Sandra Silva Costa, in Jornal Público
As contas não são imediatas - nem tão-pouco fáceis de fazer -, mas a Federação Nacional de Professores (Fenprof) arrisca dizer que cerca de 13 mil docentes que estiveram contratados no ano passado ficaram agora sem colocação.
Os números falam por si, explicou ontem ao PÚBLICO Mário Nogueira, secretário-geral da Fenprof, num comentário à divulgação, na noite de sexta-feira, das listas de contratação. "Temos a indicação de que, dos mais de 47 mil candidatos que se apresentaram a concurso, 20.500 estiveram contratados no ano lectivo 2006/07." Destes, prosseguiu, "um máximo de 4000" poderão ter apresentado uma candidatura dupla (porque há professores que podem concorrer a mais do que um grupo), o que faz com que nem sempre o número de candidaturas corresponda ao número de professores.
Os dados do Ministério da Educação (ME) indicam que foram contratados 3252 professores. Se aos 20.500 que no passado deram aulas se subtraírem 4000 e, depois, os que agora foram contratados, chega-se a um número de mais de 13 mil docentes que estão, pelo menos para já, no desemprego.
Nos próximos dias, estes professores poderão concorrer às contratações cíclicas, que servem para preencher as vagas que não forem ocupadas e também para atribuir os horários incompletos. Mas Mário Nogueira sabe que estes docentes "não vão ser todos colocados, como é óbvio".
"Não percebo como é que a senhora ministra pode dizer que o concurso foi um êxito se aumentou muito o número de desempregados", comentou ainda o secretário-geral da Fenprof, aludindo a declarações de ontem de Maria de Lurdes Rodrigues.
FNE fala em "ilegalidade"
João Dias da Silva, secretário-geral da Federação Nacional dos Sindicatos da Educação (FNE), junta aos "dramas nacionais do desemprego" a denúncia de que "houve, mais uma vez, desrespeito pelas listas graduadas" para colocação de professores. "Temos a indicação de que em Aveiro houve 30 e tal colocações feitas por convite dos serviços regionais do ME, ao arrepio da legalidade", afirma o dirigente sindical, sublinhando que já no ano passado a FNE detectou situações similares, que "não foram corrigidas pelo ME". De acordo com Dias da Silva, estas alegadas ilegalidades ter-se-ão verificado na área dos apoios educativos.
Mesmo que o cenário imediato não seja favorável à classe docente, Dias da Silva prefere centrar a tónica do seu discurso na reivindicação de medidas futuras para evitar panoramas "de desemprego como o que agora se verifica".
"O ministério deve efectivar a existência de mecanismos de apoio à promoção do sucesso nas escolas, deve criar condições para o crescimento do ensino profissional e deve ainda promover um enquadramento legal que permita que as necessidades de lugares para desenvolver actividades de enriquecimento curricular no 1.º ciclo dêem prioridade a estes professores e não, como às vezes acontece, a pessoas que não têm as competências necessárias", defende Dias da Silva. Desta forma, diz o dirigente, muitos dos professores agora sem emprego poderiam ter outra "perspectiva profissional".
O secretário-geral da FNE entende ainda que, em articulação com o Ministério da Ciência e do Ensino Superior, a tutela deve promover "formações curtas a nível superior que permitam aos professores reconverter-se profissionalmente". Isto porque, refere, continuam a sair das faculdades muitos candidatos ao ensino, cujo destino mais óbvio é o desemprego.
Somadas todas estas razões, os dois dirigentes sublinham que estão reunidas as condições para que o ano lectivo que está prestes a arrancar se inicie debaixo de um forte clima de instabilidade e insatisfação junto da classe docente. "As injustiças mantêm-se de ano para ano, o que não dá para criar um bom ambiente", antecipa Dias da Silva. "Se há desemprego, não pode haver estabilidade", diz, por seu lado, o dirigente da Fenprof, que tem marcada para amanhã, dia em que os professores têm de apresentar-se ao serviço, uma acção de sensibilização para o desemprego da classe docente.