13.4.08

FMI alerta para dificuldades da economia mundial

Rita Siza, Washington, in Jornal Público

O pessimismo dominou a reunião da Primavera do Fundo, com os países preocupados com os actuais desequilíbrios financeiros


"A economia mundial está refém do abrandamento do crescimento económico e da subida da inflação", declarou o presidente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Dominique Strauss-Khan, acrescentando que a tendência é mais séria nos países desenvolvidos, mas notando que nem as economias emergentes estão imunes a esta desaceleração.

A crise de crédito dos Estados Unidos, a desvalorização do dólar e a alta dos preços da comida e da energia são sérias ameaças para as economias mundiais, avisou ontem o comité financeiro e económico do FMI, reunido em Washington para as habituais reuniões da Primavera.

Na sua intervenção de ontem, o secretário do Tesouro norte-americano, Henry Paulson, reconheceu que "2008 vai ser um ano muito difícil" e alertou que os mercados devem preparar-se para ainda mais "sobressaltos". Mas Paulson disse também que o mercado de capitais norte-americano tem a "força, flexibilidade e resiliência" para ultrapassar a actual conjuntura negativa.

Aquele responsável desafiou o Fundo a melhorar a sua monitorização dos mercados, reclamando maior agressividade na vigilância das políticas monetárias e cambiais dos Estados-membros. "O FMI tem de se reformar para reter a sua relevância e legitimidade", considerou Paulson.

O Fundo, uma organização de 182 países, tem o mandato do equilíbrio macroeconómico e das balanças de pagamento, bem como da estabilidade do sistema financeiro. As perspectivas económicas para o hemisfério ocidental, divulgadas na sexta-feira, apontam para um acentuado abrandamento do desempenho das principais economias, particularmente a dos EUA, que se estima crescer apenas 0,5 por cento durante o ano de 2008.

Também os ministros do G7 - Grupo dos Sete Países Mais Industrializados do Mundo (Estados Unidos, Canadá, Reino Unido, França, Alemanha, Itália e Japão) se referiram à presente situação económica no mesmo tom pessimista do FMI, manifestando preocupação com os actuais desequilíbrios financeiros e o impacto mundial da crise económica americana. "Ainda mantemos a confiança na resiliência a longo prazo das nossas economias, mas temos de reconhecer que as perspectivas económicas globais de curto prazo enfraqueceram", disseram em comunicado. "A perturbação nos mercados financeiros globais é mais profunda e será mais prolongada do que tínhamos inicialmente antecipado", reconheceram.

Os ministros do G7 evitaram, contudo, classificar o actual momento económico nos Estados Unidos como uma "recessão" - e preferiram não se envolver no debate sobre a necessidade de uma intervenção dos governos sobre a economia, de forma a "reanimar" os mercados financeiros. Mais incisivo, o grupo alertou para os perigos das actuais flutuações cambiais.

O comissário europeu para os Assuntos Monetários, Joaquín Almunia, foi um dos que destacou a instabilidade cambial provocada pela desvalorização do dólar como um dos principais motivos de preocupação. "A crescente volatilidade dos mercados cambiais, que tem acompanhado a crise financeira, está a pressionar algumas moedas de forma pouco saudável", observou. "A taxa cambial efectiva do euro já está a aproximar-se de um nível que claramente não corresponde aos fundamentos da economia europeia", sublinhou.

Na agenda da reunião do FMI estava também a reforma da instituição: os membros deveriam ratificar o plano que atribui aos países em desenvolvimento um maior peso na estrutura decisória. Dominique Strauss-Kahn propôs ainda cortar 100 milhões de dólares nas despesas do Fundo e recorrer à reserva de ouro da instituição para compensar a perda de receitas da organização.

Novo New Deal para combater a fome

Os preços do pão já provocaram motins em mais de trinta países, do Haiti aos Camarões, Moçambique ou Indonésia, e o presidente do Banco Mundial, Robert Zoellick, quer evitar que a situação piore de tal maneira que ponha em risco a missão de combate à pobreza e malnutrição que está na génese da instituição e é um dos Objectivos do Milénio da Organização das Nações Unidas (ONU).

"A escalada do preços dos alimentos pode comprometer os últimos sete anos de trabalho de luta contra a pobreza", alertou aquele responsável, que neste fim-de-semana quer sensibilizar os accionistas do Banco para a necessidade de promover uma espécie de novo New Deal para as políticas globais para a alimentação.

A proposta de Zoellick passa pela duplicação das verbas dos empréstimos destinados a projectos agrícolas na África subsariana (a região do mundo mais afectada pela crise alimentar) para os 800 milhões de dólares em 2009 e ainda para o incremento do orçamento disponível através da International Finance Corporation, que gere as parcerias público-privadas do Banco, para investimentos em agricultura.

Insistindo que se trata de um problema "muito urgente", o responsável quer que os governos tomem já medidas e preencham o actual défice de 500 milhões de dólares denunciado pelo Programa Alimentar Mundial da ONU. "Não podemos ficar satisfeitos com os relatórios e os discursos. Temos de reconhecer esta emergência para actuar", sublinhou.

Nos últimos três anos, os preços da comida dispararam 83 por cento e a tendência de subida vai-se manter nos próximos anos. "Enquanto muitos se preocupam em encher os depósitos dos seus automóveis, muitos outros no mundo lutam para poder encher o estômago. E essa luta é mais difícil a cada dia que passa", lamentou Zoellick. R.S.
Zoellick quer mais apoios para a aposta na agricultura, sobretudo na África subsariana, a mais afectada.