Eduardo Pinto, in Jornal de Noticías
Freixo de Espada à Cinta tem baixos salários, mas os habitantes não trocariam de concelho por esse motivo
A hora do almoço já lá vai. Olga Gonçalves esgueira-se, apressada, por uma rua estreita do Centro Histórico de Freixo de Espada à Cinta. Vai ligeira porque tem de entrar ao serviço na residencial onde o seu trabalho mensal vale pouco mais que o salário mínimo nacional.
"Gostava de ganhar mais. Quem não gostava?" Nem se importava de vencer o que o relatório do INE diz ser o ordenado médio naquele concelho: 583 euros. Com a mesma pressa de Olga, Tiago Madeira entra no seu carro desportivo. Diz que vai para as piscinas municipais, onde trabalha. Acha que "em Freixo ganha-se pouco", mas, mesmo assim, prefere ficar lá do que sair para o litoral
Olga acredita nos números oficiais, mas franze o sobrolho: "É engraçado. Eu acredito que em Freixo até se tem um nível de vida bom. Já vivi em Foz Côa e noto que aqui as pessoas vivem melhor…" Nem toda a gente concorda. Maria do Rosário Moreno vive na freguesia de Fornos, onde cuida de ovelhas. Queixa-se que o leite é "mal pago e a más horas".
"Isto só é bom para turismo, a agricultura já não dá nada", complementa António Lucas. "Por isso é que toda a gente se vai embora".
Contudo, o rendimento do trabalho não é tudo. Porque há muitos que têm terrenos agrícolas, onde se colhe tudo o que na cidade tem de se comprar no mercado. "Parecendo que não, poupa-se muito. É a batata, o azeite, o vinho, as hortaliças e tudo mais", acentua Olga Gonçalves. Ana Sapage concorda: "Aqui ninguém passa mal. Há sempre alguém que ajuda o vizinho". Por outro lado, quase toda a gente tem casa própria. Quem não tem "consegue uma jeitosa com uma renda entre 150 e 250 euros", prossegue Ana, convicta que "vale mais ganhar 583 euros aqui do que mil no Porto".
Na rua de acesso à igreja, três homens e duas mulheres descascam amêndoa. Adriano Castro paga-lhes 30 euros a elas e 40 a eles por oito horas de trabalho diário. "O pessoal está bem pago proporcionalmente ao que o agricultor recebe pela produção". Trabalham de segunda a sábado. "Se vierem todos os dias é só fazer as contas".
E é por tanta gente viver do trabalho agrícola, muitas das vezes não declarado, que o presidente da Câmara de Freixo, José Santos, estranha os números. "Se dividiram os rendimentos declarados pelo número de habitantes, é natural que resulte um salário baixo para todos". Neste concelho, o autarca é simultaneamente provedor da Misericórdia e presidente da Adega Cooperativa. As três instituições, mais um empreiteiro e uma empresa de transportes empregam cerca de 500 dos 4000 habitantes.