Luisa Pinto, in Jornal Público
Trabalhadores portugueses recebem quase metade do salário dos espanhóis. Confederação galega promete acções de protesto na rua
Não tivesse a crise no sector da construção chegado à vizinha Espanha, e porventura as queixas dos trabalhadores galegos não se fariam ouvir do lado de cá da fronteira. Mas a crise já chegou, e todos esperam que ainda venha a fazer muitos estragos, por isso a contagem de espingardas já começou: ontem, o secretário nacional da Confederação Intersindical Galega para o sector da construção, Xoan Xosé Melón, ameaçou com "greves" e "manifestações públicas de protesto", caso governos portugueses e espanhóis não se ocupem a combater aquilo que chamam de "dumping laboral".
"Não temos nada contra os portugueses, só queremos que seja cumprida a legislação. A verdade é que os portugueses estão a fazer um autêntico dumping laboral, aceitando trabalhar em condições muito precárias, o que configura uma situação de concorrência desleal. E os grandes prejudicados são, naturalmente, os trabalhadores galegos, que se vêem preteridos", disse à agência Lusa Xoan Melón.
Esta preocupação não é exclusiva dos sindicatos galegos; os sindicatos portugueses já a denunciam "há anos", lembrou ao PÚBLICO o presidente do Sindicato dos Trabalhadores de Construção do Norte, Albano Ribeiro. "Pena é que só pense nisso quando os postos de trabalho começam a faltar. Até agora não se incomodaram por andarem em obras, lado a lado, com trabalhadores a ganharem quase metade do salário deles", argumentou Albano Ribeiro, frisando que "nós já andamos a denunciar essa situação há anos", acrescentou, ao PÚBLICO, alegando que os espanhóis ganham cerca de 12 euros por hora, enquanto que os portugueses auferem "entre sete a 7,5 euros". Os galegos fazem outras contas, mas a disparidade mantém-se: um trabalhador espanhol recebe nove euros, o português aufere "cinco ou seis" - mas não tem salário fixo, horário de trabalho, subsídios ou indemnizações.
E o que leva os trabalhadores portugueses a sujeitarem-se a essa discriminação: "Garantir um posto de trabalho" e um melhor salário, já que, contabiliza Albano Ribeiro, "mesmo a ganharem mal face aos espanhóis, sempre ganham melhor do que aqui. Em Portuggal, o salário de um trabalhador qualificado é de 518 euros. E o patronato, que espera para este ano crescimentos na ordem dos 2,5 por cento, não admitiu fazer aumentos salariais dessa grandeza", criticou o sindicalista.
Xoan Melón é o primeiro a admitir que foi a chegada da crise que os "obrigou" a esta tomada de posição: "Até aqui, havia trabalho para todos. Agora, a luta por um emprego vai ser cada vez mais feroz. Os patrões, naturalmente, o que querem é pagar salários o mais baixos possível. Se um português aceita trabalhar por menos do que está estipulado na lei trabalha mais de oito horas por dia, é mais um posto de trabalho que o galego vê fugir", sublinhou. Com Lusa
Actualmente serão cerca de 100 mil os trabalhadores da construção portugueses que estão a trabalhar em Espanha. Cerca de 80 a 90 mil, que lá estarão instalados durante a semana, ou a quinzena, e outros dez mil que atravessam a fronteira todos os dias. A estimativa é do Sindicato dos Trabalhadores da Construção do Norte. A Confederação Galega diz que só na Galiza há 14.482 portugueses inscritos na segurança social espanhola.