16.4.09

Só Europa do leste tem crianças mais pobres que Portugal

Ana Bela Ferreira, in Diário de Notícias

Estudo revelado ontem pelo Banco de Portugal revela que existiam, em 2006, 300 mil crianças pobres. O nosso país é também o quarto da Europa com maior percentagem de crianças carenciadas (24%), apenas é ultrapassado pelos países do Leste (Roménia, Lituânia e Polónia). Ministro do Trabalho admitiu que situação pode agravar-se com a actual crise.

Tatiana, de cinco anos, vive numa barraca de tábuas e chapas de zinco, sem água e sem luz no concelho de Santa Cruz, na Ilha da Madeira. Tem medo do escuro dos ratos e das lagartixas que rodeiam a casa. "Quando é que vamos sair daqui?", não pára de perguntar à mãe.

A menina madeirense é uma das 300 mil crianças portuguesas que vivem na pobreza. Um número que faz de Portugal um dos países da União Europeia (UE) com mais crianças pobres (24%), apenas ultrapassado pelos países de leste que recentemente aderiram à UE: Roménia, Lituânia e Polónia, de acordo com dados recolhidos em 2004 e divulgados no ano passado pela Comissão Europeia.

Os dados nacionais remetem ainda para a existência de dois milhões de pobres, segundo uma análise divulgada ontem pelo Banco de Portugal e que teve por base informações do Instituto Nacional de Estatística (INE) relativos a 2005/2006. Estes valores são anteriores à actual crise económica e podem já ter aumentado, reconhece Bruto da Costa, presidente do Conselho Económico e Social.

A opinião é partilhada pelo autor do estudo, Nuno Alves do Departamento de Estudos Económicos do Banco de Portugal, que nas conclusões sublinha: "O aumento da taxa de desemprego" irá contribuir "para aumentar a pobreza em Portugal no futuro próximo".

Também o ministro do Trabalho e da Segurança Social, Vieira da Silva, reconheceu ontem aos jornalistas que a crise actual "pode agravar as situações de desigualdades sociais" e que este "é um risco maior em virtude de desemprego".

Por isso "a prioridade é combater o desemprego", acrescentou. O ministro disse ainda desconhecer os números do Banco de Portugal e adiantou que trabalha apenas com os europeus que colocam os níveis da pobreza nacional em 18%.

O Presidente da República, Cavaco Silva, alertou para os números do Banco de Portugal, afirmando que o combate ao desemprego terá que ser uma prioridade, sendo necessário olhar para aqueles que estão a ser atingidos de forma particular pela crise".

Para Manuela Silva, presidente Comissão Nacional Justiça e Paz (CNJP), o número actual de pobres deve ser maior do que o de 2006. "Os trabalhadores pobres devem ter aumentado devido ao agravamento das condições de trabalho e à precariedade", refere. Uma situação que provoca "maior incidência relativa na população infantil", explica.

Estas crianças pobres estão geralmente integradas em famílias numerosas. E como indica o estudo de Nuno Alves as famílias com mais de seis elementos são as mais deficitárias (42,2%), justificando assim a elevada taxa de crianças carenciadas. Mas, os agregados com apenas uma pessoa também apresentam valores elevados (26,8%).

Esta última realidade ajuda a justificar os níveis de pobreza infantil, segundo Eugénio Fonseca, presidente a da Cáritas. "Nestes casos as crianças são confiadas às mães que, por tradição, ganham menos que os homens e têm de suportar os custos das crianças", diz.

A viver em situação de pobreza estão também os idosos reformados. "A precariedade acentuada nos idosos deve-se ao facto de estes não terem feito descontos e de agora terem uma pensão mínima que corresponde a metade do nível médio do limiar da pobreza", diz Eugénio Fonseca.

São consideradas pobres as pessoas que vivam com menos de 382 euros mensais.