Por Alexandra Campos, in Jornal Público
Bastonário rejeita qualquer privilégio para os clínicos que vão poder acumular a pensão de reforma com uma parte do salário, a única excepção na função pública
Cerca de 80 médicos reformados e que tinham pedido a aposentação antecipada manifestaram até ontem a intenção de regressar ao SNS, adiantou o Ministério da Saúde, que esclareceu que os reformados por limite de idade vão poder manter a acumulação da pensão com uma parte do salário. Esta é a única situação de excepção prevista para toda a função pública, onde a acumulação de reformas e vencimentos passa a ser proibida, inclusive no caso do Presidente da República.
Dos pedidos de regresso, "40 já estão devidamente instruídos e outros 40, recebidos nas últimas semanas, estão a aguardar instrução", referiu o Ministério da Saúde (MS), sem mais detalhes. Na terça-feira, um dirigente do Sindicato Independente dos Médicos (SIM) adiantara ao PÚBLICO que apenas 40 dos "cerca de 700 médicos" que pediram a reforma em 2010 tinham admitido voltar ao SNS, aceitando o regime especial criado para conter a corrida à reforma antecipada verificada no início deste ano, depois de as regras de aposentação terem sido alteradas. Nesse dia, o MS não confirmou nem desmentiu o número, dizendo apenas que tinha em curso um processo de avaliação da situação.
Baixa adesão
O SIM conseguiu os dados contabilizando os pedidos de regresso que vão sendo publicados no Diário da República. O decreto-lei que criou este regime especial prevê que os médicos sejam contratados após proposta das unidades do SNS, e autorização caso a caso, por despacho do ministério.
Os dirigentes dos sindicatos - tanto o SIM, como a Federação Nacional dos Médicos (FNAM) - têm-se mostrado cépticos relativamente a uma grande adesão a esta possibilidade criada para evitar o esvaziamento de alguns serviços, sobretudo nos cuidados de saúde primários. É que, dos clínicos que pediram a reforma este ano, uma parte substancial são médicos dos centros de saúde. "Os médicos de família são mais de metade. E esta área está há vários anos carenciada", acentua Mário Jorge Neves, presidente da FNAM. Se muitos destes não aceitarem voltar, o número de portugueses sem médico de família voltará a agravar-se, nota.
Anteontem, depois de fontes governamentais terem afirmado que não ia haver excepções para nenhuma classe profissional, a ministra da Saúde garantiu que a proibição de acumulação de vencimentos e pensões de aposentação na função pública "não tem efeito na saúde". Uma excepção justificada pela carência de clínicos e "a grande dificuldade" de ter profissionais "nos próximos três anos".
A excepção aplica-se apenas aos médicos já reformados ou que se aposentaram este ano por limite de idade. Os que pediram a reforma antecipada podem ser contratados por um período máximo de três anos, mas continuam a receber o mesmo, porque a pensão fica suspensa. A vantagem, neste caso, é que ao fim de três anos mantêm as condições de aposentação que vigoravam até o orçamento de 2010 ter entrado em vigor.
"Os médicos dispensam qualquer regime de privilégio", reagiu o bastonário da Ordem dos Médicos, Pedro Nunes, que não acredita no regresso em massa ao SNS. "Se aceitarem voltar, não será pelo dinheiro", diz, lamentando que se esteja a criar a ideia de que os médicos são beneficiados com esta medida. "O problema de base não tem nada a ver com dinheiro", acrescenta. Já a presidente do Conselho Regional do Sul da OM, Isabel Caixeiro, defende que a tutela ainda não esclareceu as regras para a contratação dos profissionais. Há "muitos locais" onde "algumas consultas fecharam" porque os médicos que as asseguravam eram médicos reformados que se tinham disponibilizado a voltar ao trabalho e nesses locais "as directrizes que a administração recebeu é que não podiam continuar", disse.