28.2.09

A "ilusão" do proteccionismo "encontra mais terreno nos países mais fortes"

Sofia Branco, Bruxelas, in Jornal Público

A crise é "muito forte" mas não obriga à adopção de "legislação revolucionária". A Comissão Europeia admite adoptar medidas suplementares mas, para já, como está ça marche


O Comissário Europeu para o Emprego, Assuntos Sociais e Igualdade de Oportunidades, Vladimír Spidla, diz que a deriva proteccionista, que "encontra mais terreno nos países mais fortes", não deve ser subestimada, mas não é o centro do problema. A "pressão crescente para adoptar medidas proteccionistas" é um dos temas em discussão no conselho informal de chefes de Estado e de Governo da União Europeia, que decorre amanhã, em Bruxelas. A reunião extraordinária foi convocada para debater a coordenação de esforços no combate à crise económica e financeira.

Quais estão a ser os efeitos da crise económica no emprego?

O desemprego está a aumentar de forma muito, muito forte e poderá atingir os 10,5 por cento em toda a União Europeia. Esta é apenas uma previsão, a previsão média máxima. Claro que o desemprego não vai afectar todas as regiões da mesma maneira.
Quais serão mais afectadas?

Actualmente há problemas em Espanha, Irlanda, Inglaterra, Estados Bálticos... São os dados actuais, mas é difícil fazer previsões em situação de crise.

Que medidas está a Comissão Europeia a pôr em prática para combater o desemprego em particular?

A estratégia é clara. O primeiro passo, na verdade complexo, é o plano para relançar a economia europeia, no centro do qual está o trabalho. Não podemos estar contentes com as taxas de crescimento económico sem haver aumento de postos de trabalho. O objectivo maior é criar postos de trabalho de qualidade. Vamos utilizar todos os meios à nossa disposição: Fundo Social Europeu, Fundo da Globalização e fundos estruturais em geral. E também vamos utilizar muito a coordenação entre países-membros.

Esses fundos que mencionou têm dinheiro suficiente?

Até este momento, temos plena capacidade para trabalhar no quadro já decidido. É possível. Naturalmente, estamos a avaliar atentamente o desenvolvimento da questão e, se for necessário, adoptaremos medidas suplementares. Mas neste momento, e fazendo uma consideração geral, ça marche [o que há basta].

E a coordenação entre o plano de recuperação europeu e os planos de recuperação nacionais tem funcionado?

O resultado tem sido bastante bom. Claro que há problemas, pontos fracos.

Que pontos fracos?

Alguns países-membros não têm utilizado tudo o que está ao seu alcance. Por exemplo, continuamos a trabalhar muito nas deliberações sobre a reserva de cinco mil milhões de euros de que dispomos mas ainda não chegamos a resultados definitivos. A reserva existe mas ainda não há uma decisão sobre a forma como será libertada.

Que podem ser gastos em quê?

Segurança energética, alterações climáticas e estabilização ecológica (como desenvolver a energia solar, por exemplo), indústria e construção (melhoria da economia de energia nos edifícios, por exemplo). Mas a crise tem, sem dúvida, uma componente estrutural, o que significa que a economia europeia será diferente depois dela. Portanto, investir no capital humano e na formação de pessoas é de importância estratégica.

Acha que a emergência do proteccionismo é momentânea, neste tempo de crise, ou veio para ficar?

É preciso dizê-lo claramente: nenhum Estado-membro tem capacidade para agir de forma eficaz autonomamente [face à crise]. É impossível. Mas alguns países podem ter essa ilusão... Uma resposta eficaz tem de ocorrer ao nível europeu e ser coordenada. A longo prazo, e se andamos à procura da luz ao fundo do túnel, creio haver a consciência de que o proteccionismo é um beco sem saída. Actualmente, em todas as sociedades, há tendências não racionais, não justas e por vezes perigosas, com grande capacidade destrutiva. Estas forças aumentam em tempo de crise. Não podemos subestimar o perigo, mas o proteccionismo não está no centro do problema. O desemprego é que está.

Não subestimar significa exactamente o quê, da parte da Comissão?

Significa não fazer concessões no que é fundamental, por exemplo no que diz respeito às regras e estrutura do mercado interno. E passar uma forte mensagem política em defesa do mercado único e da livre circulação de trabalhadores, que nos darão força para sairmos da crise, que é grave. Sem isso não temos qualquer hipótese, qualquer hipótese... É preciso estarmos dispostos a batermo-nos por esta posição razoável e sólida.

No que respeita ao proteccionismo, está mais preocupado com este ou aquele país?

Não, não quero fazer uma tabela, seria muito subjectivo. Estamos a assistir a certas tentações e formulações sem dúvida próximas do proteccionismo. E é claro que os países mais pequenos não têm qualquer hipótese de desenvolver ideias proteccionistas. Essa ilusão encontra mais terreno nos países mais fortes no seio da União Europeia.

Em que circunstâncias a Comissão consideraria necessário adoptar uma iniciativa legislativa?

O corpo legislativo europeu que assegura o mercado único é sólido. Não vejo razões para mais iniciativas legislativas, pelo menos no meu domínio de competência. Naturalmente a crise vai exigir legislação nos planos económico e financeiro. A situação já o exigiu. Mas é um processo de ajustamento do sistema de mercado único. Não precisamos de legislação revolucionária. A grande questão, no meu domínio de competência, é saber como assegurar a protecção social no quadro do mercado único sem criar espaço para tentativas de proteccionismo.

Já disse que é preciso manter a vigilância. Que tipo de vigilância?

Uma vigilância flexível. No caso da banca, a Comissão Europeia tomou uma posição juridicamente sólida e politicamente compatível com as regras do mercado único, sem que tenha sido ideológica.

Quando conheceremos os resultados do estudo que pediu sobre a mobilidade de trabalhadores na União Europeia?

Depende dos parceiros sociais. Tenho insistido muito para que trabalhem rápido. A minha ideia mantém-se: são os parceiros sociais que melhor sabem o que é necessário, quer seja em tempo de crise quer seja em tempo de estabilidade.

Famílias com apoio para pagar a renda

Hugo Silva, in Jornal de Notícias

Câmaras de norte a sul do país implementam medidas de apoio social


A Câmara de Matosinhos criou um fundo de um milhão de euros para subsidiar o pagamento das rendas a famílias que se vêem em dificuldades devido à crise. As autarquias multiplicam medidas para tentar ajudar os munícipes.

"O difícil é encontrar quem não esteja a implementar planos contra a crise", diz Fernando Ruas, presidente da Associação Nacional de Municípios, reivindicando que o Governo inclua as autarquias numa estratégia nacional.

Com o agravamento da situação económica, muitas pessoas procuram as câmaras em desespero. Ontem, Matosinhos e Évora juntaram-se ao rol dos municípios com programas específicos para atacar a crise. A sul, foi anunciado um pacote de meio milhão de euros para apoio às famílias mais desfavorecidas do concelho. Em causa estão, entre outras medidas, a redução de 50% das rendas de habitação social e das tarifas da água e o reforço dos apoios sociais aos alunos do Ensino Básico. Foi lançado, também, o cartão solidário municipal, para apoiar os desempregados.

Em Matosinhos, o presidente da Câmara, Guilherme Pinto, apresentou um conjunto mais substantivo de ajudas. Só na área social, prevê-se um esforço financeiro de dois milhões de euros. Metade é para criar um fundo municipal de apoio ao arrendamento. Uma verba para ajudar famílias com casa no mercado privado (não moram em bairros sociais), mas que, devido à crise e a situações de desemprego, vêem--se sem possibilidade de pagar a renda. Uma medida que, por exemplo, também foi implementada em Guimarães. Guilherme Pinto revelou que um estudo encomendado pela Câmara de Matosinhos identificou cerca de mil famílias nessa situação.

O autarca explicou que o estudo não foi feito agora, mas que a Câmara decidiu antecipar a medida de ajuda, para responder à situação de crise existente e que levou ao aumento substancial do desemprego no concelho (6864 pessoas em Novembro do ano passado; 7369 em Janeiro).

No rol das "medidas pró-activas contra a crise", prevê-se, também, a contracção de um empréstimo para garantir o encurtamento dos prazos de pagamento aos pequenos e médios fornecedores (1300 empresas). O objectivo é pagar logo as facturas, em vez de demorar os habituais 60 dias. O plano inclui, ainda, um fundo de 500 mil euros para ajudar empresas.

Para contrariar a crise, a Câmara pretende, também, dinamizar o investimento. Nesse sentido, serão antecipados alguns projectos municipais (será pedido um empréstimo de 25 milhões de euros com esse objectivo) e a concretização de empreitadas aprovadas pelo Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN).

"Queremos dar um sinal de que Matosinhos é um município onde vale a pena investir e que também sabemos ser solidários com os mais desfavorecidos", sintetizou Guilherme Pinto.

27.2.09

CCDR mobiliza 200 milhões para mudar núcleos urbanos e combater a crise do Norte

Abel Coentrão, in Jornal Público

Núcleos urbanos de aglomerados com menos de oito mil habitantes tiveram direito a 83 milhões de euros, numa espécie de minipolis para o Interior


A Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (CCDR-N) espera mobilizar até ao final deste ano 200 milhões de euros, de um total de 350 milhões que o Programa Operacional O Novo Norte dedica a projectos de regeneração urbana. Com o combate à crise nas entrelinhas, a equipa que gere a componente regional dos fundos europeus juntou aos 49 milhões de euros aprovados já em 2008, para iniciativas maiores, um bolo de 83 milhões, impulsionadores de investimentos de 118 milhões em 44 concelhos. E há mais a caminho.

O pacote de investimentos ontem aprovado, 49 no total, privilegiou os núcleos urbanos com menos de 8 mil habitantes, sendo por isso um mini-polis com intervenção nos espaços públicos, nas infra-estruturas e equipamentos. "Não é dinheiro para rotundas nem pavilhões desportivos", notou o líder da CCDR-N, Carlos Lage, que espera que as obras cumpram o objectivo primordial: ajudar a criar condições de atractividade, que fixem população nos núcleos urbanos médios e mais pequenos desta região que, como o país, tem uma demografia a pender demasiado para o litoral.

"O nosso conceito de cidade não se limita a contabilizar cabeças. Quisemos proporcionar a todos os aglomerados urbanos a possibilidade de aceder ao Programa Operacional Regional. Este é o traço original da política de cidade definida para o Norte", notou Carlos Lage, que assumiu de seguida, sem complexos, que a provação destas candidaturas visa também prosseguir as directrizes do Governo, favorecendo a actividade económica local e regional. Aliás, a CCDR-N espera que as obras cujo financiamento está já aprovado comecem ainda este ano, pelo que Lage pediu "pressa" aos municípios. "Sei que as câmaras municipais têm múltiplas solicitações e algumas têm margem de manobra financeira reduzida, mas para a aplicação de fundos comunitários podem recorrer a empréstimos bancários", alertou o presidente da CCDR-N. ´

Os 44 municípios beneficiados juntam-se ao Porto, Vila Nova de Gaia, Maia, Bragança, Guimarães, Chaves, Régua e Bragança que, no ano passado, tiveram acesso a um total de 49 milhões para operações de regeneração urbana. E, neste momento, há um novo período de candidaturas aberto, com um bolo de quase 70 milhões de euros, ao qual podem concorrer os restantes concelhos da região. Os resultados serão conhecidos nas próximas semanas.

À espera da maior subida do desemprego dos últimos 23 anos

Sérgio Aníbal, in Jornal Público

Portugueses estão assustados com a ameaça do desemprego. Clima económico - em Portugal e na União Europeia - continua a bater mínimos


Desde, pelo menos, 1986 que os portugueses não tinham tanto medo de ver a taxa de desemprego a subir rapidamente. De acordo com o inquérito de confiança divulgado ontem pelo Instituto Nacional de Estatística e pela Comissão Europeia, a expectativa de aumento do número de desempregados em Portugal atingiu, durante o presente mês de Fevereiro, o valor mais alto alguma vez registado nos últimos 23 anos, o período para o qual foram publicados resultados.

