9.6.23

Agenda do Trabalho Digno: o que significa e qual o objetivo?

ComparaJá, in Dinheiro Vivo


São cerca de 70 medidas que vieram reformular o Código de Trabalho. Conheça as principais mudanças que já estão em vigor

A Agenda do Trabalho Digno tem impacto direto numa grande diversidade de temas que importam a trabalhadores e empresas, das despesas com teletrabalho às licenças parentais, dos recibos verdes ao trabalho temporário, das bolsas de estágio aos processos de despedimento. Pelo meio, há novidades no para cuidadores informais e para quem faz horas extra.

O que é a Agenda do Trabalho Digno?

A Agenda do Trabalho Digno reúne um conjunto de iniciativas e políticas que visam garantir condições justas e adequadas para todos os trabalhadores. Esta nova legislação vem reformular questões essenciais, como a valorização dos salários, a igualdade no mercado de trabalho e o incentivo à partilha das responsabilidades familiares.

Para o efeito, foram também criados mecanismos de reforço da fiscalização, como o cruzamento de dados entre entidades, para detetar irregularidades como falsos recibos verdes ou trabalho não declarado.

Para que serve a Agenda do Trabalho Digno?

A Agenda do Trabalho Digno foi criada para garantir que todos os trabalhadores têm acesso a empregos dignos, com proporcionem uma remuneração justa, segurança e proteção social. Todas as medidas constantes neste Agenda passam pelos seguintes objetivos:

. Combater a precariedade;


. Valorizar os salários;

. Incentivar o diálogo e a negociação;


. Promover igualdade no trabalho;


. Melhorar o equilíbrio entre a vida profissional, familiar e pessoal;


. Reforçar os mecanismos de fiscalização.

A missão do Governo passa, assim, pelo aumento da qualidade de vida dos trabalhadores e das suas famílias. Espera-se que ajude ao aumento da produtividade e competitividade das empresas e ao desenvolvimento sustentável e equitativo.


O que inclui a Agenda do Trabalho Digno?

A Agenda do Trabalho Digno inclui uma série de reformulações políticas e novas iniciativas, aplicáveis ao Código de Trabalho. Estas são as principais.


1. O limite aos contratos temporários desce para 4 anos


O período máximo de renovações dos contratos de trabalho temporário passa de 6 para 4 anos. Findo este período, as empresas são obrigadas a integrar os trabalhadores nos seus quadros.


Além disso, nos casos em que o trabalhador tenha sido cedido por uma empresa de trabalho temporário não licenciada, as entidades empregadoras são obrigadas a proceder à sua integração.


2. Há novos limites para os recibos verdes


A Agenda do Trabalho Digno prevê que as empresas deixem de poder contratar trabalhadores a recibos verdes para suceder a um trabalhador temporário no mesmo posto ou atividade profissional.

Além disso, passa a ser proibido recorrer a "outsourcing" durante 12 meses após despedimento coletivo ou por extinção dos postos de trabalho. Ainda, a Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) vê o seu poder reforçado para converter contratos a termo em contratos sem termo.


3. A legislação das plataformas digitais também mudou

A Agenda do Trabalho Digno presume a existência de contrato de trabalho nas plataformas digitais (como a Uber, Glovo ou TVDE), sempre que verificarem indícios de relação laboral. Estes indícios são reconhecidos quando a empresa fixa uma remuneração, supervisiona a prestação da atividade, controla o horário de trabalho e outros aspetos relativos à organização de tarefas.


4. Novas regras para licenças parentais e de luto

A Agenda do Trabalho Digno aumenta o período de licença parental obrigatória do pai. Passa assim a ser obrigatório que o pai goze a licença de 28 dias (seguidos ou interpolados), nos 42 dias seguintes ao nascimento da criança, 5 dos quais de modo consecutivo imediatamente a seguir ao parto.

Após estes 28 dias, o pai tem ainda direito a sete dias adicionais, desde que gozados em simultâneo com a licença parental inicial por parte da mãe. Esta medida tem como objetivo incentivar a partilha das responsabilidades familiares.

Há também alterações relacionadas com o falecimento de um familiar. Se o cônjuge falecer, a licença passa a ser de 20 dias. Foi também criada a licença por luto gestacional, que tem como limite máximo 3 dias.

Além disso, os pais de crianças com deficiência, doença crónica ou doença oncológica passam a ter direito ao teletrabalho, sem necessidade de acordo por parte do empregador.

5. O trabalho não declarado passa a dar direito a prisão

O trabalho não declarado passa a ser criminalizado com prisão até 3 anos ou multa até 360 dias. Mesmo quando a situação é voluntariamente regularizada, há sempre lugar a uma contraordenação. Além disso, é obrigatório manter o registo diário dos trabalhadores cedidos ou colocados por outras empresas em explorações agrícolas e estaleiros de construção civil.


