Alexandre Salgueiro, in Correio da Manhã
António e Piedade Reis, de 47 e 42 anos, tinham, até há pouco tempo, uma vida confortável. Porém, sem que nada o fizesse prever, a empresa de engarrafamento de água onde trabalhavam entrou em processo de insolvência e deixou-os com três meses de salários e subsídios em atraso.
De um momento para o outro, o casal do Fundão viu-se sem dinheiro para cumprir os compromissos assumidos com o banco e para fazer face às despesas diárias. Com dois filhos para sustentar, teve de recorrer à Loja Social do Fundão, que os ajuda com alimentos e vestuário.
De família que contribuía com regularidade para as campanhas de solidariedade, passaram a ter de viver dessas mesmas campanhas. "É uma situação angustiante, mas temporária. Mais vale pedir do que roubar", afirma o encarregado de armazém, que assegura ter alternativas de emprego caso a fábrica não seja reaberta. "O trabalho não me mete medo e tenho a certeza de que vou encontrar alguma coisa, e a família vai dar a volta à situação. E no próximo ano, voltaremos a viver o Natal em condições", assegura.
Casos como os de António e Piedade começam a ser cada vez mais frequentes na Loja Social do Fundão. A estrutura abriu há ano e meio para poder ajudar famílias carenciadas, mas o perfil dos agregados tem vindo a mudar. Nos primeiros meses, diz Clara Ramos, responsável pelo Gabinete de Acção Social da Câmara do Fundão, "quem procurava ajuda eram pessoas em situações de pobreza de longa duração, que nunca conheceram outra realidade". Agora, "há cada vez mais pedidos de casais, muitos deles jovens, que viviam com algum conforto e que se viram desempregados e sem fonte de rendimento para fazer face às suas necessidades".
Esta é uma realidade que tem vindo a aumentar e todos os indicadores apontam para que venha a piorar em 2011. De resto, o número de famílias atendidas na Loja Social passou de 30 a 70 por mês. Para dar resposta às necessidades, "será preciso haver uma maior colaboração outras instituições e uma maior mobilização da sociedade civil", diz Clara Ramos.
CONFERÊNCIAS SÃO VICENTE DE PAULO AJUDAM 33 MIL
As Conferências de S. Vicente de Paulo desempenham um trabalho importante em Castelo Branco mas ajudam mais de 33 mil pessoas em todo o País. "Um trabalho que não é visto mas é significativo", diz António Correia Saraiva. O presidente das conferências vicentinas defende que é preciso fazer um acompanhamento mais próximo das situações para ajudar as pessoas a sair da pobreza porque, "chegar a casa das famílias e despejar alimentos não chega".
BANCO ALIMENTAR RECOLHE 70 TONELADAS
Apesar do agravamento da crise, a Campanha de Natal do Banco Alimentar Contra a Fome recolheu mais de 70 toneladas de alimentos em todo o distrito. Uma quantidade recorde que deixa satisfeitos os responsáveis das duas instituições que no território de Castelo Branco fazem as recolhas: Banco Alimentar da Cova da Beira (BACB), no Norte, e Associação Voluntariado Solidário (AVS), no Sul. No total, as associações prestam auxílio a quase seis mil pessoas em 15 concelhos, incluindo sete do distrito da Guarda.
Apesar da recolha de alimentos ter aumentado na campanha natalícia, Paulo Pinheiro, presidente da Direcção do BACB, revela que "este ano vão ser distribuídos menos 30 por cento de bens alimentares". A razão prende-se com a diminuição de donativos fora dos períodos de campanha e com a decrescente contribuição da Federação de Banco Alimentares.
DISCURSO DIRECTO
"SITUAÇÕES AFLITIVAS": António Saraiva, Pres. da Sociedade S. Vicente de Paulo
Correio da Manhã – Os pedidos de ajuda têm aumentado?
– António Saraiva – Têm aumentado muito. O desemprego cresceu e estamos a chegar à fase em que o subsídio está a acabar. Há cada vez há mais pessoas em situações aflitivas, mas algumas têm vergonha de pedir ajuda.
– De que forma estão as Conferências de S. Vicente de Paulo a intervir?
– Providenciamos alimentação, ajuda para pagar contas, medicamentos e rendas de casa. E todos os dias temos novos pedidos.
– Conseguem dar resposta?
– Por agora sim, mas temo que o cenário venha a piorar