"Como é que espera que o número de pessoas desempregadas varie durante os próximos doze meses?". Esta é a questão colocada em todos os países da União Europeia e a resposta, em Portugal, foi esmagadoramente no sentido da subida. O resultado do indicador em Fevereiro (que resulta da contabilização de respostas que vão de "subida aguda" até "descida aguda") foi de 78 pontos, num máximo de 100 pontos, segundo a Comissão Europeia. Este valor representa uma subida acentuada face aos 67 pontos registados em Janeiro, ultrapassando o anterior máximo de 73 pontos que se tinha registado em Outubro de 1993.

Se na população, a convicção é de que o desemprego vai subir de forma nunca vista, as perguntas feitas aos empresários sobre o que vai acontecer ao emprego dentro de cada uma das empresas mostra um cenário ligeiramente menos pessimista. Na indústria, nas respostas sobre qual a evolução do número de postos de trabalho em cada uma das empresas, o resultado voltou a ser bastante negativo (-31 em Fevereiro contra -30 em Janeiro). Ainda assim, o máximo histórico de -35 pontos em 1993 não foi batido. Nos serviços e na construção, o cenário é em tudo semelhante: o indicador voltou a cair em Fevereiro, mas, mesmo assim, ainda é melhor do que o registado na crise de 2003.

Clima económico afunda-se

O pessimismo em relação ao mercado de trabalho é um dos factores a contribuir para a deterioração do ambiente económico para níveis nunca vistos, tanto em Portugal como na Europa.

O indicador de clima económico português caiu de 65,8 em Janeiro para 61,2 em Fevereiro, voltando, deste modo, a bater o mínimo histórico. Na Zona Euro passou de 67,2 para 65,4 pontos.

Esta continuação da tendência de queda explica-se tanto pelo aumento do pessimismo entre os consumidores como entre os empresários da indústria, serviços, comércio a retalho e construção. Em Portugal, só neste último sector, o indicador de confiança, apesar de ter descido, não se encontra no valor mais baixo desde que há registos.
A quebra da confiança em Portugal e no resto da Europa é mais um indicador claro de que a contracção da economia registada no último trimestre de 2008 pode não ter sido o ponto mais baixo deste ciclo recessivo da economia. Até agora, os indicadores disponíveis para o primeiro trimestre de 2009 fazem adivinhar mais um período muito negativo para a actividade económica.

Para Portugal, o único ponto positivo nos indicadores de confiança ontem divulgados é o facto de os inquiridos mostrarem mais pessimismo em relação à situação geral da economia do que em relação à sua própria situação. Quando se pergunta a um consumidor quais as suas perspectivas para a situação financeira da sua família durante os próximos 12 meses, apesar do resultado estar próximo do mínimo histórico, a verdade é que se tem mantido estável desde o início do ano passado.

Isto pode estar relacionado com o efeito do abrandamento da inflação e da descida das taxas de juro que se têm vindo a registar. No entanto, a reacção dos consumidores perante estas boas notícias, mostra o inquérito de ontem, é o aumento da poupança, que está, dizem os inquiridos, ao nível mais alto de sempre.

a Ontem foi um dia negro para a General Motors (GM). Além de ter anunciado os segundos piores resultados financeiros da sua história (os maiores foram em 2007), a fabricante norte-americana deparou-se com o protesto de milhares de trabalhadores da sua marca Opel. À porta da sede, em Frankfurt, na Alemanha, milhares de funcionários reivindicaram que a GM reveja os seus planos de encerrar fábricas europeias. Este clima conturbado agudizou-se ontem, depois de a GM ter anunciado perdas de 9,6 mil milhões de dólares (cerca de 7,5 mil milhões de euros) no último trimestre do ano passado, empurrando as perdas anuais para os 30,9 mil milhões de dólares. As receitas da fabricante, que até há bem pouco tempo era a maior do mundo, caíram mais de um terço, para os 30,8 mil milhões de dólares em 2008. Nos últimos quatro anos, a GM perdeu 82 mil milhões de dólares e cortou 92 mil postos de trabalho. A.R.F.

61,2
De acordo com os números publicados pela Comissão Europeia, o indicador de clima económico em Portugal caiu em Fevereiro para um novo mínimo, sinal de que a retoma ainda está longe

Confiança das famílias ao mínimo em 22 anos

Rudolfo Rebêlo, in Diário de Notícias

Conjuntura. Para os portugueses, Fevereiro foi o mês mais negro dos últimos anos. A confiança dos consumidores, empreiteiros, industriais e lojistas atingiu o ponto mais baixo. Famílias dizem que vão adiar compras de bens como automóveis e os industriais queixam-se da fraca procura


Fevereiro é um mês negro. Um rol de queixas sobre a capacidade de melhorar o rendimento ou sequer de constituir um pé-de-meia colocou a confiança das famílias no ponto mais baixo dos últimos 22 anos. Aumentou o número de portugueses que nos últimos 12 meses relatou dificuldades financeiras do seu agregado familiar e os que declararam ao INE que não conseguem, actualmente, poupar dinheiro.

Um inquérito a dois mil portugueses, efectuado pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), demonstra que as perspectivas financeiras das famílias para os próximos 12 meses são más. Pela amostra, a maioria dos consumidores teme o desemprego e afirma que a situação financeira doméstica vai piorar nos próximos tempos. É que, endividados, se hoje já não conseguem poupar, também não o conseguirão nos próximos meses.

Comprar bens duradouros como carros ou electrodomésticos nos próximos meses? Talvez influenciados pelo medo do desemprego - ou mesmo pelas notícias pessimistas sobre o andamento da economia - a esmagadora maioria dos inquiridos está céptica quanto à possibilidade de se "meter" em grandes compras.

Uma esmagadora maioria dos consumidores não tencionava (em Fevereiro) comprar carro - novo ou usado - nos próximos 12 meses. Tão-pouco promover obras em casa ou mesmo comprar habitação com recurso a empréstimo bancário.

Os lojistas confirmam o pessimismo dos consumidores. A maioria afirma que é a escassa procura o maior obstáculo à actividade.

Neste mês aumentou o números de comerciantes assegurando que as vendas pioraram nos últimos três meses. E para os próximos três meses há cada vez mais lojistas a afirmarem que o movimento das caixas registradoras será menor, a avaliar pelo indicador da actividade.

Na cadeia do comércio, também os grossistas relatam dificuldades. As apreciações sobre o volume de vendas registaram um novo mínimo desde Junho de 1994. Menos encomendas à actividade tiveram como consequência menos ordens de importações de produtos, de acordo com inquérito realizado em Janeiro.

Também os industriais estão com a moral no ponto mais baixo dos últimos 20 anos. Esta fraqueza no "estado de alma" tem como base a fraca carteira de encomendas, a baixa expectativa da produção fabril e de exportações, bem como o nível dos stocks de produtos acabados.

Uma insatisfação que já vem de trás. Em Fevereiro, aumentou o número de industriais que relatam uma queda da produção nos últimos três meses, bem como os que se queixam da fraca procura interna e externa, o que está em linha com as estimativas divulgadas sobre o estado da economia portuguesa e europeia.

Para o próximo trimestre, a maioria dos industriais (no sector dos bens de consumo) não antecipa uma melhoria da actividade. Pelo contrário, afirma que a produção vai descer. Pelo sexto mês consecutivo, o número de semanas de produção assegurada caiu - passando para as 22,8 semanas - e há mais empresários com expectativas negativas em relação às exportações. Ao mesmo tempo, o esmagamento das margens comerciais (para ganhar competitividade) ou reflexo da queda no custo das matérias-primas, a verdade é que há mais gestores a relatarem um eventual queda de preços à saída das fábricas.

Os construtores de obras públicas continuam deprimidos. A produção assegurada baixou para oito meses (nove meses em Janeiro) e há relatos de aumento de entraves ao crédito bancário.

Nível de confiança dos portugueses no valor mais baixo em 20 anos

A.P.L., in Jornal de Notícias

A confiança dos consumidores e empresários portugueses está ao nível mais baixo dos últimos 20 anos. O pessimismo acentua-se à medida que as perspectivas económicas pioram e o desemprego aumenta.

Os dados de Fevereiro, do Inquérito à Conjuntura às Empresas e aos Consumidores, publicados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), mostram que o país segue o pessimismo da Europa, onde os índices de confiança estão nos níveis mais baixos desde 1985 (ano em que esta informação começou a ser divulgada).

O indicador de confiança dos consumidores em Portugal caiu "significativamente", refere o INE, acentuando o movimento negativo iniciado em finais de 2006 e atingindo um novo valor mínimo histórico (53,9), inferior ao valor de 22,9, registado em Junho de 1986, data do início da série estatística. A generalidade dos portugueses está preocupada, sobretudo, com a evolução do desemprego e da situação económica do país, mas também teme a situação financeira nas suas casas e a dificuldade em poupar dinheiro nos próximos 12 meses.

Nas empresas, o sentimento negativo mantém-se desde Março de 2008, e apresentou, igualmente em Fevereiro, um novo mínimo histórico desde 1989. Os empresários do sector dos serviços são os menos confiantes, com apreciações negativas em todas as componentes.

Na Zona Euro, os indicadores de confiança também estão em mínimos históricos, ao assinalar, em Fevereiro, o valor mais baixo desde 1985. A falta de confiança dos europeus reflecte o abrandamento da actividade económica e, principalmente, a subida do desemprego. A expectativa é que face a este cenário, o Banco Central Europeu baixe as taxas de juro.

Líder nacionalista assegura que trabalhadores portugueses são "muito bem vindos" na Galiza

in Jornal de Notícias

O líder dos nacionalistas galegos, Anxo Quintana, assegura que os trabalhadores portugueses são "absolutamente bem vindos" na Galiza, defendendo a importância de uma relação estratégica com Portugal.

"Os trabalhadores portugueses são absolutamente bem vindos. Nós defendemos que a relação da Galiza com Portugal e as suas gentes deve ser convertida numa relação estratégica", afirmou Quintana, actual vice-presidente da Junta da Galiza, à Agência Lusa.

Para o presidente do Bloco Nacionalista Galego (BNG), existem vários laços que unem Portugal e a Galiza, especialmente a língua, que considerou ser "fundamental".

Num balanço da campanha para as eleições autonómicas que se realizam domingo na Galiza, Anxo Quintana manifestou satisfação, considerando que "a corrente de simpatia com o nacionalismo galego é imparável e prenuncia um grande resultado eleitoral".

"O BNG é a força política em ascenção na Galiza, onde os partidos de âmbito nacional estão a descer ou estagnaram", defendeu.

Anxo Quintana admitiu que nenhum dos partidos concorrentes às eleições de domingo deverá alcançar a maioria absoluta, adiantando que os nacionalistas "vão procurar a formação de uma maioria parlamentar que dê estabilidade ao futuro governo".

Nesse sentido, rejeitou liminarmente qualquer entendimento com o Partido Popular (PP), de Alberto Feijóo, que acusou de "não saber dialogar", mas admitiu uma nova coligação com os socialistas, igual à que sustenta o actual executivo da Galiza.

"Somos duas culturas políticas muito distintas, temos dois projectos políticos distintos e até distantes, mas acho que temos demonstrado capacidade de acordo e de entendimento", afirmou.

Questionado sobre uma coligação em que um dos partidos defende que a Galiza deve assumir-se como independente, Anxo Quintana desvalorizou o problema, frisando que "um governo de coligação não implica que os seus componentes abdiquem das suas ideias".

"O que nós pretendemos é que a idéia de Galiza como nação vá abrindo caminho na sociedade e isso acho que estamos a conseguir, como se vai comprovar, sem dúvida, no resultado eleitoral de domingo", afirmou.

Relativamente à actual crise económica e social, que dominou as atenções na campanha, o líder dos nacionalistas galegos defendeu a necessidade de "um novo modelo de organização da sociedade, baseado na economia produtiva e não na economia especulativa".

"Defendemos um modelo que dê mais protagonismo ao sector público e seja mais justo na repartição da riqueza", afirmou, defendendo a necessidade de os trabalhadores "recuperarem poder de compra para podermos sair da crise".

Para Quintana, "o colapso financeiro só será ultrapassado se forem criadas no sector público entidades que permitam que o crédito volte a chegar às empresas e às famílias".

"É por isso que propomos a criação de uma banca pública galega", frisou Anxo Quintana.

FR.Lusa/fim

"Novo" Europarque prevê criação de 4900 empregos

Hugo Silva, in Jornal de Notícias

Área Metropolitana Associação Empresarial continua a não dizer onde ficará a Exponor


O novo plano de expansão do Europarque, na Feira, e da respectiva envolvente implica um investimento de 460 milhões de euros e prevê a criação de 4900 empregos. A futura localização da Exponor continua a ser segredo.

