20.11.07

Pacientes com HIV/Sida percorrem centenas de quilómetros para fugir ao estigma

in Jornal Público

O internamento para os doentes pode ser procurado a 500 quilómeros de distância. A média é de 13,4, segundo uma análise realizada entre 2000 e 2006


Os doentes com HIV/sida chegam a percorrer centenas de quilómetros para serem internados, sobretudo devido ao estigma social da doença, mas a distância média percorrida entre casa e hospital é de 13,4 quilómetros. Os dados constam de uma análise descritiva e geográfica dos internamentos hospitalares por infecção pelo vírus da imunodeficiência humana entre 2000 e 2006, encomendada pela Coordenação Nacional para a Infecção VIH/sida, e que foi elaborada por Maria de Fátima de Pina, professora da Faculdade de Medicina do Porto e investigadora do Instituto de Engenharia Biomédica.

No relatório, datado de Agosto último, refere-se que a maior distância percorrida entre casa e o internamento numa unidade hospitalar se observou em 2003 (524,2 quilómetros).

No entanto, fonte da Coordenação Nacional para a Infecção HIV/sida referiu à Lusa que as distâncias percorridas não se relacionam com a resposta do Serviço Nacional de Saúde, mas com o estigma e a discriminação social que os pacientes pretendem evitar.

A análise vincou ainda que nos grupos etários mais jovens os internamentos têm vindo a diminuir, enquanto os tratamentos nos grupos etários mais velhos (em especial no grupo dos 40-49 anos) estão a aumentar, o que pode reflectir que a necessidade de internamento dos doentes com HIV/sida está a ser retardada progressivamente.
Percebeu-se ainda que a idade média que os doentes tinham a cada episódio de internamento aumentou cerca de cinco anos em ambos os sexos e que, depois da alta hospitalar, os regressos para casa aumentaram.

O relatório também notou que os internamentos classificados no grupo diagnóstico de infecção HIV com ou sem outra situação clínica relacionada estão a aumentar, o que pode "significar que a gravidade dos internamentos tem vindo a diminuir".
O estudo detectou uma grande proporção de internamentos de curta duração, principalmente no grupo de infecção HIV com procedimento extenso em bloco operatório, o que pode "reflectir uma inadequação ou desactualização dos limites de tempo de internamento estipulados" pela Portaria 132/2003 (curta duração, duração normal e evolução prolongada).

Mesmo não considerando o ano passado - os internamentos constantes na base de dados poderão ser inferiores ao efectivamente ocorrido -, observa-se uma constante diminuição no número de internamentos a partir do final do ano de 2002 até Dezembro de 2005. O relatório também sublinhou que em 2006 não havia registo de internamentos em alguns hospitais.

O estudo refere ainda que em todos os anos a proporção de internamentos urgentes supera em muito a dos internamentos programados.

Em 2000 o número de internamentos programados foi de 640 (14,2 por cento), enquanto os urgentes foram mais de 3800 (85,8 por cento). No último ano analisado, os programados traduziram o internamento de 642 indivíduos (16,8 por cento) e os urgentes 3184 (83,1).

O relatório teve como objectivo apresentar "informações inéditas que servirão de fundamentação técnica à Coordenação Nacional para a infecção HIV/sida nos processos de tomada de decisão sobre as políticas públicas de combate à doença", lê-se no documento.

A percentagem de doentes que recebem serviço domiciliário é muito pequena, estando abaixo de um por cento, e em relação a mortes, os números têm-se mantido constantes, em torno dos 16 por cento, revela o documento da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto. O levantamento feito indica 30.744 internamentos entre 1 de Janeiro de 2000 e 31 de Dezembro de 2006 e as estatísticas apontam para uma maioria masculina de pacientes: 75,6 por cento (23.270 indivíduos) contra 24,2 por cento (7504) do sexo feminino. Em média, o número de internamentos no sexo masculino foi de 277 por mês e de 89,5 no sexo feminino.

Segundo o documento, o registo de internamentos tem vindo a diminuir significativamente nos homens, principalmente a partir de Abril de 2005. Até esta altura a diminuição foi de quatro unidades por ano e a partir desse mês diminuiu anualmente 30 unidades. Nas mulheres notou-se também uma tendência significativa de decréscimo no número de internamentos, desde Junho de 2004, no entanto essa curva é bastante menos acentuada do que nos homens. Houve um aumento de dois internamentos por ano desde Janeiro de 2000 até Junho de 2004 e a partir dessa data uma diminuição anual de seis internamentos.

O relatório sublinha que em 2006 não havia qualquer registo de internamentos em alguns hospitais.