Lucília Tiago, in Jornal de Notícias
Presidente da CIP acredita que Governo terá de tomar medidas adicionais para combater a crise e defende que estas devem ser direccionadas para os vários sectores. Associações discutem hoje soluções específicas
No dia em que o Conselho Nacional da Confederação da Indústria Portuguesa se reúne para delinear medidas de combate à crise, o presidente da CIP, Francisco van Zeller, referiu ao JN que está por provar que haja empresas a aproveitarem-se da actual conjuntura para encerrar. E defende a suspensão do aumento da Taxa Social Única nos contratos a prazo.
Esta crise parece longe de estar controlada. Deveriam ser tomadas novas medidas?
Temos de ter presente que esta crise é completamente nova. Não podemos acusar os governos de fazerem pouco ou mal porque eles também não sabem quando é que isto vai acabar. Mas é natural que tenham de ser tomadas novas medidas.
Quais? Reduções de impostos?
Eventualmente sim, porque é uma das medidas que está por tomar e que terá ainda de ser abordada. Poderão ser alterações no IRC, mas muito bem direccionadas às áreas que precisam. No IRS também poderá haver reduções, mas com este perfil como agora foi feito para os painéis solares.
Deveria adiar-se a entrada em vigor do agravamento da TSU dos contratos a prazo?
Terá de haver uma suspensão dessa cláusula. Não faz sentido procurar estimular o emprego e ao mesmo tempo encarecê-lo. Neste momento, um contrato a prazo é um óptimo emprego. Não seria há dois anos, mas agora muito pior é não ter emprego nenhum.
O Governo foi acusado de ignorar a crise durante algum tempo. Como avalia o que foi entretanto feito?
No início, não há duvida que teve uma posição de negação, mas agora está perfeitamente alinhado com o resto da Europa. Todas as medidas que estamos a tomar são comuns, excepto na parte fiscal, onde estamos atrasados.
O Conselho Nacional da CIP reúne hoje para discutir formas de atacar a crise. A abordagem é sectorial?
Sim. Temos até em curso um inquérito sectorial - cujas conclusões deverão ficar prontas ainda esta semana - para conhecer a situação por sectores. Não queremos as médias porque estas iludem e misturam a roupa, os automóveis, a comida, a construção civil e os problemas são diferentes. Isto vai permitir-nos identificar os pontos fracos de cada sector.
Que tipo de soluções defendem?
Já recebemos algumas sugestões que mostram que as soluções podem ser variadas: reforços de tesouraria, alterações na devolução do IVA, redução do horário de trabalho... Vamos condensar estas propostas e entregá-las ao Governo. O objectivo é que haja abordagens sectoriais como já houve para o automóvel ou para o têxtil, pois há outros sectores a precisar de ajuda pela descida das exportações.
A Autoridade para as Condições do Trabalho alertou que há empresas a aproveitarem-se da crise para despedir...
Isso está por demonstrar. Não se pode desmentir porque são 350 mil empresas e há de tudo. Mas isso não foi ainda provado.
As empresas queixam-se de dificuldades em obter crédito?
A maior queixa neste momento é estar caro - há situações de taxas de juro de 10%.
Antes de avançar para despedimentos há outras soluções?
Com alguns sacrifícios internos talvez se possam adiar os despedimentos. Há o lay-off e a redução dos horários. Reduções de salários não temos experiência e duvido que isso funcione. Isto só é possível por acordo colectivo, e pode ser nas horas extraordinárias ou regalias de transportes. Se nada disto funcionar, então não há mais nada a fazer senão reduzir o pessoal como temos visto pelo mundo inteiro.
Há empresas com lucros elevados no ano passado e que este ano já anunciaram despedimentos por perspectivarem uma quebra dos resultados. Como comenta?
É uma forma de gestão que sempre se usou e que se baseia no princípio de que os ajustes se devem fazer enquanto há dinheiro. Isso é a situação normal que sempre houve, porque em condições normais essas pessoas despedidas conseguiriam encontrar outro emprego. Na situação actual, parece-me um bocadinho mais vergonhoso. Mas as empresas têm uma grande capacidade de previsão e sabem se os contratos para daqui a seis meses já estão a falhar, podendo optar por começar já a dispensar pessoal para acertar as despesas. Tem de ser visto caso a caso e não se pode atirar pedras a empresas que estão muitas vezes a fazer o melhor que sabem e a tentar proteger os trabalhadores.