"Trazer a Exponor para Santa Maria da Feira era um mau negócio para todos", sentenciou José António Barros, presidente da Associação Empresarial de Portugal (AEP), limitando-se a repetir que o equipamento ficará a Norte do rio Douro e perto do aeroporto. Actualmente, está em Matosinhos (a Norte do rio Douro e perto do aeroporto), mas também a Maia (a Norte do rio Douro e perto do aeroporto) surge como hipótese para a instalação da feira de exposições. Jorge Reis, administrador da AEP, admitiu um "namoro recíproco" com as duas câmaras.

O futuro do Europarque e da envolvente foi desvendado, ontem, em Santa Maria da Feira. Os responsáveis da AEP apresentaram um novo plano de expansão, que começou ontem mesmo a materializar-se, com o lançamento da primeira pedra do futuro parque de ciência e tecnologia. O Feira Park pretende atrair empresas ligadas ao conhecimento, à tecnologia e à inovação.

Por outro lado, dentro de aproximadamente um mês, o Visionarium vai transformar-se num centro de realidade virtual, com duas vertentes: uma mais educativa, com exposições que levarão os visitantes a viajar no interior de diferentes ambientes; outra mais empresarial, com a criação de uma unidade de produção industrial de realidade virtual. O investimento é de nove milhões.

E de concreto, por agora, nada mais. O plano de expansão do Europarque e do território circundante, que abrange terrenos de Santa Maria da Feira e de Ovar, tem um conceito, muitas hipóteses, mas será preciso encontrar investidores interessados em concretizar as intenções apresentadas. No total, são abrangidos 681 hectares (583 em Santa Maria da Feira, o restante no concelho de Ovar). Jorge Reis revelou que no prazo de nove meses estará concluído o plano geral do projecto, que conta com a parceria das autarquias cujo território é abrangido. Ficará definido, então, o que poderá ser executado em cada área. Depois, será necessário conseguir investidores. Jorge Reis salvaguardou que essa procura pode ser feita mesmo enquanto o plano geral não fica pronto.

O prazo de concretização no terreno do programa de expansão é de cinco anos. Jorge Reis acredita que será possível cumprir o desiderato.

As propostas de ocupação do território ontem apresentadas são muito variadas e passam por unidades hoteleiras, residências de repouso, um campo e uma escola de golfe, um trade mark, um centro comercial hi-tech, um centro hípico e um centro cultural, entre outros equipamentos. Exponor é que não. O antigo plano de expansão, que chegou a ser classificado como Projecto de Interesse Nacional (PIN), está definitivamente enterrado.

"As associações não devem concorrer com as empresas", referiu José António Barros, lembrando que o anterior projecto tinha uma vertente imobiliária muito elevada.

O presidente da AEP explicou, ainda, que a ampliação permitirá a instalação de um conjunto de 150 a 200 empresas. Mas "empresas modernas, amigas do ambiente". "Não falamos de chaminés, efluentes nem estações de tratamento de águas residuais", salvaguardou.

Portugal é o quinto país com mais desempregados

in Jornal de Notícias

A taxa de desemprego subiu na Zona Euro para os 8,2 % e em Portugal para os 8,1 % em Janeiro, de acordo com os dados divulgados pelo Eurostat. Na Europa comunitária, há apenas quatro países com mais desempregados do que Portugal.

Nos países da Zona Euro, o valor de Janeiro, 8,1% compara com a taxa de 8,1 % verificada em Dezembro (7,3 % no mês homólogo). Em Portugal, a taxa de desemprego subiu de 7,9 % em Dezembro de 2008 para 8,1 % em Janeiro deste ano, contra os 7,7 por cento verificados em Janeiro de 2008.

Dados que colocam portugal como o quinto país da Europa comunitária com mais desempregados. Números só superados pela Espanha, novamente nos dois dígitos, com uma taxa de 14,8%, Eslováquia (9,8%), Irlanda (8,8%) e França (8,3%).

Aumentam pedidos de apoio à Cáritas da Terceira

Tibério Cabral, in Expresso das Nove

Mais de duzentos novos casos de pobreza foram detectados o ano passado por aquela organização católica, na ilha lilás, em agregados que entraram em ruptura financeira. Duas instituições de solidariedade social, ligadas à igreja católica, têm vindo a apoiar novas famílias que entram em situação de ruptura financeira.

De facto, a Cáritas da ilha Terceira registou, de 2007 para 2008, um aumento significativo em relação ao número de pessoas que pediram ajuda. Precisamente mais 222 novos casos: "Na verdade, são cada vez mais as pessoas que nos procuram e que trazem com elas graves problemas", confirma Anabela Borba, presidente da direcção da Cáritas da ilha Terceira. A dirigente considera que o aumento de novos pobres poderá estar relacionado com a tão falada recessão económica, que deu origem ao desemprego deixando muitas famílias numa situação difícil.

Na realidade começam a surgir novas formas de pobreza: "n passado, a Cáritas era procurada apenas por pessoas sem trabalho, maioritariamente com pouca orientação e/ou perspectiva de vida. Hoje, somos procurados também por pessoas que trabalham, mas cujos salários são muito baixos, alguns jovens que têm vontade de vencer na vida, mas que por mais que se esforcem não conseguem criar/ encontrar condições, e por idosos com baixos recursos", afirma ao expressodasnove.pt, esta engenheira de profissão.

Anabela Borba, que tem larga experiência de trabalho no terreno, considera que, na maior parte dos casos, as famílias que pedem ajuda são multi-problemáticas, apresentando diversos problemas que afectam o núcleo familiar.

"No entanto, o principal motivo pelo qual estas famílias procuram ajuda é a escassez de rendimentos, estando esta relacionada com vários factores, nomeadamente, o desemprego de longa duração, a baixa escolaridade, as elevadas despesas com dívidas e contas mensais, as dependências, a doença, entre outros".

Segundo a dirigente, existem algumas famílias que têm graves problemas no que diz respeito à capacidade de gestão doméstica: "esta situação poderá estar relacionada com o facto de a pobreza ter um carácter cumulativo, ou seja, existe uma transmissão geracional. Estas famílias não conhecem outra realidade".

Segundo relatos fidedignos da imprensa, no Continente, os agregados que, no passado, ajudavam famílias pobres, estão agora eles próprias a pedir apoio a organizações de solidariedade social. Um problema que já chegou também à ilha Terceira. "Estas situações começam a ser comuns. Existem muitos agregados familiares que procuraram a ajuda social pela primeira vez, tendo-se observado que eram famílias que até tinham boas/normais condições de vida, mas que devido ao desemprego, divórcio ou doença, tiveram que procurar ajuda. Nestas situações, existem muitos casos que nos são encaminhados por familiares, amigos ou vizinhos, pois as famílias têm vergonha de procurar ajuda", revela a presidente da direcção da Cáritas da Ilha Terceira.

Anabela Borba recorda que a organização tem como objectivo principal ajudar a colmatar as necessidades básicas das pessoas em situação de carência: "tentamos dar uma resposta imediata às situações de maior emergência social. Aí o nosso auxílio vai da ali- mentação, aos medicamentos, roupa, mobília etc.

"No entanto, não nos satisfazemos com isso. Temos consciência de que a nossa acção não poderá resumir-se a este gesto; temos que ajudar na promoção e desenvolvimento do indivíduo. Neste sentido, desenvolvemos vários projectos de promoção como sejam: o Programa Itineris, para jovens em risco, dando-lhes a oportunidade para estudar e de simultaneamente aprenderem uma profissão, enquanto os ajudamos a crescer como pessoas, melhorando as suas competências pessoais".

A Cáritas da Ilha Terceira promove também cursos de alfabetização e actualização de compEtências de literacia, para públicos adultos, assim como ajuda na procura activa de emprego e um envolvimento cada vez mais forte com empresas, nomeadamente ao nível da formação profissional em contexto de trabalho.

A presidente da direcção da Cáritas da Ilha Terceira admite que o rendimento social de inserção pode ser um instrumento de almofada social: "mas vejo-o como o mí- nimo dos mínimos, com pouco ou nenhum sucesso como instrumento de reinserção, mas útil, indispensável mesmo, para minimizar em primeira linha a fome, mas também como saída de situações de exclusão", afirma com convicção.

Rendimento social de inserção deve ser transitório

"Salvo determinadas excepções, de acumulação de vários factores conducentes à exclusão social, o Rendimento Social de Inserção (RSI) deve ter um carácter transitório, claramente definido nos acordos de inserção, para que a almofada não se transforme em sofá ou colchão". Quem o afirma, com fina ironia, é a presidente da direcção da Cáritas na Terceira. "Há todavia um problema de base no RSI - explica Anabela Borba - um problema de paradigma. O RSI é visto como financiamento (logo, desperdício) e não como investimento. É fundamental uma mudança de abordagem, tendo em vista a consideração do apoio como um investimento, já que terá de dar frutos que depois terão de ser avaliados. Um paradigma deste tipo credibiliza e é exigente na proporção exacta do que cada agregado familiar pode oferecer, realisticamente. Outra mudança crucial põe-se ao nível do discurso vigente sobre esta temática. Seria importante que a condenação fácil e imediata dos desvios ao RSI fosse equiparada ao enriquecimento ilícito. Em natureza são desonestidades comparáveis, já em magnitude nem por isso", conclui o seu raciocínio.

26.2.09

Portugueses recorreram menos ao crédito em 2008

in Jornal Público

Os empréstimos concedidos pelas instituições de crédito especializado a operar em Portugal diminuíram 5,1 por cento em 2008, para 5,5 mil milhões de euros, face ao ano anterior, anunciou ontem a associação do sector.

"O crédito atribuído no terceiro trimestre pelas sociedades pertencentes à ASFAC - Associação de Instituições de Crédito Especializado, contraria a tendência observada nos últimos anos, ao registar o menor valor ao longo do ano, de 1,2 mil milhões de euros", refere em comunicado o presidente da associação, António Menezes Rodrigues.
O especialista referiu também que o crédito clássico concedido ascendeu a 2,6 mil milhões de euros, dos quais 92,6 por cento se destinaram a particulares, isto é, crédito para o consumo e 7,4 por cento foram canalizados para as empresas.

O crédito clássico, que representa metade do total dos empréstimos, registou uma quebra de 5,9 por cento em relação a 2007. Os particulares foram responsáveis pela redução de 6 por cento neste tipo de crédito, enquanto as empresas se ficaram por uma quebra de 4 por cento.

A ASFAC destaca que "apenas o crédito a particulares revelou uma forte contracção no último trimestre."

Já o crédito revolving, que se caracteriza pela existência de planos flexíveis de amortização da dívida, bem como pela existência de um plafond de crédito, que poderá estar ou não totalmente utilizado (atribuído antes da aquisição do bem ou serviço), totalizou 868 milhões de euros em 2008.

"Com um comportamento muito estável ao longo de 2008, o crédito a fornecedores revelou valores próximos de 500 milhões de euros por trimestre, totalizando 1,9 mil milhões de euros de crédito concedido para a constituição de stocks - valor 10,1 por cento inferior ao de 2007", salienta a associação.

Quanto ao destino dos valores concedidos no crédito clássico, 68,8 por cento destinou-se à aquisição de meios de transporte, 12,1 por cento a crédito pessoal e 16 por cento à aquisição de artigos para o lar. "Este último tipo de crédito revelou um crescimento de 10,3 por cento face ao ano de 2007", sublinha a ASFAC.

A associação indica também que foram celebrados, ao longo do ano de 2008, 660 mil contratos de crédito clássico, mais 10,9 por cento do que em 2007. Lusa

Confiança dos empresários e consumidores europeus em mínimos históricos

Por Eduardo Melo, in Jornal Público

A confiança dos empresários e dos consumidores caiu, em Fevereiro, para o nível mínimo histórico na zona euro e em Portugal, anunciou hoje a Direcção-Geral para os Assuntos Económicos e Financeiros da Comissão Europeia, prosseguindo a tendência dos últimos meses e demonstrando a actual fraqueza das economias do espaço do euro.

