25.3.07

O que (quase não) mudou em 20 anos de integração na UE

Sofia Branco, in Jornal Público

Treze investigadores fazem, em livro, um balanço da integração europeia. E falam do que ficou por fazer

Portugal mudou com a integração na União Europeia, disso nenhum dos autores do livro Em Nome da Europa - Portugal em Mudança (1986-2006) tem dúvidas. Mas todos reconhecem, também, que as transformações estruturais profundas ficaram por fazer nos últimos 20 anos. Muito resumido, eis o balanço que 13 investigadores fazem dos 20 anos da integração de Portugal na UE, na compilação organizada por Marina Costa Lobo e Pedro Lains e editada pela Principia.

A economia

Os primeiros dez anos de integração tiveram "um impacte positivo no crescimento do PIB português", mas a segunda década caracterizou-se por "um abrandamento do crescimento", resume Pedro Pita Barros. A integração económica e monetária foi "menos ambiciosa do que a que estaria ao alcance do país", analisa Jorge Braga Macedo, realçando que Portugal não tem conseguido ou sabido "tirar partido das fases boas do crescimento económico europeu". Francisco Torres acrescenta que a adesão ao euro "foi entendida sobretudo como uma forma de assegurar a manutenção de ajudas financeiras".

A política

A pertença à UE tem contribuído para a "despolitização dos temas" e para desviar as atenções das desigualdades internas de cada Estado--membro para as menos significativas dicotomias entre Estados-membros ricos e Estados-membros pobres, avalia Manuel Villaverde Cabral. Os programas dos partidos não deram mais relevo à Europa nos últimos 20 anos, considera Marina Costa Lobo. Porém, realça, o tema vem à baila em tempo de eleições.

O Governo

Com a integração, o Governo reforçou a sua posição face à Assembleia da República e ao Presidente da República. Isto porque, explica Carlos Jalali, a União é mais executiva do que legislativa e "os governos são os principais actores nacionais junto das instâncias comunitárias". Marina Costa Lobo corrobora esta tese, sublinhando que o "partido que está no Governo beneficia com a UE", porque "ganha poder de informação em relação aos partidos da oposição", porque "a UE funciona como um vínculo externo que credibiliza" as suas políticas "perante todos os outros actores sociais".

O poder local

Os fundos europeus contribuíram para uma "maior atenção ao ordenamento do território" e promoveram a relação entre autarquias locais e instituições europeias, analisam Linda Veiga e Maria Manuel Pinho. Porém, confirma-se "a influência de motivações políticas", com os partidos a recorrerem aos fundos comunitários "para melhorar a sua imagem perante o eleitorado nas vésperas das eleições".

A justiça

As mudanças geradas pela integração no plano jurídico são mais que muitas. Os Estados e também os cidadãos podem recorrer a tribunais europeus e as directivas comunitárias têm de ser vertidas para as legislações nacionais. Porém, avaliam Miguel Maduro e Francisco Pereira Coutinho, "Portugal diverge" dos outros Estados--membros "no ritmo de aplicação do direito da União Europeia". E a mentalidade judicial mantém-se, sensivelmente, a mesma - "os juízes portugueses raramente recorrem" ao Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias e denotam "algum alheamento", contribuindo pouco para o desenvolvimento do processo judicial europeu. Simultaneamente, há um "crescente número de acções por incumprimento" contra o Estado português.

A opinião pública

Continua a não existir uma opinião pública à escala europeia e "a cidadania europeia não dispõe, verdadeiramente, de canais para exprimir o seu eventual descontentamento", afirma Manuel Villaverde Cabral. Simultaneamente, diz Carlos Jalali, a sociedade civil portuguesa não conseguiu "ganhar protagonismo" no quadro da União Europeia. Tudo isto acabou por gerar um "descompasso entre os governos e as opiniões públicas dos Estados-membros" e uma "distância crescente entre os cidadãos e as instâncias europeias", identifica Villaverde Cabral. A baixa afluência às urnas em eleições para o Parlamento Europeu confirma isso mesmo, exemplifica, realçando que tais eleições "têm funcionado basicamente como testes aos governos".