24.3.10

Governo recua e actualiza pensões

por Rudolfo Rebêlo, in Diário de Notícias

PEC abandona 'congelamento' das reformas e pensões mais baixas. Votação é amanhã no Parlamento.

O Governo recuou nas pensões, deixando cair o "congelamento nominal" descrito no Programa de Estabilidade e Crescimento (PEC). Agora, admite proceder a actualizações anuais das pensões mínimas de 900 mil reformados e dos 260 mil pensionistas dos regimes não contributivos. No Parlamento, Teixeira dos Santos, ministro das Finanças, começou também por garantir que os aumentos no IRS abrangeriam apenas 1,1 milhões de portugueses, mas acabou por, tacitamente, aceitar que o agravamento poderá afectar a totalidade dos 4,6 milhões de contribuintes.

O ministro começou, ontem, por pressionar os deputados da oposição. Com a economia endividada e dependente de novos empréstimos ao estrangeiro, alertou os parlamentares para os riscos de falhas de financiamento a Portugal, caso o PEC não seja aprovado. "Portugal corre o risco de vir a ser afectado por uma onda de choque", devido à instabilidade nas finanças públicas em "algumas áreas da União Europeia", queixando-se que os mercados "muitas vezes" não têm distinguido Portugal da Grécia. A "onda de choque", diz Teixeira dos Santos, surgirá na forma de aumentos das taxas de juro para as famílias, empresas e empréstimos ao Estado, ou mesmo pela recusa dos grandes bancos internacionais em conceder mais financiamentos.

Em véspera de aprovação do programa desenhado para baixar o défice orçamental até 2013, o Partido Socialista ainda não tinha apresentado o projecto de resolução sobre o PEC - uma espécie de moção de apoio -, o que levou a rumores de que os socialistas estariam a negociar os termos da resolução com o PSD. As regras parlamentares definem que os projectos de resolução terão de ser entregues 48 horas antes da discussão e votação, mas ainda ontem à noite Teixeira dos Santos reuniu com parlamentares socialistas, o que pode também explicar a opção por só entregar a "moção" ao meio dia de hoje.

Para mais de 1,5 milhões de reformados, dos quais 900 mil titulares de pensões mínimas, haverá, afinal, "actualizações" anuais. O mesmo sucede com os 260 mil pensionistas do regime agrícola e beneficiários de pensões sociais, que auferem entre os 189,5 euros e os 227,4 euros mensais.

No PEC, duas "normas" proíbem a "mexida" nas prestações sociais de 2010 a 2013, incluindo o valor mínimo das pensões. A primeira, define a fixação de um tecto para a despesa anual das prestações sociais, que engloba os 400 mil beneficiários do Rendimento Social de Inserção. A segunda restrição, inscrita no PEC, está no congelamento "das prestações não contributivas até 2013". É que, no Programa, o Governo descreve que o Indexante de Apoios Sociais (IAS) - ao qual, por lei, estão atreladas as actualizações das pensões - "manterá o valor nominal até 2013".


Teixeira dos Santos garantiu aos deputados que apenas 1,1 milhões de contribuintes em IRS - de um total de 4,6 milhões de declarações anuais - seriam afectados pelas reduções das deduções e benefícios fiscais. Miguel Frasquilho, do PSD, Assunção Cristas, do CDS/PP, e José Gusmão, do Bloco de Esquerda, contestaram as afirmações do ministro das Finanças. Honório Novo, do PCP, acabou por confrontar, por três vezes, Teixeira dos Santos com o congelamento das deduções específicas em todos os escalões do IRS - subtracção de montantes, definidos em lei, aos rendimentos brutos -, o que tem como resultado um aumento do imposto em todos os escalões. O ministro não negou os efeitos finais do congelamento das deduções e recusou comentar a exigência do PCP em cortar com a despesa fiscal em PPR, calculada em mais de cem milhões de euros.

Com o debate vivo, a surpresa do dia, acabou por surgir das fileiras socialistas. A uma resposta a João Galamba, deputado do PS, que considerou "que a privatização da RTP faria mais sentido do que a REN", Teixeira dos Santos acabou por sugerir que a venda da televisão pública poderá surgir a prazo, quando se reequilibrar "financeiramente a empresa".