O indicador de sentimento económico da zona euro baixou para 65,4 pontos, menos 1,8 pontos do que em Janeiro, sob a influência da degradação da confiança de quase todos os sectores, à excepção do retalho, que recuperou um ponto (menos 19 pontos).

Para Portugal, o mesmo indicador sofreu um forte desaire de 4,6 pontos entre Janeiro e Fevereiro, cotando-se nos 61,2 pontos. Os agentes de todos os sectores de actividade estão cépticos em relação ao futuro dos seus negócios, tendo em conta o agravamento da recessão interna e internacional e à ausência de soluções que, no imediato, consigam reverter a situação. Os consumidores acompanham esse sentimento, principalmente por causa do agravamento do desemprego.

Um outro indicador europeu, o do clima económico, baixou igualmente para o valor mínimo dos últimos 24 anos, data que coincide com o início dos inquéritos realizados pelos serviços da Comissão aos empresários.

Governo não vai alterar subsídio de desemprego

Susete Francisco, in Diário de Notícias

Debate. Oposição a uma voz exige mais medidas

Governo não vai alterar subsídio de desemprego


Primeiro foi Jerónimo de Sousa. Depois Paulo Rangel. Seguiram-se Paulo Portas, Francisco Louçã e Madeira Lopes. Para todos, José Sócrates teve uma única resposta: Portugal tem um dos subsídios de desemprego mais longos da Europa, a taxa de substituição é das mais altas da OCDE. Tradução: o Governo não vai mexer no subsídio de desemprego.

Os dados mais recentes do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP), que apontam para mais 70 mil inscritos nos centros de emprego, só no passado mês de Janeiro, atravessaram ontem as intervenções de toda a oposição, durante o debate parlamentar com José Sócrates. O primeiro-ministro respondeu com o primeiro mês de execução da Iniciativa Emprego 2000 - "Cerca de 1800 trabalhadores estão abrangidos por formação em período de redução de actividade; cerca de 3000 jovens estão a beneficiar de estágios profissionais; 11 mil desempregados beneficiam de empregos de transição".

Argumentos que não convenceram a oposição. Jerónimo de Sousa, que ontem abriu o debate quinzenal pelo PCP: "A sério, vocês não sabem o que estão a fazer, particularmente aos jovens." Paulo Portas, pelo CDS: "Os antigos administradores do BPN têm o descaramento de se apresentar ao subsídio de desemprego, mas os jovens com menos de um ano de trabalho não têm acesso, os casais no desemprego não têm majoração".

Outro dos temas que ontem dominou o debate foi a decisão da Caixa Geral de Depósitos (CGD) de comprar acções da Cimpor ao empresário Manuel Fino, no valor de 62 milhões de euros. Já à saída, em declarações aos jornalistas, Sócrates afirmou que só soube deste negócio (que já motivou pedidos de explicação até de socialistas) no dia de ontem, "pela comunicação social". Não tinha que saber, argumentou o primeiro-ministro, que durante o debate tinha já defendido que o Governo não dá "orientações para actos de gestão em concreto". "A orientação que o Estado deu à CGD foi no sentido de orientar a sua acção para dar mais crédito à economia portuguesa", afirmou o líder do Executivo. Já o ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, argumentou que a CGD evitou com aquela decisão "registar um prejuízo de 80 milhões de euros nos resultados". Francisco Louçã, pelo BE, retomaria o tema: "É extraordinária a facilidade com que dinheiro público pode ser lançado para um prémio individual".

Mau uso dos dinheiros públicos foi também uma crítica ouvida na bancada do PSD, com o líder parlamentar, Paulo Rangel, a acusar o Governo de gastar 4,5 milhões de euros em cerimónias de inaugurações - 500 mil euros em cada uma. "O Estado não paga um euro", responderia Sócrates, acusando o PSD de uma "manobra de diversão". O ministro das Obras Públicas, Mário Lino, também desvalorizou: "O PSD falou em cerca de quatro milhões de euros a dividir por mais de 600 inaugurações. Nem sabia que era tão pouco. Mas não é o Estado que gasta, mas sim a concessionária".

Durante o debate, Rangel acusou ainda o Governo de estar a prever a construção de uma terceira auto-estrada entre Lisboa e Porto - uma soma das quatro concessões rodoviárias lançadas nos últimos meses pelo Executivo. É a política da "auto-estrada cor de rosa", acusou, numa questão que ficou sem resposta.

Crimes contra crianças no registo criminal por 20 anos

in Jornal de Notícias

O Governo aprovou esta quinta-feira uma proposta de lei impondo que os crimes de abuso, exploração sexual de crianças e de violência doméstica apenas sejam apagados do registo criminal 20 anos depois da extinção das penas.

Em conferência de imprensa, no final do Conselho de Ministros, o titular da pasta da Justiça, Alberto Costa, afirmou que a proposta de lei agora aprovada "é uma novidade" no direito português" e que visa "reforçar a protecção de crianças e jovens contra situações de abuso e exploração sexual".

Até agora, pela lei portuguesa, este tipo de crimes apenas constavam no registo criminal entre cinco e 15 anos, dependendo da sua gravidade.

Segundo o ministro da Justiça o diploma "introduz-se um mecanismo de aferição da idoneidade, que é aplicado a todas as pessoas que se candidatem a profissões ou actividades em que haja contacto regular com crianças".

"As entidades recrutadoras devem em todos os casos ponderar a informação que resulte de um certificado de registo criminal cuja apresentação é obrigatória. Também no domínio da adopção e de decisões que se encontrem relacionadas com a entrega ou confiança de menores, a autoridade judiciária passa a aceder à informação do registo criminal no sentido de proceder à aferição da idoneidade das pessoas em causa, podendo esta consulta abranger igualmente que coabitem com a pessoa candidata", sublinhou também Alberto Costa.

Neste contexto, o ministro da Justiça referiu que estas mudanças na legislação implicarão a partir de agora "actualizações no regime do registo criminal, nomeadamente a previsão de que só haverá cancelamento definitivo do registo das condenações depois de decorridos 20 anos sobre a extinção das penas, o que é uma novidade no direito português".

Erradicação da pobreza é uma prioridade

in Agência Ecclesia

Bento XVI apela ao compromisso da comunidade internacional contra a crise alimentar e pelo desenvolvimento rural


Bento XVI defendeu hoje a necessidade de promover novas estratégias para combater a “pobreza rural” e promover o desenvolvimento junto destas populações.

O Papa, que recebia os membros do Fundo Internacional para o desenvolvimento agrícola (IFAD), das Nações Unidas, lembrou a importância dessas estratégias à luz dos “efeitos nefastos sobre a segurança alimentar” provocados pela instabilidade de preços dos produtos agrícolas.

“Os objectivos destinados a erradicar a pobreza extrema e a fome, bem como à promoção da segurança alimentar e do desenvolvimento rural, longe de serem demasiado ambiciosos ou irrealistas, tornam-se neste contexto imperativos que vinculam toda a comunidade internacional”, disse.

Bento XVI elogiou o trabalho da IFAD, sublinhando o valor da “cooperação e da corresponsabilidade” entre os países ricos e em vias de desenvolvimento, com a missão de erradicar a pobreza. Em particular, destacou o apoio oferecido aos produtores locais, que “serve para reconstruir a economia”.

“Neste sentido, os projectos de crédito rural, destinados a ajudar os pequenos agricultores e trabalhadores sem terra que seja propriedade sua, podem estimular a economia e garantir uma maior segurança alimentar para todos”, indicou.

No seu discurso, o Papa referiu-se ainda às condições de vida das populações indígenas, sublinhando que os projectos de crédito rural podem ajudar estas comunidades a prosperar no seu próprio território, vivendo em harmonia com a sua cultura tradicional.

Bento XVI falou do contributo dado, a este nível, pelas ONG’s, muitas das quais ligadas à Igreja Católica, motivadas “pelo amor aos pobres, amor que não pode tolerar a injustiça ou a privação, amor que se recusa a estar satisfeito enquanto a pobreza e a fome não forem banidas da nossa vivência social”.

Igreja mobiliza-se contra a crise

in Agência Ecclesia

Quaresma é marcada por apelos em favor da partilha e da solidariedade por parte dos Bispos do nosso país


A crise económica e financeira mundial que ganha impactos particulares na sociedade portuguesa é a preocupação dominante dos Bispos portugueses. As consequências sociais são uma realidade próxima de quem acompanha a vida em cada diocese, traçando um quadro de atenção aos mais pobres, sejam famílias carenciadas, os sem-abrigo ou crianças.

A atenção cristã e solidária está patente nos destinos das renúncias quaresmais de 2009. D. Manuel Quintas, bispo do Algarve, indica que os cristãos não podem “ficar surdos ao clamor dos pobres ou fechar o coração diante do sofrimento dos outros” perante a “insegurança e a instabilidade geradas pela crise financeira, económica e social em que vivemos”. Já D. Manuel Pelino, Bispo de Santarém, dá conta de um “momento de profunda crise da economia que se traduz numa crise social que a todos atinge e preocupa. Cada vez há mais necessitados”.

Mas se as mensagens se revestem de alertas, não ganham a forma de lamentos. Vários bispos afirmam que a crise constituiu uma oportunidade para mudar de vida. D. Manuel Pelino indica ser uma ocasião para “rever o modelo de sociedade e o estilo de vida pautado pelo consumismo desenfreado”. O bispo de Santarém evoca em especial os cristãos, para quem esta situação é um convite “a pôr em prática o estilo de vida evangélico, mais simples e austero, menos consumista e menos egoísta, menos centrado em cada um e mais solidário”. Também D. Januário Torgal Ferreira, bispo das Forças armadas e de Segurança apela “à coerência e à moderação”. D. António de Sousa Braga, bispo de Angra, fala num “salto de qualidade na civilização humana”.

A diocese de Leiria – Fátima, com vista à praxis cristã, elegeu o centro de acolhimento da paróquia da Sé de Leiria e a Comunidade Vida e Paz, concretamente na ajuda aos sem-abrigo, pois, indica o bispo, “num ano marcado pela crise sócio-económica as primeiras vítimas são os mais pobres”.

A diocese de Lisboa volta-se para as crianças da Casa do Gaiato, apostada em continuar a obra do Padre Américo que promoveu a educação e reintegração de crianças e jovens em risco. Coimbra vai apoiar também os mais pequenos da Casa de Mira da Obra do Frei Gil, privilegiando ainda as crianças, cujos pais estão desempregados, com uma colónia de férias. As crianças de Setúbal vão ter também a ajuda do Ordinariato Castrense, que vai apoiar a Congregação das Missionárias da Caridade.


Famílias carenciadas


A preocupação com a Igreja doméstica é recorrente no episcopado português. Afectadas por créditos e endividamentos, desemprego ou empregos precários, são muitos os casos que chegam aos responsáveis diocesanos, quer directamente quer também através das Caritas.

Algumas dioceses, já consequência do aumento da pobreza e dos pedidos de ajuda, constituíram, em anos anteriores, Fundos Sociais diocesanos.

Angra dispõe também de um Fundo de Solidariedade de ajuda às famílias em maiores dificuldades apostada em quebrar o “fosso entre pobres e ricos”.

D. Jorge Ortiga, centrando a ajuda na Caritas Arquidiocesana, vai criar um espaço capaz de recolher, durante todo o ano, tudo o que “seja útil aos pobres (material) e que, para nós, seja desnecessário”. Será a Casa Alavanca a dar resposta aos inúmeros casos de desemprego que o Arcebispo de Braga acompanha. D. Jorge sublinha mesmo que a situação social “pede alguma coisa dos cristãos".

Ajuda internacional

Conscientes que a crise não afecta exclusivamente os portugueses e dando continuidade aos laços que a Igreja no nosso país mantêm com as Igrejas lusófonas, os bispos portugueses destinam parte da renúncia quaresmal ao países lusófonos.

Aveiro vai ajudar a “Igreja de Benguela que desde há vários anos partilha com Aveiro o dom dos seus sacerdotes”, explica D. António Francisco dos Santos, bispo da cidade dos moliceiros.

Portalegre e Castelo Branco vão ajudar São Tomé e Príncipe, num projecto aviário na Roça “Bôbô Fôrro”, uma exploração agrícola e pecuária pertencente à Caritas daquele país africano. Também Lisboa mantém um “Fundo de Ajuda Inter-Eclesial”, através do qual presta ajuda a Igrejas mais pobres espalhadas pelo mundo.

