5.6.23

50% dos portugueses têm baixa literacia em Saúde. Sociedade lança manual para combater esta realidade

Ana Mafalda Inácio, in DN


Mais de 40 autores aceitaram o convite da Sociedade Portuguesa de Literacia em Saúde para participar no primeiro manual sobre a matéria. Uma obra que quer transportar tanto cidadãos, como investigadores e organizações, para o mundo das boas práticas. O objetivo final são "mais ganhos em Saúde".

A Organização Mundial da Saúde (OMS) diz que "a literacia dá mais Saúde", mas os níveis de literacia são muito baixos nalguns países, nomeadamente em Portugal, onde se estima que "50% da população tem baixa literacia em saúde, o que significa que cinco a seis milhões de pessoas não conseguem compreender nem aceder da melhor forma aos recursos de saúde, tomando decisões pouco acertadas". A explicação é dada ao DN pela presidente da Sociedade Portuguesa de Literacia em Saúde (SPLS), Cristina Vaz de Almeida, que aproveita para sublinhar: "A falta de literacia leva a mais hospitalizações, a mais mortes prematuras e a mais gastos de recursos. Isto está provado com evidência científica". E foi precisamente para ajudar a combater esta realidade, que a SPLS decidiu avançar com a publicação da obra, Manual de Literacia em Saúde, que reúne mais de 40 autores, especialistas, com lançamento agendado para a tarde desta segunda-feira, dia 5, no Infarmed, em Lisboa.

O objetivo final, como destaca Cristina Vaz de Almeida, coordenadora da obra em conjunto com Isabel Fragoeiro, é o de transportar qualquer leitor, desde o comum cidadão ao investigador, para uma viagem pelos diferentes ciclos da vida, do nascimento ao envelhecimento, e pelo funcionamento das instituições, das academias às organizações, sempre com o foco nas boas práticas e com fundamentação científica para proporcionar mais conhecimento e instrumentos de trabalho. "É preciso que se aborde, por exemplo, os medos das crianças, a saúde da mulher, como o sono da mulher, e outras áreas a nível das organizações, como usar a comunicação e a digitalização na literacia".

A OMS diz que "a literacia em Saúde salva vidas e nós acreditamos, portanto é hora de despertar a sociedade para esta questão e para revelar também o que já se faz em Portugal - que pode ser pouco, mas que já tem muito boas práticas nalgumas áreas", sublinha, acrescentando que "o importante é que as organizações e o próprio sistema percebam que têm de se unir para trabalhar esta questão, de forma transversal e efetiva, para se obterem mais ganhos em Saúde."

A presidente da SPLS define esta obra como "a partilha do caminho que deve ser seguido para quem queira melhorar o nível de literacia em Saúde", defendendo que o primeiro passo a dar-se é o da "criação e desenvolvimento de competências". Ou seja, "para termos mais literacia em Saúde é preciso que as competências comecem a ser ensinadas na academia, na formação básica, e de uma forma muito simples. Por exemplo, começando pelo ensino e pelo uso de uma linguagem clara para o doente". Cristina Vaz de Almeida sustenta que a falta de literacia começa quando a linguagem usada com o doente é a de "jargão técnico e complexo, que o doente não compreende e que faz com que, depois, não tome as melhores decisões em Saúde, porque não compreendeu o que lhe foi transmitido". Aliás, "um dos instrumentos chave para a literacia é a comunicação. E esta tem de ser melhorada entre profissionais e doentes e entre organizações. A linguagem tem de ser assertiva, clara e positiva", defende. A especialista destaca ainda que esta é uma das mensagens a passar à sociedade e, por isso mesmo, "é preciso dar competências aos profissionais". Cristina Vaz de Almeida não esconde que gostaria que o Manual de Literacia em Saúde "trouxesse transformação, mudança e melhores resultados em Saúde. Se as pessoas lerem este manual, se aprenderem o que aqui está e o praticarem teremos melhores resultados". Lendo-se por melhores resultados em Saúde, "menos hospitalizações, menos mortes prematuras, melhor forma de recorrer aos serviços de saúde e de se usar os recursos para mais decisões acertadas", reforça.

A presidente da SPLS explica que este manual está dividido em duas áreas, uma para o cidadão, e o que este pode fazer para melhorar a prevenção e a promoção da sua saúde, e para as organizações e sistema de saúde, sobre como estes podem e devem usar a literacia na sua organização, funcionamento e até na digitalização dos serviços, etc. "Os projetos que revelamos são diversificados e fundamentados cientificamente e vão desde modelos de boas práticas na comunidade, quer para a área da medicação, da saúde mental, da saúde da mulher e das crianças, aos modelos de boas práticas para as organizações, quer hospitais ou outras unidades, e como estas podem implementar e potenciar a literacia em saúde".


Cristina Vaz de Almeida considera que na obra "tudo é importante, dependendo só da perspectiva e da necessidade de quem a lê", por isso prefere não destacar nenhum dos capítulos, sublinhando, no entanto, que o Manual de Literacia em Saúde reúne "mais de 40 autores, uns médicos, outros enfermeiros, terapeutas, investigadores, analistas de dados, higienistas orais, etc, que trabalham em hospitais, na saúde de proximidade, nas academias e com competências em literacia em saúde". Os nomes vão desde Francisco George, ex-diretor-geral da Saúde, a Graça Freitas, atual diretora-geral da saúde, passando por Adalberto Campos Fernandes, ex-ministro da Saúde, cujos contributos, diz, "tornam esta obra mais rica e útil".

anamafaldainacio@dn.pt