços. Mas nada voltará a ser como antes.

Quais as soluções possíveis?

Muito depende da vontade política dos governantes. Medidas como o proteccionismo que alguns países adoptaram nos últimos dias só pioram a situação, porque distorcem ainda mais um mercado já de si completamente desvirtuado. Aliás, muitas das discussões sobre o futuro do sector vão ter de passar pela correcção de inúmeros factores de distorção, como as barreiras às importações e os subsídios. Mas o mercado, só por si, não irá resolver tudo e parte da acção mundial, como muitos defendem, poderá passar por apoiar os agricultores dos países pobres a aumentar a sua produtividade através de novos métodos e tecnologias, onde houve grande desinvestimento nos últimos 30 anos.

Os transgénicos são uma solução?

Os seus defensores dizem que sim, porque poderiam ser desenvolvidas sementes mais adaptadas a climas e solos menos aptos, assim como aumentar a produtividade. Mas a opinião pública europeia - e também alguma asiática - é muita adversa a estas técnicas. Receiam-se os impactos sobre a saúde e o ambiente e a dependência que esta tecnologia cria junto dos agricultores, já que as sementes têm de ser adquiridas todos os anos. Este confronto está agora a ganhar novo fôlego. A.F.