25.2.09

Câmara de Arouca quer famílias carenciadas a explorar quintas votadas ao abandono

Sara Dias Oliveira, in Jornal Público

O processo está ainda numa fase inicial, com o serviço de Acção Social da câmara a convidar os proprietários a arrendar as quintas à autarquia


A Câmara Municipal de Arouca vai colocar famílias carenciadas em quintas abandonadas da região. Nesse sentido, está a ser feito um levantamento para aferir quantas quintas existem com condições de ser trabalhadas e com as casas de caseiro desocupadas.

A autarquia pretende arrendar essas propriedades aos respectivos donos e cobrar uma quantia aos novos residentes consoante os rendimentos por estes apresentados, à semelhança do que sucede no processo de atribuição de habitação social.

"A ideia é contratualizar as quintas com os proprietários e, a partir daí, ocupar famílias mais carenciadas que necessitem de um espaço para viver e para trabalhar", adianta o presidente da Câmara de Arouca, Artur Neves. Este projecto social é, no fundo, um reajuste de uma anterior intenção da autarquia de criar hortas biológicas em Arouca, inicialmente pensada para interessados do concelho mas também de fora. As alterações agora introduzidas pelo executivo camarário visam favorecer a população arouquense.

"Neste momento, Arouca não está a sofrer muito as consequências desta crise, não há empresas a fechar. Mas receio que a crise possa afectar os que regressam a Arouca e os habitantes que trabalham em fábricas nos concelhos vizinhos e que, eventualmente, possam ficar sem emprego", explica o autarca. "Este projecto é também uma forma de nos prepararmos para enfrentar os problemas económicos", acrescenta o autarca.

O processo está ainda numa fase inicial, com o serviço de Acção Social da câmara a analisar o interesse dos proprietários em arrendar as quintas desocupadas, mas com edifícios em condições de habitabilidade. Artur Neves acredita que, no próximo mês de Setembro, já poderá ver as primeiras famílias "realojadas". "A câmara assegura o aluguer das quintas e a família pagará uma renda simbólica em função da sua capacidade financeira", resume.

A inovação e a emoção vão resistir à crise

Ana Rita Faria, in Jornal Público

Para Kjell Nordstrom, o momento actual é das empresas inovadoras e sedutoras, mas, no futuro, o mundo dos negócios será das mulheres


Antes de fazer as malas para partir para Lisboa, onde vai participar na conferência Business Innovation in 2009, o sueco Kjell Nordstrom falou ao PÚBLICO sobre que tipo de empresas e líderes vão sobreviver à crise. Aquele que é considerado um dos melhores gurus do mundo dos negócios diz que, mais do que nunca, a inovação e a emoção têm de dominar.

Vem a Portugal para falar sobre como a inovação pode conduzir--nos através de tempos difíceis. Pensa que a inovação é agora, mais do que nunca, necessária?
Sem dúvida. Numa crise como a actual, fazer o mesmo que todos os outros fazem é uma má ideia. Ninguém quer pagar mais por uma cópia ou por algo que se parece como outra coisa qualquer.

Mas será que as empresas vão arriscar e inovar? Não será mais seguro continuar a imitar?

Quem o fizer está a cair numa armadilha. Claro que é mais barato e conveniente copiar do que inovar. Mas, em contrapartida, acaba por ser ainda mais arriscado porque a empresa se coloca a si mesma numa situação em que, mais tarde ou mais cedo, vai perder. Crises como a actual mostram que realmente temos de fazer as coisas de um modo diferente.

Que tipo de companhias vão sobreviver à crise?

Há dois tipos: as grandes multinacionais como a Siemens, ou as pequenas empresas especializadas como a Apple. No fundo, serão as companhias inovadoras e que, simultaneamente, têm uma relação muito próxima com o consumidor e são capazes de o seduzir.

Que empresas são essas capazes de seduzir?

Basta pensar no Mini da BMW, no iPhone da Apple, nos telemóveis da Nokia...
Os líderes do futuro também terão de ser assim... sedutores?

Sem dúvida. Serão uma combinação de hard and soft ("duro e suave"). Um líder tem de ser duro, de cortar custos e tomar decisões críticas. Mas tem também de ser emocional e capaz de, agora mais do que nunca, entender os consumidores, motivar os empregados e antecipar as tendências que estão por vir. Um dos melhores exemplos disto é Richard Branson, dono da Virgin. Ou Barack Obama, a nível político. E, em breve, serão as mulheres. Muitas serão as líderes no futuro.

Sempre disse que as mulheres têm uma vantagem competitiva e que irão dominar o mundo dos negócios. Pensa que a crise vai acelerar esse processo?

É relativo. Por um lado, as empresas tendem a assumir menos riscos e, por isso, continuarão a contratar homens e a fazer as mesmas coisas que faziam, o que não será bom para as mulheres. Mas também haverá empresas que perceberão a importância de contratar pessoas diferentes em tempos de crise. Hoje, as mulheres já estão em maioria nas universidades e praticamente em todas as áreas. Ou seja, elas estão a conseguir uma boa formação e, quando saírem para o mercado, vão claramente dominar. Nalguns países como os da Escandinávia e no Reino Unido, já se nota inclusive a falta de homens.

O que vai acontecer a estes?

Vão ter muitos problemas e terão tendência a aproximarem-se do mundo feminino. Isso já se nota hoje em dia. Há cada vez mais metrossexuais e, mesmo nos negócios, os homens vão tornar--se cada vez mais parecidos com as mulheres, privilegiando uma postura mais conciliadora do que agressiva. A própria relação com o risco será diferente. As mulheres não irão assumir tantos riscos como os homens.
Mas isso não poderá prejudicar a inovação? A inovação não é também assumir riscos?
É, mas não demasiados. Tem de haver equilíbrio. Se houver muito risco, pode destruir-se o sistema. Basta olhar para a crise financeira. Se Wall Street fosse dominada pelas mulheres talvez não tivesse sido assim (risos). De qualquer forma, é um caso onde foram claramente tomados demasiados riscos.

Uma curiosidade: é verdade que traz sempre consigo um bloco de post-its para ir tomando notas sempre que quer?

Sim, é uma ferramenta de trabalho fundamental para mim.

Qual foi a última nota que tomou?

(remexe em papéis) A última frase que anotei foi uma pergunta: "Do we have too much choice?" ("Teremos demasiada escolha?"). Hoje, as escolhas à nossa disposição são imensas, desde fornecedores de electricidade e telemóveis à simples decisão de fazer uma tatuagem. Isso cria confusão na cabeça das pessoas e obriga-as a despender muito tempo. Temos de encontrar forma de sair disso.

Foi consultor de várias multinacionais, trabalhou com Richard Branson e com Tony Blair e correu meio mundo a dar conselhos sobre gestão. Licenciado em Economia e professor na Stockholm School of Business, Kjell Nordstrom confessou ao PÚBLICO que retira inspiração dos sítios mais variados, desde a economia e história, à psicologia e arquitectura. Juntamente com Jonas Ridderstrale, assinou dois best-sellers de gestão: Funky Business e Karaoke Capitalism. Amanhã, em Lisboa, além de vir falar sobre o mundo dos negócios, comemora o seu 51.º aniversário.

caso exemplar de 12 desempregados a tentar que o Estado se mexa

João Ramos de Almeida

Inspecção do Trabalho, Segurança Social, tribunais, todos os níveis de protecção laboral contribuem para a "letra morta" das regras legais nesta situação

A Vinha o inspector-geral do Trabalho a sair de um seminário em que se elogiara a cooperação das diversas inspecções, quando foi interpelado pelo PÚBLICO. Há duas semanas que se espera por informação sobre um caso de despedimento colectivo ilegal. Foi uma denúncia de Dezembro, sem que a Autoridade para as Condições de Trabalho tivesse actuado. "Vou ver", respondeu o inspector-geral.

A realidade é sempre crua. E para os 12 trabalhadores efectivos da firma de construção de Lisboa Guerra, Gonçalves & Filhos, Lda, a sua realidade foi uma revelação. A do vazio do Estado na regulação do mercado de trabalho. Tanto a ACT, como a Segurança Social, o Tribunal de Trabalho ou o do Comércio se mostram insensíveis para lidar com o pequeno mundo dos habitantes reais.

"A lei não foi feita para nós", comenta Filipe Nunes. "Em dois dias, conseguiram que o BPN fosse tratado, mas nós estamos desde Dezembro a batalhar." E sem resultados.
Sobre a mesa do café espalham o caso (ver texto). Primeiro, a pressão para reduzir salários, a criação de uma segunda firma e o fecho da torneira, tudo seguido do anúncio sobre a hora do despedimento colectivo, sem indemnizações. E, finalmente, o escárnio do empregador - que mais valia aceitar tudo porque a justiça tarda.

Mesmo assim, ou por isso mesmo, os 12 foram fazer valer os seus direitos. Direitos de lei, porque, na prática, a lei é outra. E as vozes alteravam-se quando descreviam a sucessão de episódios para tentar que o Estado se mexesse.

No labirinto


Dirigiram-se a 10 de Dezembro à ACT. Aí, não aceitaram uma queixa anónima. Sugeriram que fosse dado um nome verdadeiro, mas pouco usado. "Digam tudo o que sabem que esteja mal", sugeriu o funcionário. A queixa escrita e assinada descreveu a falta de segurança, as irregularidades contratuais, o trabalho de imigrantes ilegais, etc. Foram dadas todas as moradas para os inspectores aparecerem de surpresa. Em vão.
Passados uns dias, interpuseram no Tribunal de Trabalho uma providência cautelar para suspender o despedimento, descrevendo a ilegalidade do processo - simulação de pré-aviso, impedimento de trabalhar e de reclamação, ausência de motivo, de negociação ou pagamento de indemnizações.

Ali tentaram o patrocínio do Ministério Público. A funcionária perguntou se a firma já tinha pedido a insolvência. Se sim, a queixa teria ser metida no Tribunal do Comércio. E, além disso, o procurador apenas podia marcar na agenda dali a mais de um mês. Tinham de pagar 50 euros por pessoa, para a mediação laboral. "Procurem um advogado, só estou aqui para esclarecer...", afirmou.

A seguir, foram à Segurança Social pedir a isenção de custas judiciais. No mesmo dia, no mesmo serviço, um dos funcionários concedeu a isenção a um dos trabalhadores, mas o outro ao lado recusou. Uma recusa com base nos rendimentos declarados no IRS de 2007, quando estava a trabalhar e apresentou declaração com a mulher. Mas em finais de 2008 era desempregado e os serviços não viam isso.

Novo passo: obter o subsídio de desemprego. Mas a Segurança Social não o concedeu, porque na carta de despedimento colectivo não estava o motivo. O "engano" reflectiu-se, não sobre o autor, mas sobre o desempregado. O subsídio só foi autorizado porque se apresentou uma cópia da providência cautelar, que legitimou o pedido. O PÚBLICO questionou o Ministério do Trabalho. Em vão.

A 15 de Janeiro passado, a empresa pediu a insolvência, com uma dívida de 98.628,60 euros. Segundo os trabalhadores, entre os credores da empresa aparece um dos sócios principais que entretanto passara a firma para o filho mais novo. Até ao pedido de insolvência, parte dos bens da empresa foi passada a dinheiro, a casa do empresário ficou à venda e algum mobiliário foi para uma vivenda do empresário no Norte. Um dos filhos, ex-sócio e que veio a constituir a segunda firma, não nega, mas afirma que "os bens da empresa encontram-se à disposição do tribunal" e que "a vida particular dos sócios ou gerentes não se confunde com a vida da empresa".

Desde aí nada mudou. Os inspectores não foram à empresa. Na ACT, explicaram que havia muitas queixas, poucos inspectores e que os casos iam para outro serviço para triagem. Foi aconselhada uma queixa-crime. Mais advogados, mais expedientes.

No Tribunal do Trabalho, foi-lhes dito que a providência cautelar - um processo com efeitos em 30 dias - não tinha avançado. Porquê? Porque não se conseguia notificar os empresários. Isso, apesar de a advogada dos trabalhadores comunicar com a empresa por fax. Ter-se-ia de pagar a um solicitador, mas teriam de estar seguros do local e da hora onde estava o empresário. E o contador a passar. A funcionária do Tribunal do Trabalho alertou-os para o risco de a providência cautelar perder o efeito, dado a insolvência da empresa se sobrepor à acção laboral.

