1.3.08

Cerco ao insucesso escolar

Virgínia Alves, in Jornal de Notícias

Os meninos que frequentam duas escolas para aprender sem perder os amigos


Ler e escrever ainda não eram competências adquiridas no final do 4.º ano. A retenção era a única solução, mas a idade indicava que deveriam estar a frequentar o 2.º ciclo, para onde transitaram os colegas de turma. Assim foi com um grupo de 10 alunos da escola EB1 do Cerco do Porto, mas um projecto-piloto permite-lhes frequentar as duas escolas (EB1 e EB 2,3). Ou seja, estão integrados com os colegas da sua idade e ao mesmo tempo adquirem as competências em falta.

"São crianças com problemas, para os quais nem sempre temos resposta", admitiu Joaquina Quintas, responsável pela EB1 do Cerco, do Porto. Problemas que muitas vezes resultam no abandono escolar, mais ainda quando não se sentem integrados e ficam afastados dos seus colegas.

A reunião com os colegas na mesma turma é o desejo de todos, como revelou o Leandro, de 11 anos, ao dizer, enquanto tenta resolver no caderno um problema de Matemárica "Não estudava, mas agora esforço-me, quero apanhar os meus colegas".

A resposta da escola ao desejo dos miúdos foi o desenvolvimento de um projecto-piloto, que permite aos meninos frequentar três manhãs por semana a escola EB1 (acompanhados por duas professoras), "onde adquirem as competências ainda não conseguidas de matemática, português e estudo do meio" e, ao mesmo tempo, frequentar uma turma da EB2, 3.

"A ideia é tentar articular aprendizagens, por forma a que possam ter sucesso ao chegarem ao unificado, para seguirem pelo menos um curso profissional", disse a professora Cristina Costa.

Um curso profissional é o sonho do Eugénio, do Rui e do Filipe, que querem ser mecânicos e ter uma "oficina em sociedade". Por isso, garantem que agora estudam "muito mais", e já "não é tão difícil", agora que percebem o que estão a ler.

Comportamento

As questões comportamentais não estão afastadas do insucesso escolar destas crianças. O Ruben admitiu que "batia nos colegas", e o Luís confessou só "brincar na sala de aula".

Atitudes que, garantem, já não ter. "A agressividade, o desafiar o sistema, é a forma de protesto de destas crianças, muitas vezes para chamar a atenção. Alguns dizem que fazem sem nunca o ter feito. O herói é agressivo", frisou a professora Ana Mourão.

Cada um destes dez meninos, com a sua história de vida, mais ou menos estruturada, vai contando os seus sonhos, enquanto dizem que se têm "esforçado muito mais para aprender", como o Diogo que é delegado de turma e quer ser futebolista, ou o Sérgio cujo sonho "é ser polícia".

As únicas meninas da turma, a Nadia, que quer ser empregada de mesa e a Bruna, que deseja ser educadora, confessam que não estudavam, porque não tinham tempo, "ajudava a arrumar a casa", conta a Nadia, ou então "não percebia a matéria e desistia", confessou a Bruna.