21.1.10

Chegam as políticas sociais para acabar com a pobreza?

Leonor Paiva Watson, in Jornal de Notícias

Ano Internacional contra a Pobreza e Exclusão Social é lançado hoje com uma conferência em Madrid


O Ano Internacional Contra a Pobreza é inaugurado hoje, quinta-feira, com uma conferência em Madrid.

A questão-chave para a qual se procura resposta é: que políticas aplicar para acabar com uma estatística que envergonha a própria Europa, onde 17% da população é pobre?

Em que políticas investir para contrariar uma estatística que revela que 20% das crianças, 19% dos idosos e 8% das pessoas empregadas na Europa é pobre? Bastam as políticas sociais, por muito impregnadas de boa vontade que estejam?

Os números são ainda mais preocupantes quando se reduz o universo. Portugal, por exemplo, tem 23% das suas crianças em situação de pobreza e 22% de idosos na mesma situação, para não falar das pessoas empregadas que, apesar de trabalharem, são pobres. Em Portugal são 12%. Ao todo, o nosso país contabiliza 18% da população na pobreza.

E isto porque os estudos são anuais e muitas vezes com algum atraso, ou seja, "neste último estudo ainda não se verifica efectivamente o impacto da crise na vida das pessoas", alerta Alfredo Bruto da Costa, ex-presidente do Conselho Económico e Social.

Por outro lado, são estudos feitos ano a ano com amostras sempre diferentes. Para medir a pobreza talvez fosse necessário um estudo longitudinal, ou seja, que se estendesse no tempo, com a mesma amostra.

"Uma equipa de investigadores do CESIS (Centro de Estudos para a Intervenção Social) fez um destes estudos estudando a mesma amostra durante seis anos e concluiu-se que 47% das famílias portuguesas, pelo menos, passaram pela pobreza em pelo menos um ano", revela Bruto da Costa.

Contas básicas feitas, é metade da população do nosso país. E isto, sem esquecermos que já há políticas sociais, que já há todos um pacote de medidas de cariz social para contrariarem esta realidade. Portanto, a pergunta é: o que é que está a faltar? Talvez esteja a faltar percebermos, a um nível muito global, que as soluções não passam só pelas medidas sociais. Em país nenhum.

"São precisas as políticas sociais e muito, mas não basta. São urgentes medidas no que respeita à política económica", atira Bruto da Costa. Basicamente, não é possível resolver-se a pobreza com políticas que não toquem em nada o resto da população, como se fosse um problema periférico que só diz respeito ao vizinho do lado. Terá que haver medidas estruturais que impliquem a sociedade inteira. Porque "não é aceitável que pessoas empregadas, que trabalham, sejam pobres", afirma aquele especialista.

A importância da remuneração

Todo o sistema produtivo de um país tem que ser envolvido. "É preciso investir-se em emprego sustentável e bem remunerado. Os salários têm que subir", aponta como prioridade.

Portugal, por exemplo, enfrenta a inviabilidade de ter uma competitividade baseada na mão de obra barata. O caminho de Portugal já não pode ser esse, que é, aliás, baseado na baixa educação dos trabalhadores e baixa qualificação dos empresários. "Precisamos de outra cultura empresarial. Precisamos de empresários qualificados", reitera Bruto da Costa.

Regressando à restante Europa, os números são alarmantes quando se regista que 9% da sua população não pode ter uma refeição de carne ou peixe dia sim, dia não. Neste grupo de pessoas não estão só os sem-abrigos, os desempregados, "estão também as pessoas que trabalham", diz.

Claro que ser pobre na Europa será diferente de o ser na África, mas "pobreza é não termos recursos para participar nos hábitos e costumes da sociedade que estamos envolvidos", conclui.