Dias mais tarde, foi decretada a insolvência da empresa. E isso não prejudica a providência cautelar? "Sim", responderam. "Então como se faz?" Encolheram os ombros. E a queixa-crime? É no Tribunal do Trabalho. De volta lá, novo conselho para que se fale com o advogado. "É fazer um requerimento ao senhor procurador e ver se pega no caso." Foram ao Departamento de Investigação e Acção Penal. Lá deram-lhes uma folha em branco. "Façam a vossa queixa. Têm advogado? Ah... então falem com ele." Mas para o advogado, a queixa tem de especificar qual o crime, quando foi praticado, quais os bens da sociedade, com todos os pormenores...

O tempo passa. Mas não a favor dos desempregados.

É diferente a descrição feita pelo ex-sócio e ex-gerente da firma, actualmente sócio principal de uma segunda firma, Lamelas & Gonçalves, Lda, criada em Agosto de 2007.
Luís Gonçalves foi a única pessoa ligada à empresa que comentou por escrito as acusações dos trabalhadores. Não se conseguiu falar com o sócio actual. O PÚBLICO tentou falar com o advogado que estivera presente na reunião após o anúncio do despedimento colectivo. Primeiro, afirmou desconhecer se a firma era sua cliente, mais tarde disse que só falaria se fosse passada uma procuração para esse efeito.
É daquela resposta que se sintetiza a versão seguinte.

A Guerra, Gonçalves & Filhos não tinha imigrantes ilegais. Trabalhavam na empresa quatro imigrantes e totalmente legalizados. os salários não eram tão baixos: "É fácil provar que havia trabalhadores efectivos a receber mensalmente 1100 euros." "Como se pode verificar pelos recibos de vencimento de 2007 e 2008, praticamente não existiam faltas. E as que houve nem sempre eram descontadas", refere-se na carta. Aliás, "nunca houve qualquer reclamação dessas situações por parte dos trabalhadores em qualquer instância de direito". Nem foram pedidos descontos sociais a quem tirasse férias. Nunca ninguém reclamou esse facto. Luís Gonçalves nega que tenha aliciado os trabalhadores a reduzir salários. "Existiu uma reunião na empresa, na qual foi exposta a difícil situação em que a empresa se encontrava e foi dado conhecimento (...) da existência de milhares de euros por receber, de clientes." Nega-se igualmente que alguma vez tenha sido proposto uma compensação "por fora" do recibo de vencimento. Isso "seria, legalmente, impossível".

Admite que a empresa tenha atrasado o pagamento de salários, mas por atrasos dos clientes. Sobre a empresa que criou em 2007 afirma desconhecer se foram para ela passados equipamentos e contratos de obras da firma do seu pai. Nega igualmente uma ligação entre o despedimento e a mudança de morada da Guerra, Gonçalves & Filhos, formalizada em Novembro de 2008 (tal como consta do Diário da República). "Foi decidida em Abril, conforme facilmente se prova no livro de actas."

Luís Gonçalves confirma que, em Outubro de 2008, comunicaram aos trabalhadores que não conseguiam manter os salários. Confirma igualmente que, a 28 de Novembro de 2008, foi formalizado o despedimento colectivo, "devido ao facto de estarem concluídos todos os trabalhos até então em curso e não existir mais obras contratadas para realizar".

A partir daqui, Luís Gonçalves nega tudo: nunca foi pedido que prescindissem da efectividade, de direitos, das indemnizações. "Alguns empregados disseram que não tinham especial interesse em receber indemnizações, pois haviam de tornar a vida de todas as pessoas 'um inferno' e que acabariam sempre por receber." Luís Gonçalves não nega que o empregador se recusou a pagar, mas dá a entender que foram os trabalhadores que recusaram. "Segundo palavras dos próprios não seria esta esmola (indemnização) que lhes iria resolver a vida, por isso teriam muito prazer em prejudicar os gerentes." E na reunião de Novembro, "o gerente foi ameaçado de morte e insultado por vários dos trabalhadores". Nega-se que se tenha sugerido trabalho na empresa do ex-gerente. "Todos os trabalhadores reafirmaram que lhes era fácil arranjar trabalho."

50
Em euros é quanto cada queixoso tem de pagar para solicitar a mediação
laboral no tribunal

O caso dos trabalhadores da Guerra, Gonçalves & Filhos surgiu porque, como contam, os empresários quiseram reduzir os seus salários. Ao fim de um ano, os trabalhadores estavam despedidos, a empresa fechou e funciona já outra no seu lugar com o mesmo gerente da primeira.

Segue-se a versão dos trabalhadores. Os donos da empresa apresentam factos diferentes (ver texto).

A empresa era uma pequena firma familiar. Os sócios eram o pai, a mulher e os dois filhos. Criada em Janeiro de 2001, chegou a dar actividade - entre trabalhadores e subempreiteiros - a 80 pessoas, incluindo trabalhadores ilegais. Quando os estaleiros eram inspeccionados, os imigrantes tinham instruções para se esconder.
No quadro de pessoal havia, contudo, apenas 12 trabalhadores. Os ordenados eram, em média, entre os 700 e 850 euros, mas o montante variava consoante o número de faltas que lhes ia sendo imputadas falsamente em cada mês - "quando dava jeito". Os subsídios de férias e de Natal eram recebidos mensalmente, mas quando o trabalhador queria tirar férias o empregador obrigava-o a pagar à empresa os descontos sociais que já tinham sido feitos em cada mês. Esse pagamento não entrava nos recibos de vencimento.

Em 2007, os empregadores tentaram chegar a um acordo. Reduziam os salários, ainda que pagassem a diferença "por fora" do recibo de salário. O aliciamento foi feito separadamente, e pelo menos a um deles com a promessa de que se conseguisse convencer os outros não lhe era diminuído o salário. Os trabalhadores recusaram e, logo depois, a empresa começou a atrasar o pagamento salarial.

A 31 de Agosto de 2007, um dos dois filhos, sócio da empresa e gerente, criou uma nova firma. A Lamelas e Gonçalves, Lda passou a funcionar na garagem do apartamento de habitação do pai. Conseguido o alvará, a firma - segundo os trabalhadores - foi comprando o equipamento da empresa do pai e a receber os seus contratos de obras. Em Outubro de 2008, os responsáveis da Guerra, Gonçalves & Filhos começaram a falar das dificuldades da firma, que não conseguiam manter os salários e que já não iam pagar Novembro. E assim foi.

Ao longo de Novembro aliciaram os trabalhadores para aceitar contratos a prazo de seis meses na nova empresa do filho, prescindindo da efectividade e das indemnizações. Teriam de fazer o mesmo trabalho, nos mesmos locais. Os trabalhadores não aceitaram. E a 28 Novembro os 12 trabalhadores efectivos foram despedidos, mas sem o pré-aviso legal de dois meses. Nesse mesmo dia, de acordo com o Diário da República, os donos da Guerra, Gonçalves & Filhos mudaram a morada da sede da empresa para uma loja vazia. Teria sido isso que criou dificuldades à notificação dos empresários, quando o Estado interveio.

No dia seguinte ao do despedimento, os trabalhadores tentaram receber os seus créditos e indemnizações. Daria uns dez mil euros por cabeça. Em vão. Foi-lhes dito que não havia dinheiro e pediram-lhes para assinar uma carta de comunicação do despedimento com a data de 29 de Setembro, ou seja, perfazendo o período legal de pré-aviso de dois meses. Uma falsificação de documentos que constitui um crime. O empresário quis reaver os instrumentos de trabalho. Os trabalhadores recusaram-se, assumindo os seus direitos de retenção até que lhes pagassem as indemnizações. O empresário propôs-lhes antes trabalho "por fora", nas mesmas obras, embora com patrão diferente e que lhes passaria as cartas para a Segurança Social para receberem o subsídio de desemprego enquanto estivessem a trabalhar. Os trabalhadores recusaram e não assinaram nada.

"Se não entregarem as máquinas, encontramo-nos em tribunal." Mas avisou de que, se o fizessem, o melhor que poderia acontecer era receberem depois de anos de espera. E sem garantia. Os trabalhadores queriam mesmo que a lei fosse aplicada e pediram a intervenção do Estado. Passados mais de dois meses, ainda esperam.

A empresa faliu entretanto e o caso está no Tribunal de Comércio. À excepção do filho mais novo, todos deixaram de ser membros dos corpos sociais. E apresentam-se como credores da empresa falida, juntamente com a banca, a Segurança Social, a administração fiscal e os trabalhadores.

"Parece que os empresários sabem onde é que o sistema não funciona e sabem como fazer as coisas para que nunca sejam tocados", revolta-se um dos trabalhadores.
Quando começaram, há mais de dois meses, a tentar receber o que era seu por lei, nunca pensaram que os serviços do Estado fossem tão ineficazes. Tentaram suspender o despedimento, com uma providência cautelar. Mas ficaram particularmente escandalizados com a dificuldade que os tribunais demonstraram em notificar os donos da empresa. "Como é possível, se todos os dias os vejo?", diz um deles. "Vivem no mesmo sítio, vão aos mesmos locais, andam pelas mesmas obras. E ninguém os apanha..."
A revolta dos trabalhadores é maior porque optaram pelo caminho da legalidade, mas invariavelmente têm sido empurrados de um tribunal para outro - cada um deles parece estar a prejudicar a acção do outro, quando o caso é o mesmo - e sem que as autoridades façam valer a força da lei. Isto, apesar de terem sido cometidos crimes e de haver dívidas ao fisco e à Segurança Social.

No início eram 12. Agora são sete os que teimam em fazer valer os seus direitos. Não dão a cara para a fotografia porque receiam. "Tudo joga para que as pessoas desistam." Em vez de se colocar ao lado dos que estão em posição mais frágil, parece que o funcionamento do Estado protege quem escapa aos seus deveres, sentem.

Desemprego é a preocupação central dos alentejanos, perder o emprego vem a seguir

Carlos Dias, in Jornal Público

A taxa de desemprego no Alentejo atingiu os 10,8 por cento no primeiro mês de 2009,
a mais alta do país. Sobe o número de famílias que reclamam apoio em géneros alimentares


O Alentejo continua a ser a região do país que apresenta os mais elevados índices de desemprego. Segundo os dados revelados nos últimos dias pelo Instituto Nacional de Estatística, o número de inscritos nos centros de emprego da região, durante o mês passado, atingiu uma taxa de 10,8 por cento.

Este valor pode já ter sofrido alteração, pois tanto as organizações sindicais como as instituições de solidariedade social da região confrontam-se desde o início de 2009 com o aumento do número de desempregados que deixaram de procurar resposta nos centros de emprego ou de um número crescente de pessoas que reclamam auxílio alimentar.

Em meados de Fevereiro, o PÚBLICO acompanhou elementos do executivo da Câmara de Beja, no contacto com as populações das freguesias rurais do concelho. Francisco Santos, presidente da autarquia, diz que o objectivo da iniciativa Beja, orgulha-se... é dar a conhecer as obras que foram feitas, o que está em marcha e o que se
pode ainda fazer.

Numa das localidades já visitada, Salvada, a sala de reuniões da junta de freguesia estava cheia. Francisco Santos antevia que o desemprego seria a questão mais abordada. Não se enganou. Tem sido assim desde que a autarquia iniciou o contacto com as populações, em 6 de Fevereiro. Olhando as 40 pessoas na sala, a maioria está de cabeça baixa. Os depoimentos confirmam o estado de espírito. Uma responsável de uma instituição de solidariedade social na freguesia da Salvada explica que "está tudo triste por causa do desemprego".

"Folgar a reforma"

Alguns não tiveram coragem para falar em público e aguardaram que o presidente da câmara chegasse à rua para lhe colocar o seu problema. Uma mulher pedia ocupação para o marido. Um idoso implorava trabalho para um dos filhos ou, em alternativa, para um neto que já anda sem "trambelho". Para ver, esclareceu, "se me folgam um pouco a reforma".

Nem os que tinham trabalho estavam mais descansados. "Eles têm medo de perder o emprego", observa o autarca, confirmando que este tipo de questão "é uma constante nos nossos encontros com a população": "Uns falam de desemprego e outros assumem que têm medo de perder o seu posto de trabalho".

