Alexandra Campos, in Jornal Público
A epidemia de gripe à escala global é moderada, mas vírus "pode reservar surpresas", avisou a directora-geral da OMS. A organização prevê que H1N1 circule no mundo entre um a dois anos
Depois de muitas hesitações, a Organização Mundial de Saúde (OMS) deu ontem o passo esperado. Anunciou a passagem ao nível máximo de alerta face à gripe A (H1N1), declarando oficialmente a primeira pandemia do século XXI. É, para já, uma pandemia "moderada", mas, tendo em conta a situação actual, "o vírus não pode ser travado", justificou a directora-geral da OMS, Margaret Chan, na conferência de imprensa que se seguiu à reunião com o comité de especialistas, em Genebra.
Foi a globalização da disseminação do vírus que levou a OMS a elevar o nível de alerta, não a gravidade da doença. "Pandemia significa extensão [geográfica do vírus]. Um maior nível de alerta pandémico não significa necessariamente que teremos um vírus mais perigoso ou que muita gente vá ficar gravemente doente", reafirmou a directora-geral da OMS, que pretende evitar o alarme injustificado da população.
Por que se avançou então para a declaração de pandemia? Porque se tornou inquestionável que em vários países fora da América do Norte já há transmissão local sustentada, sobretudo no hemisfério Sul, onde começou agora a época da gripe. Anteontem, aliás, a OMS auscultou os oito países mais afectados, justamente para fundamentar esta decisão "muito difícil", nas palavras de Chan.
A situação na Austrália e no Chile, onde nos últimos dias os casos confirmados cresceram de forma exponencial, parece ter funcionado também como um estímulo decisivo para a declaração de epidemia à escala global. O fenómeno de transmissão local fora do continente americano já era evidente, mas a OMS preferiu aguardar mais uns dias para preparar os seus 193 membros e evitar reacções de pânico - reacções que neste momento não fazem sentido, até porque a mortalidade do vírus é, por enquanto, pouco mais elevada do que a da gripe sazonal (à excepção do México, onde os primeiros casos surgiram, em Abril). A gripe sazonal, a de todos os Invernos, mata entre 250 a 500 mil pessoas por ano.
A OMS avançou também para a declaração de pandemia porque o vírus pode "reservar surpresas", advertiu a directora-geral. Os especialistas receiam que o H1N1 possa sofrer mutações ou combinar-se com uma estirpe mais virulenta.
"Uma maratona"
O aumento do nível de alerta foi acompanhado de uma série de recomendações a todos os países, incluindo os não afectados pela nova gripe, de forma a reduzir ao máximo o impacto da pandemia sobre a população. Os Estados são livres, porém, de aplicar as recomendações da forma que entenderem, ajustando-as à sua situação concreta.
A OMS prevê que a nova estirpe do vírus circule no planeta "entre um a dois anos", antecipou o número dois da organização, Keiji Fukuda. "Quando se está a falar de pandemia de gripe, está a falar-se de uma maratona, não de um sprint", avisou. Os países foram aconselhados a fornecer informações regulares à população acerca da evolução da pandemia, tratamentos e medidas profilácticas, e a planificar futuras campanhas de vacinação, mas a organização não recomendou restrições ao movimento de pessoas e bens.
Comentando a declaração de pandemia, o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, convidou a comunidade internacional a reagir com sangue-frio. "A nossa melhor resposta é uma demonstração cerrada de solidariedade", defendeu o secretário-geral da ONU, que prometeu trabalhar com os governos e a OMS para que "a resposta seja o mais coordenada e eficaz possível".
Nos EUA, a Casa Branca não demonstrou surpresa nem antecipou grandes alterações às medidas "enérgicas" já tomadas. "O Presidente trata [a nova gripe] como um assunto muito sério desde o início", disse um porta-voz. Face à declaração da OMS, o ministro da Saúde do México decidiu manter o nível de alerta máximo que tencionava diminuir na segunda-feira, face à diminuição de novos casos. "Não podemos baixar o alerta", justificou Jose Angel Cordova, que demonstrou também preocupação pela previsível "segunda vaga" da infecção no final do ano.com agências
A directora-geral da Organização Mundial de Saúde, Margaret Chan, disse que o vírus A (H1N1) "já não pode ser travado"