22.4.09

Votação antecipada da declaração sobre racismo para salvar cimeira da ONU

Ana Fonseca Pereira, in Jornal Público

Paris diz que aprovação do documento representa um fracasso para a tentativa de desestabilização iraniana


A declaração final da conferência sobre o racismo foi aprovada ontem, três dias antes do final dos trabalhos em Genebra, numa iniciativa destinada a salvar do fracasso a reunião das Nações Unidas, abalada na véspera pelo discurso do Presidente iraniano. Israel respondeu às denúncias equiparando Mahmoud Ahmadinejad a Adolf Hitler.

O projecto que, ao contrário do saído da conferência de Durban, em 2001, não faz referências explícitas a Israel ou ao conflito no Médio Oriente, foi aprovado sem debate e por aclamação ao início da tarde. Desde o incendiário discurso de Ahmadinejad - que acusou Israel de ser "o mais cruel regime racista", criado com o apoio do Ocidente - que as Nações Unidas tentavam minimizar os estragos e recentrar a discussão no combate ao racismo e à discriminação de imigrantes e minorias.
A imprensa internacional deu a conferência por perdida, mas a alta-
-comissária da ONU para os Direitos Humanos, Navanethem Pillay, considerou um "sucesso" o facto de, após meses de negociações, a declaração "ter sido aprovada por todos os estados, com excepção dos nove" países ocidentais que boicotaram o encontro.

Por seu lado, o ministro dos Negócios Estrangeiros francês criticou "a diplomacia da cadeira vazia" e disse que os participantes mostraram que Ahmadinejad "falhou" quando tentou usar a reunião de Genebra como "uma tribuna de ódio". Apesar de admitir que o texto "não é perfeito", Bernard Kouchner diz que ele integra "tudo o que os países ocidentais desejavam", ao não incluir referências directas a Israel ou aos alegados direitos das religiões a não serem criticadas. Em comunicado, também a diplomacia portuguesa considera que a declaração "constitui um bom resultado" para as pretensões nacionais e europeias, centrando-se "efectivamente" no combate ao racismo.

Um diplomata sul-americano contou à AFP que os participantes "decidiram acelerar" a aprovação do texto "para impedir que outros países se sentissem tentados a partir, depois do incidente" de anteontem. Durante o discurso do Presidente iraniano, os diplomatas europeus saíram da sala e a delegação checa anunciou o abandono definitivo dos trabalhos. A decisão, tal como a ausência de vários países ocidentais, foi muito criticada mas, ao contrário de outras delegações presentes, Portugal diz "respeitar" a opção dos seus parceiros.

Já em Israel as críticas visaram a ONU, por organizar uma conferência que, nas palavras do vice-primeiro-ministro, Silvan Shalom, "é a prova viva que o mundo ainda não aprendeu as lições" do Holocausto. As palavras de Ahmadinejad foram repudiadas por todos os dirigentes - o presidente do Knesset falou no "regresso de Hitler -, mas soube-se entretanto que o discurso foi alterado à última hora. O Presidente iraniano, recebido ontem por uma multidão em Teerão, decidiu omitir a parte em que descrevia o Holocausto como "ambíguo e dúbio".