Francisco Santos deixa claro que o município não tem condições para solucionar os problemas das pessoas sem trabalho. Mas tenta animá-las com as possibilidades que o novo aeroporto de Beja pode vir a oferecer à região, assim como a instalação, para breve, de uma grande superfície comercial na cidade. A tentativa de alento cheira a futuro e as pessoas querem respostas no presente, que a Cáritas Diocesana de Beja, por exemplo, tem cada vez mais dificuldade em dar. O número de pessoas no refeitório da instituição sobe constantemente, "mas os apoios decrescem", salienta a responsável da instituição, Teresa Chaves.

Todas as instituições de solidariedade social no concelho de Beja "estão com o garrote financeiro ao pescoço", frisa o vereador Miguel Ramalho, dando como exemplo o que se passa no Centro de Apoio Social do Concelho de Beja, que dava apoio a 125 idosos e socorre neste momento 145 com o mesmo fundo de maneio. As dificuldades financeiras e alimentares são extensíveis a um número crescente de imigrantes e estudantes bolseiros. A Cáritas é solicitada a ajudar a comunidade brasileira e cabo-verdiana que vieram "trabalhar na área da construção civil".

Para além de "uma intervenção mais articulada" junto da Cáritas de Beja e de outras instituições sociais, para activar "imediatamente" apoios "às camadas mais desfavorecidas da população e às situações mais dramáticas", a autarquia alentejana compromete-se a garantir o enquadramento de "pelo menos" 50 desempregados, no âmbito do chamado emprego social, e a criar 20 estágios profissionais para jovens licenciados. O município diz que dará prioridade a quem não aufere qualquer rendimento.

Ao mesmo tempo, a Câmara de Beja disponibiliza-se para dar sequência ao que foi acordado na última reunião do Conselho Local de Acção Social (CLAS) de Beja, no passado dia 9, para analisar e debater formas de apoio aos habitantes do concelho que se encontram em condições precárias. Do encontro saiu um apelo a todos os membros para um esforço acrescido, dado o agravamento da situação social, tendo sempre em vista "o direito à dignidade e à salvaguarda da exposição a situações de humilhação". O CLAS concluiu que é "cada vez mais frequente o recurso de famílias às instituições de caridade e apoio social" que até possuíam um razoável suporte económico.

Teresa Chaves, da Cáritas de Beja, teme que os pedidos de auxílio aumentem para além da capacidade de resposta. O problema já se colocou em 2008, quando se registou "um aumento significativo de pedidos de ajuda à instituição". A título de exemplo, o número de refeições servidas no refeitório da Cáritas "cresceu cerca de 30 por cento em relação a 2007".

A responsável também está preocupada com a emergência constante de "novos pobres", oriundos da chamada classe média, explicando que estas pessoas "têm mais dificuldade em assumir que precisam de ajuda". A Câmara de Beja vai discutir hoje as recomendações do CLAS.

Despedimentos sobem 59% em Janeiro

Catarina Almeida Pereira, in Diário de Notícias

Trabalho. 14 724 inscrições nos centros de emprego


O número de pessoas que se inscreveram no Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) na sequência de um despedimento unilateral registou um aumento homólogo de 59% em Janeiro. Foram 14 724 casos, o valor mais alto desde, pelo menos, 2003.

O agravamento começou a ser flagrante em Setembro, altura em que o número de despedidos superou já as 10 mil pessoas. Nos últimos três meses, com mais de 34 mil casos, estas situações registaram o maior aumento homólogo (58%) desde o início da série.

Notável é também a evolução do que o IEFP classifica como "despedimentos por mútuo acordo": mais 77,5% em comparação com Janeiro do ano passado. Apesar do aumento, estas situações são muito menos frequentes, rondando os 2270 casos. Este é, ainda assim, o valor mais alto desde a entrada em vigor da lei que limita as rescisões amigáveis.

O IEFP considera vários motivos na origem do desemprego. Pessoas que acabam de estudar, que chegam ao fim de um período de formação, que se despedem ou cujo contrato não foi renovado. O fim do trabalho não permanente (24 793) é a razão que mais pesa. Os dados divulgados na segunda-feira mostram, contudo, que os maiores aumentos se deram nos despedimentos unilaterais e por mútuo acordo, que já explicam um quarto das novas situações de desemprego.

Em Janeiro inscreveram-se 70 334 mil desempregados nos centros de emprego, o que representa o segundo valor mais alto em 30 anos, tal como o DN ontem noticiou. O número dos que permaneceram de-sempregados no final do mês também deu um salto inédito (mais 31 mil). Segundo o IEFP, há agora quase 448 mil desempregados.

Construção lidera aumento de 27% do desemprego em Portugal

João Paulo Madeira, in Jornal de Notícias

Centros de emprego com 70 mil novas inscrições em Janeiro. Algarve e Centro mais afectados


Em Janeiro, inscreveram-se nos centros de emprego mais de 70 mil trabalhadores desempregados, um aumento de 27,3% em termos homólogos e de 44,7% face a Dezembro. O sector da construção foi o mais penalizado.

De acordo com dados ontem divulgados pelo Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP), no final do mês passado estavam inscritos nos centros de emprego do país um total de 447 966 trabalhadores desempregados.

Com base nos dados do Continente, verifica-se que há mais desempregados nos trabalhadores não qualificados dos serviços e comércio: os mais de 55 mil desempregados daquelas áreas de actividade representam 12,8% do total.

Segue-se o pessoal dos serviços, de protecção e de segurança, com um peso de 11,8%, os empregados de escritório (10,9%) e os trabalhadores não qualificados de minas, construção civil e indústria transformadora (9,6%).

De resto, o sector da Construção está a ser particularmente penalizado pelo desemprego. As inscrições de operários desempregados da indústria extractiva e da construção civil são as que registam maior variação (+53,9%), atingindo um total de 29 mil trabalhadores. E, segundo o Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil do Norte, pode haver 10 mil trabalhadores desempregados além daqueles números oficiais, sem receber subsídio.

Depois da construção, o maior aumento ocorre ao nível de quadros superiores da administração pública, com uma variação de 29,5%. Neste caso, contudo, o universo ainda é reduzido (123 desempregados).

Os dados do IEFP mostram que nenhuma região do país escapa ao aumento do desemprego. O Algarve e o Centro, com subidas homólogas de 30,8% e 13,9%, respectivamente, são as mais afectadas. A deterioração do mercado de trabalho está a afectar jovens e adultos em medida semelhante, de acordo com os dados do IEFP. No primeiro caso, o aumento do desemprego registado é de 11,9%; nos mais velhos, é de 12,1%.

Todos os níveis de escolaridade registam mais desemprego. A subida é mais expressiva nas habilitações de 2.º e 3.º ciclos do ensino básico (+18,3 e +17,9%, respectivamente). Face à tendência de aumento do desemprego, os gastos do Estado com subsídios de desemprego também aumentam. Dados de Janeiro publicados ontem pela Direcção-Geral do Orçamento mostram que a despesa com aquela prestação social aumentou 8,6% no primeiro mês do ano, face a Janeiro do ano passado, totalizando 142 milhões de euros.

Bruxelas dá mais seis meses para aplicação de fundos estruturais

in Jornal de Notícias

A Comissão Europeia prolongou, esta terça-feira, por seis meses o prazo para os Estados-membros gastarem os fundos estruturais que lhes foram atribuídos para o período 2000-2006, como parte da resposta à actual crise financeira e económica.

A medida, que faz parte de um pacote de decisões da Comissão Europeia tendente a dar mais flexibilidade aos Estados-Membros na sua utilização dos fundos estruturais, tem como objectivo possibilitar que os países da União Europeia esgotem o financiamento comunitário atribuído para 2000-2006.

Nesse sentido, o executivo comunitário convida os Estados-Membros a pedirem uma prorrogação, até 30 de Junho, do período de elegibilidade relativa ao financiamento de 385 dos 555 programas da política de coesão, em 2000-2006, sempre que não tivessem utilizado inteiramente os fundos atribuídos.

A prorrogação do período de elegibilidade abrange os quatro Fundos Estruturais em vigor na altura: o Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER), o Fundo Social Europeu (FSE), o Fundo Europeu de Orientação e de Garantia Agrícola (FEOGA) e o Instrumento Financeiro de Orientação das Pescas (IFOP).

"Estamos a envidar todos os esforços para assegurar que cada euro dos Fundos Estruturais seja gasto de modo eficiente. Estamos a adaptar a política de coesão às novas realidades económicas, deixando que os Estados-Membros utilizem o investimento comunitário como um excelente remédio anticrise", justificou a comissária europeia responsável pela Política Regional, Danuta Hubner.

Para o período 2000-2006, foram atribuídos a Portugal 19.700 milhões de euros a título de fundos estruturais.

Espanha prevê recessão "de certa magnitude"

in Jornal de Notícias

O governador do Banco de Espanha antecipou uma recessão de "certa magnitude" e um período de inflação baixa que determinará um ritmo de crescimento nominal "muito modesto ou até negativo" com um comportamento idêntico da expansão de crédito.

Em declarações no Congresso de Deputados espanhol, Miguel Ángel Fernández Ordóñez afirmou que a "forte contracção" da economia espanhola arrasta de "forma inevitável" o crédito.

"Nada seria mais contraproducente que cair na simplificação errónea de que a saída da crise depende exclusivamente a existência de uma disponibilidade abundante de financiamento de crédito", disse.

Ordóñez considerou ainda que as principais economias do mundo só sairão da crise quando os Estados Unidos conseguirem sair.

"É muito difícil que um país consiga sair sozinho da crise se os Estados Unidos não o tiverem feito antes", disse, antecipando que a recessão pode chegar até 2010 se as medidas em curso não conseguirem estabilizar os mercados.

Noutro âmbito, o responsável espanhol afirmou que "fechar a porta" a medidas como a recapitalização bancária "não parece uma atitude prudente" num momento de "enorme incerteza" económica e financeira.

Ordóñez admitiu mesmo que a "profundidade" da crise pode mesmo obrigar a um processo de reestruturação do sistema bancário espanhol na qual, caso ocorra, o Banco de Espanha procurará garantir que nem os depositantes nem os credores são afectados.

A banca espanhola, disse, que enfrentou com "relativa força" a primeira fase da crise financeira, poderá ter agora mais dificuldades para evitar a segunda ronda de efeitos da crise económica.

Entre os efeitos, Ordóñez destacou a persistência da falta de liquidez, as dificuldades de financiamento e as reacções exageradas dos bancos e caixas de aforro à recessão.

Entre os dados que divulgou Ordóñez explicou que o crédito a famílias e empresas subiu seis por cento em Janeiro, quase metade menos de aumento que há um ano.

Contabilizando os dados líquidos, as famílias e empresas receberam 110 mil milhões de euros de financiamento nos últimos 12 meses.

Segundo os dados do Banco de Espanha os empréstimos concedidos para a compra de casa aumentaram 4,2 %, tendo os créditos para consumo aumentado três por cento. Os fundos concedidos a empresas cresceu 6,1 %.

Jovens cegos exigem medidas contra discriminação

Licínia Girão, in Jornal de Notícias

"Desisto de desistir". Foi com a criação deste slogan que lhe irá nortear os passos futuros que terminou, esta terça-feira, na Lousã o primeiro encontro de jovens cegos.

Durante três dias, 10 jovens de todo o país, incluindo Açores, em representação de outras tantas delegações, das 13 que constituem a ACAPO - Associação dos Cegos e Amblíopes de Portugal, responsável pela organização do evento, trocaram ideias e experiências que lhe permitem agora dar início a um conjunto de iniciativas locais e nacionais que virão a culminar na criação de um documento que pretendem fazer chegar a governantes e instituições que "parecem alheadas dos problemas que enfrentamos no dia-a-dia", como referiram ao JN.

Os jovens dizem sentir-se por vezes mais ultrajados e diminuídos, não pela sua deficiência, nem pela forma como a encaram, mas, sobretudo, pela maneira como são tratados pela sociedade.

Desejam apenas ser tratados como iguais com direito a terem, por exemplo, disponíveis atempadamente, os livros e materiais escolares que necessitam, mas que chegam a ser entregues praticamente no final dos anos lectivos.

