12.3.07

A política de inclusão social na UE

Fernando Marques, in Notícias da Amadora

A acção contra a pobreza e a exclusão social passou a ter uma maior relevância na UE no início dos anos 2000, através de uma política de inclusão social baseada essencialmente num processo de coordenação de políticas nacionais, no quadro de objectivos comuns e de um acompanhamento e avaliação a nível europeu.

As cimeiras de Lisboa e de Nice, realizadas em 2000, e a de Laeken,em 2001, traçaram o quadro essencial para este processo, incluindo a elaboração de um conjunto de 18 indicadores estatísticos comuns. Cada Estado-Membro passou, desde 2001, a elaborar um Plano Nacional de Acção para a Inclusão, de horizonte bianual, e, ainda neste ano, a UE aprovou um relatório conjunto baseado na apreciação destes primeiros planos.

No início da década, 15 por cento dos cidadãos dos então 15 países da UE eram pobres (20% em Portugal), no sentido de que viviam com menos de 60 por cento de um rendimento médio, dos quais 9 por cento eram persistentemente pobres (15% em Portugal), e os 20 por cento mais afortunados tinham rendimentos 4,4 vezes superiores aos 20 por cento no fundo da escala (6,5 em Portugal). O desemprego era de 7,3 por cento. Apesar desta situação ser considerada “inaceitável”, não se definiu nenhum objectivo global europeu para a redução da pobreza. Porém, foi afirmado, na Cimeira de Lisboa e reafirmado depois, que deveriam “ser tomadas medidas que tenham um decisivo impacto no que respeita à erradicação da pobreza”.

Foi neste quadro que se estabeleceram objectivos comuns a nível europeu, na base dos quais seriam elaborados os planos nacionais de acção: a promoção da participação no emprego e o acesso de todos aos recursos; a prevenção dos riscos de inclusão; a actuação em favor dos mais vulneráveis; a mobilização do conjunto dos intervenientes. Conseguiriam estes planos, através das medidas neles inseridas, erradicar a pobreza tendo como horizonte o ano de 2010?

O Relatório Conjunto sobre a Inclusão Social de 2001 continha uma apreciação crítica dos planos nacionais. O desemprego foi apontado como o principal factor de risco de pobreza e de exclusão, mas salientaram-se novos riscos, entre outros, as alterações estruturais do mercado de trabalho, o aumento da população dependente e as mudanças na composição dos agregados familiares. Apesar disso, segundo a análise feita, apenas alguns planos foram além de intenções gerais, definiram metas específicas e quantificadas e fixaram recursos adequados. Estas críticas deixaram antever que o seu impacto seria limitado.

A ausência de estatísticas adequadas (devido à transição na UE para um novo instrumento sobre estatísticas de rendimento e de condições de vida) torna difícil a avaliação, mas o risco de pobreza não se reduziu, tendo passado de 15 por cento em 1999 para 16 por cento em 2004. O desemprego agravou-se neste mesmo período. Um elevado número de trabalhadores tem estatutos precários de trabalho e as desigualdades têm-se vindo a acentuar. Tudo isto não significa que as políticas de inclusão social sejam inúteis – sem elas, a situação seria de certeza pior. Faltam-nos muitas vezes instrumentos para fazer a avaliação da ausência de políticas, mas, por exemplo, sem as transferências sociais o risco de pobreza em 2003 na UE25 seria de 40 por cento e não de 16 por cento. O problema está em como dar mais eficácia a estas políticas.

Esta é uma questão central que alimentou o debate sobre a revisão da Estratégia de Lisboa e o método de coordenação de políticas sociais nos vários países. Mas, o que se aprovou resulta em mensagens contraditórias. Por um lado, considera-se que a política de inclusão social deve ser mais centrada nos objectivos; mais integrada com a economia e o emprego, bem como com as outras vertentes da política de protecção e inclusão social (as pensões e os cuidados de saúde e os cuidados prolongados); mais visível.

Por outro, a Estratégia de Lisboa Revista põe de novo a tónica na economia, retomando a perspectiva liberal de que esta arrasta o emprego e melhora a situação social. A principal debilidade destas políticas não resulta tanto da sua natureza intrínseca mas antes da sua incapacidade para contrabalançarem quer processos económicos e sociais que geram pobreza, desigualdades e exclusão social quer a própria orientação doutras políticas comunitárias. Recordemos que a política monetária está apenas ancorada na estabilidade de preços e não no emprego; que as preocupações financeiras se estão a sobrepor a objectivos de política social.

No próprio âmbito das políticas de protecção e de inclusão social, as reformas em curso da segurança social estão a reduzir as pensões determinadas pelos sistemas públicos, o que está a conduzir ao recurso a pensões complementares, com sacrifícios dos valores da solidariedade e com o aumento das desigualdades. Trata-se de uma evolução que a Comissão Europeia não só constata como explicitamente apoia (por exemplo, na Comunicação de Outubro passado sobre o futuro demográfico da Europa). A perspectiva de uma União Europeia que em 2010 terá erradicado a pobreza e a exclusão social não se afigura assim credível.