in Jornal Público
Tem 80 anos, uma página na Internet, um currículo de fazer inveja e uma vida feita de ziguezagues entre o Porto, Lisboa e qualquer ponto do mundo para onde o convidem para falar sobre a sua área de especialidade: a Bioética. Apanhámo-lo em casa, ultrapassada há muito a hora de jantar, no intervalo entre uma chegada de Lisboa, onde fora apresentar uma comunicação sobre Darwin, e uma partida para Roma, onde ia participar no plenário da Academia Pontifícia para a Vida.
A sua agenda está toda na Internet (www.danielserrão.pt) e, quando lhe perguntam se a idade não lhe curva os ombros, a resposta surge embrulhada numa gargalhada. "Cansados andam os jovens que vejo à minha volta. Dou quatro aulas seguidas e eles, a meio, têm que fazer uma pausa porque não aguentam." A seguir, tom mais sério para explicar que, em Dezembro de 2002, tomou a iniciativa de encerrar o laboratório privado de anatomia patológica que pusera a funcionar 27 anos antes. "Fizemos um milhão e seiscentos mil exames histológicos e citológicos, mas achei que devia parar, por iniciativa minha, porque um patologista não pode cometer erros e eu não podia correr qualquer risco de falhar o diagnóstico."
Tinha então 75 anos. Cinco anos antes, a 1 de Março de 1998, fora obrigado a jubilar-se. "Deixei de poder dar aulas a alunos de licenciatura, mas, no mesmo ano, passei a dar aulas a médicos, num curso de mestrado em Bioética", recorda. Hoje, lecciona no curso de doutoramento do Instituto de Bioética na Universidade Católica e ainda no Instituto Superior de Saúde de Gandra. Na agenda tem ainda as aulas num curso que vai abrir na Faculdade de Direito da Universidade do Porto. E, claro, incontáveis conferências em diferentes pontos do mapa.
No tempo que lhe sobra, Daniel Serrão garante que continua a maravilhar-se com o mundo. "Uma das coisas que gosto de fazer quando viajo é andar de autocarro e, nas ruas, observar as pessoas." O culto da juventude não é fantasma que o assuste. "Ainda não estou muito curvado, não ando a arrastar os pés. Do ponto de vista físico, estou muito razoável", galhofa.
A quem insiste em descartar tudo o que tenha passado a curva dos 70, Serrão responde com estatísticas: "Em 2010, os idosos com mais de 65 anos serão mais de dois milhões, a maior parte saudáveis e activos". Vamos poder continuar a ignorá-los? N.F.