Bárbara Wong, in Público
Fenprof vai fazer queixa do Ministério da Educação à OMS, à UNESCO e à Comissão Europeia
Para identificar as crianças com deficiências, o Ministério da Educação adoptou um critério que não é o correcto, acusam dezenas de investigadores reunidos no Fórum de Estudos de Educação Inclusiva (FEEI). O resultado imediato é que, dos mais de 60 mil alunos que eram acompanhados porque tinham deficiências ou necessidades educativas especiais, apenas 24.600 são apoiados. Ou seja, 35 mil ficaram de fora.
A Federação Nacional dos Professores (Fenprof) também contesta a classificação adoptada e pretende denunciar a tutela à Organização Mundial de Saúde, à UNESCO e à Comissão Europeia. A medida foi tomada por razões economicistas, deixando alunos com necessidades educativas especiais sem apoio, acusa.Em causa está a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (conhecida por CIF), que é um critério que deve ser aplicado a adultos e só no âmbito da saúde, recomenda a Organização Mundial de Saúde (OMS). O que acontece, dizem os peritos do FEEI e a Fenprof, é que o ministério decidiu usá-lo para avaliar crianças e jovens com deficiências ou com necessidades educativas especiais (NEE). Resultado: só os primeiros é que são identificados e têm apoio.
Além disso - referem os professores e investigadores de 18 universidades e politécnicos reunidos no FEEI -, a CIF nem sequer deveria ser utilizada, porque o próprio autor da classificação está a adaptá-la a crianças e jovens, por sugestão da OMS."A forma como o ministério sugere a aplicação da CIF é contrária às recomendações da própria CIF", escreve o FEEI, numa tomada de posição conjunta sobre o tema, enviada para a tutela. E pergunta: que meios humanos estarão nas escolas para que a aplicação da CIF seja feita correctamente? Aparentemente, nenhuns, responde a Fenprof, já que só os professores é que estão a ser "informados" e não a fazer formação sobre a CIF, denuncia o dirigente sindical Vítor Gomes."
É preciso desenvolver novos modelos de elegibilidade, que não se centrem na deficiência para dar resposta aos alunos com NEE", defende David Rodrigues, responsável pelo FEEI e professor na Faculdade de Motricidade Humana da Universidade Técnica de Lisboa. "Em Portugal, temos mais de cem mil alunos com NEE entregues à sua sorte", contabiliza Luís de Miranda Correia, catedrático da Universidade do Minho, num texto enviado ao PÚBLICO, onde explica que os estudos efectuados noutros países apontam para que haja entre 10 a 12 por cento de crianças com NEE - mas que a tutela diz que são apenas 1,8 por cento.
A educação para a inclusão está a regredir, num país que foi pioneiro, lamentam José Morgado, professor no Instituto Superior de Psicologia Aplicada e Ana Maria Bénard da Costa, anterior responsável pela Educação Inclusiva do ministério de Marçal Grilo.
Com a CIF nem todas as crianças que precisam estão a ter apoio, porque dos seis mil professores especialistas nesta área, apenas 2150 continuam a dar apoio. "É inacreditável o que se está a passar. Não se deve classificar as crianças para as separar das outras. O conceito de inclusão é o oposto, é ter todas as crianças na mesma sala", reage Ana Maria Bénard da Costa. O FEEI e a Fenprof pedem ao ministério que os receba. O PÚBLICO tentou ouvir a tutela, sem sucesso.