Alexandra Marques, Artur Machado, in Jornal de Notícias
Ciganos a viver em bairros sociais com portugueses é "uma situação um pouco explosiva"
A comunidade cigana do distrito de Braga é muito mais discriminada do que os imigrantes oriundos dos países africanos lusófonos.O estudo realizado nos concelhos de Braga, Barcelos e Guimarães por dois investigadores - Manuel Carlos Silva da Universidade do Minho e José Sobral do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa - mostra que "uma percentagem razoável" dos dois mil inquiridos aceitaria coabitar com um cidadão africano, mas "quase ninguém" do universo auscultado admite viver com um indivíduo de etnia cigana.
"Ao nível das respostas explícitas, há um sentimento minoritário de discriminação em relação aos negros e um sentimento muito forte de preconceito em relação aos ciganos", salienta José Sobral, co-autor do estudo "Relações Interétnicas: Portugueses, ciganos portugueses e imigrantes dos PALOP", em que colaboraram mais cinco investigadores, entre nacionais e estrangeiros.
Namoros incómodos
Os ciganos são a população-alvo sujeita a discriminações "flagrantes ou mais subtis". No capítulo de situações de convivência próxima desagradável aos autóctones, 22,4% dos inquiridos respondeu que seria "um incómodo" um negro namorar a sua filha e 37,3% se fosse cigano.E enquanto 28,9% não desejariam que um negro se tornasse seu genro, 46,9% rejeitam se for um cigano.
"Existem razões históricas devido ao estereotipo" que subsiste em relação aos ciganos. "São séculos de desentendimento", refere o investigador ao JN, baseado numa existência itinerante e nómada que foi sempre fonte de conflitos. "São os que têm piores habilitações escolares e continuam a ter uma cultura própria, à parte, separada e não estão enquadrados. Esta é a ideia prevalecente para a maioria cujo modo de vida é o padrão segundo o qual observa os outros. Para o português, o modelo de cidadania passa por frequentar a escola, por ter uma vida sedentária, partilhando valores, e eles têm outros paradigmas", assinala.
Há aspectos na cultura cigana que são considerados positivos pelos portugueses, como o facto de "serem unidos e de respeitarem os mais velhos". Mas, ao mesmo tempo, são vistos "como uma ameaça, que são violentos, impulsos e incontroláveis". Em suma, "a segregação mantém-se", realça José Sobral.
Por sua vez, "a população cigana sente-se marginalizada, vistos como oportunistas do Estado e antes de mais sentem-se vítimas de discriminação por parte das autoridades judiciais e policiais. Há muita hostilidade". A maioria dos inquiridos não se considera racista ou xenófobo. Há um racismo dissimulado "que se esconde sob fórmulas eles não são iguais a nós, eles são diferentes e muitas vezes os vocábulos são empregues indiciam distanciamento" E outro que se expressa em termos mais pejorativos e que é apanágio de portugueses com mais idade e menos escolarização. Este sociólogo considera, por isso, "uma situação um pouco explosiva, o alojamento de membros da comunidade cigana em bairros sociais ao lado dos portugueses pobres".
A menor discriminação dos africanos deve-se ao facto da população negra residente nestes concelhos minhotos ser universitária e estar integrada em zonas habitacionais - embora algumas jovens tenham referido ter sido alvo de racismo por os vizinhos se queixarem do barulho nocturno - não se encontrando concentrada em bairros periféricos suburbanos, como acontece na Área Metropolitana de Lisboa, com a Cova da Moura (Amadora) ou o Jamaica (Seixal).