Leonor Paiva Watson, in Jornal de Notícias
Uma em cada cinco crianças está exposta à pobreza, em Portugal. Somos um dos países da União Europeia onde esta realidade mais se verifica, revela o último relatório da Comissão Europeia sobre a matéria. Os dados são tão ou mais preocupantes se tivermos em conta que o problema é extensivo aos agregados com emprego.
"Mesmo trabalhando, os pais são pobres. Estão endividados, com a casa e os electrodomésticos, com os bens básicos. Não há dinheiro. E não há dinheiro para coisas básicas. As suas crianças chegam às aulas sem terem tomado o pequeno- almoço e depois não se concentram e acabam por abandonar a escola", analisa Isabel Jonet, do Banco Alimentar, acrescentando que o "problema há muito chegou à classe média".
De facto, tem sido regra que ao lado da pobreza caminhe o absentismo escolar. Se tivermos em conta que este gera mais emprego precário, então, temos um problema inter-geracional. No relatório de Bruxelas, onde são apresentadas os riscos e/ou as causas desta situação, o abandono da escola aparece no topo da lista.
Na mesma listagem constam os baixos níveis de qualificação, a participação diminuta em accções de aprendizagem no decorrer da vida, a info-exclusão. Se este drama, que passa de geração para geração, não for quebrado, "o legado que as famílias pobres deixarão aos seus filhos será uma pobreza que se agravará", alerta o Padre Lino Maia, da Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade Social (CNIS).
A pobreza propaga-se
A pergunta que se coloca é como quebrar o ciclo? A resposta é unanime: através da Educação. Mas como fomentar uma Educação decente para todos? Com um Estado-providência ou com um Estado solidário?
"Não é uma situação que se possa resolver com um clique do Governo. É preciso que este seja solucionado com as famílias, com as instituições da Igreja, com a comunidade, com as autarquias. E isto é a definição do Estado solidário", argumenta o presidente da CNIS, acreditando que o Estado-providência tem grandes limitações.
No sentido contrário, as estatísticas da sociologia, ou de organizações como a Unicef, indicam que os países onde as crianças vivem melhor são os que têm um bom Estado-providência, como a Dinamarca, a Suécia, a Finlândia ou a Noruega. A socióloga Anália Torres entende que "não se quebra este ciclo da pobreza sem investir seriamente na Educação, mas não haverá uma boa educação para todos se não houver um bom Estado-providência", avisou a socióloga Anália Torres.
Um Estado que, para os mais pobres, deve "continuar a incentivar, por exemplo, o Rendimento Social de Inserção" - tal como destaca o próprio relatório europeu; e que para a classe média, a caminhar para a pobreza, "poderia incentivar o desagravamento de impostos", sugeriu.
Certo é que, para quem trabalha com os mais desfavorecidos diariamente, a pobreza parece estar a agravar-se. O padre Lino Maia entende que isto é ainda mais verdade no interior Norte e no Alentejo, bem como nas zonas periféricas das metrópoles Lisboa e Porto (ver páginas ao lado). Nestas últimas, o que mais se verifica é o emprego precário ou a falta dele e as condições em que se vive em bairros cada vez mais degradados e onde a revolta cresce.
"Quem cresce na pobreza educa em si a revolta e o desencanto", conclui o presidente da CNIS.