6. Aumentam as bolsas de estágios de IEFP

A bolsa de estágio do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) para licenciados beneficia agora de um aumento para 878 euros. É também anulada a possibilidade de pagar a estagiários uma remuneração inferior à prevista no Código de Trabalho, ou seja, 80% da Remuneração Mínima Mensal Garantida (RMMG). Os estágios que não beneficiem do apoio do IEFP têm acesso a regime de proteção social equiparado ao trabalho por conta de outrem.

7. A ACT tem novos poderes para acompanhar processos de despedimento

Também a ACT vê os seus poderes reforçados, tendo agora a autoridade de, por exemplo, suspender processos de despedimento com indícios de irregularidade. Os processos estão também mais simplificados, com recurso a notificações eletrónicas, inquirição por videochamada ou aplicação de processos com base apenas no cruzamento de informação.

8. O estatuto dos cuidadores informais entra em vigor

É criada uma licença de 5 dias para cuidadores informais não principais reconhecidos, além do direito a faltar 15 dias sem perda de direitos (exceto retribuição). De forma a prevenir que o trabalhador seja prejudicado pelo exercício dos seus direitos, foram introduzidas garantias especiais relativas a despedimento e à não discriminação.

Além disso, os cuidadores informais não principais reconhecidos passam a ter acesso a regimes de trabalho flexíveis e ao teletrabalho.

9. Despesas adicionais do teletrabalho passam a ser pagas

A Agenda do Trabalho Digno prevê a fixação do valor das despesas adicionais do trabalhador em caso de teletrabalho. Este valor deve estar discriminado no contrato de trabalho. Quando isso não acontece, consideram-se despesas adicionais aquelas que não existiam antes do contrato.

Quando esta compensação não é comprovada por faturas, passa a ser tributada em sede de IRS. Dito doutro modo, reembolsos de despesas adicionais apenas ficam isentos de impostos quando devidamente comprovadas.

10. Horas extraordinárias passam a ser pagas até mais 75%

O valor das horas extraordinárias foi agora aumentado quando ultrapassam as 100 horas anuais. Em dias úteis, o valor sobe de 25 para 50% na primeira hora ou sua fração e, nas horas seguintes, passa de 37,5% para 75%. Em dias de descanso semanal, o aumento é de 50% por cada hora ou fração.

11. Baixas médicas podem ser pedidas online até 3 dias úteis

As baixas médicas podem agora ser pedidas online, através da plataforma digital do Serviço Nacional de Saúde, sem necessidade de o trabalhador se deslocar fisicamente a um centro de saúde ou a um hospital. Esta medida também vem libertar os médicos destes atos, abrindo mais espaço para consultas.

Contudo, as justificações emitidas através deste modelo não podem exceder 3 dias consecutivos de falta ao trabalho, duas vezes por ano. A partir destes limites, o trabalhador terá de recorrer ao método convencional, ou seja, deslocar-se ao hospital ou ao centro de saúde para atestar a sua incapacidade para trabalhar.

Quanto à perda de vencimento, não se verificam alterações, ou seja, a Segurança Social só paga as baixas a partir do quarto dia de impedimento para o trabalho.

12. Semana de quatro dias ainda em testes no privado

A Agenda do Trabalho Digno abriu um projeto-piloto livre e voluntário às empresas do setor privado que queiram experimentar a implementação de uma semana de quatro dias. Esta modalidade implica a redução de horas de trabalho semanais sem perda de salário. Contudo, a jornada laboral diária pode ser aumentada.

Qual a origem de Agenda do Trabalho Digno?

A origem da Agenda do Trabalho Digno remonta à década de 1990, quando a Organização Internacional do Trabalho (OIT) iniciou um debate global sobre o que significa "trabalho digno".

Em 1999, a OIT adotou a Declaração sobre Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho, que estabelece quatro categorias de direitos dos trabalhadores considerados fundamentais: a liberdade sindical e o reconhecimento efetivo do direito à negociação coletiva, a eliminação de todas as formas de trabalho forçado ou obrigatório, a abolição efetiva do trabalho infantil e a eliminação da discriminação em matéria de emprego e ocupação.

A partir daí, a OIT desenvolveu a Agenda do Trabalho Digno, que ampliou o conceito de trabalho digno para incluir outras questões relevantes, como a proteção social, o desenvolvimento de habilidades e competências, a igualdade de oportunidades e a promoção do diálogo social entre empregadores, trabalhadores e governos. Trata-se assim de um compromisso global para promover um mundo do trabalho mais justo e humano.

Estas são as principais medidas previstas pela Agenda do Trabalho Digno. Guarde esta informação e verifique quais as implicações para a sua situação profissional, quer como empregador quer como trabalhador.

Este artigo de Finanças Pessoais resulta de uma parceria da ComparaJá com o Dinheiro Vivo, com publicação semanal.