Catarina Gomes, in Jornal Público
Percentagem de toxicodependentes que consomem heroína e cocaína por via injectada está a diminuir, mas mesmo a via fumada (com tubos de fumar e cachimbo/garrafa) tem riscos
71,3%
dos utentes estudados continuavam a consumir heroína
24,4%
dos utentes partilhavam seringa no consumo
46,3%
dos toxicopendentes partilhavam tubo de fumar
47,9 %
não usavam qualquer protecção na relação sexual
O kit de consumo de droga distribuído a toxicodependentes para evitar transmissão de infecções como o HIV/sida inclui duas seringas, toalhete de álcool, preservativo, água destilada, filtro, ácido cítrico e recipiente. Um estudo do Instituto da Droga e da Toxicodependência (IDT) diz que o tubo de fumar é um objecto cada vez mais partilhado e recomenda que o kit passe a ter utensílios para droga fumada.
Responsáveis da Coordenação Nacional para a Infecção VIH/sida, que tem competência sobre o conteúdo do kit, dizem estar atentos à situação. "A posição não é consensual" e um eventual acrescento do kit ou criação de um kit para droga fumada estão a ser discutidos com as organizações não-governamentais no terreno, explicou uma fonte do organismo.
Há cada vez mais consumidores de heroína e cocaína que em vez de injectarem as substâncias fumam-nas, algo que é considerado positivo e prova de que as políticas de redução de danos estão a dar frutos, constata um estudo deste ano que acompanhou a evolução durante um ano (2004) de uma amostra de 331 utentes, acompanhados por 15 das 24 equipas de rua do país financiadas pelo IDT. Por ano estima-se que as equipas tenham contacto com cerca de 14 mil toxicodependentes marginalizados.
A tendência crescente é o policonsumo (cerca de 80 por cento misturam várias drogas) e, apesar de estar a diminuir, a heroína continua a ser a droga de eleição. Mas há mudanças de uso. Mais de metade (62,2 por cento) injectavam a substância no início do ano de avaliação, número que desceu para 55,2 por cento passados 12 meses; fumavam heroína 42,9 por cento dos utentes iniciais e subiram para 47,9 por cento.
A mesma tendência foi encontrada em consumidores de cocaína: eram 51 por cento a injectá-la no início da avaliação, passaram a 47,5 por cento ao final de um ano; os que a fumavam eram 50 por cento, tendo passado a 52,6 por cento, refere o estudo a que o PÚBLICO teve acesso e que foi em parte publicado no último número da revista Toxicodependências.
Mesmo entre os toxicodependentes que continuam a injectar-se, houve uma diminuição da partilha de material, algo que é atribuído ao kit de consumo asséptico que as equipas de rua distribuem.
As seringas foram o objecto em que a partilha mais diminuiu (de 64,1 por cento para 24,4 por cento), logo seguido do filtro (33,3 por cento para 19,5 por cento).
Usar seringas traz riscos de transmissão de infecções como o HIV/sida e hepatites, mas o estudo explica que fumar também tem riscos. A partilha de tubos de fumar (feitos de alumínio, papel de estanho do maço de cigarros ou de notas) e de cachimbo/garrafa traz riscos de contágio de hepatites e a tuberculose, explica Paula Andrade, responsável pelo Núcleo de Redução de Danos do IDT, que elaborou o estudo. Daí a proposta de o kit passar a incluir utensílios para fumar.
A partilha do tubo de fumar passou de 23 por cento para 46,3 por cento e do cachimbo/garrafa de 4,6 por cento para 12,2 por cento. Cerca de 20 por cento dos que entraram para programas de metadona deixaram de consumir substâncias ilícitas. O recurso a outros tratamentos (por exemplo, comunidade terapêutica) foi pouco eficaz: cerca de 69 por cento dos que iniciaram tratamento continuaram a consumir.