30.4.08

“Situação em Portugal é das mais preocupantes”

Luís Rego, em Bruxelas, in Diário Económico

Isabel Jonet alerta para os efeitos da crise.

Portugal é um dos países europeus mais expostos à recente subida dos preços agrícolas. Numa combinação explosiva, os portugueses têm o maior peso da factura alimentar no orçamento familiar (20%) são os terceiros mais pobres da Europa – 20% da população, ou seja 2 milhões, vive abaixo do limiar da pobreza – e 14% dos trabalhadores no activo vivem abaixo desse limiar (60% do rendimento mediano por adulto). Neste quadro, pagar mais na alimentação – ou muito mais, se atendermos a que os bens alimentares vão, segundo Bruxelas, subir 38% este ano – pode significar um rastilho para o agravamento da pobreza e conflitualidade social.

Isto num país onde a subida marginal das taxas de juro – tendo em conta que a esmagadora maioria dos contratos de crédito à habitação foram feitos com taxas variáveis – tem empobrecido muitas famílias. E onde o poder de compra salarial é cada vez menor. Os rendimentos auferidos por trabalhador são, em média, negativos nesta década, como demonstraram as últimas previsões da Comissão Europeia, apresentadas esta segunda-feira. Mas não são apenas as estatísticas que o dizem. No terreno, Isabel Jonet, economista e presidente do Banco Alimentar contra a Fome, explica que a situação em Portugal “é das mais preocupantes porque não estamos só a falar de desfavorecidos como crianças, desempregados ou idosos”. “A subida das taxas de juro criou uma nova classe de carenciados: são os novos pobres. Estamos a falar de pessoas sobreendividadas, que até têm emprego, mas que começam a sentir o peso do aumento dos bens de consumo, sobretudo os de primeira necessidade, como pão e leite”, disse ao Diário Económico.

Os dados recentemente divulgados pelo INE demonstram que o ressurgimento da inflação, em níveis superiores a 3% – e em particular dos bens alimentares – terá um impacto mais violento no orçamento dos portugueses do que na média europeia. Não só gastamos mais em comida como o país importa cada vez mais alimentos para satisfazer a procura e compensar a falta de produção. Na zona euro, os alimentos representam em média menos de 15% do cabaz de bens consumidos, enquanto em Portugal e em Espanha esta proporção já ronda os 20%. Aliás, os espanhóis também estão bem expostos a esta crise, partilhando do mesmo drama nas taxas de juro. Apesar de Espanha contar com ligeiramente menos população nas margens da pobreza, tem uma bolha inflacionista a rebentar no sector da habitação que promete reduzir à força o crescimento económico. Uma situação bem diferente têm por exemplo, a Grécia, a França ou a Alemanha – tanto pelo peso da alimentação no cabaz, menor nestes países do que em Portugal ou Espanha.