Catarina Gomes, in Jornal Público
Responsável diz que há regiões onde o transporte rápido está mais assegurado, como o Norte e Lisboa. O Alentejo está mais "desprotegido"
Uma dor num braço pode ser reumatismo, a dificuldade em articular palavras pode ser cansaço. Estes dois sintomas juntamente com a boca ao lado podem ser sintomas de acidente vascular cerebral (AVC) e são desconhecidos da maioria da população. O coordenador nacional para as doenças cardiovasculares, Ricardo Seabra-Gomes, afirma que se justificava uma campanha nacional informativa sobre estes sinais de alarme. Não avança "porque não quero criar falsas expectativas à população. Pode não existir capacidade do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM)". Hoje assinala-se Dia Nacional do AVC - que continua a ser principal causa de morte em Portugal.
Muitas pessoas esperam que os sintomas passem, ou esperam por um familiar que os leve ao médico ou vão para a urgência hospitalar mais próxima de casa. Errado, errado, errado. O mais indicado é mesmo ligar 112.
Desde há cerca de um ano que quem liga o número de urgências e é uma potencial vítima de AVC tem tratamento prioritário e é transportado para o hospital adequado: está a funcionar ainda em fase experimental a chamada Via Verde AVC.
É no espaço das três primeiras horas após os sintomas que há muito a fazer pela vítima de AVC. Existe mesmo um tratamento que pode deixar o doente ileso ou com menos sequelas. O tratamento chama-se trombólise, é uma injecção com um fármaco que, em 75 por cento dos casos, desfaz o coágulo que está a impedir o vaso, explica Seabra-Gomes. Nos casos mais frequentes, o AVC acontece quando as células cerebrais morrem ou deixam de funcionar porque lhes falta o oxigénio e os nutrientes por bloqueio do fluxo de sangue.
A trombólise é uma terapia que existe nos Estados Unidos desde 1999, na Europa desde 2002 e que chegou a Portugal há cerca de três anos, mas só no Porto e Lisboa, explica João Ramalho Fontes, responsável da Unidade de AVC do Hospital de São Marcos, em Braga, que passou a ter o tratamento há cerca de um mês. Dos 60 doentes com AVC admitidos na unidade, a injecção foi dada a 11, "alguns ficaram completamente ilesos, outros com melhorias do seu défice". Os restantes doentes foram excluídos porque a terapêutica não era adequada ao caso ou porque não chegaram em menos de três horas.
O médico de Braga afirma que o atraso da chegada da terapêutica a todo o país teve ver com "atrasos de organização". Só neste ano passaram a existir unidades de AVC em 16 hospitais de todas as regiões (em 2003 eram apenas três), explica Seabra-Gomes, médico responsável pela estrutura que funciona na alçada do Ministério da Saúde.
Seabra-Gomes afirma que este ano avançarão mais três unidades de AVC, que exigem sempre a existência de uma TAC e uma equipa de neurologistas. Neste momento diz que há capacidade de tratamento instalada e que podia ser altura para uma "campanha de massas" sobre sinais de alarme. "Ainda não houve divulgação" porque "o INEM não tem capacidade de resposta para todos os enfartes e AVC se for o público a chamar". Mas acredita que há regiões onde o transporte rápido está mais assegurado, caso da região Norte, Lisboa e Algarve. "O Alentejo é onde se morre mais, é a região mais desprotegida", diz.
No caso do AVC, afirma que o transporte rápido é a prioridade e não é obrigatório que haja um médico na ambulância - como indicam as directrizes divulgadas pela Ordem dos Médicos. "Não há número de médicos em número suficiente. O que interessa é o transporte rápido para sítios onde haja médicos", nota, "é um desafio de organização".