12.3.07

Só 1,5 por cento dos portugueses têm acesso a serviços de saúde mental

Catarina Gomes, in Jornal Público

Comissão Nacional para a Reestruturação dos Serviços Mentais quer psiquiatras dos hospitais a prestar parte dos cuidados em centros de saúde. Relatório final fica pronto este mês

O diagnóstico do problema está feito: só cerca de 150 mil portugueses - 1,5 por cento da população - têm acesso a serviços públicos de saúde mental (dados de 2005), quando "a prevalência de doenças mentais com alguma gravidade andará pelos seis por cento", diz o presidente da Comissão Nacional para a Reestruturação dos Serviços Mentais, Caldas de Almeida. O primeiro Plano Nacional de Saúde Mental, que é entregue ao ministro da Saúde este mês, pretende resolver em dez anos "um problema de acessibilidade grave".

Há pessoas que têm de andar centenas de quilómetros para ter uma consulta de psiquiatria, aponta o psiquiatra Caldas de Almeida. Nomeado há cerca de um ano pelo Ministério da Saúde para dirigir uma comissão de peritos para pôr ordem à casa da saúde mental, o médico tem nas suas mãos o mapa dos problemas. Os dados que recolheu dizem-lhe que o acesso à saúde mental passa sobretudo por Lisboa, Porto e Coimbra. O que cria "um problema de acessibilidade grave e um problema de equidade gravíssimo", admite o médico, que passou cinco anos na Organização Mundial de Saúde a ajudar a criar planos de saúde mental em países da América Latina.

Mesmo a descentralização conseguida com a abertura de hospitais gerais por todo o país já com unidades de Psiquiatria não foi acompanhada pela dispersão dos médicos fora dos grandes centros urbanos. Caldas de Almeida dá o exemplo do hospital de Tomar, que tem unidade de Psiquiatra, mas não tem médicos para começar a funcionar. Quem consegue ir a consultas pú-blicas de Psiquiatria em Portugal, concentradas nos hospitais, vai na sua maioria por doenças mentais graves, como a esquizofrenia e doenças bipolares, e por perturbações associadas ao abuso de droga e álcool. Em menor escala vão pessoas que sofrem de doenças mentais de menor gravidade, como a depressão e a ansiedade.

O problema está também na excessiva concentração de serviços de Psiquiatria dentro dos hospitais. Já existe "um número significativo de equipas de saúde mental [dos hospitais] em que parte do seu trabalho é feito na comunidade", em centros de saúde. Um dos grandes desafios é ter o país coberto por equipas comunitárias de saúde mental, constituídas por psiquiatras, psicólogos, enfermeiros e assistentes sociais, em articulação com os clínicos gerais, refere o responsável.

Caldas de Almeida critica ainda a má divisão de recursos financeiros, em que 70 por cento dos custos são absorvidos pelo tratamento em internamento e só 30 por cento é dedicado a serviços de saúde mental na comunidade. Em "países desenvolvidos", a proporção anda nos 40 por cento para internamento e o restante vai para serviços na comunidade.