24.6.09

Para que serve a ajuda ao desenvolvimento?

Alexander Ellis, Embaixador Britânico, in Expresso

Li ontem o relatório anual da organização "One" , que é um pressure group liderado por Bob Geldof para encorajar os países do G8 a respeitarem os compromissos assumidos na cimeira do G8 em Gleneagles em 2005, no que respeita à ajuda ao desenvolvimento, para ajudar os países mais pobres, especificamente os da África subsariana, a alcançar os objectivos do Milénio .

A conclusão do relatório é simples: a ajuda está a aumentar, mas não com a rapidez suficiente para respeitar os compromissos de Gleneagles. Esta conclusão pode também aplicar-se ao esforço dos estados membros da União Europeia, que também fixaram objectivos para aumentar a ajuda até 0,51% do PIB no caso dos 15, ao qual pertencem Reino Unido e Portugal. Alguns países ja alcançaram o objectivo das Nações Unidas de ajuda correspondente a 0,7% do PIB (saúdo, por exemplo, Suécia e Países Baixos nesta área). Mas a maioria está longe disto, embora a ajuda esteja a crescer.

O relatório provoca-me algumas reacções.

Primeiro: aumentar a ajuda ao desenvolvimento é um meio, não um fim. O fim é claro - eliminar a pobreza. Mas há outros meios para realizar este objectivo - por exemplo, o comércio. Dezenas de milhares de Chineses têm saído de pobreza nos últimos vinte anos por causa do comércio internacional. A UE tem um regime de comércio muito aberto aos países mais pobres, o tal "tudo excepto armas", ou seja, que todas as importações dos países mais pobres entrem sem tarifas e quotas com excepção de armas. Mas há outros países, incluindo os países que estão a crescer rapidamente, que não dão um acesso tão aberto aos seus próprios mercados.

Segundo: há outras condições necessárias para reduzir a pobreza - e a seguranca é uma delas. Quando trabalhei nestas questões na Comissão Europeia, a minha primeira regra para erradicar a pobreza era "acabar com a guerra". Vêem-se as consequências para Angola do fim da guerra civil. Ou as consequências na Somália com a continuação da violência.


Terceiro: será que a ajuda ao desenvolvimento erradica a pobreza? O relatório responde a esta pergunta com alguns exemplos. Mais 34 milhões de crianças entraram para a escola primária entre 1999 e 2006 por causa da ajuda ao desenvolvimento (entre outros factores). A percentagem de pessoas em risco de malária que tem acesso a redes mosquiteiras aumentou de 3% em 2001 para 39% em 2007.


Quarto: acima de tudo, tem que haver uma governança eficaz. Quando Tony Blair esteve no Estoril há algumas semanas , disse que além do dinheiro a governança era essencial. Concordo. Às vezes, desejaria que algum do esforço fenomenal que as ONG dedicam a pressionar os governos da UE e dos G8, fosse também para pressionar os governos dos países receptores a utilizarem bem o dinheiro.

Lembro-me muito bem de estar uma vez com Bono, uma figura que admiro profundamente pelo seu trabalho nesta área, e de não ter tido a coragem de perguntar-lhe: então, o que aconteceria ao apoio dos países ricos se vissem que o dinheiro com que eles contribuem é mal gasto? De facto, quando é bem aproveitado, pode fazer uma diferença notável (por exemplo Moçambique). Mas não é sempre assim.

Quinto: será que este grande esforço vai sobreviver à crise económica, por exemplo, em Portugal ou no Reino Unido? Espero que sim, porque às vezes descobrimos o melhor de nós quando trabalhamos para os outros.