Madalena Ribeiro tem 23 anos, frequenta no Porto um mestrado em Tradução Especializada de Inglês e Alemão. Nasceu cega, mas "nunca me esconderam e proporcionaram-me condições para que tivesse acesso ao ensino e a uma vida normal", refere a jovem que tenta agora ultrapassar as frustrações da rejeição social que diz sentir-se vítima. Não passa da entrevista numa candidatura a um emprego e, tal como tantos outros, cuja mera aparência física não deixa antever a cegueira, é por vezes humilhada quando em determinadas situações a acusam de se fazer passar por cega para obter privilégios.

Economia tema de debate com Sócrates

Ana Paula Correia, com Lusa, in Jornal de Notícias

Oposição insiste em confrontar primeiro-ministro com a falta de resultados no combate à crise


A situação económica e social do país é o tema comum das perguntas que a Oposição fará, esta quarta-feira, a Sócrates, em mais um debate quinzenal, no Parlamento, onde o assunto voltará quinta-feira, numa interpelação do BE ao Governo.

O tema começará logo a abrir o debate. O grupo parlamentar do PCP, ao qual cabe, regimentalmente, abrir a sessão, já anunciou questões centradas nas políticas económicas e sociais. BE e CDS-PP fizeram a mesma opção e, apesar de só esta manhã serem divulgadas as escolhas de democratas- cristãos e Verdes, tudo indica ser difícil ao primeiro-ministro escapar à insistência do maior partido da Oposição no balanço dos resultados do combate à crise.

Para o retrato social do país desenhado à Esquerda à Direita, contribuem os números divulgados na segunda-feira, pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional, ao revelaram que, em Janeiro, mais 70 mil pessoas inscreveram-se nos centro de emprego. O que significa o segundo maior pico de crescimento nos últimos trinta anos, só batido em Setembro de 2004.

É ainda no contexto da crise que Sócrates será "obrigado" a explicar a decisão do Ministério das Finanças de não conceder mais nenhum aval público ao BPP, em resultado da qual a falência do banco será uma inevitabilidade.

Já ontem os partidos da Oposição exigiram explicações do Governo e anunciaram que irão confrontar o chefe do Governo e o ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, com a "nebolusidade" que envolve a aplicação o aval de 450 milhões de euros já concedido ao BPP.

Genericamente, os deputados vão quer "saber tudo" sobre a utilização de recursos públicos em instituições financeiras privadas e, em particular os de Esquerda, desafiarão o Executivo a mudar o rumo da política de concessão de apoios estatais.

Os socialistas, como é habitual no Parlamento, cumprirão o papel de amortecedor das críticas à política do Governo. Desta vez, escolheram o plano tecnológico como almofada temática para a tarde parlamentar de hoje.

A crise económico/financeira e as suas consequências não serão, contudo, a única dor de cabeça, com que a Oposição tentará atingir o primeiro-ministro.

No último debate quinzenal, no passado dia 11, o Governo escolheu o tema genérico da economia, mas o caso Freeport marcou o debate, com uma troca violenta de acusações entre o primeiro-ministro e o líder parlamentar social-democrata, Paulo Rangel, com o primeiro-ministro a acusar o PSD de desenvolver uma campanha "negra" e pessoal contra si.

Desta vez, não passará sem referência a "deriva censória", como designa o BE, dos últimos dias, ilustrada com o caso do desfile carnavalesco de Torres Vedras e, em particular, da apreensão, em Braga, pela PSP por alegado conteúdo pornográfico, de um livro cuja capa reproduzia o quadro "A origem do mundo", de Gustave Courbet, do século XIX, actualmente exposto no Museu d'Orsay, em Paris.

24.2.09

Mudaram-lhe as fechaduras e fez queixa por discriminação

Ana Espada, in Jornal Público

Comprar uma casa exige muitas burocracias, mas é um processo relativamente fácil. Contacta-se com uma sociedade de mediação imobiliária, visitam-se apartamentos, decide-se qual se quer comprar e, posteriormente, assina-se um contrato de compra e venda para adquirir o imóvel. Rui Maia passou por todo este processo para comprar um apartamento na urbanização Colinas do Cruzeiro, em Odivelas, mas no final, e já depois de se ter instalado no imóvel, alegou terem-lhe mudado as fechaduras, impossibilitando-o de usufruir do mesmo. Porquê? O comprador diz que é por ser de etnia cigana.

Rui Maia, talvez por não corresponder ao estereótipo (físico) concebido pela sociedade, não teve dificuldades em adquirir um apartamento num empreendimento de luxo. A urbanização Colinas do Cruzeiro é "uma cidade dentro da cidade", segundo o site do Grupo Obriverca, empresa construtora responsável pelo empreendimento. Rui Maia dirigiu-se à empresa de mediação imobiliária Patrimonium, que trabalha com a construtora, e assinou um contrato promessa de compra e venda.

De forma a poder usufruir do imóvel, fez um aditamento ao contrato e instalou-se. Alguns dias depois, levou familiares a visitar o espaço e foi assim que os vendedores se aperceberam que se tratava de um cidadão de etnia cigana. "Quando chegámos a casa, tínhamos tudo trancado, mudaram as fechaduras", disse Rui Maia, que já apresentou queixa na esquadra de Odivelas da PSP.

José Falcão, dirigente do movimento SOS Racismo, disse que "não é a primeira vez que este tipo de situação acontece", acrescentando que "a lei não permite uma tomada de decisão rápida, que normalmente demora anos".

Em declarações ao PÚBLICO, a Patrimonium disse "não ter praticado quaisquer actos de discriminação", alegando que este caso "tem uma eventual relevância de foro criminal". Para a empresa, tudo não passou de uma tentativa de burla. O comprador ocupa a casa e transforma a vida do prédio num "inferno", levando o empresário a romper o contrato e a pagar uma indemnização ao comprador.

Já o grupo Obriverca afirmou não ter nenhum negócio directo com José Maia, mas confirma que uma sociedade em que detém uma "participação social [a Patrimonium] terá celebrado um contrato com o referido comprador, [e] tal contrato terá sido denunciado pela [sua] participada com justa causa".

José Falcão, do SOS Racismo, considera a lei "bastante demorada" em denúncias de discriminação racial

Um em cada cinco presos é estrangeiro

José Bento Amaro, in Jornal Público

As cadeias portuguesas inverteram uma tendência de décadas e já não estão sobrelotadas. A maior parte dos reclusos cumpre penas devido a roubos e tráfico de droga


Uma em cada cinco pessoas que estão presas em Portugal é estrangeira. De um total de 11.008 reclusos, 2240 não possuem nacionalidade portuguesa. São, na sua maioria, cabo-verdianos, brasileiros e angolanos, sendo que a maior parte cumpre penas de três a seis e de seis a nove anos de cadeia. São condenações, na generalidade, resultantes de crimes como o tráfico de droga e roubos.

Um relatório da Direcção-Geral dos Serviços Prisionais (DGSP) referente ao terceiro trimestre de 2008 refere que, até essa data, estavam nas prisões portuguesas 275 pessoas condenadas a penas entre os 20 e os 25 anos (normalmente aplicadas em casos de homicídio) e, dessas, 22 são de nacionalidade estrangeira. As estatísticas referem ainda que no sector dos crimes contra as pessoas há, entre toda a população prisional, 1157 pessoas a cumprir pena por homicídio, o que representa 13 por cento. Os números de estrangeiros envolvidos em alguns dos crimes mais violentos apontam para o envolvimento de 135 estrangeiros em homicídios e 24 em violações.

Os números relativos aos presos estrangeiros por roubo apontam para a existência de 159 casos, que representam uma percentagem bem mais diminuta do que a que se refere aos portugueses implicados no mesmo tipo de delitos, os quais são 1097.

As estatísticas prisionais apontam ainda para uma grande intervenção dos estrangeiros em delitos relacionados com os estupefacientes. Aqui há um total de 733 pessoas de outras nacionalidades detidas, sendo que 107 são mulheres. A maior parte destas pessoas, de acordo com o parecer dos polícias que investigam o narcotráfico, são "correios". São, na sua maioria, pessoas de fracos recursos financeiros que, a troco de poucas centenas de dólares (porque a maior parte é oriunda de países sul-americanos e ali ainda é o dólar a moeda mais utilizada), aceitam viajar para a Europa transportando pequenas quantidades de droga (cocaína) no organismo ou dissimulada na bagagem. As "mulas", conforme são designadas pela polícia, poucos ou nenhuns conhecimentos possuem em relação à organização das redes de narcotraficantes. Muitas vezes desembarcam nos aeroportos e dirigem-se para uma morada que lhes foi facultada ainda no país de origem ou, simplesmente, aguardam por um contacto. As suas estadias, sempre a pretexto de turismo ou de visita a familiares, resumem-se a quatro ou cinco dias.

Habilitações mínimas

Com excepção dos crimes relativos a estupefacientes, todos os outros (contra as pessoas, contra vida em sociedade e contra o património) têm mais homens condenados do que mulheres. Nos processos de droga os homens correspondem a 25 por cento dos detidos e as mulheres a 75 por cento.

A maior parte da população prisional nacional possui apenas o 1.º ciclo do ensino básico. Os dados da DGSP indicam que 3826 dos 11.008 reclusos se incluem neste grupo de habilitações literárias. Com cursos superiores existem apenas 245 presos (137 são estrangeiros). Há, no total, 588 pessoas que não sabem sequer ler nem escrever e mais 564 que, conseguindo escrever ou ler, possuem estudos inferiores ao 1.º ciclo do ensino básico.

Em relação à idade da população reclusa, os gráficos mostram que o grupo mais numeroso, quase com 35 por cento do total, é o dos indivíduos com 30 a 39 anos, seguindo-se o grupo que compreende os de 40 a 49 anos (mais de 22 por cento) e aqueles que se incluem entre os 25 e os 29 anos (18 por cento). Apesar de há vários anos as diversas polícias estarem a alertar para a necessidade de controlar a violência juvenil (individual ou grupal), as estatísticas demonstram que as condenações de jovens (entre os 16 e os 18 anos) ainda são pouco significativas no panorama geral, ficando-se pelas 92 pessoas (31 estrangeiros), que representam apenas 0,8 por cento da totalidade.

As estatísticas referem, por fim, que os actuais 54 estabelecimentos prisionais do país (centrais, especiais e regionais) possuem todos vagas. A questão da não existência de sobrelotação, como acontecia até há bem pouco tempo, deve-se às reformas do sistema penal que, entre outras medidas, tem preconizado a aplicação de medidas alternativas à prisão, nomeadamente o uso de pulseiras electrónicas e a substituição da detenção por trabalho comunitário. A taxa média de ocupação era, no final do terceiro trimestre de 2008, de 88 por cento (11.008 presos para um total de 12.294 lugares). Existem entre os condenados 187 pessoas consideradas inimputáveis, as quais estão internadas em estabelecimentos psiquiátricos não prisionais.

Estrangeiros têm mais dificuldade em defender-se

Os estrangeiros que são julgados em Portugal têm mais dificuldades em defender-se? Para o presidente da distrital de Lisboa da Ordem dos Advogados, Carlos Pinto de Abreu, essa é uma realidade. "Também um português que não fale chinês se veria aflito num tribunal da China", refere o causídico.

"Para além dos que não percebem a língua, existe também um obstáculo de natureza cultural", refere o advogado, tentando, desse modo, encontrar uma explicação para a eventual diferença no acesso e compreensão da justiça por parte dos cidadãos estrangeiros face aos portugueses.

São essas dificuldades que, de resto, poderão explicar o facto de o número total de estrangeiros presos em Portugal ser substancialmente mais elevado do que o número de estrangeiros com autorização de residência quando comparados, percentualmente, com o número de habitantes nacionais.

Carlos Pinto de Abreu entende ainda que pode existir "alguma discriminação legal" nas medidas de coacção que os operadores judiciários aplicam aos estrangeiros.
"A suspensão da execução de penas é sempre mais fácil de aplicar a nacionais do que a estrangeiros. Tem a ver com as garantias que estes podem oferecer para cumprirem as medidas de coacção, por exemplo", diz Pinto de Abreu.

O advogado salienta que, apesar de não existirem estudos científicos que comprovem as eventuais disparidades na aplicação da justiça em relação a portugueses e estrangeiros, há alguns sinais que podem indiciar uma propensão para desconfiar mais dos estrangeiros. "Mercê da rotina, abusa-se do estereótipo", refere. J.B.A.