Pedro Olavo Simões*, Jornal de Notícias
Portugal, que presidirá à União Europeia no segundo semestre de 2007, poderá ficar intimamente ligado a um futuro tratado constitucional, devendo preparar uma conferência intergovernamental para o efeito. Na Declaração de Berlim, feita para assinalar os 50 anos do Tratado de Roma, que instituiu a Comunidade Económica Europeia, 2009 surge como meta para a entrada em vigor do futuro texto fundamental. O documento foi assinado apenas por Angela Merkel, chanceler da Alemanha (que preside à UE), Durão Barroso, presidente da Comissão Europeia, e Hans-Gert Pöttering, presidente do Parlamento Europeu, perante os chefes de Estado e de Governo dos 27, alguns deles menos optimistas.
Gorado, para muitos, o sonho de ver uma Constituição europeia a vigorar à data do cinquentenário, devido à negação expressa nos referendos francês e holandês, é agora prioritário, como se nota na declaração, encontrar "uma base comum e renovada".Angela Merkel, anfitriã e protagonista da cimeira informal do fim-de-semana, disse, justamente, que a presidência portuguesa "poderá preparar-se", salientando que tudo será feito para "elaborar um roteiro", antes da cimeira europeia de Junho, que encerra a presidência alemã, fixando as grandes etapas necessárias à preparação de um novo tratado.
Merkel pretende, tal como fez para a obtenção da declaração ontem aprovada, "trabalhar duro" e manter conversações à porta fechada com todos os estados-membros. Diz que "a vontade existe", mas salienta que "é necessário chegar a acordo sobre um roteiro, que contemple determinadas medidas, sem antecipar um resultado" "Vimos hoje que o assunto não se torna mais fácil se tergiversarmos e adoptarmos uma atitude de expectativa".
Mas também há cepticismo entre os líderes europeus. O presidente da Polónia, Lech Kaczynski, considera "irrealista" a meta de 2009, que subscreveu. "Na declaração de Berlim está o objectivo, que alguns, como nós, interpretam de maneira realista... Compreendo que a senhora Merkel queira que o texto do tratado esteja pronto antes das eleições de 2009. É, talvez, um belo objectivo, mas parece-me irrealista", disse mostrando-se convicto de que uma futura Constituição europeia só poderá vigorar em 2011, atendendo à distância que vai do texto à ratificação.
Kaczynski e o irmão gémeo Jaroslav, o primeiro-ministro, são vistos como eurocépticos por vários dos parceiros europeus, tendo ficado perceptível que a Polónia será um duro negociador a ter em conta. É que a concordância de Varsóvia dependerá de alterações importantes ao esboço existente, designadamente no que respeita à figura de um presidente europeu a longo termo e de um ministro comum dos Negócios Estrangeiros. "Não estamos sós. Vários países querem riscar do tratado tudo o que sugira que a União Europeia é um Estado".
Mas outros simpatizaram com a linha traçada por Merkel. Estão entre eles, naturalmente, os portugueses, incluindo Durão Barroso, para quem a presidência portuguesa poderá ter "uma enorme responsabilidade", que é, também, "uma enorme oportunidade" para o país "mostrar o seu compromisso com a Europa, a sua convicção e a sua capacidade de gerar consensos".
Também o primeiro-ministro, José Sócrates, sustenta que Portugal desempenhará "um papel muito importante" no desenho de um novo tratado constitucional, se bem que não queira admitir o compromisso de que o texto esteja pronto antes do final da presidência portuguesa. Apenas dá destaque ao facto de que a Europa "assumiu com clareza", como maior desafio, o desbloqueamento do tratado constitucional, referindo que o compromisso assumido ontem "é o mais claro e o mais forte sinal do empenhamento da Europa na resolução do problema institucional".* com agências
Cavaco salienta necessidade de um novo fôlego político
"A União Europeia carece de um novo fôlego político, que lhe permita decidir e agir com mais legitimidade democrática, mais eficiência e maior coesão", disse o presidente da República, em consonância com as linhas apontadas em Berlim, nomeadamente por Angela Merkel. Cavaco Silva falava no Palácio de Belém, onde, pela manhã, teve lugar uma sessão comemorativa do cinquentenário dos tratados de Roma, tendo salientado que "é o próprio Mundo que reclama uma maior intervenção da Europa em defesa da paz, da estabilidade e equilíbrio das relações internacionais". Cavaco, que hoje promove uma reunião com "os funcionários executivos que criaram condições para uma boa adesão e o bom desempenho que se seguiu", marcada pela polémica ausência de ex-chefes de Governo, especialmente de Mário Soares, salientou, também, os desafios que se colocam à presidência portuguesa da União Europeia "A convergência de esforços e a mobilização de todos os intervenientes é um imperativo nacional".