in Jornal Público
Sentada no sofá do hall de entrada de uma casa do centro histórico de Coimbra, Fernanda Pereira, de 92 anos, puxa por dois fios que diz trazer "sempre" ao peito. "Nunca os largo", insiste. Um é um terço. O outro um objecto do tamanho de um mostrador de relógio de pulso, um controlo remoto que traz pendurado por um cordão prateado. E é a este último que se agarra em momentos de aflição: "Quando estou para morrer, toco e vivo sempre mais algum tempo."
O controlo remoto, que acciona um telefone em alta-voz e provoca a resposta pronta de uma operadora da central telefónica, faz parte do projecto de teleassistência permanente aos idosos sozinhos que do centro histórico a câmara municipal alargou ao resto do concelho. Conta Fernanda Pereira que foi o que lhe valeu, há dois anos, quando caiu e partiu um pé. A voz da profissional da central de assistência, ecoando por toda a casa, foi-a acalmando: "Vou já mandar uma ambulância." "Tenha calma, o socorro está a chegar."
Mal o botão é accionado, a técnica tem acesso a todos os dados relativos à pessoa que originou a ligação: nome ("Dona Fernandinha"), idade, morada, números de telefone de familiares, vizinhos e amigos... Alguns só ligam em caso de emergência, muitos fazem-no para quebrar a solidão, como Raul Duarte, de 89 anos, que acciona o sistema (através do controlo remoto que usa como um relógio de pulso) para a quinzenal saudação à equipa da teleassistência: "Então muito bom dia! Como estão?" "Isto anima!", diz depois, a rir. E, mais do que isso, proporciona-lhe uma sensação de segurança: "Felizmente nunca precisei, mas já viu o que é se me dá alguma aflição e eu aqui sozinho?"
Há também quem não se tenha adaptado. Quem tenha dificuldade em entender o sistema e, simplesmente, abandone o controlo remoto entre outras bugigangas, acabando por desistir do serviço. Mas o número de utentes, meia dúzia quando ele foi criado, há três anos, tem vindo a crescer: actualmente são 74 idosos que beneficiam deste tipo de apoio que a câmara municipal paga à empresa de assistência Helphone. O investimento chegou a ser criticado pela oposição, na autarquia. Mas venceu o argumento da maioria: "Se salvar uma única vida, ele já terá valido a pena."
74
O programa criado há três anos começou com um reduzido número de utentes. Hoje presta serviço a 74 idosos