Por Luciano Alvarez, in Jornal Público
Fernando Ruas, presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), disse ao PÚBLICO haver "cada vez mais municípios a pedir reequilíbrio financeiro" das suas contas e que uma das causas é o facto de o Estado estar em dívida para com os municípios num montante que, no final de 2008, quando foi feito o último apanhado geral, rondava os 102 milhões de euros. Embora não tenha dados actuais, Ruas diz que "nunca a dívida foi tão alta" e adivinha "muitas e sérias dificuldades" se o Estado não pagar o que deve às autarquias. Já José Junqueiro, secretário de Estado da Administração Local, lembra os números das dívidas das autarquias e diz que "algumas deram passos maiores que a perna".
Segundo um documento revelado em Maio do ano passado pela ANMP, o valor reclamado pelas autarquias aos serviços e organismos tutelados directa e indirectamente pelo Estado, relativo à dívida vencida em 2008, era de 102 milhões de euros. Reclamaram dívidas 137 autarquias, num valor médio de 745 mil euros.
Fernando Ruas diz não saber exactamente qual será actualmente o estado da dívida às autarquias ("há sempre algo que vai sendo pago e outro tanto que se vai acumulando"), mas diz não ter dúvida de que continua acima dos 100 milhões de euros.
O também presidente da Câmara de Viseu e presidente da mesa da assembleia geral do PSD fala em vários problemas práticos que as câmaras sofrem, "nomeadamente dificuldade em cumprir o QREN (Quadro de Referência Estratégico Nacional)". Diz também que os municípios estão a ter cada vez mais dificuldades "em cumprir os seus programas de apoios sociais".
"Há cada vez mais municípios a pedir o reequilíbrio financeiro. E isso é um problema porque o Governo terá de intervir. Será uma espécie de FMI das câmaras", acrescentou.
Fernando Ruas fala também no "problema simbólico" de "o Estado passar para os cidadãos a ideia de que não consegue cumprir os seus compromissos". "Fazem-se cerimónias públicas, assinam-se documentos e depois o Estado não paga", salientando que "muitas vezes há organismos e ministérios que mostram desconhecimento das dívidas".
"O problema já não é só o tempo que o Estado demora a pagar. É quando paga e se paga. Já nos deparamos com situações em que há documentos assinados e eles não existem nos ministérios", revelou. Fernando Ruas diz ainda que já falou com o ministro das Finanças "sobre a gravidade do problema" e espera ter em breve uma reunião formal.
José Junqueiro começou por revelar alguns números apurados em meados de Junho: "Há neste momento 26 autarquias em saneamento financeiro e mais cinco em reequilíbrio financeiro. As dívidas das autarquias a médio e longo prazo [à banca, por exemplo], excluindo o capital de dívida excepcionado, são de cerca de 2,7 mil milhões de euros e as dívidas aos fornecedores são de cerca de 2,6 mil milhões." Revelou ainda que dois programas de apoio ao pagamento de dívidas das autarquias, financiados pelo Estado e pela banca, envolveram já cerca de 600 milhões de euros.
Por isso, José Junqueiro diz que "há municípios exemplares" na sua gestão, mas há outros que "parecem ter dado passos maiores do que as pernas", tendo "adquirido equipamentos e despesa fixa que têm dificuldade em vencer". E, recordando mais uma vez haver municípios exemplares, "outros há que demoram 400 dias", em média, a pagar as suas dívidas.